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sani SOBRE O AUTOR Sikiri Salémi, iorubé nascido em Abgokuta, Ogun State, na Nigéria e residente hé oito anos no Brasil, pertence 2 linhagem Kenta ¢ dedica a maior parte de seu tempo & pesquisa, 20s estudos © ao ensino de Lingua, Cultura e Religifio ‘Tradicional Torub4. B pés-graduando de Citneias Sociais na Universidade de Sio Paulo e professor de Lingua Cultura Torub4 do curso promovido pelo Centro de Estudos Africanos/USP. Fundou 0 Centro Cultural Oduduwa, onde ministra cursos sobre a Cultura Iorub, partieularmente, sobre 08 Cultos aos Oricés e aos Ancestrais e sobre Aaivinhagio, Ebé, Encantamentos e Magia. ti spn a5.55936-08-x > } DOS ORIXAS NA _AFRICA Acompante is-cemsete voludy VN SYXIHO SOG SOOLNYD (Sup) wy T¥S NY;YS (King) oe q 4q eee sess 3 Ge CANTICOS DOS ORIXAS NA AFRICA "Todos dicts par lingua portgucsa reservados pola Baitora Odd, | Nenuna pare desta publcagio poder ser rprodura,guurdada pelo nema “retrieval” ou trnsmitds de. qualquer modo ou por qualquee ‘outro melo, sofa este eletOnico, mecfico, de fotocdpia, de gravacio ‘ou otros, sm provi utorizag por pare do autor. Dados de Catalogasio na Publicasfo (CIP) Internacional (Cimara Bracleira do Livro, SP, Brasil) Stag, sae, “Censons Sos orc na Africa) Sk SG (King). ‘So Paulo Bator Otudwa, 1931. “Tero em orb com eadaso par portagube, i ISBN 5485326-02-X 1. Hao fiaaos 2, Miologi aca 3, Orin, Tao, st-a832 cop.209.64 230.6 ‘dices para catélogo sistemético: Iedtiea:Ctisos doors. 239.64, Edltora Oduduwa Ltda, Caixa Postal 9301 — CEP 01051 Sio Paulo— Brasil PREFACIO, A presente obra desse jovem afticano de pouco mais de trinta anos € a resposta dos Orixés, no final deste século XX, de tanta revolugdo fisiea, a um povo sofrido, descendente da tradigio iorubd, inicialmente radicado na Bahia, posteriormente espalhado por todo 0 territ6rio brasileiro. Os tempos atuais trazem para o povo de Orixé uma novidade: a possibilidade de expressdo, a certeza de que a Tradigao religiosa e cultural deve ser mantida, Daf, um mogo nigeriano, de Abgokuta, inspirado pelo Odu que rege o século XX, tem a idéia de publicar uma série de informagdes em forma de livro, compensadoras para aqueles que chegaram 40 Ocidente sem saber como nem para que vieram, No ano luz de 1990, ano das descobertas de inten- bes, publica o livro Mitologia dos Orixas Africanos, num impulso tranquilo e corajoso. Seguindo a linha magica de Asiwaju lanca, agora, este Canticos dos Orixas na Africa, fazendo eu a apresentagdo desta obra, com imenso prazer. Considero 0 resultado deste volume como sendo aquela drvore euja raiz esteve quase em decomposigae por enxertos impréprios, renascida pelos adubos de um jovem autor iorubd, amante deste Brasil, o qual reside em Sdo Paulo, para alegria dos ramos da drvore revigorada, Stkiri imi, o King, ou Adesina, 0 coroado nos caminhos, a0 colocar em pritica sua intencio,além de nos dar muita alegria, deixa claro que as forgas benéticas so verdadeiras e imutaveis, por isso, vencedoras. Dal a cer be 2 i teza da boa aceitagio deste livro que achei da maior Pureza e verdade, pois, pelo tempo que conheco esse nigeriano nascido em Abgokuta, posso afirmar que Ade- sina consegue, com distingao, realizar um curso de Pos. Graduagao em Sociologia na USP e, com orgulho, Preservar sua cultura de origem, sem oculté-la, Jovem autor, usando eu essa terminologia “em cima" de meus sessenta e seis anos de vida e cinquenta ¢ dois de iniciads, com discricéo, preservando o Segredo ‘oso, leva avante a idéia de ndo deixar morrer a tradi- 40 de seu povo. De uma forma didtica, de acordo com 08 tempos atuais, nenhum ser humano pode, no Culto aos Orixas, desprezar a forma escrita. Traduzindo os orin e ori dos orixds, proporciona a todos a sabedoria do que $e canta, aproximando, assim, cada vez mais, o Filho do Pai, Nada mais gratiicante que cantemos sabendo o que estamos cantando, A fita gravada, junto com o livro, pro- Porciona 0 aprendizado da melodia, o que faz maior ainda 2 proximidade dos homens com 0 Orixé. Destacamos do Orin agg: Aye Qkanténigha imale yé0 ba 9 ghé. aye. O axé das duzentas e uma divindades vai acomp: har voeé por toda vida. Homenageando Exu, diz o orin 2: Ex ghé, Eyi ghé o, Ents ¢ho Vore 0, Exu apoie-nos, 6 Exu, apoie aquele que fez 0 eb6 bem feito. Com os canticos para cada Orixd, chegamos a0 Orixd Oko: Oris Oko glént a tg kd Orixd Okd, aquete que poss dade. ima esteira de bon- Homenageia os Egingéin, quando diz: Omo di selé de wa. O filho tomard conta de casa durante nossa aus cia. Nossa drvore sagrada, que & 0 Irokd, também & homenageada: A tive lara o. Iroké vai harmonizar teu corpo. E, por af, seguem diversos orin € orfki que, com certeza, serdo lidos com delicia e, também, ouvidos por todo 0 povo de Santo, Maria Stella de Azevedo Santos Ode Kaygde Salvador, Bahia, outubro de 1991 He Ase Opo Afonja Canticos de Orixés, que ouvi dos babaléwo, babalériga ¢ iyélériga na Nigésia, entéo para 08 babalorixds @ ialorixds no Brasil Aqueles @ a estes oterego esta obra Introdusio ..... 9 Cintieos Ea Ex. 13s Osis) Ogu. aS Marts. a ‘Qbardié# Oxal.. ee 41 dia / Odudua a Osényin | Ossion 55 Sang 1 Xan’ ou Qya 1 Oyé -tansa 7 Ogun fOxum .... : at Q0b/ Oba sees 189 Yernoja lemanjé Osg9si Oxosse Odgtn-ede | Loguncs Oylunded / Oxumaré Qnig/ Omeolu Tei bei... m Qbaitwayd/ Obakuaé u7 ON: Oko f Orixd Okd .. 1a os a Eggngsin | Egungum ..2.e ese TRIE so seesseesesssutsesesserseesseseesessecseees BBL TSR rok} 135 Glossirio. 1 BT Relatores Oras 219 ReferGncias Biblogrifieas ...... sun cire 0 61 Introducio Apés 0 langamento do primeira volume de A Mi- tologia dos Orixits Africanos ', que retine um conjunto de mitos acompanhados de Addr’ (rezais), iba (saudagies), (evocagées) € orin (cantigas) usados nos cultos aos orixds na Africa, récebemos muitas curtas ¢ comentirios verbais de diversas pessoas, expressando sua satisfagio pelo trahalho e soticitando que gravassemos esse material em fitas de audio a fim de tornar possivel o aprendizado da prontincia correta das palavras, bem como da melodia € ritmo musical. Esse primeiro volume esteve restrito a Xangé, Oya (lansa), Oxum e Obi, devendo ocorrer, a médio prazo, a publicagio de material sobre outros orixas. ‘Temos razdes para supor que as pessoas que solici- taram a apresentagdo deste material didatico, mostrando- se interessadas em aprender as auténticas cantigas, rezas € evocacdes africanas, tenham sido porte-vozes de um grupo maior de devotos de orixas no Brasil, Por isso con- sideramos necessdrio e oportuno antecipar 0 langamento da presente obra, Acompanhado de fita cassete, com finalidade pri mordialmente didética, apresenta material sobre vinte & um orixis. A gravagao dos orin (cantigas) foi feita pelo préprio autor, iorubé de origem ¢ o fato de nao haver acompanhamento cle instrumentos dle percussio justifica- se pela necessidade de facilitar o aprendizado da prondin- 1 SALAMIS - Mania das Ont fice, Coeteade 8 (118), Ib (suites) or evox) oi (cats) wads ns culos soe ore na Avie. Vl 1 So Pala, Fu Oda, 198, ’ is formas de louvagdo aqui apresentadas hd objetivos comuns: comemorar a aceitagdo das oferen- das feitas aos orixas e solicitar a protegao divina para que, afastadas as interferéncias negativase favorecidas as posi- tivas, seja possivel ao homem aleangar a desejada condi de bem estar, Nos versos do adira Ogin (reza de Ogum) que apresentamos a seguir, temos um exemplo, Através dele solicita-se ao orixa que neutralize a agio de forcas negat vas: Ogiin onilé kat Opts mea ye we ta ikea Ma se wé tu éniyan Méi se éniyan ta wa Qgum, senhor da morada da morte, Ogum, nao nos conduza a morte, Livra-nos de desentendimentos com 0s outro Livra os outros de desentenderem-se conosco. Os versos de uma cantiga de Exu, apresentados a seguir, visam atrair forgas positivas: Ei fi ire bd wd o Ela fi ire bd wa yaya Esti ghé ire ajé kd wa 0 Iyd-mdgtin fire bo wa 0 Exu, faga nossa vida plena de coisas boss. Ela, ponha muita sorte em nossas vidas, Exu, ponha sorte e progresso em nossas vidas. Tya mogun, faga nossa vida plena de coisas boa Outros versos pretendem, simultaneamente, atrair Forgas positivas e afastar as negativas. Como estes de uma cantiga de Exu: Okainrin ond Kio dé ibi Kio st ire sile bay? 0. O homem do caminho, Que vocé afaste o mal abra caminho para o bem. Incluimos Egangin, Geledg e Iroko entre os vinte ¢ um orixis, Bgtingin ¢ Gzlidg constituem, respectiva- mente, culto aos ancestrais masculinos € ao poder ances tral feminino; Iroko é a expresso de um fendmeno da natureza -a drvore. No Brasil nos defrontamos com uma diivida a respeito do falo de Egangin ¢ Geedé serem orixis ou ndo, Queremos relatar que, na Africa, entre os iorubiis, ambossdo considerados orixds e constituem, mui- tas vezes, o principal objeto de culto em algumas familias, como evidencia a expressio Eyingiin ni oro ile wa, que significa Eyingin é o orixd cultuado em nossa familia. A mesma expresso é utilizada para referéncias feitas aos ccltos de outros orixés: Obatala ni ora ile wa, que significa Obatala 6 0 orixd cultuado em nossa familia ou sind: Géledé ni oro ile wa, que significa Geldg é 0 orixd cultuado ‘on nossa familia, Outro dado comprobatério do fato de Egiinggn estar entre os orixds cultuados nas varias familias Jo 0s nomes ou sobrenomes de algumas pessoas: Egun- u dola - cultuando Egiingiin alcancamas a prosperidade e 0 bem-estar almejados; Qjctande -parintermédio do sacerdse te de Egiingéin retornaesta crianga ao seio de nossa familia? © processo de iniciagdo em Egingiin ¢ Géledé n ‘ocorre de modo idéntico ao dos demais orixds, pois finalidade principal é a transmissao de conhecimento do awo, A desobedigncia& determinugdo do ordeulo de I quando este aponta para a necessidade dle render culto a Egangin, Gelgdg ou qualquer outro ori, trard grande atraso de vida ao desobediente, Tal determinagio tem duas origens possiveis. Pode tratar-se de um orixd de hheranca familiar, isto é, orix que foi ou deveria ter sido cultuado por um antepassado e pode ocorrer, também, que a determinacdo tenha cardter mais individual. Newe aso, hd vias possibilidades: 0 orixd indicado pelo orieu lo devers ser cultusdo para que os problema sejam sol. cionados; para que se erie um eficiente eunal de comunieagdo entre o orixé © o ort da propria pessoa, evitando, assim, oaparecimento de problemas que pertur, bariam o desenvolvimento natural do destino ou ainda, ara que a pessoa tenha forga necessiria pa ssdria para a realizagio do proprio destino, , * Nao esquecumos que muitas vezes a inicia realizada, nao por determinagdo do ordculo e sim por escolha da propria pessoa que sente especial simpatia pelo ‘cane Gg = seeded sto de Hg un de = priors ni vtomar Ogun ‘seated singin. tans ese sul, ore se fami de wma ing que mona escolhiido como objeto de culto, Os orfki, addr, orin ¢ ijald, cuja forge e profundo significado revelam feitos e caracteristicas dos orixés, ser- vem, também, como formas de evocé-los. Os adiir’ (re- zas) e oriki (evocacdes) visam a obter as gracas dos orixés ¢ dirigem-se aos elementos por eles dominados. =O oriki de um orixa geralmente tem passagens em que suas bengaos e ajuda sdo solicitatlas. Ao serem evoca- dos seus feitos, 0 chamado sera infalivelmente ouvido: receberd as oferendas e ouviré os pedidos de quem o esté ‘evocando, Uma pessoa recita o oriki de determinado orixd para obter seus beneficios, evitar sua antipatia, aplacar sua ra ou exorté-lo a langé-la contra algum inimigo. Oxum é solicitada em caso de esterilidade e Ogum nas aberturas, de caminhos, Cada orixa domina determinado elemento estar eoneliiude eam um orixd signitiew utustar de st a ‘ocorréncia de problemas relacionados ao elemento por ele dominado. Quando a ira de um orixi nao é aplacada, ou ainda, se é dirigida contra alguém, surgem males earac- teristicamente associados aos elementos por ele domina- dos. Por exemplo, a barriga d’agua é associada a ira de Oxum: Ela enche de dgua a barriga dos inimigas e Xango, normalmente evocado em casos de injustiga, é solicitado alangar raios na casa dos inimigos. Os orin (cantigas) so formas mais brandas de Jouvacdo, empregadas nas festas ¢ celebragdes a determi- nado orixd, Carrega parte da carga informativa do oriki e representa um ponto intermedifrio entre a exortagdo dos poderes do orixé contidos no Adar’ ¢ a musicalidade do oriki, 3 As cantigas em homenagem a Ogum, o guerreiro, denominam-se ijald Qdé ¢ sdo acompanhadas de dangas, nas festas promovidas pelos cagadores que o consideram como seu patrono®. A expressdo oriki Ogiin refere-se aos oriki recitativos usados em outras circunstiincias, especial- mente em atos individuais de veneragao, Poderia causar estranheza a alguns, o fato de apre- sentarmos Omolu e Obaluaé como dois orixds distintos. Sabemos que ha uma polémica em torno disso, defenden- do alguns, posigio de que se trata de uma tinica divindade com dois nomes, No Diciondrio da Lingua Pontuguésa, de Aurélio Buarque de Holanda, encontramos o registro des- Se equivoco: Obaluaé é apresentado como o orixa da variola e como equivalente a Omolu e Xapana. Assim, os orixés Obaluaé, Omolu ¢ Xapand sto apresentados como um iinico. E necessirio que se eselareca que Obaluaé e Xpand sio, de fato, a mesma divindade - 0 senhor da variola, orixd da terra, Omolu, entretanto, € outra divinda- de, também chamada Nana Buruku ou Nana Buluku, Esta divindade tem origem em Sabg, uma das cidades de Dao- mé (atual Repiblica do Benin) e foi levada para a cultura iorubé, mais especificamente, para Abgokuta, por uma escrava. Em seus grupos de origem (ewe e fon) recebe 0 nome de Nana-Buluku e € considerado o Deus Supremo, © criador de todas as coisas. Entre os iorubés recebeu denominacdo de Omolu, que signitica, literalmente, "O filho de Deus". Hi mitos que o descrevem como homem € outros, como mulher. & chamado de Buruku, enquanto 3° Pars evitarpossies mal enone, slarego que Ons eaxadore Open € guerrero paronn dos cagadores Amb sh cnsierado prolongs don cages 4 homem, tornando-se Omolu quando o aspecto feminino é enfatizado. Cate ressalar, ainda, que esta obra apresentapar- ii la te de um longo e intenso trabalho de pesquisa realiza desde 1985 na Africa (Nigéria), junto a babalads, babalo- rixds ialorixds, cujas vidas sio inteiramente dedicadas aos servigos sagrados. Nos textos em portugués o leitor encontrard muitos voesbulos que no foram traduzidos. Optamos por eriar uum glossério que os reunisse, possibilitando uma explana ‘gio mais cuidadosa e completa a respeito de seu significa do, uma vez que a tradugdo do iorubé para o portugués constitui sério desafio e nao queremos mutitar ou distor- cer o sentido das palavras. Este glossério constitui parte de um outro, bem mais amplo, que vem sendo elaborado desde 1987, em colaboracdo com a pesquisadora Iyakemi Ribeiro, da Universidade de Sio Paulo, cujo vinculo com a Tradigio Torubé manifesta-se em intenso ¢ detleado trabalho com a lingua e @ cultura, visando participar do resgate das auténticas rafzes africanas em nosso meio, Experamos que esta nova publicagio, cumprindo os propésitos que he deram origem, venha a consttuir-se ‘em instrumento vital para a preservagdo ¢ resgate da tradigdo religiosa iorubé. Treo! Sao Paulo, outubro de 1991 15 Algumas observagées sobre o idioma iorubé

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