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Lula é o político mais popular do mundo

Newsweek:

“O Homem Mais Popular do Planeta”


Durante quase sete anos ele tem feito um trabalho espetacular como presidente do
Brasil. Mas ele pode resistir à tentação de jogar tudo fora?
By Mac Margolis | Newsweek Web Exclusive
22 de setembro de 2009

Eraldo Peres / AP
Luiz Inácio Lula da Silva é o improvável herói do Brasil.

Ele cresceu tão pobre, que somente descobriu o que era pão quando tinha 7 anos. Essa era a
idade de Lula quando ele subiu em um "pau-de-arara", com agricultores que fugiam da seca, para
uma viagem até o sudeste do país, onde sua família instalou-se numa favela de São Paulo. Ele
abandonou a escola na quinta série, foi engraxate e foi trabalhar como operário aos 14 anos. No
início da carreira, perdeu um dedo em um torno em virtude de um acidente ocorrido no turno da
noite, em uma fábrica de autopeças. Anos depois, tornou-se líder sindical respeitado
internacionalmente. Isto porque, em pleno regime militar, as greves eram ilegais, mas ele
desafiou os generais e os patrões e praticamente paralisou a potência do estado de São Paulo, a
região do ABC, em nome do sindicato.

Esta semana, está em Nova York para lançar a sessão da Assembléia Geral da ONU. As câmeras
podem concentrar-se no charme 'cool' do americano Barack Obama, ou em ditadores como
Mahmoud Ahmadinejad, do Irã, e Hugo Chaves, da Venezuela, Hugo Chávez, mas a maior
estrela do encontro será o operador de torno barbudo: o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da
Silva. Após quase sete anos tumultuados em exercício, ele continua com uma inacreditável taxa
de aprovação acima de 70%. Isso, por si só, seria um feito notável em qualquer lugar, até mesmo
em um continente onde os presidentes são uma mercadoria descartável. "That's my man", disse
sobre ele o presidente Obama, na cimeira do G-20, em Londres. "O político mais popular na
terra", completou.

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Lula é o político mais popular do mundo

Com sua liderança, o Brasil tem resistido à crise melhor do que qualquer outra nação: nenhum
banco foi abaixo, a inflação está controlada e a economia está crescendo novamente. "As pessoas
duvidavam quando eu disse que seria o último a cair em recessão e o primeiro a sair", Lula disse
à revista Newsweek, em entrevista exclusiva. "Mas basta apenas esperar e conferir. Nós vamos
criar um milhão de empregos este ano". A notícia não é tão boa quanto pode parecer: um milhão
de empregos seriam suficientes apenas para substituir os postos que o país perdeu desde outubro
de 2008. Mas o Brasil está parecendo muito bem em comparação com a maioria dos lugares.
Ultrapassou a Rússia e se junta à Índia e à China, outras grandes potências emergentes, que
foram o BRIC.

O brasileiro é o homem do momento e diz que não jamais poderá dar costas às urnas. "Se você
tem políticas com falhas e tenta vendê-las com publicidade falsa, sua avaliação não vai durar",
diz ele. Mas a questão agora é saber se ele pode continuar a apostar na transformação de sua
força em ganhos para o Brasil e, mais incisivamente, se ele está prestes a jogar fora muito do que
ele realizou como presidente. Ele tem apenas 15 meses de mandato e sua candidata à sucessão, a
ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, tem pouco reconhecimento entre a população e nem um
traço do charme de seu chefe. Apesar de sua imensa popularidade, pesquisas recentes dizem que
ela está correndo num distante segundo lugar e perdendo terreno para o governador de São
Paulo, José Serra. "A aura de Lula não é transferível", observa Donna Hrinak, embaixadora dos
E.U. para o Brasil.

Em nome de ajudar os pobres e trabalhadores brasileiros de classe, mas com um olhar atento
sobre a eleição do próximo ano, Lula tem reiteradamente reajustado o salário mínimo (67%
desde 2003, quase 40% acima da inflação) e está impulsionando pagamento de dívidas e de
pensões; um movimento que pode criar problemas à administração seguinte. "Temos que dar um
pouco mais para aqueles que ganham menos", diz Lula. No entanto, esse é o tipo de conversa
populista que dá muitos calafrios. "O risco é o legado de despesas fixas e compromissos
orçamentais que Lula vai deixar para o futuro", adverte o ex-ministro Mailson da Nóbrega. A
folha de pagamento pública está crescendo em mais de 10 vezes a taxa de investimento público
em estradas, pontes e portos. Enquanto isso, Lula não tem feito nada para aliviar a carga
tributária total do país, o mais elevado nos mercados emergentes em 36% do PIB. E quando o
senador e ex-presidente José Sarney, que controla um bloco de chave de votos no aliado Partido
do Movimento Democrático Brasileiro, foi pego distribuindo empregos para amigos e parentes,
Lula correu para sua defesa, dizendo que Sarney “não poderia ser tratado como uma pessoa
comum”, uma estranha escolha de palavras, vindo de um homem do povo.

Ainda assim, se há uma verdade constante sobre Lula, é que as coisas estão sujeitas as alterações.
"Eu sou uma metamorfose ambulante", ele gosta de dizer, citando o cantor brasileiro Raul
Seixas. Na superfície, ele tem mais do que uma leve semelhança com o homem rudimentar de 30
anos atrás, ou mesmo para o político que se tornou nos anos 80 e 90. Os antigos cachos negros e
uma barba desgrenhada, agora é cuidadosamente aparada. Ao invés de camisetas surradas de
trabalho e jeans boca-larga, veste-se em belos ternos sob medida. O homem que assumiu o cargo
dizendo que chegava para melhorar a sorte dos pobres brasileiros está convencido de que o
Brasil tem a missão de transformar o mundo. "O Brasil é um país com sólidas instituições
democráticas", diz ele. "E nós mostramos às demais nações algumas lições sobre como enfrentar
a crise econômica."

Apesar disso, os amigos próximos dizem que ele é o mesmo de sempre. Utiliza nos discursos o
mesmo vocabulário que eletrizou seus companheiros metalúrgicos e fica irritado quando passa
muito tempo em seu gabinete. "Ele fica nervoso quando ele passa muito tempo em sua mesa",
diz o chefe de gabinete, Gilberto Carvalho. “Ele diz: Eu preciso sair e viajar e conhecer pessoas.”

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Lula é o político mais popular do mundo

No entanto, Lula tem resistido aos apelos para emendar a Constituição e buscar um terceiro
mandato, e alerta para o erro da "falsa celebridade". "Popularidade é como a pressão arterial", diz
ele. “Às vezes é alta e às vezes é baixa. O que você precisa é mantê-la sob controle”.

Essa é uma habilidade que ele adquiriu da maneira mais difícil. Começando em 1989, ele
concorreu à presidência por três vezes e, no final dos anos 90, ele estava prestes à abandonar a
política. Em vez disso, fez algo mais ousado: refez a si mesmo. Passou a usar terno e gravata,
contratou um treinador de fala e um assistente de marketing. Não bastasse, mudou o tempero de
sua política de esquerda. O ponto da virada foi junho de 2002. Ele estava à frente nas pesquisas,
mas a economia do Brasil foi sendo abalada, em parte porque os investidores estavam assustados
com a perspectiva de ter Lula como presidente. Ele respondeu com uma "Carta ao Povo
Brasileiro", comprometendo-se a honrar os contratos, pagar as dívidas do país, cumprir as
exigências do Fundo Monetário Internacional e jogar pelas regras do mercado. Foi a jogada de
sua carreira. A linha dura de seu Partido dos Trabalhadores (PT) acusou-o de traição e de estar
cedendo aos banqueiros.

Ganhou as eleições, mas o trabalho duro tinha apenas começado. A turbulência financeira pré-
eleitoral teve conseqüências no crescimento econômico e forçou a uma forte desvalorização da
moeda do Brasil. "Não foi fácil", lembra Lula. "Não tínhamos crédito externo. Nossas reservas
eram extremamente baixas e a inflação mostrava fortes sinais de ressurgimento. A economia
estava engarrafada." Mas um desafio ainda maior foi conviver com a imagem que ele adquiriu ao
longo dos anos. "Nós assumiu o cargo em meio a uma enorme crise de desconfiança", diz
Carvalho, seu chefe de gabinete e um amigo de longa data. "Nós éramos uma minoria no
Congresso. A imprensa foi cética."

Para convencer os credores que o Brasil era sério, Lula aumentou o "superávit primário", o
dinheiro que o governo deixa de lado a cada ano para pagar dívidas e juros e aumentou as taxas
de juros para 26%, a fim de matar a inflação. Ele também manteve os salários e pensões sob
controle. "Os sindicatos e muitas pessoas do partido odiaram", diz Ricardo Kotscho, amigo e ex-
assessor de imprensa.

Internacionalmente, os grandes executivos ainda não estavam convencidos. "Sabíamos que ele
tinha sido um líder sindical e presidente de um partido político. O que eu realmente me perguntei
foi se ele tinha as armas para ser presidente", diz o ex-presidente do Banco Mundial, James
Wolfensohn. E Lula tem agido dessa maneira desde então, colocando o pragmatismo à frente da
ideologia. "Ninguém nos seus sonhos teria pensado que Lula iria se comportar do jeito que se
comporta", admite o guru do mercado de investimentos, Mark Mobius, da Templeton Asset
Management. Agora Templeton tem US $ 5 bilhões no Brasil, mais do que na China. Por certo,
Lula tinha muito o que trabalhar. Com uma rede de centrais hidroelétricas e metade da frota de
veículos movida à álcool, o país tem sido o ponto de referência em energias renováveis.

"Tivemos de deixar claro que o Brasil não é um país pequeno", reforça Lula. "O Brasil tem a
Amazônia [floresta], mas faz também aviões e telefones celulares." E assim, sua diplomacia
agressiva tem encorajado nações mais pobres a assumirem um novo papel na economia
internacional. Seu maior mérito, no entanto, tem sido a sua capacidade de vender as reformas
para uma população maioritariamente pobre que olhou para ele como uma espécie de salvador.
"A popularidade de Lula ajudou a tomar decisões arriscadas", diz José Dirceu, um ex-ministro,
que caiu após um escândalo de corrupção. Mais importante: ao contrário dos demagogos
populistas que abundam na América Latina, ele fez jogando pelas regras. "O respeito de Lula
pela democracia e eleições é uma grande vantagem", diz o ex-secretário do Tesouro Joaquim
Levy. "Muitas vezes ele tem sido capaz de traduzir os valores fundamentais da democracia de
modo a torná-las mais concretas para as pessoas".

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Lula é o político mais popular do mundo

O crash econômico, finalmente, colocou as habilidades de Lula à prova. "Foi assustador", lembra
o presidente do Brasil. "Não tínhamos crédito, sem dinheiro, em setembro, outubro, novembro,
dezembro, janeiro, fevereiro e março." Mas em vez de balançar para a esquerda, seus instintos o
levaram para o centro, fortalecendo-o contra pressões populistas. Ele deu ao Banco Central uma
mão livre para controlar a inflação, mesmo ao preço de reduzir o crescimento. "Nós sabíamos
que não haveria milagres", diz ele.

Ainda assim, a crise inflamou o velho rancor de Lula sobre o "capitalismo selvagem" e a loucura
do mercado livre. Ele culpou a confusão do mercado às pessoas de "pele branca e olhos azuis",
que sempre conduziram a economia mundial, além de ridicularizar os campeões da
desregulamentação e do "mínimo" do estado. "Nos anos 80 e 90, era moda ridicularizar o
Estado", diz ele. "Mas em um piscar de olho, o mercado livre quase faliu o mundo. E a quem vão
pedir ajuda? Ao Estado."

Mas a maior ambição de Lula é fazer valer o lugar do Brasil no cenário mundial. Ele não faz
segredo do seu próprio orgulho nacional. Já em 2003, as nações do G-7, finalmente, abriram seu
encontro anual para alguns dos países menos ricos, e Lula estava entre os convidados. Ele se
levantou antes do encontro na França e ficou maravilhado com o quão improvável era que ele,
filho de um camponês, era agora abordar algumas das pessoas mais poderosas do planeta. Então
ele virou a mesa: por que não realizar a próxima reunião do G7 no Brasil, ele desafiou. "Afinal,
em 20 anos talvez apenas três de vocês vai continuar a existir." Nem todo mundo se divertiu.
Mas ninguém perdeu o ponto.

Fonte: http://www.newsweek.com

Adaptado por: Maria Clara Oliveira de Albuquerque


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E-mail: marie.oliveira1997@yahoo.com

Newsweek (News= Notícia, Week=Semana), é uma revista norte-americana semanal publicada


na cidade de Nova Iorque e distribuída para os Estados Unidos e também internacionalmente. Na
atualidade é a segunda maior revista semanal do país, superada apenas pela Revista Time em
circulação e ganhos com publicidade.

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