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Siranda.

Revista de Estudios Culturales, Teoría de los Medios e Innovación ISBN : 1989 - 6514
Tecnológica Número 3
http://grupo.us.es/grupoinnovacion/ Año 2010

BABEL: AS DIFICULDADES DE COMUNICAÇãO NUM MUNDO GLOBAL

BABEL: THE DIFFICULTIES OF COMMUNICATION IN A GLOBAL

Maria do Céu Martins Monteiro Marques


CEMRI – Universidade Aberta
Rua da Escola Politécnica, 147
1269-001 Lisboa
Tel. +351 213 159 777
mariaceu@univ-ab.pt
Resumo

Babel, o filme que nos propomos analisar, levanta algumas questões no que
respeita à sociedade contemporânea e ao seu modus operandi. O ataque
perpetrado contra as Torres Gémeas abalou a ordem mundial e gerou polémica e
medo em todo o mundo.
O manuseamento irreflectido de uma arma por duas crianças marroquinas dá
origem a uma série de situações que, no mundo globalizado em que vivemos,
acabam por interligar povos e continentes. O tiro, que atinge uma camioneta com
turistas e fere uma americana, é considerado um ataque terrorista e serve para
mostrar como tudo está ligado neste planeta.

Abstract:
Babel, the film we are going to analyse asks some questions concerning
contemporary society and its modus operandi. The attacks against the Twin
Towers shook the world order and produced debate and fear everywhere.
The handling of a gun by two young boys in Morocco was in the origin of a series
of misunderstandings that in the globalized world we live in interweave people
and continents. An American woman travelling in a tourist bus is hit by a stray
bullet and the incident being considered a terrorist attack. The film tries to show
that everything is tied up on this planet.
Babel: As Dificuldades de Comunicação num Mundo Global

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'Where do you come from?'


´What's the difference, I´m here
now"

Louis Malle

A escolha do título do filme Babel não foi de todo inocente tendo em


conta os paralelismos que é possível estabelecer entre a obra cinematográfica e a
história da Torre de Babel narrada no livro do Génesis 11:1-9, onde se conta que
um povo emigrante do Oriente, que falava a mesma língua, decidiu construir uma
cidade e uma torre que chegasse aos céus. Quando o Senhor (Yahveh) viu o que
os homens tinham construído, resolveu dispersá-los por toda a Terra tendo antes
baralhado a sua linguagem. Através desta alegoria procura explicar-se a origem
das diversas línguas faladas no globo. Babel foi, no mundo antigo, uma cidade
bastante rica e poderosa, uma grande metrópole que recebia muitos emigrantes
de diversas nacionalidades que falavam línguas diferentes.
À semelhança de Babel, o filme com o título homónimo apresenta casos de
cidadãos comuns num mundo globalizado e em mudança, onde se falam várias
línguas mas os homens não se entendem porque não se ouvem e não por
falarem outra língua. A comunicação entre as pessoas tornou-se numa troca de
códigos indecifráveis. O espectador é apanhado por uma teia de histórias de
quatro famílias com problemas diversos, mas cujas vidas acabam por se enredar
devido a uma série de mal-entendidos. Cada família representa uma cultura
distinta e fala uma língua diferente: a marroquina, luta pela sobrevivência num
solo hostil, a americana busca a felicidade longe do seu país, a mexicana vive
dividida entre o México e os Estados Unidos, onde uma mulher enfrenta os
problemas da emigração ilegal e a solidão e, a japonesa busca respostas para as
suas frustrações sexuais e o equilíbrio emocional que não existe em relação ao pai.
O manuseamento irreflectido de uma arma por dois jovens marroquinos
que apenas queriam testar o seu alcance depois do pai a ter comprado e lha ter
entregue para poderem tomar conta do rebanho, gera uma série de situações,
que no mundo globalizado em que vivemos, acabam por interligar diferentes
povos e continentes. O tiro, que atinge uma camioneta com turistas e fere uma
americana, é noticiado em todo o mundo não como um acidente mas, de uma

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forma sensacionalista, como um ataque terrorista. Se Susan Jones não fosse


americana e não estivesse num país árabe, a trama seria diferente. Desde o
atentado do 11 de Setembro contra as Torres Gémeas, em Nova Iorque, que os
americanos passaram a sofrer do sindroma do terrorismo, por isso, um qualquer
acto que para um simples mortal não passa de um acidente, para um americano
é, de imediato, associado aos terroristas islâmicos.
Na era da globalização em que vivemos e em que se pretende que a
cooperação entre os povos cresça e frutifique, é normal que os perigos também
aumentem porque cada povo tem um ver e um sentir diferentes mas essa
diferença tem de ser respeitada para que as relações se fortaleçam. O desejo de
abertura para o mundo sempre foi uma ideia defendida pelos americanos mas
nem sempre bem aceite pelos outros países.
No segundo discurso inaugural proferido em 1957, o Presidente Dwighy
D. Eisenhower afirmou: "… our world is where our full destiny lies – with men, of all
peoples, and all nations, who are or would be free." Como se depreende das
palavras do presidente, nos anos 50, os Estados Unidos da América e os seus
políticos pretendiam que o país tivesse um papel interventivo a nível mundial e
prossegue "no people can live to itself alone … No nation can longer be a fortress,
lone and strong and safe. And any people, seeking such shelter for themselves,
can build only their own prison". Ao optarem por um papel demasiado
interventivo em todo o mundo, os Estados Unidos têm-se conseguido impor
muitas vezes, pela força, na vida dos outros países, gerando ódios por parte dos
povos que consideram aquela potência uma ameaça a nível económico, político,
cultural e social por condicionar a sua liberdade.
Muitas das dúvidas que foram levantadas ao longo do século XX, quanto à
possibilidade da existência de uma cultura a nível global, ficaram a dever-se à
ausência de uma memória mundial capaz de unir a Humanidade. No entanto, era
inegável que o mundo partilhava, há algumas décadas, várias coisas desde o
desejo de uma democracia a nível mundial, ao respeito pelos direitos do homem,
passando pela existência de uma língua e moeda comuns que facilitassem a
convivência entre todos os povos.

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A partir da década de setenta do século passado, os movimentos


migratórios e o desenvolvimento de novas tecnologias promoveram o
conhecimento de diferentes culturas, algumas quase desconhecidas para muitos.
A supremacia económica e tecnológica dos Estados Unidos permitiu àquele país
uma imposição dos seus valores e dos seus produtos que passaram a estar
associados a uma invasão das economias mundiais e a uma uniformização dos
bens de consumo.

Globalization has reduced the sense of isolation felt in much of the


developing world and has given many people in the developing countries
access to knowledge well beyond the reach of even the wealthiest in any
country a century ago. The antiglobalization protests themselves are a
result of this connectedness. (Stiglitz, 2002)

Contudo, a influência americana acabou por ser nefasta para os mais


desfavorecidos e as tendências de consumo não foram tão globais como muitos
desejavam. Apesar de muitos milhões de pessoas usarem a Internet diariamente
em todo em mundo, outros tantos não conseguem sequer ter acesso a um
telefone ou aos bens essenciais para assegurarem a sua sobrevivência. Este facto
está bem patente em Babel, quando Richard Jones, o turista americano, tenta
comunicar com a embaixada do seu país para pedir uma ambulância ou um
helicóptero que permita transportar a mulher para o hospital.
A sua atitude e o comportamento face à situação em que se encontra
demonstram, de certa forma, alguma arrogância do americano face às outras
pessoas. O desespero e impotência perante a situação da mulher fê-lo esquecer
que estava num país estrangeiro cujas leis desconhecia e que, apesar de ser um
forasteiro, tinha de seguir e respeitar. O seu comportamento corresponde ao de
qualquer ser humano que perde o controle quando deixa de ser capaz de gerir a
situação em que se encontra. Os factos narrados não apresentam uma atitude
conflituosa, os brancos civilizados não entram em confronto com os árabes
primitivos mas existe uma colaboração porque alguém está entre a vida e a morte.

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Perante o problema da sobrevivência de Susan, a solidariedade marroquina


foi fundamental durante as primeiras horas depois de ter sido ferida. O facto dos
socorros serem prestados não por um médico, como aconteceria nos Estados
Unidos ou num país ocidental, mas por um veterinário por ser o único com
conhecimentos científicos capazes de a ajudar, não significa falta de respeito pelo
estrangeiro. Num lugar recôndito e pobre, as pessoas não tinham um médico a
quem recorrer em caso de doença, por isso, qualquer ajuda podia significar a
diferença entre a vida e a morte. De notar também o apoio de uma mulher
marroquina idosa que, graças à sua sabedoria, ajudou a americana a suportar o
sofrimento e as dores dando-lhe algo para fumar que a pôs a dormir e a aliviou
durante algum tempo.
De certa forma, o filme testemunha que as diferenças culturais existem em
todas as classes sociais e podem influenciar a vida de qualquer um, em qualquer
lugar do planeta, mesmo numa pequena aldeia perdida no meio do deserto
marroquino. Apesar de alguma relutância inicial do casal em ser ajudado pelos
marroquinos, o auxílio acaba por ser bem aceite embora também não houvesse
muito mais a fazer. Por parte dos marroquinos não sentimos qualquer relutância
em ajudar Susan e tudo foi feito para salvar uma mulher ferida
independentemente da sua raça, religião ou ideologia.
Esta situação prova que apesar de existir alguma tensão política entre o
governo americano e o marroquino, o povo consegue distanciar-se desses
problemas, ou porque os ignora ou porque prefere optar pela ajuda ao próximo
de acordo com a sua cultura. Depois daquele acidente, o comportamento do
casal em relação ao outro será certamente diferente: "How American define
themselves determine their role in the world, but how the world views that role
also shapes American Identity" (Huntington, Samuel P., 2004)
Apesar de existir algum preconceito em relação aos americanos,
nomeadamente por parte dos países árabes, e um certo medo devido à ameaça
que estes representam por quererem impor a sua presença a nível económico,
político e cultural, em Marrocos, o casal foi bem acolhido e não se verificou
qualquer hostilidade. Em parte, o anti-americanismo que tem surgido deve-se ao
receio da homogeneização por parte dos países mais pobres e prende-se com a

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padronização imposta pela economia que, por um lado, cativa as massas e, por
outro, condiciona as indústrias locais. As indústrias de comunicação e de
entretenimento, de origem americana, têm sido vistas como uma ameaça à
diversidade cultural dos povos mas servem também como instrumentos capazes
de criar as condições para "renewed dialogue among cultures and civilizations "
como refere a "Universal Declaration on Cultural Diversity"1 ratificada pelos
membros da UNESCO.
No âmbito do processo de globalização cultural contemporânea, devemos
examinar como foi vista a identidade americana no mundo e a forma como foi
influenciada por factores externos. Segundo Dominique Walton:

A tecnologia e a economia transformaram o mundo numa aldeia, mas, ao


suprimirem as distâncias físicas, tornaram infinitamente visíveis as distâncias
antropológicas. Ou tentamos modestamente compreendermo-nos e
tolerar-nos um pouco melhor, ou fingimos acreditar que a cultura e a
comunicação serão solúveis na modernidade ocidental. Então, a
globalização, em vez de ter dado ocasião a uma cooperação um pouco
mais pacífica, tornar-se-á um factor suplementar de guerra. (Walton, 2003)

Babel está repleto de fobias e preconceitos culturais colocando algumas


questões que afligem a sociedade do século XXI. Para além de ser exposta a
situação económica e político-social das personagens que representam culturas
diferentes, é proposta ao espectador uma reflexão sobre o relacionamento dos
cidadãos com as autoridades, os problemas da emigração, a importância das
relações entre os membros das famílias, a solidão, o autoritarismo e o terrorismo.
No fundo, pretende-se provar que apesar de vivermos numa aldeia global e
termos ao nosso dispor toda a tecnologia para nos mantermos em contacto,
estamos cada vez mais distantes ao nível da comunicação não por falta de meios
mas de vontade e capacidade para comunicar.
Actualmente, considera-se que a função do cinema vai muito além de um
objectivo estético a ser exibido ou de uma mensagem a ser transmitida. O cinema
constitui-se numa efectiva prática social para os realizadores e para o público.

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Trata-se de um núcleo onde podemos identificar os próprios componentes da


cultura.

If globalization continues to be conducted in the way that it has been in the


past, if we continue to fail to learn from our mistakes, globalization will not
only not succeed in promoting development but will continue to create
poverty and instability. Without reform, the backlash that has already started
will mount and the discontent with globalization will grow. (Stiglitz, 2002)

Esta produção cinematográfica apresenta algumas críticas à política externa


americana quer em relação ao vizinho México quer em relação ao papel que os
Estados Unidos têm adoptado face aos outros países ao longo da história. A
situação narrada que decorre entre Tijuana e Los Angeles evoca a questão da
fronteira um assunto sempre caro aos americanos. Se, por um lado, a ideia de
globalização defende a livre circulação de mercadorias e quase todo o tipo de
bens, por outro, as pessoas vêem-se limitadas por muros e passaportes como
acontece naquele zona do planeta.
O grito de Amélia "eu não sou má, só cometi uma idiotice", mostra bem
como todos estamos à mercê do acaso e como um erro, por mais pequeno que
possa ser, pode destruir os sonhos e objectivos de uma vida. No filme, Amélia é
uma anti-heroína que ao quebrar as regras sociais é castigada sofrendo na própria
pele as consequências dos seus actos. No entanto, ela já foi uma heroína que, à
semelhança de muitos homens e mulheres de países pobres, um dia abandonou
o seu país, o México, e a sua família para ir em busca do seu sonho americano:
uma vida melhor e alguma riqueza.
Apesar da distância, esta mulher não esquece as suas raízes, a sua cultura, e
no dia do casamento do filho ela, como qualquer mãe, quer estar presente para
testemunhar e viver as alegrias de uma data tão especial na vida de alguém tão
próximo e, ao mesmo tempo tão longe, que ela teve de abandonar em busca de
uma vida melhor.
Depois de várias tentativas frustradas para deixar as crianças americanas
nos Estados Unidos, que estavam à sua guarda devido à viagem dos pais a

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Marrocos, e como não quer faltar à cerimónia talvez para compensar o filho pela
sua ausência de mais de uma década, num acto irreflectido, pega nas crianças e
parte para o México apesar de saber que é uma emigrante ilegal e que se for
apanhada pela polícia na fronteira, pode ser presa e deportada. Mesmo assim,
arrisca o seu futuro e a sua vida bem como a das crianças para estar presente e, a
partir desse momento, tudo passa a estar em perigo. Embora viva e trabalhe há
dezasseis anos nos Estados Unidos, Amélia não adquiriu quaisquer direitos
naquele país onde não passa de mais uma peça da engrenagem que pode ser
substituída a qualquer momento.
À semelhança desta personagem, Iñarritu também é um mexicano que
vive nos Estados Unidos embora com outro estatuto. Numa entrevista, que deu a
alguns jornalistas relativamente a Babel, o cineasta afirmou que "Foi uma
necessidade pessoal falar de temas que me estavam causando muita dor, que
vieram de uma necessidade de expressar o que eu sentia vivendo num país como
os Estados Unidos". O filme surge de uma reflexão pessoal e fala de problemas que
assolam as sociedades actuais, constituindo um documento importante para os
historiadores. De acordo com a opinião de René Gardies

Examinados de forma crítica, quer procurando neles dados autênticos,


quer demonstrando os seus discursos enganadores, alguns filmes,
utilizados como fontes primárias, permitem então confirmar ou, por vezes,
modificar as análises provenientes de outras fontes. As suas imagens são
testemunhos da percepção que temos ou que queremos e podemos dar
de factos reais, num momento preciso, datado e localizado. (Gadies, 2008)
O cineasta conhece bem os problemas das minorias que existem na
sociedade americana e que são aceites porque constituem mão-de-obra barata.
Contudo, vivem nas margens mas, de um modo geral, não se deixam aculturar
mantendo os seus usos e costumes bem como a sua língua, que constitui uma
forma de preservar a sua identidade. Num espaço onde todos os saberes se
cruzam, essa é uma riqueza que temos para nos relacionarmos com os nossos
semelhantes. De acordo com as palavras do linguista e filólogo Sebastián Serrano

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La lengua se nos manifiesta como el hecho cultural por excelencia, y eso


por diferentes motivos. Primero porque ya es parte de la cultura, una de
aquellas actitudes o hábitos que recibimos de nuestros antepasados a
través de la tradición. En segundo lugar porque el lenguaje es el
instrumento esencial, el medio privilegiado por el cual asimilamos la cultura
de nuestra comunidad. Finalmente, y por encima de todo, porque la
lengua es la manifestación de la cultura que le sirve de fundamento, ya que
toda reflexión o pensamiento sobre cualquier forma de cultura pasa por el
lenguaje. El dominio de la reflexión es un dominio lingüístico. La lengua es
el hilo de Ariadna que me permite orientarme por mi viaje por la vida.
(Serrano, 1981)

Babel apresenta uma visão pessimista da globalização e mostra como


independentemente do local em que se vive seja Marrocos, Estados Unidos,
México ou Japão, os problemas são semelhantes embora atinjam nuances
diferentes, de acordo com a cultura de cada povo. Os dois jovens marroquinos e a
adolescente japonesa, que pertencem a culturas distintas, vivem a sua sexualidade
de acordo com os padrões da sociedade a que pertencem mas acabam por ter
comportamentos semelhantes. A história de Chieko não se encaixa muito bem nas
outras, parece mais artificial e forçada, no entanto, ela é utilizada para mostrar ao
espectador como os jovens vivem a sua sexualidade, em lados opostos do mundo.
Enquanto a jovem japonesa considera a sua deficiência física uma barreira que
não lhe permite liberdade sexual, os jovens marroquinos desejam iniciar-se
sexualmente assumindo um deles um comportamento de voyeur, ao espreitar
pelo buraco da parede a irmã a despir-se. Para o pai de ambos, este procedimento
é tão condenável como o tiro disparado contra a camioneta de turistas.
O facto do cineasta colocar a realidade de uma forma tão crua, mostra que
o governo de Bush não sabia lidar com o terrorismo e não estava muito
interessado na diplomacia, o que só faz aumentar o distanciamento em relação
aos outros povos. Contrariamente a muitos realizadores contemporâneos, Iñarritu
consegue questionar-nos sem tecer juízos de valor, retratar a sociedade sem

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julgamentos nem valores deturpados e deixar que o espectador tire as suas


próprias conclusões.
O filme mostra o desfasamento que existe a nível do planeta: os países ricos
e industrializados possuem as ferramentas para poderem comunicar quando e
como querem, enquanto os pobres vivem em condições miseráveis que não lhes
permitem qualquer acesso às tecnologias. Uma vez mais surge a comparação com
a Babel da Bíblia, povos diferentes com línguas e culturas diferentes tentam
sobreviver à sua maneira mas a batalha é difícil porque se atravessa o limiar da
língua, da religião, da política e do dinheiro. Iñárritu recorre a dialectos e à
linguagem gestual para expor cenas do quotidiano. Apesar do tom, por vezes,
quase a tocar o documentário, o filme é uma notável criação artística por
conseguir observar, narrar e quase sublimar os problemas que assolam a nossa
sociedade e pela excelente fotografia acompanhada por uma banda sonora de
Gustavo Santaolalla onde intervém também Sakamoto.
Babel procura expor um mundo multicultural e variado em que a
comunicação entre os diferentes continentes é possível e desejável mas os
cidadãos do mundo ainda não encontraram a fórmula certa para o fazer.

Notas

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1
UNESCO http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001271/127160m.pdf
(consultado em 9/03/2009)

Bibliografia

GARDIES, René (2008): Compreender o Cinema e as Imagens. Lisboa, Texto &


Grafia.
HUNTINGTON, Samuel P. (2004): Who Are We? America's Great Debate. London:
Simon.
STIGLITZ, Joseph E. (2002): Globalization and its Discontents. London, Penguin
Books.
SERRANO, Sebastián (1981): Signos, lengua y cultura. Barcelona, Ed. Anagrama.
WALTON, Dominique (2003): A Outra Globalização, Algés: Difel.

Filme

Babel (2006). Realização: Alejandro González Iñarritu. Perf.Brad Pitt, Gael García
Bernal, Cate Blanchett. USA, Paramount Pictures.

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