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Nicole Aubert
•o tempo sempre foi descrito por dois tipos de metáforas: as que o descreviam
como fluxo que passa e que o representava indissociável da vida que também
passa; mais recentemente, no Ocidente, ele era associado com possessão e
rentabilidade (“ter tempo”, “falta tempo”...): assim, o tempo, normalmente
impossível de se agarrar, tornava-se um dado quantitativo que procuramos
segurar e possuir e que queremos submeter e dominar.
•Esta aliança gerou um indivíduo “em tempo real”, funcionando segundo o ritmo da
economia e aparente mestre do tempo. Numa economia que funciona “just in time”,
este executivo tornou-se ele mesmo um indivíduo “just in time”, um produto de
duração efêmera, do qual a empresa se esforça de comprimir cada vez mais o
ciclo de concepção e o prazo de validade, um produto de consumo do qual é
preciso assegurar a rentabilidade imediata e a rotação rápida.
•Esta urgência não é simplesmente um dado externo, ela comporta uma dimensão
interior: galvanizados pela urgência, algumas pessoas precisam desta nova forma
de droga para ter a impressão de existir intensamente! Para outros, a perda do
vínculo social, um trabalho de resultados intangíveis e carente de sentido, a perda
do significado de sua ação, levam a uma indiferença amarga e triste. Em outros
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AUBERT, Nicole, Le culte de l´urgence, la société malade du temps, Paris, Champs, Flammarion,
2003
casos, o clima de pressão e urgência acaba levando a histeria e corroí os
relacionamentos pessoais e os próprios indivíduos.
Tudo isso contribui para desenhar uma sociedade imediata que funciona no
registro da reatividade o que compromete sua capacidade de enfrentar o futuro.
Assim, se forma um retrato multifacetado do homem hipermoderno:
•De um lado, homem instantâneo que vive no ritmo do próprio desejo e pensa ter
abolido o tempo, do outro, um homem afundado no aqui e agora da urgência e da
instantaneidade, como se a velocidade na resolução dos problemas pudesse, por
si só, dar sentido à sua ação.
•De um lado, o indivíduo “por excesso”, conquistador, mestre de sua performance
e empreendedor da própria vida; do outro, o indivíduo “por defeito”, cujo corpo é o
único bem e que somente consegue agüentar o tempo sem conseguir inscrever
um projeto pessoal nele.