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Conferência

Em busca da teoria unificada

A beleza e a elegância do universo


Por Luciana Thomé

A popularização da ciência através de metáforas e analogias. Esta pode ser a síntese da


grande contribuição do físico teórico norte-americano Brian Greene para o mundo. No
Fronteiras do Pensamento, no Salão de Atos da UFRGS, em Porto Alegre, ele conduziu a
plateia através de uma compreensão intuitiva de como os cientistas chegaram à concepção
atual do cosmos. Um tema, ao mesmo tempo, difícil e fascinante, mas que, através da lógica
e da matemática, revela a elegância e a beleza do universo.

Considerado por muitas publicações como um dos maiores especialistas no mundo em


Cosmologia e Física de Partículas, Greene lidera um programa de pesquisas das
implicações da Teoria das Supercordas em questões cosmológicas. A teoria se baseia na
ideia de que minúsculas vias de energia vibrando em dez dimensões criam todas as
partículas e forças no universo. E foi a origem desta teoria que ele apresentou em sua
conferência, em sua primeira vinda ao Brasil.

A busca da teoria unificada, segundo Greene, é um dos desenvolvimentos mais


impressionantes da física. E foi um desafio que levou Albert Einstein a uma paixão
desesperadora de tentar, até o fim da vida, encontrar uma teoria que fosse capaz de
descrever tudo o que vemos no universo. “Uma resposta seria algo que todos nós já
vivenciamos. Saímos à noite, olhamos para cima, vemos o céu com estrelas maravilhosas, e
é impossível não pensar que existe uma resposta para toda a beleza que vemos lá fora. Isto
é parte do que levou Einstein e leva outros físicos hoje em dia a buscarem isso. Mas esta
não é a única resposta. Não é apenas uma questão estética. Existem questões vitais do
universo para as quais jamais teríamos respostas até encontrarmos a teoria unificada”,
explicou.

Mas como tudo começou? Sobre a origem de tudo, até mesmo do próprio tempo, muitos
pensam na teoria do big bang. “O universo começou como algo muito pequeno, muito
denso, e iniciou uma expansão. Conforme se expandiu, foi esfriando.
Aquele plasma quente primordial se juntou e formou estruturas, como estrelas, galáxias,
tudo o que conseguimos ver lá em cima num céu claro. A ideia é usarmos a observação e a
matemática para voltar este filme cósmico e tentar entender como tudo começou, o que foi
que aconteceu lá no início”, apontou. A meta da teoria unificada é encontrar equações que
funcionem para achar as respostas de como o universo surgiu. E talvez seja possível ter
essas respostas a partir da Teoria das Supercordas.

No interior mais fundo da matéria, vibram cordas como as de um instrumento musical. Tudo
o que existe e acontece no mundo surge das vibrações dessas entidades centenas de
bilhões e bilhões de vezes menores do que o núcleo de um átomo. De acordo com Greene,
a Teoria das Supercordas é um assunto totalmente especulativo. “É um conjunto de ideias
matemáticas que comunica as possibilidades a respeito do universo, mas ainda não temos
provas experimentais ou observações do cosmos para dizer que esta teoria, de fato, explica
a realidade.” Ela se origina, na verdade, da distinção da física já estabelecida com outras
ideias que estão do lado da especulação, permitindo compatibilizar dois pilares antagônicos
da física moderna: a Teoria Geral da Relatividade e a mecânica quântica.

A Teoria Geral da Relatividade de Einstein relaciona a força da gravidade à estrutura do


espaço e do tempo, por isso é essencial entender a gravidade para progredir na direção da
teoria unificada. Ela se originou da teoria de gravitação de Isaac Newton e trata de
fenômenos em escalas cósmicas. “Quando Einstein começou a pensar sobre Newton, ele
viu que tinha algo errado, que Newton estava perto da realidade, mas que ela não poderia
ser daquela forma.” Existia a equação, mas ninguém sabia como a gravidade funcionava de
fato.

Einstein passou dez anos tentando encontrar esta resposta. “Em 1915, ele chegou a uma. E
a resposta é tão simples, linda e impressionante e diz o seguinte: aqui temos o Sol, aqui
temos a Terra e este é um espaço vazio. Então, só pode ser esse vazio que age como meio
da força da gravidade. Como é que o vazio consegue fazer qualquer coisa que seja? Ele
percebeu que o espaço consegue se dobrar e curvar, e dessa forma influenciar o movimento
do objeto. Vamos fazer uma analogia: pensem numa folha de borracha esticada
horizontalmente. Se eu jogar uma bolinha de gude, vocês conseguem imaginar a bolinha
numa trajetória reta. Agora se eu pegar um objeto mais pesado e colocar no meio desta
folha ela vai se curvar. Então eu jogo a bolinha de gude e ela não vai seguir a mesma
trajetória em linha reta, pois ela está rolando numa superfície curva. Einstein aplicou esta
teoria ao universo. A folha de borracha é o universo e o objeto pesado é qualquer astro.
Uma presença, como o Sol, entorta o espaço, curva o espaço, e desta forma afeta o
movimento da Terra, o que a faz orbitar. A Terra se mantém em órbita porque gira ao longo
de um ‘vale’, no ambiente curvo criado pela presença do Sol. Gravidade não é nada além do
que espaço e tempo empurrando os objetos em determinadas trajetórias. É uma teoria
maravilhosa”, explicou Greene.

Esta teoria formou a base do entendimento sobre a evolução do universo. Mas não funciona
para fenômenos em escalas microscópicas. No início do século XX, os cientistas viram que
ao utilizar a teoria convencional para analisar estas pequenas moléculas chegavam a
previsões errôneas. Assim, surgiu a mecânica quântica. “A única característica da mecânica
quântica que vocês precisam saber para entender porque existe um conflito com a ideia da
gravidade de Einstein é o princípio da incerteza, de Werner Heisenberg. É difícil de explicar
este princípio, aliás, como toda a mecânica quântica, porque vai contra a nossa intuição, vai
contra o que vivenciamos no dia a dia.”

No micromundo, o que reina é a incerteza. O princípio diz que, quanto menor o elemento
que analisamos, maior a incerteza sobre ele. Esta é a chave que explica por que a Teoria
Geral da Relatividade e a mecânica quântica entram em conflito. “A incerteza diz que o
universo não vai se curvar gentilmente, como Einstein achava. Ele vai tremer loucamente. É
uma visão totalmente diferente do espaço daquela que Einstein tinha na sua Teoria da
Relatividade”, ressaltou. E é por isso que a Teoria das Supercordas consegue unificar as
duas ideias, ultrapassando o convencional ao se perguntar: qual a partícula fundamental
que constitui a matéria? O átomo não é o fim da história, até ele pode ser dividido. “A
sequência daquelas bonecas russas, que ficam cada vez menores, não acaba nos elétrons
e nos quarks. Existe, no mínimo, mais um nível de estrutura de um elétron, de um quark ou
de qualquer partícula. É um pequeno filamento de energia que se parece com uma corda, e
que vibra em padrões diferentes. Estas vibrações produzem várias espécies de partículas.
Um padrão de vibração é um quark, outro padrão é um elétron.” Tudo, claro, no campo da
especulação, pois as cordas são tão minúsculas que não temos a capacidade de detectá-
las, mesmo que a teoria, no papel, seja correta.

Então, como seria o universo se estas ideias estiverem certas? Greene respondeu: a
implicação mais surpreendente é que o universo teria que ter mais de três dimensões, além
de “da esquerda para a direita”, “da frente para trás” e “para cima e para baixo”. “Se estas
fossem as únicas dimensões do espaço, a matemática não funcionaria, as equações da
Teoria das Cordas não funcionariam”, enfatizou. Com dez dimensões todos os problemas
matemáticos desapareceram. As dimensões podem ser grandes e fáceis de enxergar ou
podem ser pequeninas e difíceis de ser detectadas. Mas talvez elas tragam a resposta para
uma das perguntas mais profundas da ciência. Nos últimos 100 anos, os cientistas mediram
uma diversidade de características do universo, como a massa do elétron, a massa dos
quarks, a força da gravidade e a força eletromagnética. Uma lista de 20 números medidos,
mas que ninguém sabe por que têm o valor específico que possuem. “Quem determinou
estes números, que têm um valor que permitem que os processos nucleares aconteçam,
que as estrelas brilhem, que os planetas se formem e que a vida exista e se desenvolva?
Ninguém tem esta resposta.”

Isso acaba gerando três reações entre os cientistas e a comunidade acadêmica. A primeira
reação é a de que existem tantos formatos possíveis para as dimensões, pois as cordas
vibram de formas diferentes, que nunca teremos uma previsão definitiva até sabermos qual
o formato definitivo. A segunda diz que a Teoria das Supercordas é estudada há apenas 30
anos, e não se chegou perto de descobrir qual o formato das dimensões adicionais, pois a
probabilidade é gigantesca e quem sabe um dia seja encontrada uma equação matemática
que diga qual é o formato. E isso leva à terceira reação, a mais radical de todas: talvez não
exista um formato correto, pois todas as possibilidades de formatos estão corretas, fazendo
com que existam vários universos, cada um com o formato da sua dimensão. “Talvez
façamos parte de um multiverso, ou seja, de universos múltiplos. O que é compatível com
teorias da cosmologia que sugerem que o bing bang não tenha sido um movimento único,
que tenham existido diversos big bangs, que deram origem a vários universos, cada um com
um formato diferente nas suas dimensões adicionais e que flutuam junto a outros universos.”
E finalizou reconhecendo o grande desafio do seu trabalho: “Se encontrarmos provas, e é
possível que encontremos, e evidências de que existem dimensões adicionais ou outros
universos, que demonstrem que, há milhares de anos, estivemos enganados na nossa
perspectiva da realidade, para mim esta seria a maior conquista da humanidade”.

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