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O DEBATE

QUÂNTICO NO
ESPIRITISMO

A Mecânica Quântica existe na realidade, conceitualmente, há cerca


de cem anos, mas foi a partir da terceira década do século XX que ela
começou a virar de pernas para o ar a nossa compreensão dos conceitos de
energia, do comportamento das partículas elementares de matéria, de
como o Universo foi constituído, e de como se desenvolveu, se desenvolve
e se desenvolverá até o seu fim.

A Mecânica Quântica já nasceu em desacordo, sob vários aspectos,


com o nosso senso comum e com a maneira dos físicos compreenderem os
fenômenos da Natureza, assentada nas idéias da Mecânica Clássica ou
Newtoniana.

A descrição do Universo proposta pela Mecânica Quântica é sem


dúvida interessante e notável, mas pode parecer absurda à primeira vista
e, possivelmente, pode também assim parecer da segunda, da terceira, da
vigésima e da enésima vez em que é analisada. No entanto, ela tem
sucesso muito grande quando prevê o comportamento observado dos
sistemas físicos. Ela concorda muito bem com as observações. Embora os
cálculos onde ela se assenta sejam freqüentemente muito difíceis de serem
executados, por meio de uma matemática não muito convencional,
entediante, eles se adaptam, com fidelidade espantosa, àquilo que é
realmente observado. Embora o resultado de uma medida física isolada
possa parecer aleatório e imprevisível, as previsões levadas a efeito pela
Mecânica Quântica se ajustam consistentemente aos resultado médios a
partir de muitas medidas.

Qualquer observação de um evento que ocorre em escala


macroscópica envolve sempre um número assustadoramente grande de
átomos presentes, e, portanto, um número indefinido de observações na
escala atômica.

Até o ponto onde foi investigada, a Mecânica Quântica parece ter


aplicabilidade Universal. Em uma escala macroscópica, suas previsões
perdem o aspecto aleatório e se adaptam àquelas da Mecânica Clássica ou
Newtoniana, que trabalha muito bem com eventos que ocorrem em grande
escala.

Por volta de 1889, alguns cientistas, entre eles Heinrich Hertz,


estudavam a fotoeletricidade. Quando um feixe de luz incide numa lâmina
de metal, produz a liberação de elétrons, gerando uma corrente elétrica,
daí o nome fotoeletricidade. Hertz havia provado que a luz consiste de
ondas eletromagnéticas, declarando: "a teoria ondulatória da luz é, do
ponto de vista dos seres humanos, uma certeza".

Onze anos mais tarde, ou seja, em 1900, Max Planck, físico alemão,
propôs a idéia de que a luz consistia de fragmentos pequeníssimos de
energia, distintos uns dos outros, que ele chamou de quanta (plural da
palavra latina quantum), dando origem à Teoria Quântica.

Quando empenhado no estudo da radiação luminosa, Planck se


deparou com uma dificuldade teórica. Quando calculava o que acontecia, a
partir das teorias conhecidas da Mecânica Clássica, com pedacinhos
mínimos de calor, percebia que eles indicavam a presença de uma luz
muito intensa. Como tudo que nos cerca encerra alguma quantidade de
calor, o nosso corpo humano deveria ser quentíssimo, ao contrário do que
realmente é. Como nada existia de errado em seus cálculos, algo deveria
estar errado na Mecânica Clássica, e ele teve coragem de afirmá-lo,
contrariando a opinião geral dos físicos da época. Teve também a
capacidade de imaginar uma teoria para explicar seus cálculos, pensando
no 'quantum' ou 'pacotinho de energia'. Os pacotes de energia, afirmava
Planck, seriam de tamanhos diferentes, conforme a ocasião. Precisava-se
de um maço grande para elevar o nível de energia das altas freqüências da
luz, mas um pacote muito pequeno para elevar o nível de energia das
baixas freqüências. Planck, apresentou essa idéia do quantum à Academia
de Ciências da Alemanha e, se o leitor tiver um pouco de imaginação, não
se surpreenderá com o que aconteceu. Essa teoria restabelecia a teoria
corpuscular da luz, considerada falsa, sepultada solenemente por Hertz, de
modo que os físicos de todo o mundo não estavam preparados para aceitá-
la pacificamente. Observa-se que a Mecânica Quântica nasceu já
contestada e, a partir daí, nunca chegou a ser unanimidade, entre os
físicos.

Einstein, desenvolvendo sua Teoria da Relatividade, na Suíça,


percebeu que o efeito quântico poderia explicar alguns dos enigmas da
fotoeletricidade que o preocupavam. Quando os quantas se chocavam com
uma lâmina de metal, elétrons eram arrancados. Aumentando-se a
intensidade da luz, aumentava-se o números de elétrons arrancados da
lâmina de metal. Se correta a Teoria Ondulatória da Luz, o aumento da
intensidade da luz deveria aumentar a velocidade dos elétrons liberados,
mas não o número deles.

Em 1913/ Einstein foi a Berlin conhecer Planck, e os dois se


tornaram amigos íntimos, partilhando de interesses na Matemática, na
Música, na Filosofia. Somente em 1918, recebeu Planck o reconhecimento
pela criação da sua Teoria Quântica, quando foi laureado com o Prêmio
Nobel de Física.

Einstein, continuou trabalhando com a Teoria Quântica durante a


década de 1920-1930/ mas começou a ficar perturbado com os trabalhos
promovidos por Heisenberg, na Dinamarca, Paul Dirac, na Inglaterra, e
Erwin Schrodinger, na Suíça, que desenvolviam novas leis para aquilo que
passaram a chamar de Mecânica Quântica. As partículas elementares da
matéria perderam suas características de apresentarem posição e
velocidade definidas. Quanto mais se determinava com exatidão a posição
de uma partícula, menos exatamente ficava definida a sua velocidade e
vice-versa. Einstein começou a repudiar essa característica aleatória,
imprevisível, que penetrava nas leis básicas, e passou a não aceitar
plenamente a Mecânica Quântica, argumentando que algo nela não
funcionava bem. Foi nessa época que pronunciou a frase que iria ficar bem
conhecida de todos, físicos ou não físicos, "Deus não joga dados", para
mostrar seu inconformismo com os processos aleatórios e imprevisíveis
que passavam a caracterizar os fenômenos da Natureza.

Assim, observa-se que entre físicos de renome, considerados


sustentáculos da Ciência, a Mecânica Quântica nunca foi unanimidade. Mas
isso, longe de desaboná-la, mais a fortaleceu. É que, em Física, discordar é
um processo comum. Na Física não existe unanimidade pois, como
afirmava o escritor Nelson Rodrigues, a unanimidade é burra. É na
discordância das idéias que surge o progresso. Se todos pensassem da
mesma maneira, tudo ficaria estagnado. Mas, por que os físicos pensam
muito diferente uns dos outros?

A palavra "física" deriva do grego, com significado de Natureza.


Assim, estudar Física é estudar as leis da Natureza. Desta forma, a Física
descreve o Universo e sua Natureza associada, e tenta explicar o modo
como ambos funcionam. Um físico é, portanto, uma pessoa como qualquer
outra, apenas dotada, no mais das vezes, de qualidades de curiosidade e
de um espírito lógico que sua atividade de pesquisa só faz desenvolver,
mas também carregada/ às vezes, de defeitos de amor-próprio e de um
espírito de narcisismo acentuado que sua obrigação de estudar e pesquisar
só faz exacerbar. O físico, além disso, está sujeito, como qualquer outra
pessoa, às ideias de seu tempo, de sua educação, de sua cultura. Assim é
que, basta que a hipótese de trabalho a que ele se apega seja ruim - mas
que ela se veja, infelizmente, bem acolhida, e que seu autor se aferre a ela,
o que é comum - para que uma visão científica deturpada se instale.

Entre os físicos, como em todas as demais profissões, existem


aqueles que:

1) foram formados em escolas não muito boas; nunca freqüentaram um


laboratório de Física de primeiro mundo; não sabem trabalhar com
Matemática avançada, que é a linguagem da Física; e desconhecem suas
leis básicas;

2) especializaram-se em determinados ramos da Física mas


negligenciaram os demais, como se ela estivesse assentada em uma
Natureza fragmentada;

3) tornaram-se generalistas, conquistando uma visão global da Física, mas


completamente elementar;

4) especializaram-se em determinado ramo da Física, mas conseguiram se


manter atualizados com os demais, acompanhando os trabalhos de
vanguarda. Lamentavelmente, no Brasil, esses formam uma minoria
ínfima, reforçando a redundância;

5) são extremamente conservadores, especializando-se em criticar tudo


aquilo que se desvia do pragmatismo exagerado;

6) são altamente criativos e imaginativos, sempre procurando inovações.

Nesse sentido, é sempre importante lembrar citações do físico Prêmio


Nobel Richard P. Fleymman: "Aquilo de que necessitamos é a imaginação:
precisamos descobrir uma nova visão do mundo", e de Freeman Dyson:

"Não há esperança para as teorias que, à primeira vista, não pareçam


malucas".

7) passaram a se dedicar aos aspectos filosóficos da Física, esquecendo


suas leis e princípios, obrigando-a a retomar a sua origem remota quando
fazia parte da Filosofia, direcionando-a para um caminho totalmente
distinto daquele que caracteriza seu objetivo fundamental, que é estudar
as leis da Natureza como um todo indivisível e os fenômenos que se
assentam nessas leis.

Como o físico, antes de tudo, é um ser humano, cada um deles desenvolve


um tipo de crença e de fé religiosa, que muitas vezes refletem também nas
suas funções profissionais. Assim é que temos acompanhado, nas revistas
e jornais ligados ao chamado "movimento espírita brasileiro", artigos
escritos por físicos, a favor e contra o estudo de algum fenômeno espírita
por meio do uso de conceitos da Mecânica Quântica. E isso deve ser
considerado natural, em decorrência do quadro que ilustramos
anteriormente, caracterizando as diferentes posturas dos FÍSICOS.

Levando-se em conta que a Doutrina Espírita forma um conjunto de


princípios ditados pelos chamados Espíritos comunicantes, que servem de
base ao texto da obra complementar desenvolvida por Allan Kardec - e que
a palavra princípio significa uma proposição que se coloca no início de uma
dedução e que não é deduzida de nenhuma outra, dentro do sistema
considerado, sendo admitida, provisoriamente, como inquestionável, por
se assentar nas leis da Ciência vigente -, infere-se que ela está respaldada
pelas leis naturais da Física. E se os princípios em que se assenta a
Doutrina Espírita estão respaldados pelas leis da Física, os fenômenos
chaamados espíritas, que têm por base esses mesmos princípios, também
devem estar respaldados por essas mesmas leis. Esse é o aspecto óbvio da
questão que derruba os argumentos daqueles que procuram explicar os
fenômenos espíritas por meio de suposições místicas, sobrenaturais,
professando a existência de uma "ciência espírita" especial, para lhes dar
sustentação.

Entre outros, vamos citar alguns conceitos assentados nos princípios que
dão sustentação à Doutrina Espírita que podem ser estudados e
pesquisados com auxílio das leis da Mecânica Quântica, a saber:

1°) "O Espírito é o ser inteligente da Criação e povoa o Universo fora do


mundo material" - referência: questão 76 de "O Livro dos Espíritos". Se
considerarmos que a inteligência é uma das faculdades - aptidões inatas -
que formam a mente do Espírito, ser inteligente da Criação, e que ela, para
se manifestar, depende de um banco de dados suficientemente ordenado,
em quantidade e qualidade, e que essas informações se acumulam num
campo magnético, temos aí todos os ingredientes físicos de um processo
complexo que pode e deve ser estudado por meio dos conceitos da
Mecânica Quântica. Além disso, se o Espírito se insere no Universo, como
um todo, as ferramentas da Física que o estudam chamam-se Teoria da
Relatividade, Geral e Restrita, de Einstein, e a Mecânica Quântica, de Max
Planck, Heisenberg, Schódinger, Dirac. ..

2°) "O Espírito possui um princípio bem definido, como todas as demais
coisas da Natureza, não sendo, portanto, algo sobrenatural" - referência:
questão 78 de " O Livro dos Espíritos". Se todas as coisas que existem na
Natureza estão ligadas ao plano pelo qual o Universo foi idealizado,
construído e colocado em funcionamento - por meio da atuação das suas
quatro forças básicas: gravitacional, nuclear forte, eletromagnética e
nuclear fraca -, e são Mecânica Quântica e a Teoria da Relatividade que as
estudam, então a presença do Espírito, nesse contexto todo, também fica
condicionada a esses tipos de estudos.
3°) O Espírito é criado como todas as demais criaturas da Natureza, pelas
mesmas leis - referência: questão 81 de "O Livro dos Espíritos". Se o
Espírito é criado pelas mesmas leis naturais que regem a Natureza, sendo
considerado uma das suas forças, ele pode e deve ser estudado por meio
dessas leis, representadas, atualmente, pela Teoria da Relatividade e
Mecânica Quântica e, possivelmennte, no futuro, pela Teoria das Cordas.

4°) "O Espírito é constituído de matéria quintessenciada" - referência:


questão 82 de "O Livro dos Espíritos". Quintessenciada é um nome
particular dado a um estado indefinido da matéria. Atualmente, são
considerados cinco estados da matéria: sólido, líquido, gasoso, plasma e
ondulatório. A quintessenciada implica em matéria exótica que é bem
estudada pela Mecânica Quântica na parte pertinente a partículas
elementares.

5°) "A alma está onde seu pensamento está, pois é a alma que pensa" -
referência: questão 89 de" O Livro dos Espíritos". Se o pensamento
caminha com a mesma velocidade da luz, ele deve fazê-lo na forrma de
onda. Segundo André Luiz, autor desencarnado do livro" Mecanismos da
Mediunidade', psicografado por Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, o
pensamento é uma onda mentonética, semelhante às ondas de televisão,
que transporta em si, codificado nos seus pacotes de ondas, quantum ou
fótons, imagens, sons, movimentos, cores, etc, tornando-se altamente
criativo.

Ora, é a Física Ondulatória, assentada nos conceitos da Mecânica Quântica,


que estuda os fenômenos ondulatórios produzidos pela vibração ou
oscilação de partículas elementares de matéria dotadas de carga, caso das
ondas eletromagnéticas.

6°) "O Espírito não se divide, mas cada um é um centro que irradia em
diversas direções e é por isso que parecem estar em vários lugares ao
mesmo temmpo" - referência: questão 92 de "O Livro dos Espíritos". Se o
Espírito é um centro que irradia pensamentos isotropicamente, isto é, com
igual intensidade em todas as direções, a teoria da irradiação está
assentada nas leis da Mecânica Quântica, e deve ser por ela estudado.

7°) "O Espírito possui uma forma e uma fisiologia bem determinadas" -
referência: questão 88 de " O Livro dos Espíritos". Se o Espírito possui
forma e fisiologia bem determinadas e se é constituído de matéria
quintessenciada, interagindo com um corpo humano constituído, em
média, de 1O(30) átomos (grandeza representada pelo número 1 seguido
de trinta zeros) que se renovam 90% deles em quatro anos e 100% deles
a cada sete anos, todo esse fluxo e refluxo atômico é regido pela Mecânica
Quântica.

8°) "Existem estados diferentes de matéria que não impressionam os


sentidos humanos" - referência: questão 22 de " O Livro dos Espíritos". As
partículas elementares que dão constituição aos diferenntes estados da
matéria são estudadas por meio da Mecânica Quântica, envolvendo as
modalidades de Física Nuclear e Atômica.

9°) "O Espírito é um ser limitado e circunscrito, ao qual só falta ser visível
e palpável para se assemelhar aos seres humanos" - referência: cap.l, item
3, "O Livro dos Médiuns". A pergunta que se faz, diante desse conceito
espírita, é a seguinte: limitado e circunscrito a que? A resposta é: às leis
natuurais, já que o Espírito, como visto no item 3, é criado pelas mesmas
leis naturais que regem a Natureza, nada possuindo, portanto, de
sobrenatural.

10°) "Os Espíritos, não sendo outros senão as almas das pessoas que já
morreram, não têm a soberana sabedoria nem a soberana ciência" -
referência: " Obras Póstumas", pág. 259. Se os Espíritos possuem vida
indeterminada, e nada mais são que almas de pessoas que já morreram,
então as informações que acumularam, como experiência de vidas
passadas, podem ter ficado acumuladas no campo magnético que se
constitue em um incomensurável banco de dados, da mesma forma que as
partículas elementares de matéria guardam, nas suas memórias quânticas,
as lembranças das leis físicas de conservação da energia, da matéria e do
movimento.

Podemos citar um número crescente de argumentos para mostrar que, se


os fenômenos espíritas nada têm de sobrenatural, conforme enfatiza,
insistentemente, Kardec, então eles podem e devem ser estudados por
meio das leis materiais, isto é, leis da Física.

Wladimyr Sanches - Revista Espírita Além da Vida.


"A História, que é essencialmente História do Espírito,
transcorre "no tempo". Assim, pois, "o desenvolvimento do espírito
cai no tempo". Hegel, porém, não se contenta em afirmar a
"intratempo-racialidade" do espírito como um factum, mas trata de
compreender a possibilidade de que o espíritocaia no tempo, que é o

"sensível não-sensível". O tempo há de poder acolher o espírito,


por assim dizer. E o espírito há de ser, por sua vez, afim com o
tempo e com a sua essência."

HEIDEGGER, crítica de Hegel, em

"O Ser e o Tempo"

.
Querida Adriana,

Bem sei que na angústia temos uma sensação de “nulidade


absoluta”. Ficamos “imersos na monotonia e na indiferenciação da
vida cotidiana”. E nada, absolutamente nada, “do lado de fora” pode
nos despertar, nos acordar, nos fazer sentir vivos.

Faço parte deste “lado de fora” e não consigo encontrar em


mim algo que possa ajudá-la a se encontrar. Não tenho o que
oferecer e nada tenho a dizer. Mas, assim mesmo, preciso dizer. Dar
o meu ponto de vista. Preciso ser egoísta. Mostra apenas o meu lado.
E por quê?

Porque é necessário. Lembra de uma conversa que tivemos a


alguns anos no escritório aqui de casa quando trabalhávamos um
material para o Coral Asas? Você me questionou dizendo que se
considerava minha amiga, mas que eu não me considerava seu
amigo. Não concordei com o que você disse, mas reconheci que meu
comportamento dava esta impressão. E passei a me abrir com você.
De lá para cá, passei a demonstrar o significado que você tem em
minha vida. Pelo menos parcialmente. Nem sempre conseguimos ou
podemos expressar tudo.

Por isso, preciso dizer sobre um certo desconforto que sinto ao


reconhecer que não posso devolver para você o que recebo de você.
E é nessas horas que a vida pode nos surpreender. A sua presença é
insubstituível e única para mim. É bom sentir você por perto. Mas não
consegui devolver o sentimento. Nada posso fazer para diminuir o
sentimento de vazio e angústia que está com você. Mas posso
expressar o seu significado em minha vida.
Querida Adriana,

Bem sei que na angústia temos uma sensação de “nulidade


absoluta”. Ficamos “imersos na monotonia e na indiferenciação da
vida cotidiana”. E nada, absolutamente nada, “do lado de fora” pode
nos despertar, nos acordar, nos fazer sentir vivos.

Faço parte deste “lado de fora” e não consigo encontrar em


mim algo que possa ajudá-la a se encontrar. Não tenho o que
oferecer e nada tenho a dizer. Mas, assim mesmo, preciso dizer. Dar
o meu ponto de vista. Preciso ser egoísta. Mostra apenas o meu lado.
E por quê?

Porque para mim, encontrar você, foi significativo. Foi bom,


muito bom. Simples assim. Nos últimos anos em que suas dores se
intensificaram, que uma sensação de erro e de “caminho desviado”
foi desenvolvendo sua angústia, eu a conheci. E gostei muito.

No meio de suas dores, dúvidas e angústias eu, simplesmente,


gostei de sua “presença”. Para uma pessoa, como eu, que valoriza
tanto a busca interior e o encontro consigo mesmo, ser despertado
por alguém do “lado de fora” foi uma bela contradição. E uma
demonstração profunda de que a força que nos movimenta tem
muitas alternativas e muitos caminhos que podemos escolher. Na
vida do espírito é na existência que chegamos à essência.

E eu achava que já havia passado o tempo dos encontros


significativos de minha atual existência. Schopenhauer dizia que os
trinta e cinco anos iniciais de nossas vidas ofereciam o texto e os
quarenta anos seguintes o comentário. Isto quer dizer que tudo de
significativo na nossa história está na primeira metade de nossas
vidas. Será mesmo? Quer dizer que quando digo que gosto de sua
presença é apenas para preencher uma ausência? Na vida, então,
tudo é preto no branco? Não existem outras cores? Não concordo.
Não posso concordar. Eu gosto de você e não preciso buscar em meu
passado ou em minhas lembranças e memórias uma razão para isso.
É em você e em quem eu sou que encontro a razão. E ponto.

E o que eu quero dizer por “gostar da sua presença”? É


simples: é o seu modo de ser, a sua solicitude, seu discurso, suas
opiniões. Mas é mais que isso: é todo um comportamento: sua
sensibilidade (lembra do Tuffy – não sei como se escreve – seu
cachorro?), seu jeito de observar tudo e a todos, seu jeito de sorrir,
seu jeito de demonstrar cansaço, seu jeito alegre, mas,
principalmente, e acima de tudo, a sua intensidade. Você realmente é
intensa.

Quando começamos a trabalhar juntos foi a sua intensidade


que me conquistou. Apesar do vazio em que você se encontrava, e
ainda se encontra, eu encontrei uma “presença” que preenche. De
tão poucas pessoas eu tive despertada a “vontade da presença”
delas. Nunca gostei de vulgarizar os encontros com os outros e de ter
muita gente em minha volta e, contraditoriamente, não ter ninguém.
Acho que devemos valorizar nossos momentos e intimidade. E,
confesso, os poucos encontros que tive com você, valorizei.

Todos os trabalhos que fizemos pelo coral foram, de minha


perspectiva, uma troca de vida. Por um lado, prestei muita atenção
na sua, e pelo outro, ofereci um pouco da minha. Este não é um dos
grandes significados dela, da vida? Participarmos uns das histórias
dos outros? Se não tenho condições de dizer que contribuí com sua
vida, posso, pelo menos, dizer que você contribuiu com a minha. E
não ache que, com essa revelação, esteja querendo dizer que minha
vida foi desprovida de intensidade, porque não seria verdade.

Querida Adriana, eu confesso que aproveitei desses momentos


em que trabalhamos juntos. Você, com sua tristeza e grandes
dúvidas existenciais. Eu, com sua simples “presença” e com um
grande despertar de que existe um “lá fora”. E este “lá fora” não é
uma oposição à minha busca interior. Eles se completam. Que
maravilha.

Para mim, a base de qualquer relação, em qualquer nível que


possamos imaginar, tem que ser o “sair da superfície”. Temos que
mergulhar, buscar as profundezas de nós e de quem nos desperta. O
quão profundo for o mergulho que dermos em nossas relações poderá
dar uma resposta de quanto significado conseguimos extrair da
proximidade de outra pessoa e do papel que ela acaba exercendo em
nossa própria vida.

Adriana, estou sendo muito pessoal, muito egoísta e usando


uma perspectiva de vida tão minha que devo estar sendo muito
confuso. Mas a intenção aqui é clara: embora o seu jarro esteja
vazio, ele encheu o meu copo. Esta é a moral da história: não existe
o vazio. Não existe o nada. Só a sensação do vazio e do nada. Mas,
um dia, a sensação acaba e podemos ver uma luz iluminando nossa
trajetória de vida.

Você vai acordar. Aposto a minha vida nisso. E vou ficar muito
feliz com este despertar. Estando perto ou longe de você.

Para terminar, o significado que eu tenho sobre o amor é uma


combinação do que eu li em Erich Fromm (A Arte de Amar) e Leon
Denis (O Problema do Ser, do Destino e da Dor). Portanto, estou com
a proteção deles quando escrevo: eu te amo.

Um grande beijo e um profundo e longo abraço,

Paulo Murilo.
Dearest e muy bonita Adriana,

Cómo estás you? Enjoying quite the vacaciones escolares?

Te echo de menos, ou, I miss you ...

Besos e kisses,

Paulo Murilo.
Querida Adriana,

Aliás, minha muito querida Adriana,

Ontem vi, pela primeira vez, uma apresentação sua como


bailarina.

Reconheci em seus movimentos e gestos, em sua postura e


expressão, algo já característico do seu comportamento cotidiano.
Embora pareça, à primeira vista, um tanto comum em todas as
pessoas, não se trata do mesmo em você.

Era o contrário do que ocorre normalmente com quase todo


mundo, pois não eram expressões do cotidiano aplicadas à dança e a
arte. Era o contrário: elementos artísticos, observados em sua
performance, que são naturais em você e estão presentes no seu dia
a dia.

Aos meus olhos é um claro indício da mistura entre arte e vida


em você. Você transpira arte na vida e vida na arte.

E não preciso de drogas para “ver” isto. Preciso de arte.

Beijos,

Paulo Murilo.
Querida Adriana,

“Nada é mais misterioso que o ponto de vista de outra pessoa.


Cada um de nós tem uma perspectiva.”

Estou aprendendo a observar melhor você. E compreendê-la


um pouco mais, na medida do possível. Não o seu “misterioso ponto
de vista”, mas o seu direito a exercê-lo.

Todos os dias fazemos escolhas. Viver é escolher. A cada


escolha nos aproximamos de um caminho, fortalecemos laços e,
naturalmente nos afastamos de outros caminhos e enfraquecemos
certos laços. Nossas escolhas são mais importantes do que nossas
qualidades.

Espero que você esteja conseguindo fortalecer os laços de que


tanto precisa. Da minha parte, prometo não esquecer do sentimento
que construiu um forte laço que parte de mim até você.

Beijãããõo,

Paulo Murilo.

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