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LEANDRO QUADROS

PORQUE VOCÊ
DEVE CRER NA
RESSURREIÇÃO
DE MOISÉS
Evidências bíblicas e
extrabíblicas de que Moisés e
Elias apareceram em corpo no
Monte da Transfiguração.

LEANDROQUADROS.COM.BR

ACESSE AS MINHAS REDES SOCIAIS!


Leandro Soares de Quadros,
graduado em Comunicação Social,
pós-graduado em
Jornalismo Científico
e Mestre em Teologia.

leandro@leandroquadros.com.br

ACESSE AS MINHAS REDES SOCIAIS!


AGRADECIMENTOS

Desejo agradecer a algumas pessoas em especial,

que contribuíram para que eu conhecesse mais fontes

para a elaboração desse material:

Ao amigo Ricardo dos Santos Oliveira, por me

passar links e argumentos sólidos para a defesa da

verdade.

Ao Dr. Rodrigo Silva pelas fontes judaicas

especializadas que me sugeriu, e por repartir comigo

seu grande conhecimento teológico.

Ao Pr. Gilberto Theiss, por sua contribuição com

alguns esclarecimentos quanto ao grego bíblico e por

compartilhar comigo sua habilidade com a escrita.

Ao amigo e doutorando Sérgio Monteiro, por me

passar algo de seu profundo conhecimento de hebraico

e de cultura judaica.
Ao amigo Marcos Alves por também repartir

comigo seu conhecimento na área da apologética.

A esses e outros apologistas que amam e

defendem a verdade com amor e cristianismo, meu

muito obrigado.

Também não posso deixar de agradecer:

Aos produtores do programa “ Vejam Só! ” e ao

Reverendo Eber Cocarelli, por darem espaço aos

adventistas do sétimo dia nos debates doutrinários

realizados no programa.

À Rede Novo Tempo de Comunicação por ser uma

escola para mim e me proporcionar tantas

oportunidades de aprendizagem.

À minha esposa, Nayara Quadros, e às minhas

filhas Yasmin e Lavínia pelo puro amor vindo do Céu

para alegrar minha vida.

Ao Criador Triúno por me amar

incondicionalmente e ser meu Companheiro, Amigo e

Pai nos momentos bons e ruins.


SUMÁRIO

Introdução...................................................................7

Capítulo 1: Pressupostos........................................ 10

Capítulo 2: Base Bíblica da Ressurreição de


Moisés....................................................................... 15

Mateus 17:1-8............................................................. 15

Judas 1:9..................................................................... 27

Cristo: “as primícias dos que dormem”................. 32

Se Moisés ressuscitou, por que Hebreus 11 não

menciona esse grande feito? ................................ 42

Capítulo 3: Base Extrabíblica da Ressurreição de


Moisés....................................................................... 45

Adam Clarke............................................................... 46

Jamieson, Fausset e Brown........................................ 48

Josué 1:1,2 nega a ressurreição de Moisés?.......... 50

Mathew Henry............................................................ 54
Bíblia de Estudo de Genebra..................................... 56

Bíblia de Estudo Scofield........................................... 57

Geza Vermes.............................................................. 57

Flávio Josefo............................................................... 60

Capítulo 4: Resumo e Considerações Finais...... 63

Bibliografia............................................................. 67

APÊNDICE A - 1 Coríntios 15:20-23 e as Primícias

- Por Sérgio Monteiro .............................................. 74

APÊNDICE B - Respostas ao Pr. Elias Soares de

Moraes - Por Marcos Alves .................................... 85


INTRODUÇÃO

No dia 11 de novembro de 2016 participei

novamente1 do programa de debate “ Vejam Só! ” , na

Rede Internacional de Televisão (RITTV). Dessa vez, o

tema discutido foi: “Judas 9 refere-se à ressurreição de

Moisés?”2 Enquanto defendia a ressurreição de Moisés,

o Pr. Elias Soares alegava que Moisés não ressuscitou.

Graças a Deus, pude demonstrar por meio da

Bíblia e de diversas outras fontes que os argumentos à

favor da ressurreição de Moisés são muito mais

convincentes, e que tal crença não é exclusiva dos

adventistas do sétimo dia, como alegam alguns

apologistas pouco informados.

Como sempre, foi uma satisfação enorme ter

estado no programa do Reverendo Eber Cocareli, um

1 Antes eu já havia debatido sobre o mesmo tema com o educadíssimo Pr.


Carlos Vaillati. Veja-se “A Disputa pelo corpo de Moisés”, disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=IeUJ4r9LCHo; Internet (consultado em
27 de novembro de 2017).
2 “Vejam Só com Leandro Quadros e Pr. Elias”, disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=MPOSuVoUa50 ;Internet (Bloco 1);
https://youtu.be/MPOSuVoUa50 ; https://youtu.be/0r1yzFIugns (Bloco 2) e
https://youtu.be/d594v-HZstc (Bloco 3). (consultado em 26/11/2017).

7
apresentador que conhece as Escrituras (inclusive

leciona Teologia) e abre um espaço precioso em seu

programa para que os adventistas possam participar e

demonstrar que suas doutrinas distintivas

(Imortalidade Condicional da Alma, Santuário e Juízo

pré-advento, Reforma de Saúde, Dom Profético e

Observância do Sábado) nada têm de “ herético ” ou

“ sectário ” , mesmo que diversos cristãos não

concordem com tais doutrinas.

A postura o Reverendo Cocareli e da produção do

programa em convidar adventistas tem agradado a

maior parte do público que está realmente

interessado em bons debates que tragam crescimento

e que sejam pautados pelo respeito, clareza de ideias e

argumentação sólida.

Infelizmente, alguns têm se posicionado contra a

linha editorial do programa por convidar os adventistas,

mas isso em nada afeta a ótima audiência e a

credibilidade do “ Vejam Só! ” . Afinal, há um público

exigente que assiste ao programe e que, assim como

8
seu apresentador e produtores, preocupam-se com a

qualidade do programa, independente da opinião de

uma minoria que se preocupa mais em “brigar” do que

em pensar e aprender.

Nas páginas a seguir você terá as fontes que usei

no programa, bem como outras mais que fui coletando

com o passar do tempo. Originalmente esse manuscrito

tinha umas 20 páginas, porém, decidi agregar outros

argumentos, fontes e artigos riquíssimos que lhe

ajudarão a fazer um estudo sério e a refutar uma série

de argumentos infundados contra a ressurreição de

Moisés.

Desejo que esse material contribua para que você

aprecie cada vez mais o estudo da Bíblia e os bons

debates apologéticos, que podem trazer bastante luz

sobre as verdades transformadoras da Palavra de Deus,

firmando-nos na fé e capacitando-nos para refutar (com

respeito) o erro daqueles que podem estar

sinceramente enganados.

9
CAPÍTULO 1

PRESSUPOSTOS

Antes de estudar a respeito da ressurreição de

Moisés, é fundamental que tenha em mente alguns

pressupostos que nortearão seu estudo:

Pressuposto 1: Não devemos imaginar que em

Judas 1:9 Miguel e Satanás disputaram simplesmente

“ um corpo morto ” . Li certa vez um comentário que

alegou ter ocorrido uma disputa entre Miguel e

Satanás “ sobre o direito de enterrar o corpo de

Moisés ” ou de “ ficar com ele ” . Isso é ridículo,

considerando que Deus já havia sepultado o profeta,

segundo Deuteronômio 34:6.

Dizer que Miguel e Satanás ficaram “ batendo

boca ” por causa de um cadáver é desconsiderar a

seriedade do conflito cósmico que envolveu uma

batalha real entre Cristo e Seus anjos, e Satanás e os

anjos dele, como lemos em Apocalipse 12:7-9. É óbvio

10
que a disputa envolvia algo de muito mais

importância e seriedade do que simplesmente a

posse de um “cadáver”.

O impasse ocorrido entre Miguel e Satanás foi a

respeito da legalidade da ressurreição de Moisés.

Você verá as evidências disso ao longo desse

documento que usei no debate com o Pr. Elias Soares.

Satanás, tendo como pretexto inclusive o pecado

do profeta em Números 20:8-12 (veja também Dt

32:50-51), desejava confiná-lo ao seu domínio, de modo

que o direito legal de ressuscitar Moisés estava

sendo questionado pelo demônio. Afinal, Jesus ainda

não havia pago o preço pelo resgate do pecador

na cruz “tendo despojado os principados e potestades”

exibindo-os “ publicamente ” e triunfado sobre eles “ na

mesma cruz ” (Cl 2:15). O Diabo tinha uma base legal

para sua reclamação, porém ainda não tinha visto que

Cristo tinha uma base muito maior do que ele: Seu

próprio sangue derramado na cruz (Rm 5:7-8; 2Co

5:18-21).

11
Pressuposto 2: Temos que perguntar às

Escrituras se o autor hebreu, com sua filosofia

hebraica holística, imaginava a possibilidade de

existir vida sem corpo, para que somente “ o espírito

de Moisés e Elias ” tivessem aparecido no Monte da

Transfiguração, como alegam outros intérpretes.

Se formos às Escrituras com imparcialidade, como

têm feito vários eruditos protestantes e católicos3,

veremos que a resposta bíblica é um claro não: a

Bíblia não ensina ser possível viver fora do corpo,

tanto que Deus levará para a eternidade um corpo

glorificado, não um espírito desencarnado (leia

todo o cap. 15 de 1 Coríntios, bem como 1

Tessalonicenses 4:13-18).

Como bem disse o teólogo luterano Oscar

Cullmann, considerado uma das maiores autoridades

da Teologia do Novo Testamento do século 20: “ nós

3 Veja-se, por exemplo, Edward William Fudge, The Fire That Consumes: A
Biblical And Historical Study Of The Doctrine Of Final Punishment (Lincoln,
NE: Edição do Autor, 1982); Samuele Bacchiocchi, Imortalidade ou
Ressurreição? Uma abordagem bíblica sobre a natureza humana e o
destino eterno (Engenheiro Coelho, SP: UNASPRESS, 2007).

12
não somos libertados do corpo; pelo contrário, o

próprio corpo é libertado”.4

Em apoio a essa intepretação de Oscar Cullmann

e dos adventistas do sétimo dia, há a observação

precisa de Conrad Bergendoff, também Luterano:

[...] os evangelhos não fornecem base para uma

teoria de redenção que salve almas à parte dos

corpos aos quais pertencem. O que Deus

ajuntou, filósofos e teólogos não deviam

separar. Mas estes têm sido culpados de

divorciar os corpos e almas dos homens que Deus

criou como um por ocasião da criação, e a culpa

deles não é diminuída por seu apelo de que assim

a salvação seria facilitada. Até termos uma teoria

de redenção que atenda toda a necessidade do

homem falhamos em compreender o propósito

4 Oscar Cullmann, Imortalidade da Alma ou Ressurreição dos Mortos? O


Testemunho do Novo Testamento (Artur Nogueira, SP: Centro de Estudos
Evangélicos, 1958), p. 26. Esse livreto é resultado de uma conferência
que ele apresentou na Capela Andover, Universidade de Harvard, EUA,
em 26 de abril de 1955.

13
daquele que se fez carne para que pudesse ser

capaz de salvar a humanidade.5

Com esses dois pressupostos em mente, você

estará mais aberto às evidências bíblicas e

extrabíblicas da ressurreição de Moisés. Além disso,

poderá ver a fragilidade argumentativa da suposta

aparição de Moisés “ em espírito ” , bem como terá

certeza da impossibilidade (apresentada por alguns

estudiosos) de o evento da Transfiguração ter sido não

mais que uma “visão simbólica”.

5 Conrad Bergendoff, “Body and Spirit in Christian Thought”, The Lutheran


Quarterly 6 (Agosto de 1954), p. 188-189.

14
CAPÍTULO 2

BASE BÍBLICA DA RESSURREIÇÃO DE

MOISÉS

Os poucos versos que tratam do evento da

transfiguração são suficientes para comprovar que

Moisés de fato ressuscitou, pela intervenção de um

Deus gracioso que antecipou a recompensa desse

grande homem, efetivando-a obviamente somente na

cruz do calvário. Analisaremos Mateus 17:1-8 (e

relatos sinóticos) e Judas 1:9.

● Mateus 17:1-8 (cf. Mc 9:2-8; Lc 9:28-36)

Leiamos o relato da Transfiguração como

registrado por Mateus:

Seis dias depois, tomou Jesus a Pedro e aos

irmãos Tiago e João e os levou, em particular, a

um alto monte. E foi transfigurado diante deles;

o seu rosto resplandecia como o sol, e as suas

15
vestes tornaram-se brancas como a luz. E eis

que lhes apareceram Moisés e Elias, falando

com ele. Então, disse Pedro a Jesus: Senhor,

bom é estarmos aqui; se queres, farei aqui três

tendas; uma será tua, outra para Moisés, outra

para Elias. Falava ele ainda, quando uma nuvem

luminosa os envolveu; e eis, vindo da nuvem,

uma voz que dizia: Este é o meu Filho amado,

em quem me comprazo; a ele ouvi. Ouvindo-a os

discípulos, caíram de bruços, tomados de

grande medo. Aproximando-se deles, tocou-lhes

Jesus, dizendo: Erguei-vos e não temais! Então,

eles, levantando os olhos, a ninguém viram,

senão Jesus.

Afirmar que Moisés estava “em espírito” no Monte

da Transfiguração, como o fazem alguns leitores, é dar

aos amigos espíritas um forte argumento a favor da

consulta aos mortos. Jamais Jesus se comunicaria com

o espírito de um morto, mesmo sendo Deus, se em

Deuteronômio 18:9-14 Ele inspirou Moisés a

16
escrever que o Criador abomina a comunicação com

os mortos. Leia também Isaías 8:19-20.

Pedro, Tiago e João teriam ficado totalmente

confusos entre aquilo que aprenderam na Torá (em

Deuteronômio 18:10-14) e aquilo que viram Jesus fazer.

Seria o mesmo que Jesus dizer: “ filhos, façam o que

eu digo em Deuteronômio 18:9-14 e não façam o

que eu faço em Mateus 17 ” , ou seja: um péssimo

exemplo.

Os estudiosos da Bíblia de Estudo Defesa da Fé

(atualmente intitulada Bíblia de Estudo Apologia Cristã)

reconheceram o perigo de argumentar que o “espírito”

de Moisés apareceu no monte. Mesmo discordando das

doutrinas distintivas adventistas6, os autores da Bíblia

6 Doutrinas “distintivas” são aquelas que distinguem os adventistas do


sétimo dia dos demais cristãos, e que são tidas como verdades apenas
pela Igreja Adventista do Sétimo Dia: doutrina do Santuário Celestial e do
Juízo Pré-Advento (1ª fase do juízo que ocorre antes da segunda vinda
de Cristo), imortalidade condicional da alma, dom profético na vida e
obra de Ellen G. White e doutrina da Reforma de Saúde como parte do
processo de santificação. Deve-se destacar que algumas dessas
doutrinas, especialmente da imortalidade condicional, que está
relacionada ao sono da alma e aniquilação final dos ímpios, têm sido
aceitas por teólogos de outras confissões religiosas cristãs. Entre estes se
destacam: Oscar Cullmann, Basil Atkison, John Stott, Clarke Pinnock,
Edward Fudge, entre outros.

17
Defesa da Fé parcialmente concordam conosco, de que

Judas 1:9 sugere a ressurreição de Moisés:

Os espiritualistas e os médiuns que passam por

transes referem-se a estes versículos [Mt 17:1-13]

como um exemplo de comunicação com os mortos.

Eles não percebem que Elias nunca morreu, mas,

na verdade, foi arrebatado ao céu. Judas 9

sugere que o corpo de Moisés foi

provavelmente levado ao céu, colocando-o

em uma categoria exclusiva. Embora Jesus

possa ter a capacidade de se comunicar com os

mortos [nisso nós adventistas diferimos deles],

esta prática é estritamente proibida para nós (Lv

19:31; 20:27; Dt 18:10-12; Is 8:19; Gl 5:20; Ap

21:8).7

Outro argumento insustentável por parte de

apologistas é o de que a experiência poderia ser sido

não mais do que “ uma visão sobrenatural ” , sem que

7 Bíblia de Estudo Defesa da Fé: questões reais, respostas precisas, fé


solidificada (Rio de Janeiro: CPAD, 2010), p. 1506. Grifo acrescido.

18
Moisés e Elias estivessem realmente presentes. Entre

outras coisas, alegam que o termo “ visão ” (grego

horama) que aparece em Mateus 17:9 indica que o

evento não foi literal, devido a seu uso “simbólico” em

outros textos bíblicos.

Sobre isso, Gilberto Theiss, moderador do blog

www.feoufideismo.com,8 bem destacou:

Horama e horasis são duas palavras, dentre

outras, utilizadas para descrever uma visão

concreta ou abstrata. A palavra com terminação

“ma”, neste caso horama, diferente da terminação

“sis” é comum para algo mais real. Embora ela

possa ser utilizada para uma simples visão,

também pode ser utilizada para algo que pode ser

visto com os olhos. Uma espécie de vista

extraordinária, um acontecimento real ocorrido

fisicamente na terra, como por exemplo em Atos

7:319. De um modo semelhante Jesus usa a

8 Theiss também é moderador do blog www.gilbertotheiss.blogspot.com


9 Para entendermos Atos 7:31 é importante lermos Êxodo 3. A "visão" de
Moisés foi da sarça ardente, na qual ouviu a ordem divina para tirar as
sandálias, pois pisava em terra santa. Isso não foi uma “visão simbólica”
dentro “de sua mente”, e sim algo concreto, situado na história. Deus

19
palavra para se referir a uma "vista"

extraordinária que apareceu aos discípulos,

quando Ele foi transfigurado. Marcos 9: 6 não diz

que Pedro não sabia o que ele estava dizendo

[como afirmam alguns] , mas que ele não sabia o

que dizer. A "vista" era muito real, mas Pedro não

sabia como responder a tal aparência

extraordinária e real.10

Sobre a possibilidade de que o evento poderia ter

sido apenas uma “ visão ” sobre algo não real, R. V. G.

Tasker, explica: “A tradução a visão (to horama) não é

muito feliz, pois pode dar a impressão de que a

experiência da transfiguração foi da natureza de um

sonho. ‘O que vistes’ é melhor”.11

Tasker está correto porque o verbo horao é usado

para coisas físicas. Temos, por exemplo, o uso do

estava presente ali com Moisés, e a presença dEle tornava aquele lugar
santo (veja também Js 5:13-15).
10 Gilberto Theiss, mensagem de correio eletrônico ao autor, 17 de
setembro de 2016. Grifos Acrescidos.
11 R. V. G. Tasker, Mateus: Introdução e comentário. Série Cultura Bíblica
(São Paulo: Vida Nova, 1980), p. 134.

20
substantivo horama na palavra paranorama, que se

refere à visão do todo. Por sua vez, o geógrafo grego

Pausânias (115 - 180 d.C) usou a palavra panorama

para fazer uma descrição geográfica da terra da

Grécia. Ou seja: alegar que o significado principal de

horama é somente “visão”, é uma alegação totalmente

infundada.

Já Norman Champlin, mesmo crendo

erroneamente que era o “ espírito ” de Moisés que

estava presente no Monte da Transfiguração, comenta:

Alguns intérpretes não aceitam a aparição

objetiva desses homens, mas acham que o

acontecimento foi um tipo de visão que

dispensava a presença literal dos mesmos. Mas, a

maior parte dos intérpretes compreende

corretamente que eles realmente apareceram,

e não há razão alguma para que se negue a

possibilidade de tal aparição [...] a palavra

‘ visão ’ , como visto anteriormente, não

equivale a ‘fantasia’ e não implica em que tal

21
acontecimento não tenha incluído a presença

autêntica de Moisés e Elias [...] Nesse

acontecimento, Jesus não dependeu de qualquer

documento escrito, como o V.T., mas do próprio

testemunho pessoal de Moisés.12

A análise de alguns detalhes do relato não deixa

dúvidas de que Jesus teve uma conversa real com

Moisés. Vejamos:

1. Em Mateus 17:1 vemos que Cristo separou três

pessoas para testemunharem Sua transfiguração. Se

fosse apenas uma visão simbólica ou algo que

passou “dentro da mente” dos participantes, por que

houve a necessidade de separar três dos demais?

Por que a “visão” não ocorreu diante do grupo todo,

já que apenas Pedro, Tiago e João veriam a cena?

Isso não faria sentido.

2. Em Lucas 9:30 lemos que “dois varões ” “ falavam ”

com Jesus. Para Lucas, Moisés e Elias mantiveram

um diálogo real com Cristo sobre Sua morte na cruz.

12R. N. Champlin, O Novo Testamento Interpretado Versículo Por Versículo,


vol. 1 (São Paulo: Hagnos, 2002), p. 453. Grifos acrescidos.

22
Afinal, já imaginou se Cristo desistisse no Getsêmani?

Eles teriam de voltar e morrer e, com certeza, tal

conversa motivou ainda mais ao Salvador a

continuar em Sua missão, pois dela dependiam

Moisés, Elias e Enoque (Gn 5:24) para

permanecerem no Céu, bem como todos os justos de

todas as épocas que viessem a ressuscitar.

3. Por sua vez, Lucas 9:31 informa-nos que Moisés e

Elias “apareceram em glória”. Não há margem para

dúvidas: o relato se constitui numa visão real de

corpos glorificados. Jesus não estava falando com

pessoas “ irreais ” – ao contrário de Paulo em Atos

16:9,10.13

4. Pedro, ao contar que foi testemunha ocular do

evento da Transfiguração, demonstra ter visto algo

real e que o impactou positivamente: “ Porque não

13 Alguns imortalistas que não creem na ressurreição física de Moisés


alegam que “a visão que Paulo teve do varão Macedônio em Atos 16:9 é
semelhante a visão que os discípulos tiveram no monte da
Transfiguração”, ou seja: simbólica. Deve-se destacar que Paulo não
conversou com a visão registrada em Atos 16:9, 10. Por sua vez,
Jesus conversou com Moisés e Elias a respeito de um assunto
muito importante (Lc 9:31). Portanto, isso prova que tais personagens
estavam presentes com Cristo, e que Atos 16:9,10 trata de outro tipo de
visão, que não pode ser relacionada ao evento da transfiguração.

23
vos demos a conhecer o poder e a vinda de nosso

Senhor Jesus Cristo seguindo fábulas

engenhosamente inventadas, mas nós mesmos

fomos testemunhas oculares da sua majestade, pois

ele recebeu, da parte de Deus Pai, honra e glória,

quando pela Glória Excelsa lhe foi enviada a

seguinte voz: Este é o meu Filho amado, em quem

me comprazo. Ora, esta voz, vinda do céu, nós a

ouvimos quando estávamos com ele no monte santo”.

(2Pe 1:16-18).

Argumentando contra a hipótese de Pedro ter dito

nesse texto que ele havia sido testemunhar ocular “ de

uma visão simbólica ” , o apologista Ricardo dos Santos

Oliveira afirmou:

Agora, pensemos: testemunhas oculares de uma

mesma visão? Existe tal situação? Sem sombra

de dúvidas, Tiago e João, assim como Pedro,

viram algo real, e não passaram por um êxtase

coletivo. Se aquela visão não era real e “ só

estava na mente dos discípulos ” , então

deveríamos supor que Jesus também era uma

24
“visão”, pois é informado nos textos bíblicos sobre

a Transfiguração que os dois profetas estavam

falando com o Mestre. Porém, se Jesus está

literalmente presente e a visão só se refere a

Moisés e Elias, o problema ainda é maior: temos

um personagem literal - Jesus - conversando

com uma visão, falando com algo que

realmente não está ali, mas que se encontra

apenas na mente dos discípulos. Ou seja:

teríamos de aceitar que Jesus, ao mesmo tempo

em que está presente fisicamente, está “em visão”

na mente dos discípulos. Tem sentido essa teoria?

Claro que não. Os que negam a ressurreição de

Moisés precisam nos mostrar quantos relatos há

nas Escrituras que nos mostrem pessoas tendo

visões simbólicas coletivas14

Precisamos também considerar, como já foi dito,

que a ideia de uma “vida sem corpo” é inconcebível nas

14Ricardo dos Santos Oliveira, mensagem de correio eletrônico ao autor,


18 de novembro de 2016. Grifos Acrescidos.

25
Escrituras, inclusive no Novo Testamento. Ronald

Hall, anglicano, acertadamente diz:

Mesmo no além-túmulo, o corpo não é um mero

adorno do espírito, mas um elemento essencial no

ser de uma pessoa. Seria difícil entender por que

Paulo centralizava a fé na crença da ressurreição

se ele tivesse outra ideia. Se ele pensasse, por

exemplo, que a salvação tivesse que ver somente

com uma alma desincorporada liberta do corpo,

certamente não teria insistido tanto o tema da

ressurreição do corpo; ele teria se contentado

com a noção grega de uma alma imortal.15

Portanto, o evento da Transfiguração é um golpe

na doutrina da imortalidade da alma. É por isso que os

apologistas imortalistas se esforçam tanto para negar a

ressurreição de Moisés.

● Judas 1:9

15 Ronald L. Hall, “Dualism and Christianity. A Reconsideration” em Center


Journal (outubro de 1982), p. 43-44.

26
Leiamos o verso: “ No entanto, até o arcanjo

Miguel, quando contestava com o diabo e disputava a

respeito do corpo de Moisés, não se atreveu a lançar

contra ele um juízo ofensivo, mas lhe disse: Que o

Senhor te castigue!” (Tradução Ecumênica da Bíblia).

Mesmo que provavelmente Judas tenha citado a

obra pseudoepígrafa intitulada Assunção de Moisés, do

início de século I, isso não significa que o trecho é

espúrio e nem mesmo que a obra “se tornou inspirada”.

Apenas demonstra que o Espírito Santo, ao dirigir a

mente do profeta, fez com que ele usasse elementos

reais e corretos da referida obra por estarem corretos

e expressarem melhor a verdade que Deus queria

comunicar. Como a citação era verdadeira, Deus guiou

o profeta no uso da mesma.

Vemos aqui Moisés sendo “ a primeira pessoa

conhecida a provar o poder vivificador de Cristo ” 16.

Como já destacado, não teria lógica haver uma disputa

por causa de um corpo morto.

16Francis D. Nichol e Vanderlei Dorneles (editores). Comentário Bíblico


Adventista do Sétimo Dia, vol. 7 (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira,
2014), p. 781. Série Logos.

27
Deve-se também considerar que o termo grego

para “ disputa ” (diakrinómenos) em Judas 1:9 está

relacionado com disputas judiciais, envolvendo

questões legais. A ideia que parece estar envolvida é

que Satanás acusa Moisés de estar em débito,

juridicamente falando, por ser um pecador, e que este

lhe pertencia.

Veja que a disputa envolve algo moral,

demonstrando claramente que a questão em Judas 1:9

é algo muito maior do que apenas “ ser ou não

sepultado ” . Portanto, o uso de diakrinómenos destrói

qualquer alegação dos críticos de que a “disputa” entre

Miguel e Satanás possa ter sido pela posse do

“cadáver”.

Em Judas 1:9, apesar de estar sendo insultado,

“ sob tal provocação, conforme diz a história, Miguel

não tratou o diabo com desrespeito. Não se atreveu a

condená-lo com palavras ofensivas (New English Bible,

de 1961)”.17 Matthew Henry pondera:

17 Michael Green, 2 Pedro e Judas: Introdução e comentário. Série Cultura


Bíblica (São Paulo: Vida Nova, 1983), p. 162.

28
Embora essa contenda tenha sido

poderosamente zelosa e séria18 e Miguel tenha

saído vitorioso, nessa questão, ele ‘ não ousou

pronunciar juízo de maldição ’ contra o próprio

diabo. Ele sabia que uma boa causa não precisava

desse tipo de arma na sua defesa. Lemos: Ele não

ousou, etc. Por que ele não ousou? Não que

tivesse medo do Diabo, mas ele acreditava

que Deus seria ofendido se, em uma disputa

como essa, ele agisse dessa forma. Ele achava

que era indigno de envolver-se em uma prova de

habilidade com o grande inimigo de Deus e do

homem, em que qual deles afrontaria e

repreenderia mais fortemente o outro. Temos

aqui um lembrete a todos os disputantes, para

nunca fazerem acusações injuriosas em suas

18É impossível que tal contenda pudesse ser considerada “poderosamente


zelosa e séria” por Matthew Henry se tivesse ocorrido por causa de um
“cadáver”, como alegam alguns.

29
disputas. A verdade não precisa da ajuda da

falsidade e da grosseria.19

Alguns críticos afirmam que Jesus não pode ser

identificado com Miguel por que este “ não teve

autoridade para repreender o diabo em Judas 1:9 ” .

Porém, esse é um argumento débil, considerando o

comentário anterior de Henry e também Apocalipse

12:7-9.

No referido texto bíblico, o mesmo Miguel

expulsou o Diabo de Céu. O que é mais difícil:

repreender ou expulsar? Com certeza, expulsar. Por

isso, assim como a expulsão por parte de Miguel não

significa que “ ele não tivesse autoridade para mandar

Satanás embora com apenas uma palavra ” , o não

envolvimento dEle com Satanás naquele tipo de

palavreado injurioso não significa falta de autoridade.

Em Jó 1 e 2 Deus também não expulsou Satanás de

cara, mas preferiu deixá-lo agir para desmascarar o

19 Henry, Comentário Bíblico Novo Testamento: Atos a Apocalipse (Rio de


Janeiro: CPAD, 2012), p. 954. Grifos acrescidos.

30
caráter do inimigo diante dos seres celestiais. Nem por

isso interpretamos que Deus “ não tivesse autoridade ”

para mandar o inimigo embora. Por que Miguel (Cristo)

não poderia agir como Deus - com classe - apesar de

sua ilimitada autoridade?

Como já destacado, o próprio contexto revela que

a questão em Judas 1:9 não foi “ falta de autoridade ”

por parte de Miguel, mas sim sua postura de classe

em não descer ao baixo nível do diabo em ficar

proferindo palavras difamatórias. Cristo, mesmo em

sua função de Comandante dos Exércitos celestiais, é

um Deus de classe.

Além disso, o relato de Daniel 10, onde Miguel

ajuda Gabriel na luta contra o demônio, demonstra

que Miguel tem mais poder e autoridade que Satanás.

31
EM QUE SENTIDO JESUS É “ AS PRIMÍCIAS DOS

QUE DORMEM”?

Elias Soares de Moraes alega que se Jesus é “ as

primícias dos que dormem ” (1Co 15:20), ou seja: “ o

primeiro a ressuscitar para nunca mais morrer ” ,

Moisés não poderia ter ressuscitado antes dEle.20

Mesmo que “ primícias ” se refira também à ordem

cronológica, não é esse o sentido aplicado a Cristo

em 1 Coríntios 15:20. Você verá mais detalhes sobre

isso no artigo “1 Coríntios 15 e as Primícias”, escrito

por Sérgio Monteiro e disponibilizado no Apêndice A

desse e-book. Porém, quero lhe dar algumas

informações iniciais desde já.

Quando o texto bíblico diz que Cristo é “ as

primícias dos que dormem”, o contexto esclarece que é

no aspecto figurado, no sentido de principal. É no

mesmo “contexto”, diríamos assim, em que a Bíblia fala

de Cristo como “ primogênito da criação ” em

Colossenses 1:15. Se entendermos “ primícias ” no

20 Veja-se, por exemplo, Elias Soares de Moraes, Perguntas Difíceis de


Responder Sobre a Imortalidade da Alma entre a Morte e a Ressurreição,
vol. 4 (São Paulo: Beit Shalom, 2016), p. 322-323 e 348.

32
sentido literal como significando que Cristo foi o

“ primeiro que ressuscitou para não mais morrer ” ,

temos que entender Colossenses 1:15 como ensinando

que Cristo foi o “primeiro a ser Criado” . Sabemos que

isso é uma heresia.

A argumentação de Elias Soares e outros

apologistas como João Flávio Martinez21, do Centro

Apologético Cristão de Pesquisas (CACP), não resiste à

uma breve análise contextual e linguística. O texto de 1

Coríntios 15:23 - que obviamente se encontra no

mesmo contexto de 1 Coríntios 15:20 - demonstrará

esse fato: “ Cada um, porém, por sua própria ordem:

Cristo, as primícias; depois, os que são de Cristo, na

sua vinda”

A palavra em negrito - ordem - foi destacada para

o leitor perceber em que contexto linguístico se

21 O debate entre Sérgio Monteiro e João Flávio Martinez no programa


“Vejam Só!” pode ser visto em: “Debate - Vejam só - Transfiguração -
Com Pastor Sérgio Monteiro”, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=grUt5X9RdHM ;Internet (consultado
em 28 de novembro de 2017). Já uma resposta de Monteiro às alegações
infundadas Pr. Martinez pode ser vista em “Resposta do Pastor Sérgio
Monteiro a acusação do Flávio Martinez do CACP”, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=QUiZyZUchf4 ; Internet (consultado
em 28 de novembro de 2017).

33
encontra a segunda palavra em destaque - primícias.

O termo grego para “ ordem ” é tagma e, segundo o

Dicionário do Grego do Novo Testamento, significa

“ordem”, “turno”, “classe”22.

Por sua vez, o Theological Dictionary of the New

Testament explica sobre o termo: “ No NT, a única

referência está em 1Co 15:23, onde o significado mais

provável é "ordem", "posição", "classificação" ” . Para o

referido dicionário, “ é altamente possível que o

sentido ” da palavra tagma seja “ cada um em sua

‘posição’, ‘ranking’”.23

Desse modo, quando Cristo é chamado de

“ primícias ” , o texto não diz que ele foi “ primeiro em

uma ordem cronológica ” , mas “ o primeiro de uma

classe ” , ou seja: Ele é o primeiro de uma ordem ou

turno especial, obviamente no sentido de importância

- não cronológico.

22Carlo Rusconi, Dicionário do Grego do Novo Testamento (São Paulo:


Paulus, 2003), p. 449. Ver “τάγμα”(Tagma).
23 Theological Dictionary of the New Testament (Vols. 5-9 edited by
Gerhard Friedrich. Vol. 10 compiled by Ronald Pitkin.; ed. Gerhard Kittel
et al.;, electronic ed.; Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1964-c1976), vol. 8, p.
31-32.

34
O termo “ primícias ” em 1 Coríntios 15:20, 23,

segundo a Bíblia de Estudo Genebra24, possui um

significado mais metafórico, com o propósito de

demonstrar que a ressurreição de Cristo é a mais

importante e especial, pois dela depende a

ressurreição de todos os justos mortos:

Primícias – essa metáfora se baseia na

ordenança do Antigo Testamento, que pedia aos

israelitas para trazerem ‘ um molho das primícias

da vossa messe ao sacerdote ’ (Lv 23:10). Essa

oferta indicava o reconhecimento, por parte do

ofertante, de que toda a colheita pertencia a Deus.

Assim, Paulo utilizou essa expressão para

enfatizar, por exemplo, que os cristãos, ao

receberem o Espírito, recebiam a garantia da

sua ressurreição futura [...] A questão aqui é

que a ressurreição de Jesus e a ressurreição

24 Durante do debate na RIT TV, o Pr. Elias Soares alegou que fiz uso
indevido da Bíblia de Estudo de Genebra por essa precisar de uma
“revisão”. Porém, noutro debate ele fez questão de usar a mesma Bíblia
de estudo para apoiar suas ideias pessoais. Veja-se essa contradição do
referido pastor no link a seguir, que se encontra no canal do YouTuber
Ricardo Oliveira: https://www.youtube.com/watch?v=V7ISi-C4TQo
(consultado em 27 de novembro de 2017).

35
dos cristãos não são coisas separadas,

desconectadas. Pelo contrário, Jesus foi ‘ o

primeiro da ressurreição dos mortos’ (At 26:23), e

é esse fato que torna possível a ressurreição dos

cristãos. Uma vez que Cristo, como

representante do seu povo, ressuscitou, assim

também o cristão foi ressuscitado espiritualmente

[...]25

Leon Morris destaca:

As primícias compreendiam o primeiro feixe da

colheita, que era trazido ao templo e oferecido ao

Senhor (Lv 23:10, 11). Num sentido, ele

consagrava toda a colheita. Além disso, primícias

implica na existência de frutos posteriores.

Ambas as ideias vão ao ponto aqui. Cristo não

foi o primeiro a ressuscitar dos mortos. Na

verdade, Ele próprio ressuscitara a alguns. Mas

estes tinham que tornar a morrer [cremos que

25Bíblia de Estudo de Genebra (Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil; São


Paulo: Cultura Cristã, 2009), p. 1529.

36
Moisés foi ressuscitado, mas poderia tornar a

morrer se Cristo no Getsêmani desistisse]. A

ressurreição de Cristo foi para uma vida que não

conhece a morte, e, neste sentido, Ele foi o

primeiro, o precursor de todos os que haveriam

de estar nele. Hodge vê na comparação com as

primícias a ideia de que ‘a ressurreição de Cristo

é um penhor e uma prova da ressurreição do Seu

povo’.26

Vê-se que Morris, em parte, concordaria com a

explicação do Pr. Soares. Obviamente não concordaria

totalmente, pois Morris explica que a ênfase principal

de primícias, quando aplicada a Cristo, significa que

por meio de Sua ressurreição, Ele consagra todos os

mortos nEle para apresentá-los a Deus. Citando outro

comentarista, Morris explica que Cristo é as “primícias

dos que dormem ” no sentido de ser o penhor, a

garantia de que todos os que O aceitaram como

26 Leon Morris, 1 Coríntios: Introdução e Comentário. Série Cultura Bíblica


(São Paulo: Vida Nova, 1981), p. 171.

37
Salvador serão ressuscitados. Isso leva a crer que,

mesmo bem-intencionado, o Pr. Elias Soares seguiu

uma linha de raciocínio na interpretação de “primícias”

que não faz parte do raciocínio de Paulo em 1 Coríntios

15:20.

Seria importante o prezado Pr. Soares atentar

para o fato de que esse comentário publicado pela Vida

Nova está em harmonia com a posição do Comentário

Bíblico Adventista a respeito de 1 Coríntios 15:20:

O molho das primícias da colheita tipificava a

Cristo, as ‘ primícias ’ , ou promessa, da grande

colheita que se seguirá quando todos os justos

mortos forem ressuscitados na segunda vinda de

Jesus (ver 1Co 15:23; 1Ts 4:14-16) [...] Assim

como as primícias eram uma promessa e uma

certeza da reunião de toda a colheita, também

a ressurreição de Cristo é uma promessa de que

38
todos os que confiam nEle serão ressuscitados

dos mortos.27

Já a Bíblia de Estudo Plenitude apresenta

posicionamento parecido: “ As primícias são a primeira

parte madura da colheita, fornecendo provas reais de

que a colheita inteira está a caminho. De acordo com

Lv 23:4-14, as primícias, em conexão com a Páscoa,

eram usadas para consagrar a colheita que chegaria.

Jesus morreu na Páscoa e sua ressurreição é uma

promessa de nossa própria ressurreição”.28

Lamentável é a insinuação do Pr. Soares em sua

última obra29, de que o Comentário Bíblico Adventista

do Sétimo Dia, vol. 1, p. 676, concorda com a opinião

dele de que Cristo foi o “ primeiro em ordem

cronológica”, sendo que o referido comentário, no vol.

6, destaca claramente o sentido figurado da

27 Nichol e Dorneles, Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 6


(Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2014), p. 884. Série Logos.
28 Bíblia de Estudo Plenitude (Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil,
2001), p. 1194.
29 Soares, Perguntas Difíceis de Responder Sobre a Imortalidade da Alma
entre a Morte e a Ressurreição, p. 349.

39
expressão. Também lamentável é o fato dele

desconsiderar a explicação do comentário bíblico

adventista no vol. 6, p. 475, referente à Atos 26:23 que

contradiz abertamente a alegação dele:

O primeiro da ressurreição. Cristo é ‘ as

primícias dos que dormem ’ (1Co 15:20) e ‘ o

primogênito de entre os mortos ’ (Cl 1:18). Ele

também foi o primeiro a proclamar que os mortos

viveriam pela fé nEle (Jo 5:21-29; 11:23-26).

Cristo não foi o primeiro da história a

ressuscitar dos mortos. Moisés foi o primeiro

nesse sentido (Lc 9:28-30; Jd 9). Cristo é o

‘primeiro ’ em preeminência e por ser o Autor

da Vida (Cl 1:15, 16; 3:4) [...].30

30 Nichol e Dorneles, Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 6, p.


475. Grifos acrescidos.

40
Portanto, ao contrário do que Soares alega31, o

Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia explica

que Cristo é as primícias dos que dormem não no

sentido cronológico, mas de importância: é só por

causa da ressurreição dEle que todas as pessoas

puderam e poderão ser ressuscitadas.

Por isso, se outros ressuscitaram antes de Cristo,

Moisés também poderia. “ Assim como as primícias

eram uma promessa e uma certeza da reunião de toda

a colheita, também a ressurreição de Cristo é uma

promessa de que todos os que confiam nEle serão

ressuscitados [colhidos] dos mortos”.32

31 Outras alegações de Elias Soares podem ser verificadas, por exemplo,


em Apologética e Polemismo!, “A verdade sobre a ressurreição de
Moisés”, disponível em
https://www.youtube.com/watch?v=X9qMDKbeN8w ;Internet (consultado
em 20 de março de 2016).
32 Nichol e Dorneles, Comentário Bíblico Adventista do Sétimo Dia, vol. 6, p.
884.

41
SE MOISÉS DE FATO RESSUSCITOU, PORQUE

ESSE EVENTO EXTRAORDINÁRIO NÃO É

MENCIONADO ENTRE OS FEITOS DELE EM

HEBREUS 11?

Entre as objeções apresentadas contra a

ressurreição de Moisés, essa é a mais fraca de todas.

Na prática, se baseia em dizer que, se a ressurreição

de Moisés tivesse ocorrido, isso teria sido mencionado

pelo autor de Hebreus na descrição dos heróis da fé

em Hebreus 11.

As considerações a seguir demonstram a

precariedade de tal argumento:

a) Há uma infinidade de fatos sobre os heróis da fé que

também não aparecem na galeria de Hebreus 11.

José, por exemplo, é até hoje lembrado por ter se

tornado o governador do Egito, o segundo maior de

toda a terra naquela época, atrás apenas do Faraó.

Isso depois de ter sido desprezado por seus irmãos,

42
vendido aos egípcios, se tornado escravo, ser preso

e passar por toda uma reviravolta em sua vida. Mas

nada disso é dito em Hebreus 11, apenas que “ pela

fé José, no fim da vida, fez menção do êxodo dos

israelitas do Egito e deu instruções acerca dos seus

próprios ossos” (Hb 11:22).

Em outras palavras, se um acontecimento

importante na vida de um personagem bíblico devesse

necessariamente passar pela confirmação na descrição

do autor de Hebreus, teríamos que rejeitar todos esses

grandes acontecimentos na vida de José. Quer dizer

que nenhum fato bíblico importante realmente

aconteceu, a não ser que tenha sido mencionado pelo

autor de Hebreus? Não me parece um método

exegético sério e confiável.

b) Elias, que foi arrebatado ao Céu em vida e se

encontra lá até hoje (sendo, portanto, algo ainda

mais significativo do que a vivificação posterior de

43
Moisés), também não se encontra na lista de

Hebreus 11. Isso significa que o arrebatamento dele

descrito em 2 Reis 2:1-18 não ocorreu? É óbvio que

não.

c) Daniel, um dos maiores nomes de todo o Antigo

Testamento a quem Deus se refere muitas vezes

como o “ muito amado ” (cf. Dn 9:23; 10:11; 10:19),

também não aparece na lista dos Heróis da Fé, nem

seus grandes feitos.

Sendo assim, a conclusão óbvia a que se chega é

que o autor de Hebreus não tinha a finalidade de listar

todos os grandes nomes do AT, nem mesmo todos os

grandes acontecimentos que marcaram a vida de tais

personagens.

Ele selecionou alguns por sua própria vontade

(inspirada) e deixou outros de fora pela mesma razão.

É uma postura um tanto imatura considerarmos

verdadeiros apenas os fatos que o autor de Hebreus

“registrou em sua lista”. Este é o chamado “argumento

do silêncio” que não prova nada.

44
CAPÍTULO 3

BASE EXTRABÍBLICA DA RESSURREIÇÃO DE

MOISÉS

Agora o leitor perceberá que é tendenciosa a

alegação de que “ Ellen G. White errou em dizer que o

corpo de Moisés não viu corrupção ” 33. Alguns críticos

desconsideram o fato de que eruditos protestantes,

33 Ellen G. White, Primeiros Escritos. 10ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora
Brasileira, 2014), p. 165. Elias Soares alega erroneamente, com base na
obra Patriarcas e Profetas, 16ª ed. (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira,
2013), p. 477-478, que Ellen G. White concorda com ele de que a disputa
a respeito do corpo de Moisés ocorreu “para que o mesmo não fosse
idolatrado”. Porém, essa é uma observação tendenciosa. No referido
contexto ela dá a razão para o sepultamento do corpo de Moisés, não
para a disputa ocorrida em Judas 1:9. A opinião dela sobre a disputa em
Judas 1:9 é muito clara: “Moisés passou sob o domínio da morte, mas não
devia permanecer na sepultura. O próprio Cristo o chamou à vida.
Satanás, o tentador, reclamara o corpo de Moisés por causa de seu
pecado; mas Cristo, o Salvador, o retirara da tumba” (O Desejado de
Todas as Nações. 22ª ed. [Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2014], p.
421. Além disso, o argumento de Soares de que a disputa em Judas 1:9
ocorreu “para que o corpo de Moisés não fosse idolatrado” carece de
base séria. Como bem argumentou Ricardo dos Santos Oliveira em um e-
mail que me foi enviado em 18 de novembro de 2016: “Alguns dizem que
Miguel disputava o corpo de Moisés para sepultá-lo, para que o povo não
idolatrasse o corpo. Isso é contradição gritante, pois em Deuteronômio
34:5,6 diz que quem sepultou o corpo de Moisés foi o Senhor, ou seja
Deus. Por que Miguel disputaria o corpo de Moisés para sepultá-lo, se o
Senhor já tinha feito isso? Diante dos fatos, só podemos crer que o que
motivou Miguel a disputar o corpo de Moisés foi qualquer outro motivo,
menos querer sepultá-lo". Ricardo Oliveira é YouTuber, e seu canal é:
“Ricardo Oliveira” (Veja-se o link: https://goo.gl/TAQ6XN)

45
assim como a referida autora, acreditaram na

ressurreição de Moisés. Entre esses críticos, destaco o

Pr. Elias Soares de Moraes (apresentador do programa

de rádio “ Exaltando a Palavra ” ) que, ignorando o que

dizem eruditos protestantes, acusa a Sra. White de

heresia. Por que Ellen G. White é “ herege ” e tais

eruditos protestantes não o são? Obviamente, o Pr.

Moraes está sendo tendencioso.

Veja-se a seguir alguns dos eruditos protestantes

que pensam como Ellen G. White ou admitem a

possibilidade da ressurreição de Moisés:

1. Adam Clarke, erudito metodista:

Elias veio do Céu no mesmo corpo que ele tinha

sobre a Terra, porque ele foi trasladado, e não viu a

morte (2Rs 2:11). E o corpo de Moisés era

provavelmente ressuscitado, como penhor da

ressurreição; e como Cristo deve vir julgar os vivos

e mortos, porque nem todos morreremos, mas

todos seremos transformados (1Co 15:51). Ele

provavelmente mostrou a plena representação

46
disso na pessoa de Moisés, que morreu, e foi

assim ressuscitado para a vida (ou apareceu

agora como ele aparecerá quando ressuscitado no

último dia), e na pessoa de Elias, que nunca provou

a morte. Ambos os seus corpos exibiam a mesma

aparência, para mostrar que os corpos dos santos

glorificados são o mesmo, quer a pessoa tenha sido

trasladada, quer tenha morrido.34

O comentário do teólogo adventista Francis D.

Nichol é útil na referida análise:

A narrativa na transfiguração não diz nada

acerca de um espírito ou alma imortal

pairando ao lado de Cristo. Em vez disso, lemos

que Cristo estava presente com “Moisés e Elias” ao

seu lado. Sabemos que Cristo era real – ‘o

Verbo se fez carne ’ . Sabemos que Elias foi

transladado corporalmente para o Céu. Portanto,

podemos corretamente presumir que ele era real. E

não há nada no relato a sugerir que Moisés

34 Bible Commentaries, Adam Clarke Commentary, disponível em


https://www.studylight.org/commentaries/acc/matthew-17.html ; Internet
(consultado em 31 de agosto de 2016). O comentário foi originalmente
publicado em 8 vls, entre 1810-1826. Grifos acrescidos.

47
era menos real [...] O relato não diz que o espírito

de Moisés estava ali, mas que Moisés estava. Além

disso, os discípulos evidentemente devem ter

considerado Moisés como sendo tão real como os

outros dois, porque Pedro queria construir três

tendas (v. 4) [...] O relato da transfiguração apoia

não a doutrina de almas imortais, libertas da

cápsula de um corpo, mas a doutrina da

ressurreição.35

2. Jamieson, Fausset e Brown, imortalistas, no

clássico comentário entre os batistas, publicado

originalmente em 1871 e novamente impresso em

1961, ao comentarem o evento em Lucas 9:28-36

afirmam: “ Moisés representava "a lei," Elias "os

profetas", e os dois juntos todo o testemunho de

Escrituras do Antigo Testamento [...].36

35Francis D. Nichol, Respostas a Objeções: uma defesa bíblica da doutrina


adventista (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2004), p. 271. Grifos
acrescidos.
36Robert Jamieson, A. R. Fausset e David Brown, Commentary Practical
And Explanatory on the Whole Bible. (Grand Rapids, MI: Zondervan,
1961), p. 1002.

48
Ao comentarem Judas 1:9, esses teólogos batistas

não deixam dúvidas de que a disputa entre Miguel e

Satanás foi pelo direito ou não de Moisés

ressuscitar. Esses autores evangélicos viram que o

conflito cósmico nesse texto envolve questões muito

mais sérias do que a simples disputa pelo direito de

enterrar alguém:

Sobre o corpo de Moisés - seu corpo literal. [...]

Que o corpo de Moisés foi levantado, vê-se de

sua presença com Elias e Jesus (que estavam

no corpo) na Transfiguração [...] Judas,

inspirado, conseguia distinguir quanto da tradição

era verdade e o quanto era falsa. Nós não temos

tais meios de distinguir e, portanto, não podemos

ter certeza de nenhuma tradição, salvo o que está

na palavra escrita [...] A partir da palavra

"disputada", ou do debate na controvérsia, fica

claro que foi uma competição judicial.37

37 Ibid., p. 1519. Grifos acrescidos.

49
Vemos que para esses teólogos, o termo grego

para “corpo” (soma) não foi utilizado por Judas apenas

por razões de estilo ou para se referir a um corpo

morto, mesmo que o termo possa também se referir a

um cadáver.

No caso de Judas 1:9, foi usado soma para

demonstrar que a disputa realmente não era por um

cadáver que estava em decomposição avançada. O

mesmo termo foi usado em referência ao corpo de

Cristo em Mateus 27:58, que estava morto e não em

estado de decomposição. É usado também em Mateus

5:29 para se referir a um corpo vivo; em 1 Coríntios

6:6 como sinônimo de pessoa, e em Apocalipse 18:13,

como sinônimo de escravo.38

JOSUÉ 1:1 E 2 NEGA A RESSURREIÇÃO DE

MOISÉS?

A análise anterior revela que a argumentação de

Elias Soares em torno de Josué 1:1-2, para negar a

38Carlo Rusconi, Dicionário do Grego do Novo Testamento (São Paulo:


Paulus, 2003), p. 447. Veja-se “soma”

50
ressurreição de Moisés, é totalmente infundada39. Ele

alega que no hebraico, ao Deus dizer “ Moisés, meu

servo, é morto” (Js 1:2), isso indica que 30 dias após o

luto por Moisés (Dt 34:6), este ainda continuava morto,

de modo que seu corpo “se decompôs” sendo, portanto,

inviável ter ele ressuscitado.

Mesmo que a hipótese de tradução apresentada

por Moraes possa verter o texto como “ Moisés, meu

servo, está morto ” , o texto não é conclusivo sobre o

assunto. No contexto de Josué, Deus apenas não

havia revelado sobre a disputa que ocorreu pelo

corpo de Moisés, pois não era o assunto em pauta na

narrativa. Se os Israelitas soubessem que Moisés havia

sido arrebatado após sua ressurreição, com certeza

dariam um jeito de fazer uma imagem para idolatrar o

39 A alegação de que Ellen G. White em Primeiros Escritos, p. 164 (Tatuí, SP:


Casa Publicadora Brasileira, 2014 – 10ª ed.), contradiz Josué 1:2, ao dizer
que Moisés ao ter passado pela morte não viu “corrupção”, é totalmente
infundada, quando percebemos que outros comentaristas creem na
ressurreição de Moisés, assim como Ellen G. White. Os críticos não
alegam, por exemplo, que as fontes citadas no presente esboço
“contradizem Josué 1:2”. A co-fundadora do adventismo foi muito feliz
em sua abordagem do evento da transfiguração quando afirmou na
mesma página: “Moisés estava presente para representar os que serão
ressuscitados dentre os mortos, por ocasião do segundo aparecimento de
Jesus. E Elias, que fora trasladado sem ver a morte, representava os que
serão transformados à imortalidade por ocasião da segunda vinda de
Cristo, e serão trasladados para o Céu sem ver a morte”.

51
profeta. É por isso que a disputa pelo corpo de Moisés

e sua ressurreição ficam evidentes no Novo

Testamento.

Se a revelação da doutrina da Trindade foi

progressiva (entre outras doutrinas bíblicas), por que

os autores bíblicos não poderiam receber uma

revelação progressiva sobre a ressurreição de Moisés?

Devemos considerar um contexto muito mais amplo

que o de Deuteronômio 34:8 e José 1:1, 2 para

avaliarmos o assunto, assim como o fizeram eruditos

protestantes que estão sendo listados no presente

trabalho.

Devemos considerar que traduções bem

reconhecidas como a Tradução Ecumênica da Bíblia 40 e

a Bíblia de Jerusalém41 simplesmente dizem que

Moisés morreu. A interpretação do Pr. Soares foge do

40 A Tradução Ecumênica da Bíblia (TEB) assim verte o texto: “Moisés, meu


servo, morreu”. Nada mais do que isso.
41 Já a Bíblia de Jerusalém traduz do mesmo modo: “Moisés, meu servo,
morreu; agora, levanta-te!”

52
significado simples do verbo, e isso é impor ao texto

uma ideia preconcebida.

Sérgio Monteiro, teólogo e apologista adventista,

esclareceu por meio de um áudio que essa frase no

hebraico (“Moisés, meu servo, é morto ”) não pode ser

usada para indicar se Moisés morreu há 30 dias, no

mesmo dia ou há mil anos.

Segundo ele, alegar que a tradução do verbo na

Septuaginta indica que “até o momento em que ela foi

traduzida ” eles (os tradutores) “criam que Moisés

continuava morto”, é uma inverdade. A Septuaginta é

apenas uma tradução e, como se pode ver na obra de

Geza Vermes (mais adiante), a crença na Ascensão de

Moisés era comum entre boa parte dos judeus.

Se as traduções não são unânimes para Josué 1:1-

2; se o significado simples é que Moisés “morreu”, não

podemos fazer toda uma teologia em cima apenas de

um suposto significado gramatical, desconsiderando

outros trechos bíblicos, comentaristas abalizados e o

propósito evidente no contexto de Josué 1:1-2.

53
Deus simplesmente estava dizendo à Josué:

“ Moisés morreu e agora você terá de liderar o povo.

Não conte com Moisés ” . Nada mais do que isso. O

texto é uma narrativa que tem o propósito de informar

que Josué sucedeu Moisés. Dar a ele um sentido que

não faz parte da intenção original do autor é forçar

uma interpretação de maneira irresponsável.

3. Matthew Henry, teólogo metodista, também

imortalista, falando de Miguel42:

Ele não ficaria disputando com o diabo, nem

entraria em um debate particular a respeito dos

42 Diferentemente das Testemunhas de Jeová, os adventistas creem que


Miguel é um título honorífico de Cristo, sem que isso interfira em sua
absoluta divindade. Nossa posição é praticamente a mesma de Matthew
Henry e outros eruditos protestantes. Veja meus artigos “Cristo e o
Arcando Miguel”, disponível em http://leandroquadros.com.br/cristo-e-o-
arcanjo-miguel/ ; Internet; e “Miguel não é mais que um título do divino
Jesus”, disponível em http://leandroquadros.com.br/miguel-nao-e-mais-
que-um-titulo-do-divino-jesus/ ; Internet. Estudos sobre a posição
adventista a respeito da identificação de Jesus com Miguel podem ser
vistos em: Questões Sobre Doutrina: o clássico mais polêmico da história
do adventismo (Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 2009), p. 87-95;
Juan Víctor Mamani Quispe, “Quién Como Dios?: La Vindicación de Cristo”
em Cristología: VII Simposio Bíblico Teológico Sudamericano
(Cochabamba, Bolívia: Editorial UAB, 2009), p. 387-398; Gerhard Pfandl,
“Quem é o Arcanjo Miguel?” em Interpretando as Escrituras: descubra o
sentido dos textos mais difíceis da Bíblia (Tatuí, SP: Casa Publicadora
Brasileira, 2015), p. 221-222; Veja-se também “Miguel Arcanjo”,
disponível em https://translate.google.com.br/translate?hl=pt-
BR&sl=en&u=http://www.bibleexplained.com/revelation/r-seg11-
12/r1207a-Michael.htm&prev=search ; Internet (consultado em 02 de
setembro de 2016).

54
méritos dessa causa especial [veja: “ causa

especial ” , muito mais que brigar por um

corpo morto]. Ele sabia que Moisés43 era seu

conservo, um dos favoritos de Deus, e ele não

permitiria passivamente que fosse insultado

[Satanás estava insultando um corpo

morto?], não pelo príncipe dos demônios [...]

Moisés era uma dignidade, um magistrado,

alguém amado e preferido pelo grande Deus; o

arcanjo achava insuportável que alguém assim

fosse tratado dessa forma [um corpo morto

pode ser ofendido a tal ponto de Miguel não

aceitar?] por um espírito desprezível e apóstata,

independentemente de sua posição.44

43Comentando Deuteronômio 34:6, Matthew Henry observou: “O conceito


que têm alguns dos judeus de que Moisés foi levado ao céu, como Elias, é
infundado, pois está expressamente escrito que ele morreu e foi
sepultado; mas é provável que ele tenha sido ressuscitado para
encontrar Elias, para presenciar a solenidade da transfiguração de Cristo”
(Matthew Henry, Comentário Bíblico Antigo Testamento: Gênesis a
Deuteronômio [Rio de Janeiro: CPAD, 2012]), p. 682. A respeito de Mt
17:3, continua: “Havia santos glorificados com Ele; se havia três para dar
testemunho na terra, Pedro Tiago e João, também havia alguns para dar
testemunho da parte do céu [...] Elias foi levado ao céu em um carro de
fogo, e não morreu. O corpo de Moisés nunca foi encontrado.
Possivelmente estava preservado da degradação, e reservado para essa
aparição” (Henry, Comentário Bíblico Novo Testamento: Mateus a João
[Rio de Janeiro: CPAD, 2012], p. 216, 217.
44Matthew Henry’s Commentary on the Whole Bible, vol. 6 – Acts to
Revelation (Rio de Janeiro: CPAD, 2012), p. 955.

55
Os críticos que consideram “hereges” os

adventistas, por crerem na ressurreição de Moisés

e na identificação de “Miguel” com Cristo,

deveriam aprender com Matthew Henry a

interpretar Judas 1:9. Ou, ao menos terem a

humildade de não acusar o adventismo de

“heresia” ao perceberem que nossa crença, assim

como a crença de tal comentarista evangélico, em

nada afeta a ortodoxia cristã bíblica.

4. Bíblia de Estudo de Genebra: [sobre Mateus 17:3]:

Moisés, o doador da lei, e Elias, o maior profeta

do período monárquico, têm aqui o privilégio de

falarem com Jesus. De acordo com Lc 9:31, eles

discutiram sobre a iminente morte redentora de

Jesus.45

45Bíblia de Estudo de Genebra. 2ª Ed. Revista e Ampliada (Barueri, SP:


Sociedade Bíblica do Brasil; São Paulo: Cultura Cristã, 2009), p. 1257.
Grifos acrescidos.

56
Comentando Lucas 9:31, a referida Bíblia de

Estudo afirma: “ Pedro queria prolongar essa

experiência ao sugerir a construção de tendas para

acomodar, e possivelmente deter, os visitantes

celestiais”.46

5. Bíblia de Estudo Scofield:

A cena da transfiguração contém, em menor

proporção, todos os elementos do futuro reino em

sua manifestação (2Pe 1:15-21): 1) o Senhor Jesus,

não em humilhação, mas em glória (v.2); 2) Moisés,

glorificado, representante dos redimidos que

passaram por meio da morte para o reino (Mt 13:43;

comp. Lc 9:30, 31); 3) Elias, glorificado,

representante dos redimidos que entraram no reino

ao serem arrebatados (1Co 15:50-53; 1Ts 4:13-17)

[...].47

46 Ibid., p. 1337.
47 Bíblia de Estudo Scofield (São Paulo: Holy Bible, 2009), p. 875.

57
6. Geza Vermes (uma das maiores autoridades em

judaísmo e cristianismo da atualidade). Em seu livro

sobre a Ressurreição e Mitos48, ele afirma que havia

entre os Judeus a crença de que Moisés e Isaías haviam

ressuscitado e, portanto, ido corporalmente ao céu.

Ele deixa bem claro que Judas 1:9 estaria

certamente fazendo referência à ressurreição de

Moisés. É um autor muito respeitado tanto por cristãos

quanto por judeus nessa área da pseudoepígrafia

judaica que não deveria ser ignorado pelos críticos.

Ele argumenta que o próprio fato de a obra ser

chamada de A Assunção de Moisés (escrita entre 3 a.C

a 30 d.C), prova que esses judeus bem antigos (não

todo o judaísmo, obviamente) criam que Moisés foi

corporalmente ao Céu.

Além disso, devemos destacar que da obra

Assunção de Moisés possui-se apenas fragmentos, e

nenhum dos que restaram contêm a parte final que

esclareceria a suposta razão da disputa entre Miguel e

48 Geza Vermes, The Resurrection: History and Myth (Doubleday, EUA:


2008).

58
Satanás. O que podemos fazer é deduzir que, inspirado

pelo Espírito Santo, Judas extraiu essa parte da

referida obra para explicar a verdade que queria

comunicar.

Geza Vermes cita o Talmude49 Babilônico na

passagem Yomá 4:9, onde aparece esse relato muito

interessante: “ Moisés ascendeu na nuvem e foi

escondido na nuvem e foi santificado pela nuvem”.

Essa expressão “ escondeu-se numa nuvem ” está

descrevendo a ressurreição de Moisés. Isso porque

essa expressão simbolizava a crença daqueles

judeus do período do Segundo Templo na ressurreição

corpórea das pessoas. É por isso que a ressurreição de

Cristo e Sua consequente ascensão é descrita em Atos

1:9-11 com seu corpo subindo e uma nuvem o

envolvendo.

49 “O Talmude é uma compilação de estudos, reunidos desde o tempo de


Esdras até o sexto século de nossa era, contendo leis, poesias, orações,
ritos, sermões, folclore, regras sobre o procedimento, mas especialmente
comentários escriturísticos. Outra definição bastante sintética é esta:
Talmude é um repositório de leis judaicas. O termo Talmude vem do
hebraico Lamad = aprender, vindo a significar depois ensino, instrução,
estudo. Todo o talmude não é mais do que um esclarecido comentário à
Bíblia, continuando a ser grande força e fonte do judaísmo” (Pedro
Apolinário, História do Texto Bíblico: Crítica Textual [São Paulo: Instituto
Adventista de Ensino, 1985], p. 194).

59
Geza Vermes também faz menção à Pesiquitá

Rabat 20:4: “ quando Moisés foi ascendido ao Céu,

uma nuvem desceu e o cobriu, e esta nuvem cobriu

Moisés e o carregou”. Aparentemente essa descrição é

do 1 º século depois de Cristo, contemporânea à

época de Judas. Ela descreve uma tradição judaica

antiga.

7. Flávio Josefo em Antiguidades judaicas, 4. 326:

Amigavelmente conversava ainda com Eleazar e

Josué, quando uma nuvem se colocou entre eles e o

escondeu em um determinado vale, embora ele

mesmo tenha escrito nos livros sagrados que havia

morrido, por temor de que por sua elevada piedade,

pensassem que ele havia sido levado para a

divindade.50

50 A tradução foi feita por Sérgio Monteiro a partir do texto grego de Josefo,
como se encontra na obra Flavii Iosephi opera. B. Niese (Berlin.
Weidmann. 1892). O texto grego se apresenta como se segue:
ἀσπαζομένου δὲ καὶ τὸν Ἐλεάζαρον αὐτοῦ καὶ τὸν Ἰησοῦν καὶ
προσομιλοῦντος ἔτι, νέφους αἰφνίδιον ὑπὲρ αὐτὸν στάντος ἀφανίζεται
κατά τινος φάραγγος. γέγραφε δ᾽ αὑτὸν ἐν ταῖς ἱεραῖς βίβλοις τεθνεῶτα,
δείσας μὴ δι᾽ ὑπερβολὴν τῆς περὶ αὐτὸν ἀρετῆς πρὸς τὸ θεῖον αὐτὸν
ἀναχωρῆσαι τολμήσωσιν εἰπεῖν.

60
Essa passagem é vista pelos principais

comentaristas como uma expressão da crença de

Josefo, de que Moisés foi assunto ao Céu.

Após uma análise da citação original de Josefo,

Sérgio Monteiro observou:

É por isto que é correto afirmar que na

mentalidade de Josefo, Moisés não morreu. Neste

sentido, Josefo é parte de um conjunto de

tradições que afirmavam explicitamente a

recepção de Moisés nos céus51, seja pela

Ressurreição – como parece evidente de Judas 9,

apoiado no Assunção de Moisés – ou pela

Ascenção direta sem passar pela morte. Ademais,

é claro que os autores do Novo Testamento,

judeus, estavam conscientes deste conjunto de

tradições e, por seu uso, as recebiam como

válidas[8]. Textos como Romanos 5:12-14 e Judas

51 Como indica Monteiro em seu artigo, uma descrição das tradições


judaicas quanto à Morte de Moisés e sua ascensão pode ser vista no
ensaio de Haacker, K., Schafer, P., 'Nachbiblische Traditionen vom Tod
des Mose', in: O. Betz, K. Haacker, M. Hengel (eds.), Josephus Studien.
Untersuchungen zu Josephus, dem antiken Judentum unddem Neuen
Testament (FS O. Michel; Gottingen, 1974), p. 147-174.

61
9, parecem apontar para uma compreensão

neotestamentária de que Moisés havia sido liberto

do império da Morte.52

Perceba o quanto são significativas as evidências

de que entre os judeus havia a crença na assunção de

Moisés, e que isso influenciou também aos autores

bíblicos inspirados sem que eles tivessem sido

corrigidos pelo Espírito Santo.

52 Sérgio Monteiro, “Flávio Josefo e a Morte de Moisés: Uma nota”,


disponível em http://www.feoufideismo.com/2017/09/flavio-josefo-e-
morte-de-moises-uma-nota.html ; Internet (consultado em 28 de
novembro de 2017).

62
CAPÍTULO IV

RESUMO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da clareza do texto bíblico e de tantas

outras fontes, é muito mais coerente crer na

ressurreição de Moisés. Não há como negar que ele

realmente foi ressuscitado, e que a doutrina da

imortalidade da alma precisa ser revista com urgência

pelos estudiosos realmente comprometidos com o texto

bíblico. Afinal, segundo os autores bíblicos, não há vida

fora do corpo.

Miguel é mencionado tendo parte ativa em uma

ressurreição escatológica, conforme nos revela Daniel

12:1-2 (cf. 1Ts 4:16). E após a morte de Moisés, quem

vai disputar seu corpo? Exatamente o Arcanjo

Miguel, o mesmo Arcanjo que terá parte ativa em uma

grande ressurreição futura. Isso não é incrível? É

63
bastante óbvio que Miguel apareceu para ressuscitar

Moisés.

A crença na ressurreição de Moisés torna a

disputa por seu corpo algo de muito mais relevância

para o conflito cósmico (cf. Ap 12:7-12), ao mesmo

tempo que nos dá a certeza de que se a ressurreição de

Cristo foi eficaz para garantir a permanência de

Moisés no céu53, será eficaz para garantir a nossa

permanência eterna e corpórea no Paraíso.

Satanás tinha um argumento legal para dizer que

Moisés não merecia ser ressuscitado porque ele era

pecador (veja Êx 2:12 e Dt 32:51). Porém, ao Cristo

desejar que Deus Pai repreendesse Satanás em relação

a esse aspecto judicial (Jd 1:9), Ele estava levando

Moisés para o Céu com um tipo de “ cheque pré-

datado”, que foi totalmente pago na cruz (Cl 2:15).

53 Veja-se mais argumentos contra as análises dos críticos em “Moisés e


Elias: onde eles estão agora?”, disponível em
http://www.evangelhoperdido.com.br/moises-e-elias-onde-eles-estao-
agora/ ; Internet (consultado em 02 de setembro de 2016).

64
Foi quando Cristo morreu pelo pecador e depois

ressuscitou, que o Eterno pôde demonstrar

definitivamente perante o universo que Ele era capaz

de unir Seu amor e Sua justiça em ressuscitar um

pecador como Moisés.

No contexto de Judas 1:9, o autor bíblico critica

falsos mestres que eram rebeldes e irreverentes a

ponto de difamarem “ autoridades superiores ” (v. 8).

Ele nos ensina que se Miguel “ não tratou o Diabo de

modo frívolo, nem lhe deu resposta grosseira”; e diante

de tal provocação, “ não tratou o Diabo com

desrespeito ” , não dirigindo-lhe palavras ofensivas,

“ quanto mais os homens mortais deviam vigiar suas

palavras”.54

Isso se constitui numa lição preciosa para todo

apologista que realmente é cristão. Afinal, tendo a

Cristo como seu exemplo na forma de tratar as pessoas,

o defensor da fé de Cristo pautará seus debates pelo

54 Michael Green, 2 Pedro e Judas: Introdução e comentário. Série Cultura


Bíblica (São Paulo: Vida Nova, 1983), p. 162.

65
respeito, amor e misericórdia, e jamais tratará seu

oponente como desrespeito, sarcasmo e ironia.

Que todos os que se dizem ser defensores da “ fé

que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 1:3)

possam ter a classe de Miguel quando discordarem de

alguém (ver Jd 1:9) inclusive nas redes sociais.

Infelizmente, muitos têm imitado a grosseria do

Diabo apresentada no mesmo texto e se esquecem da

advertência de Jesus em Mateus 12:36-37:

Digo-vos que de toda palavra frívola que

proferirem os homens, dela darão conta no Dia do

Juízo; porque, pelas tuas palavras, serás

justificado e, pelas tuas palavras, serás

condenado.

Considerando a iminência do juízo, decidamos

imitar a postura de classe de Miguel, ao invés da

grosseria e má educação de Satanás.

66
BIBLIOGRAFIA

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Uma abordagem bíblica sobre a natureza humana
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73
APÊNDICE A

1 Coríntios 15 e as Primícias

Por Sérgio Monteiro

MTh, Doutorando em línguas Semitas

http://www.feoufideismo.com

Nós adventistas ensinamos que Moisés foi


ressuscitado e levado ao céu pouco após sua morte. As
Escrituras apontam em pelo menos três lugares para
este acontecimento (Transfiguração, Mat. 17 e
paralelos; Romanos 5:12-14 e o reino da morte; Judas 9,
com a disputa entre Miguel e Satanás.). Tradições
judaicas preservadas em Josefo, Pseudo-Filo, e no
Talmud apontam na mesma direção. Vários teólogos
não adventistas, curvam-se ante o peso da evidência
escriturística também entendem que Moisés foi
ressuscitado.

Outros teólogos, entretanto, não aceitam este


entendimento. Críticos do adventismo, dos mais
abertos ao diálogo aos mais desinformados e fechados,
em conjunto ribombam que esta crença é invenção
adventista. Os primeiros afirmam que esta é uma má
interpretação dos textos, enquanto os últimos afirmam

74
quase exasperadamente que esta é uma invenção
herética deste grupo herético (adventistas) e sua
profetisa herege (Ellen G. White).

Ambos os grupos que discordam do adventismo,


entendem que a ressurreição de Moisés contradiz
frontalmente dois textos principais das Escrituras: 1
Coríntios 15:20-23 e Hebreus 11:39-40. O primeiro
texto afirma:

Mas, agora, Cristo ressuscitou dos mortos e foi


feito as primícias dos que dormem. Porque, assim
como a morte veio por um homem, também a
ressurreição dos mortos veio por um
homem. Porque, assim como todos morrem em
Adão, assim também todos serão vivificados em
Cristo. Mas cada um por sua ordem: Cristo, as
primícias; depois, os que são de Cristo, na sua
vinda.

O segundo diz, referindo-se aos heróis da fé:

E todos estes, tendo tido testemunho pela fé,


não alcançaram a promessa, provendo Deus
alguma coisa melhor a nosso respeito, para
que eles, sem nós, não fossem aperfeiçoados.

Os críticos argumentam: “se ninguém antes dos


tempos do Novo Testamento e da Ressurreição
alcançou a promessa, como diz Hebreus e, sendo
Cristo as primícias dos que dormiram, ou seja, o

75
primeiro a ressuscitar, como é possível que Moisés
tenha ressuscitado e levado para os céus?”

De certa forma, descartando o animus ad


ecclesiam de alguns críticos, a pergunta é válida e
precisa ser respondida em base exegética, não
dogmática ou sistemática. Esta análise exegética
precisa ser feita sem espírito apologético combativo,
permitindo que o texto fale por si, para nós, por nós e
para si.

Com esse princípio balizador em mente, esta nota


apresenta uma análise linguística de dois termos
importantes que se encontram em 1 Coríntios 15:20-23.
O primeiro é o controverso aparkhe ( “ primícias ” ), e o
segundo é tagma (“ordem”). Esta análise nos permitirá
entender precisamente o objetivo paulino , bem como
confirmar ou descartar referências temporais no texto.

Aparche

Duas vezes o apóstolo utiliza o termo aparche para


se referir a Cr-sto. Este termo aparece 85 vezes nas
Escrituras (incluindo apócrifos), considerando a LXX55
e o Novo Testamento.56 No Novo Testamento,

55 LXX designa a Septuaginta (palavra latina que significa setenta) a


tradução do Antigo Testamento para o Grego feita por 72 rabinos entre o
século III e I a.C. Noutros momentos, o presente artigo utilizara LXX para
se referir aos “70 escribas”.
56 Exod. 22:28; 23:19; 25:2-3; 35:5; 36:6; 39:1; Lev. 2:12; 22:12; 23:10;
Num. 5:9; 15:20-21; 18:8, 11-12, 29-30, 32; 31:29; Deut. 12:6, 11, 17;
18:4; 26:2, 10; 33:21; 1 Sam. 2:29; 10:4; 2 Sam. 1:21; 2 Chr. 31:5, 10, 12,

76
encontramos 8 ocorrências57, sendo 6 nos escritos
paulinos, 1 em Tiago e 1 no Apocalipse. Fora do
contexto escriturístico, o termo é encontrado em
inúmeros documentos desde Platão até papiros do 2o
século da era Comum (Exemplos em Lidell-Scott58).

Etimologicamente, aparché está ligado ao verbo


aparchomai. O verbo não é encontrado no NT, mas
ocorre em várias formas na Septuaginta e na literatura
grega. A ideia básica do termo é consagração,
principalmente de um sacrifício.59

Tanto o verbo quanto o substantivo são termos


primordialmente cúlticos. 60 É verdade que eles
aparecem em outros contextos não religiosos, com um
espectro semântico que vai desde a certidão de
nascimento de um filho até o imposto que os judeus
deveriam pagar. Não obstante, tanto estatística quanto
contextualmente, o significado do termo em Paulo deve
ser buscado em seus usos no campo cúltico, mais
diretamente nos LXX.
14; Ezr. 8:25; Neh. 10:38, 40; 12:44; 13:5; Jdt. 11:13; Tob. 1:6; Tbs. 1:6;
Ps. 77:51; 104:36; Sir. 7:31; 35:7; 45:20; Ps. Sol. 15:3; Mal. 3:8; Ezek.
20:31, 40; 44:30; 45:1, 6-7, 13, 16; 48:8-10, 12, 18, 20-21; Rom. 8:23;
11:16; 16:5; 1 Cor. 15:20, 23; 16:15; 2 Thess. 2:13; Jas. 1:18; Rev. 14:4
57 Rom. 8:23; 11:16; 16:5; 1 Cor. 15:20, 23; 16:15; Jas. 1:18; Rev. 14:4
58 Henry George Liddell et al., A Greek-English Lexicon ("With a revised
supplement, 1996.";, Rev. and augm. throughout; Oxford; New York:
Clarendon Press; Oxford University Press, 1996), 180.
59 Ibidem.
60Horst Robert Balz and Gerhard Schneider, Exegetical Dictionary of the
New Testament (Translation of: Exegetisches Worterbuch zum Neuen
Testament.;Grand Rapids, Mich.: Eerdmans, 1990-c1993), 1:116.

77
Ocorre que o termo nos LXX é utilizado para
traduzir algumas palavras hebraicas: reshit, terumah,
tenupah, halev, ma ’ aser e matan. Destes termos, o
principal é terumah. De todos os usos de aparche nos
LXX, mais de 40 são tradução de terumah, a palavra
básica para ofertas61. Pode ser surpreendente que
aparche nunca traduza diretamente o termo hebraico
bekor, do qual advém o nome da festividade de
primícias. O termo utilizado pelos LXX para traduzir
bikkurim (hebraico) é protogennema (grego,
evidentemente), cujo sentido é precisamente o
primeiro fruto, ou primeiro que nasce.

Terumah é a o termo básico para descrever oferta,


quando a ênfase está no sentimento do ofertante. O
cognato acadiano rammu tem o sentido básico de
oferecer um presente, seja à divindade, seja a um ser
humano. A raiz hebraica rum quer dizer levantar,
erguer. Desta forma, terumah teria o significado algo
erguido, uma oferta consagrada à divindade, no
sentido de algo que não mais pertence ao ofertante.
Isto quer dizer, efetivamente, que aquele que oferta
escolhe algo de suas posses e oferece em presente.62

61 James Swanson, Dictionary of Biblical Languages With Semantic


Domains : Hebrew (Old Testament) (electronic ed.; Oak Harbor: Logos
Research Systems, Inc., 1997), DBLH 9556, #1.
62 Willem VanGemeren, New International Dictionary of Old Testament
Theology & Exegesis (Grand Rapids, MI: Zondervan Publishing House,
1998), 4:335.

78
O campo semântico do termo aparche na LXX
engloba as ideias equivalentes aos campos semânticos
dos termos hebraicos que ele traduz. Por exemplo, por
traduzir reshit, cujo sentido é princípio, início e
também principal, “ ... melhor, escolhido, i.e., o que é
superior em valor a todos os outros na mesma classe
ou tipo...”63, aparche também denota as mesmas ideias.
De igual maneira, ao traduzir helev, cuja ideia
inclui o que é melhor, aparche deve também incluir
este significado. Em outras palavras, o espectro do
termo não pode ser restringido a um único significado,
mas expandido.

Desta forma, como aparche nos LXX traduz


principalmente o termo terumah, cujo significado é
oferta, estando ligado à oferta volitiva, ou presente,
dom, não é possível se exigir do termo um significado
puramente temporal, supostamente advindo de uma
relação com o hebraico bekor, um termo que sequer
está no campo de traduções de aparche nos LXX.

Já a relação entre aparche e reshit tampouco pode


ser forçada no sentido de exigir noção de
temporalidade, porque nem mesmo reshit, quando
ligado aos primeiro frutos, possui um sentido muito
mais próximo da ideia de melhor. Esta é a ideia
encontrada em Êx 23:19 e 34:26, por exemplo. A
expressão reshit bikkure não pode ser entendida como

63 Idem, 8040, #3.

79
uma referência meramente ou primordialmente
temporal. O uso de reshit com bekkor, com esta
intenção seria pleonástico e redundante. De fato, o
reshit aqui quer dizer “ o melhor dos primeiros frutos
do solo, como um lembrete de que Deus merece o
melhor do que nós temos ” 64. Esta é a interpretação,
por exemplo, de Ibn Ezra65, Knobel, dentre outros66.

O tratado bikkurim do talmud nos indica que esta


interpretação está em harmonia com a forma judaica
de entender as primícias. De fato, de acordo com a
forma judaica que aparece no capítulo 1 do tratado,
verso 3, “primícias” não era estritamente o primeiro
fruto produzido pela terra que deveria ser apresentado,
mas o primeiros frutos das sete espécies nativas de
Israel67. Uma das discussões deste capítulo da Mishná
declara explicitamente que não era apenas a
característica temporal que deveria ser observada, mas
o produto deveria ser digno de ser declarado como
bikkurim, por ser o melhor68.

64Tokunboh Adeyemo, Africa Bible Commentary (Nairobi, Kenya; Grand


Rapids, MI.: WordAlive Publishers; Zondervan, 2006), 118.
65Disponível em: http://mg.alhatorah.org/Full/Shemot/23.18#e0n6
(hebraico). (Consultado em 03/01/2018).

66 Veja: John Peter Lange et al., A Commentary on the Holy Scriptures :


Exodus (Bellingham, WA: Logos Research Systems, Inc., 2008), 96.

67 Jacob Neusner, The Jerusalem Talmud: A Translation and Commentary


(Peabody, Massachusetts: Hendrickson Publishers, 2008), Bikkurim 1:3.

68 Segundo a Gemará do verso 3, R. Yosé afirmou: “Ouvimos que produtos


que sejam inferiores são aceitáveis como dízimos, mas seriam também
aceitáveis como primeiros frutos? Seguramente não”. idem

80
Tagma

Tagma é um hapax legomen, ou seja, aparece


apenas uma vez em todo o Novo Testamento - em 1
Coríntios 15:2369 - o que dificulta a definição de seu
significado. Não obstante, esta mesma palavra aparece
em vários textos gregos de diferentes períodos, e seu
significado não apresenta ampla variedade.

De fato, fora do contexto bíblico, o termo é


utilizado por Josefo em 172 ocasiões, descrevendo em
todas elas grupos ou legiões romanas70. Filo utiliza o
termo duas vezes, com o significado de conjunto71.
Nos pais da Igreja, tagma é encontrado 16 vezes, ainda
com o significado básico de grupo72, mas também como
posição73. Na literatura grega secular, o termo é

69“Cada um, porém, por sua própria ordem [tagma]: Cristo, as primícias;
depois, os que são de Cristo, na sua vinda”.
70Ant. 7:47; 13:238; 14:1, 48, 79, 123, 169, 171, 434, 447, 452-453; 15:72;
17:251, 286, 292, 299; 18:1-2, 120, 262; 19:119, 365; 20:122; Bellum
1:22, 157, 162, 183, 219, 317, 327, 329-330; 2:40, 45-46, 51, 63, 66-67,
74, 76, 79, 122, 125, 143, 160-161, 164, 186, 308, 369-370, 375, 377-
378, 383, 387, 494, 500, 510, 544, 578; 3:8, 65, 97, 120, 123, 125-126,
233-234, 259, 265, 289, 310, 324, 412, 447; 4:13, 63, 84, 87, 93, 445,
495, 546, 598, 606, 617, 619, 633, 645; 5:41, 43, 47, 49, 67-69, 75, 81,
84, 92-93, 96-97, 127, 132, 135, 244, 262, 269, 282, 294, 304, 312, 356-
357, 467-468, 502, 510, 524, 554, 557; 6:68, 72, 80, 92, 137, 150, 187,
220, 236-238, 255, 257, 273, 362, 376; 7:5, 17-18, 117, 164, 225; Vita
1:347
71 Mig. 1:100, 209
72Ignácio aos Romanos, 5:1 (Todas as citações são traduzidas de Michael
William Holmes, The Apostolic Fathers : Greek Texts and English
Translations (Updated ed.; Grand Rapids, Mich.: Baker Books, 1999).
73 1 Cl. 37:3; 41:1; Hermas 68:8; 70:2, 6; 71:1ff

81
sempre utilizado no sentido de classificação, grupo ou
ordem, arranjo, status74.

Vê-se que em nenhum dos exemplos citados há


qualquer ideia de tempo, como pretendem os críticos
que negam a ressurreição de Moisés. A alegação deles
de que Cristo é as “ primícias dos que dormem ” no
sentido temporal e cronológico, não faz sentido. O
campo semântico de tagma cobre apenas aspectos de
arranjo ou ordem. De fato, Deling afirma que “τάγμα
usualmente significa o resultado de τ ά σ σ ε ι ν , o que é
ordenado, fixado...” 75. Daí o seu uso preferencial para
descrever destacamentos militares, ou escalões com
suas classificações por patentes.

Nos LXX, tagma aparece apenas 15 vezes,


principalmente no livro de Números 76, e traduz dois
termos hebraicos: degel e regal. O último significa “pé”
e designa em 1 Samuel 4:10 e 15:4, os destacamentos
israelitas que se deslocavam “a pé”. Em 1 texto, 2
Samuel 23:13, tagma traduz chaia, com o sentido de
agrupamento, em referência aos Filisteus. O restante
dos usos, em Números, traduz sempre o hebraico degel,
cujo sentido é estandarte, bandeira ou acampamento,

74 Liddell-Scott, 1752.
75 G. Delling, “τάσσω” in Theological Dictionary of the New Testament
(Vols. 5-9 edited by Gerhard Friedrich. Vol. 10 compiled by Ronald Pitkin.;
ed. Gerhard Kittel et al.;, electronic ed.; Grand Rapids, MI: Eerdmans,
1964-c1976), 8:31.
76 Num. 2:2-3, 10, 18, 25, 31, 34; 10:14, 18, 22, 25; 1 Sam. 4:10; 15:4; 2
Sam. 23:13

82
em uma referência às várias tribos de Israel, dispostas
no acampamento.

Novamente, não há qualquer vinculação temporal.

Conclusão

Ao analisarmos os dois principais termos utilizados


por Paulo, na referência de 1 Coríntios 15:20-23,
podemos perceber que sua ênfase não é temporal. A
escolha de termos ligados ao povo de Israel no deserto,
tanto no aspecto cúltico quanto na disposição física e
geográfica, parece indicar que Paulo tem em mente,
acima de tudo, apresentar uma correlação entre o
movimento de Israel e sua disposição ao redor do
Tabernáculo com Cr-sto, que É o Tabernáculo de D-us
com os homens.

Cr-sto é Aquele que torna possível e real a


Presença e Habitação de D-us com o homem. É Ele
quem aproxima o Céu da Terra e torna real a promessa
da Ressurreição. Por isto, Ele é o Aparche, “Primícias”.
Ele é o sacrifício de boa vontade de D-us,
proporcionando Paz entre o mundo e Ele.

Ao mesmo tempo, Ele é a Garantia de que os que


morrem crendo, não ficarão mortos, mas serão
ressuscitados, assim como os primeiros frutos, que
eram mais do que apenas marcadores temporais: eram
garantidores de uma colheita abundante e suficiente.

83
Reduzir a Ressurreição de Cr-sto, ou a referência
Paulina a tempo, é perder de vista seu significado para
a fé cristã e para o destino do universo.

Cr-sto, por ser Ele mesmo todos os sacrifícios


necessários e suficientes para proporcionar e garantir
a Salvação dos seres humanos, por ser Emanuel, o
Templo Vivo, D-us em forma humana, unindo em Si a
Família do Céu e a família da Terra, é o único que
pode pertencer a uma classificação única, a uma
posição única: Ele está entre o Céu e a Terra. Sua Vida,
Sua Morte e Sua Ressurreição são a única ligação
entre o grupo de seres humanos, em sua posição
desonrada diante do universo e a posição mais elevada
que estes mesmos seres humanos podem alcançar. Por
isto o TAGMA DE J-SUS É ÚNICO, É APARCHE.

84
APÊNDICE B

RESPOSTAS AO PR. ELIAS SOARES DE MORAES

Por Marcos Antonio Sousa Alves

malvez@bol.com.br

facebook.com/marcos.alvez.334

Os artigos a seguir foram preparados pelo

apologista Marcos Antonio Sousa Alves, e se

constituem numa contribuição significativa para a

discussão.

Neles você terá respostas apologéticas a uma

série de argumentos do Pr. Elias Soares de Moraes que,

ineficazmente, tem tentado negar a realidade da

ressurreição de Moisés.

Veja que rico conteúdo lhe aguarda nas próximas

páginas:

● “ O Aparecimento de Moisés e Elias: Visão ou Fato

Literal?”

85
● “ É possível ter ocorrido a ressurreição em glória

antes da ressurreição de Jesus?”

● “As ‘Primícias’ em Tg 1:18, Rm 16:5 e 1Co 16:15”

Desfrute dessa rica argumentação a seguir, e

decida-se pela verdade bíblica.

86
ARTIGO 1

O Aparecimento de Moisés e Elias: Visão ou Fato


Literal?

Aqueles que creem na imortalidade da alma,


geralmente ensinam que foi o “espírito” de Moisés que
apareceu a Jesus no Monte da Transfiguração (Mt
17:1-9).

Porém, outros são mais engenhosos. Para eles,


Moisés e Elias não apareceram realmente a Jesus: o
evento se constituiu numa “ visão simbólica ” .
Essencialmente, eles argumentam que a palavra
“ visão ” , encontrada no texto grego de Mateus 17:9,
significa algo “ sobrenatural ” , sem que
necessariamente envolva um evento real. Leiamos:

E, descendo eles do monte, Jesus lhes ordenou,


dizendo: A ninguém conteis a visão até que o Filho
do Homem seja ressuscitado dos mortos (Mt 17:9,
grifos acrescidos).

Essa tese resiste à analise contextual? Será que os


discípulos tiveram uma visão “ simbólica ” , semelhante
às visões dos profetas Isaías, Ezequiel e Daniel, por
exemplo?

87
Para entendermos essa questão, leiamos na íntegra
o relato de Mateus 17:1-9. Grifarei várias palavras
para facilitar nossa análise do texto bíblico como se
apresenta a nós:

1 Seis dias depois tomou Jesus consigo a Pedro e aos


irmãos, Tiago e João, e levou-os a sós a um alto monte.
2 Foi transfigurado diante deles; o seu rosto
resplandeceu como o sol, e as suas vestes tornaram-se
brancas como a luz.
3 Eis que lhes apareceram Moisés e Elias falando com
ele.
4 Pedro disse a Jesus: Senhor, bom é estarmos aqui;
se queres, farei aqui três tabernáculos: um para ti,
outro para Moisés e outro para Elias.
5 Falava ele ainda, quando uma nuvem luminosa os
envolveu; e da nuvem saiu uma voz, dizendo: Este é o
meu Filho dileto, em quem me agrado; ouvi-o.
6 Os discípulos, ouvindo-a, caíram de bruços e ficaram
com muito medo.
7 Aproximando-se Jesus, tocou-os e disse: Levantai-vos, e
não temais.
8 Eles, erguendo os olhos, a ninguém viram mais senão só
a Jesus.
9 Enquanto desciam do monte, ordenou-lhes Jesus: A
ninguém conteis esta visão, até que o Filho do homem
ressuscite dentre os mortos.

88
O verso 2 informa-nos que Jesus foi transfigurado.
Este termo vem do grego metaforphoo, indicando que
aparência de Cristo foi mudada e resplandecia com
brilho divino.
Analisemos agora a palavra “apareceram” (verso 3).
Jamais as Escrituras usam esse termo para indicar que
uma “visão/êxtase” está em andamento, sem que exista
algo de real acontecendo. Veja alguns versos onde o
termo “aparecer” não aparece do mesmo modo que em
Mateus 17:3:

● Números 12:6 - “ E disse: Ouvi agora as minhas


palavras; se entre vós houver profeta, eu, o
SENHOR, em visão a ele me farei conhecer ou
em sonhos falarei com ele.”

● Números 24:4 - “Fala aquele que ouviu os ditos de


Deus, o que vê a visão do Todo-poderoso, caindo
em êxtase e de olhos abertos

● Jó 33:15 - “Em sonho ou em visão de noite, quando


cai sono profundo sobre os homens, e adormecem
na cama,Todo-poderoso, caindo em êxtase e de
olhos abertos”

● Ezequiel 11:24 - “Depois, o Espírito me levantou e


me levou em visão à Caldéia, para os do cativeiro; e
se foi de mim a visão que eu tinha visto”.

89
● Daniel 2:19 - “ Então, foi revelado o segredo a
Daniel numa visão de noite; e Daniel louvou o Deus
do céu”.

● Obadias 1:1 - “ Visão de Obadias: Assim diz o


Senhor JEOVÁ a respeito de Edom: Temos ouvido a
pregação do SENHOR, e foi enviado às nações um
embaixador, dizendo: Levantai-vos, e levantemo-nos
contra ela para a guerra”.

● Atos 10:3 - “ Este, quase à hora nona do dia, viu


claramente numa visão um anjo de Deus, que se
dirigia para ele e dizia: Cornélio!”

● Atos 10:17 - “ E, estando Pedro duvidando entre si


acerca do que seria aquela visão que tinha visto, eis
que os varões que foram enviados por Cornélio
pararam à porta, perguntando pela casa de Simão”.

● Atos 10:19 - “ E, pensando Pedro naquela visão,


disse-lhe o Espírito: Eis que três varões te buscam”.

● Atos 11:5 - “ Estando eu orando na cidade de Jope,


tive, num arrebatamento dos sentidos, uma
visão; via um vaso, como um grande lençol que
descia do céu e vinha até junto de mim”.

Atente para Atos 11:5 onde se encontra a frase “um


arrebatamento dos sentidos, uma visão ” . O termo

90
“ visão ” usado nesse contexto é muito diferente
daquele em que se encontra a palavra “ visão ” no
evento da transfiguração. Portanto, a leitura atenta de
todos esses versos revela que cogitar que os discípulos
tiveram uma “ visão ” ou “ êxtase ” no monte da
transfiguração é torcer por demais a Palavra de Deus.
Não há a mínima hipótese deles terem “ caído em
êxtase com os olhos abertos”.
Em nenhuma dessas passagens citadas acima é
mencionado o termo “ apareceram ” como ocorre no
evento da transfiguração. É óbvio que o relato de
Mateus 17 se trata de uma visão literal. Além do mais,
a palavra “aparecer” em grego é optanomai e significa
“ olhar para ver ” , “ ver ” , “ permitir-se ser visto ” ,
“ aparecer ” , “ contemplar com os olhos arregalados ” ,
etc.
Já que Mateus 17:3 é muito claro em nos mostrar
que não se trata de uma “visão simbólica” , será que o
verso 4 poderia dar algum apoio à tese de Pr. Elias
Soares de Moraes? Vejamos: “ Pedro disse a Jesus:
Senhor, bom é estarmos aqui; se queres, farei aqui
três tabernáculos: um para ti, outro para Moisés e
outro para Elias” (Mt 17:4).
Mesmo Pedro perguntando a Jesus se poderia fazer
três tendas para abrigar também aos hóspedes
celestes, os que negam a literalidade da visão
argumentam que Pedro falou assim por que “ ele não
sabia o que falava”. A base para tal raciocínio é Lucas

91
9:33: “ Ao apartarem-se estes de Jesus, disse-lhe Pedro:
Mestre, bom é estarmos aqui, e façamos três
tabernáculos: um para ti, outro para Moisés e outro
para Elias; não sabendo o que dizia.”
Pedro podia não saber o que falava, mas sabia
muito bem o que estava vendo. Era algo real para
ele e não um êxtase visionário. Ele não sabia o que
dizia não por que o evento era simbólico, mas por que
estava ATERRORIZADO por ter visto algo magnífico
e real, assim como estavam os demais discípulos: “ Não
sabia o que havia de dizer, pois estavam
aterrorizados” (Mc 9:6)
O apóstolo simplesmente disse o que veio à sua
mente diante de uma cena tão gloriosa e real, que
impactou profundamente sua experiência religiosa.
Uma coisa é não saber o que se fala por ignorância;
outra é por se achar acometido de medo ou terror,
excessivamente amedrontado, como é o caso em que
estamos analisando. É justificável Pedro não saber o
que dizer, pois ele estava aterrorizado.
O que dizer de Mateus 17:8? Quem sabe esse
texto ajude aos adeptos de tal teoria na argumentação
deles. Leiamos: “ Eles, erguendo os olhos, a ninguém
viram mais senão só a Jesus”.
O verbo “ ver ” no grego (eido) deixa claro que eles
ergueram os olhos e viram somente Jesus. Se o
evento tivesse envolvido apenas uma “visão ou êxtase”,
teríamos de supor que “ olhos físicos se ergueram por

92
terem contemplado um evento apenas dentro da
mente”, o que seria um absurdo.
Sabemos que quando ocorre uma visão ou êxtase
profético, há um arrebatamento dos sentidos, não
simplesmente um “erguer de olhos físicos”. O texto de
Atos 11:5 compra isso. Destaco que o evento de Atos
envolve o apóstolo Pedro, e que este diferenciou muito
bem o tipo de visão que ele teve nos dois momentos!
Por que ignorar a interpretação que Pedro deu ao
evento, e criar teorias fantasiosas que não contribuem
em nada para o correto entendimento bíblico, mas
apenas para atender a caprichos pessoais?

MATEUS 17:9 - O VERSO PREFERIDO

Esse texto é o “ fundamento ” e o verso que os


adeptos de tal teoria fantasiosa mais gostam. Leiamos
e façamos uma breve análise: “ Enquanto desciam do
monte, ordenou-lhes Jesus: A ninguém conteis esta
visão, até que o Filho do homem ressuscite dentre os
mortos” (Mt 17:9).
Será que “ visão ” nesse verso se refere ao tipo de
visão que Pedro teve em Atos 10, por exemplo?
Segundo o Dicionário de Strong, a palavra grega
para visão - horama - se refere ao “ ato de olhar ” .
Significa, entre outras coisas, “ contemplar um
espetáculo”, especialmente sobrenatural.

93
Perceba que para o referido dicionário, “ visão ”
está relacionada ao órgão da vista, pelo qual se
percebe cores, formas e tamanhos dos objetos. Strong
também nos informa que horama vem de horao que
significa, entre outras coisas, “ perceber com os olhos”,
“ olhar para ” , sem enfatizar o mero ato de ver, mas a
real percepção de algum objeto.
Para você compreender ainda melhor, analise a
visão que teve Moisés na sarça ardente. Quando
Moisés viu a sarça queimar, ela realmente estava ali
ou era uma “ visão ” ou “ êxtase ” ? Ninguém duvida de
que era uma sarça real, mas a Bíblia diz que era uma
visão: “ E Moisés disse: Agora me virarei para lá e
verei esta grande visão, porque a sarça se não
queima.” (Êx 3:3)
É óbvio que visão aqui se refere a uma visão com
os olhos físicos. Mesmo sendo sobrenatural, não estava
apenas “ dentro da mente de Moisés” , mas ocorreu de
fato - assim como o foi a visão que Pedro, Tiago e João
tiveram na transfiguração!
A teoria de que Pedro vivenciou apenas uma visão
simbólica de Moisés é tão absurda que teremos de
admitir que nem o Mestre estava realmente ali, mas
apenas “ em visão ” . Afinal, o texto apresenta Moisés e
Elias conversando com Jesus e retrata os três envoltos
numa nuvem luminosa: “ Eis que lhes apareceram
Moisés e Elias falando com ele, uma nuvem
luminosa os envolveu” (Mt 17:3, 5)

94
Tal teoria fantasiosa do Pr. Elias Soares de Moraes
(entre outros) pode nos levar até mesmo a pensarmos
que Jesus conversava com uma visão, ou seja, com
“o nada”; que Ele, um ser real, estava dentro da visão
ou, pior: Jesus também estava tendo uma visão.
Se formos levar essa teoria a sério, então temos
uma situação sui generis: 3 pessoas tendo a mesma
visão, o que seria incrível, ainda mais considerando
que quando Marcos e Lucas relatam a transfiguração,
eles não apresentam o evento com os mesmos
detalhes. Portanto, é sensato deduzirmos que eles
presenciaram um evento literal e o descreveram de
acordo com a percepção de cada um.
A seguir, farei uma análise dos outros textos que
registram o evento da transfiguração e o aparecimento
de Moisés e Elias.

Marcos 9:3-9

3 As suas vestes tornaram-se resplandecentes e em


extremo brancas, como nenhum lavandeiro sobre a terra
as pode alvejar.
4 Apareceu-lhes Elias com Moisés, e estes falavam com
Jesus.
5 Pedro disse a Jesus: Mestre, bom é estarmos aqui;
façamos três tabernáculos: um para ti, outro para
Moisés e outro para Elias.

95
6 Não sabia o que havia de dizer, pois estavam
aterrorizados.
7 Veio uma nuvem que os envolveu, e dela saiu uma voz,
dizendo: Este é o meu Filho dileto; ouvi-o.
8 Eles, olhando de repente em redor, não viram mais a
ninguém consigo senão só a Jesus.
9 Enquanto desciam do monte, ordenou-lhes que não
contassem a ninguém o que tinham visto, senão
quando o Filho do homem houvesse ressurgido dentre os
mortos.

Lucas 9:29-36

29 Enquanto orava, o aspecto do seu rosto alterou-se, e as


suas vestes tornaram-se brancas e resplandecentes.
30 Eis que dois varões falavam com ele; estes eram Moisés
e Elias,
31 que apareceram em glória e falavam da sua retirada
que ele estava para realizar em Jerusalém.
32 Pedro e seus companheiros estavam oprimidos de sono;
mas conservando-se acordados, viram a sua glória e os
dois varões ao lado dele.
33 Ao apartarem-se estes de Jesus, disse-lhe Pedro: Mestre,
bom é estarmos aqui, e façamos três tabernáculos: um
para ti, outro para Moisés e outro para Elias; não
sabendo o que dizia.
34 Enquanto assim falava, veio uma nuvem que os envolvia;
e encheram-se de temor ao entrar na nuvem.
35 Dela saiu uma voz, dizendo: Este é o meu Filho, o meu
escolhido, ouvi-o.

96
36 Tendo cessado a voz, viram só a Jesus. Eles
guardaram silêncio, e naqueles dias a ninguém
contaram coisa alguma do que haviam visto.

Após a leitura de tais relatos, pergunte-se: é lógico


“a visão aparecer”? Nenhum relato bíblico usa o termo
aparecer para uma visão/êxtase. Além disso, se Moisés
e Elias estão apenas “ na mente ” dos discípulos por
estarem recebendo uma visão, então Jesus também é
uma visão, pois é descrito que os dois profetas
estão falando com o Mestre!
Se Jesus está literalmente presente, e a visão
apenas se refere a Moisés e Elias, então temos um
problema maior ainda: um personagem literal, que é
Jesus, está conversando com uma visão, falando com
algo que realmente não está ali, mas que ocorre
apenas na mente dos discípulos, ou seja: além de estar
presente fisicamente, Jesus também está em visão na
mente dos discípulos. Tem sentido uma teoria dessas?
Há a alegação de que quando Pedro menciona esse
incidente, não diz nada sobre Moisés e Elias, indicando
com isso que o que ele teve foi uma visão. Se tal
argumento fosse válido, então nem visão existiu, pois
Pedro também não menciona que teve uma visão.

97
Leiamos 2 Pedro 1:16-18:

Pois não seguimos fábulas engenhosas, quando


vos fizemos conhecer o poder e a vinda de nosso
Senhor Jesus Cristo; mas nós fomos
testemunhas oculares da sua majestade,
porquanto ele recebeu de Deus Pai honra e glória,
quando pela Magnífica Glória lhe foi comunicada
esta voz: Este é o meu Filho dileto, em quem me
agrado. Nós ouvimos esta voz, do céu comunicada,
quando estávamos com ele no monte santo.

Se vamos questionar a Pedro por não mencionar a


Moisés e Elias, querendo com isso sustentar que os
dois profetas não estavam realmente presentes,
deveríamos fazer o mesmo com respeito aos relatos de
Mateus, Marcos e Lucas - e eles nem presentes
estavam naquele evento.
E mais: se formos nos basear no “ argumento do
silêncio ” , então podemos afirmar que tal
acontecimento jamais ocorreu, pois nem a epístola de
Tiago e no evangelho de João, bem como nas três
epístolas dele e no Apocalipse, a transfiguração é
mencionada (recordo que João e Tiago estavam
presentes no monte da transfiguração).
Eu poderia concluir com base nesse fraco
argumento dos críticos que jamais houve
transfiguração, só por que aqueles que a presenciaram
não a mencionam em seus respectivos escritos.

98
Se o fato de Moisés e Elias não serem mencionados
indica que o evento foi uma “ visão ” , ou seja, eles não
estavam realmente ali, então como explicar que Pedro
diz: “ ...nós fomos testemunhas oculares da sua
majestade” ? É óbvio que Pedro está dizendo que ele foi
testemunhar ocular de um evento real. Nada de
“visão” ou “êxtase coletivo”!
Outro detalhe que nos revela que não se trata de
uma visão apenas, mas de algo literal, é o que consta
no verso 8 de Marcos 9: “ E, tendo olhado em redor,
ninguém mais viram, senão só Jesus com eles”
Por qual razão eles olhariam em redor, se não fosse
o interesse em tentar localizar Moisés e Elias? O
movimento de olhar em redor só é possível de explicar
se estamos tratando com algo literal no texto.

O SIGNIFICADO GREGO DE “ OLHADO EM


REDOR”, EM MARCOS 9:8

Analisando no original grego as palavras “ olhado


em redor ” , não temos dúvidas de que o evento foi
realmente literal, ao invés de uma “visão simbólica”.
O termo grego é periblepo, e se encontra também
em outras passagens de Marcos, tais como em 3:5, 34;
5:32; 9:8 e 10:23. Em todas elas, periblepo se refere à
ação de olhar ao redor, em volta, para verificar
algo real, não olhar para “ver algo após um êxtase”.

99
Outro aspecto a ser analisado é: o que os discípulos
faziam quando Moisés e Elias apareceram? Responder
a essa pergunta é importante, pois nos ajudará na
interpretação correta e definitiva do evento da
transfiguração.
Diz o texto de Lucas 9:32, na Nova Versão
Internacional: “Pedro e os seus companheiros estavam
dominados pelo sono; acordando subitamente, viram a
glória de Jesus e os dois homens que estavam com ele”.
Ao dizer que eles estavam “ dominados pelo sono ” ,
o texto grego usa o termo bebaremonoi, que pode
significar “sobrecarregado” ou “morrendo de sono”. No
grego ele é um particípio perfeito passivo, que quer
dizer que eles realmente estavam com muito sono, mas
que os resultados desse sono ainda se faziam presentes.
Isso desmonta por completo a tese de que eles tiveram
só uma “visão” de Moisés, pois Deus jamais daria uma
visão/êxtase para eles em tais condições sonolentas,
pois quase não teriam capacidade para compreender.
Veja que Pedro, Tiago e João não estavam tendo
uma visão em estado adormecido como o profeta
Daniel (Dn 7 ), mas que eles realmente estavam apenas
dormindo. Quando eles despertaram totalmente é que
viram a glória de Jesus, Moisés e Elias.
As traduções a seguir também são claras em nos
mostrar que, de imediato, eles não viram os visitantes
celestes por estarem dormindo. Porém, ao acordarem,

100
puderam perceber que não apenas Jesus estava com
eles:

E Pedro e os que estavam com ele estavam


carregados de sono; e, quando despertaram,
viram a sua glória e aqueles dois homens que
estavam com ele. (Lucas 9:32 – Almeida,
Corrigida e Fiel).

E Pedro e os que estavam com ele estavam


carregados de sono; e, quando despertaram,
viram a sua glória e aqueles dois varões que
estavam com ele. (Lucas 9:32 Almeida, Revista e
Corrigida).

A conclusão que este verso nos apresenta é uma só:


quando Moisés e Elias apareceram, logo de início eles
estavam dormindo e, ao acordarem, eles viram
pessoas reais. Desse modo, é mais simples e correto
entendermos o texto de Lucas 9:32 como se apresenta
na Bíblia Judaica Completa :

101
Definitivamente: a tese de que o evento da

transfiguração não envolveu o aparecimento literal de

Moisés e Elias é absurda, e não pode ser aceita por

aqueles que realmente aceitam a autoridade das

Escrituras.

102
ARTIGO 2

É possível ter ocorrido a ressurreição de Moisés

antes da ressurreição de Jesus?

Aqueles que negam a ressurreição de Moisés


ensinam que antes de Jesus “ninguém jamais ressurgiu
dentre os mortos em glória” para “nunca mais morrer”.
Porém, é difícil saber de onde tiram essa ideia, pois
quando Paulo diz em 1 Coríntios 15:20 que Jesus é “as
primícias ” dentre os mortos, ele não faz questão de
distinguir entre mortos ressuscitados ou não para a
glorificação.

Basta apenas lermos o verso para constatarmos


que: (1) essa “ distinção ” não existe; (2) a distinção
criada pelo crítico Elias Soares de Moraes é
meramente um “ exercício exegético ” inútil, que ilude
ao invés de ensinar.

Leiamos o texto: “ Mas, de fato, Cristo ressuscitou


dentre os mortos, sendo ele as primícias dos que
dormem” (1Co 15:20).

Você notou alguma coisa que indique a distinção


entre os “mortos que voltariam a morrer” e “mortos
glorificados que não mais morreriam”? O texto diz
simplesmente “ dentre os mortos ” . Apenas isso. O
apóstolo é direto em dizer que Jesus é as primícias dos
103
que dormem, ou seja, ele se refere a todos os
mortos, pois Jesus é as primícias de todos os mortos.

Paulo nem sonha em dizer: “Cristo é as primícias


dos que dormem no sentido de que é o primeiro a
ressuscitar para não mais morrer”. Simplesmente o Pr.
Soares está fazendo uma “eisegese” (ao invés de
exegese), ou seja, colocando suas ideias particulares
no texto.

A mesma ideia básica e principal para o termo


“primícias” é apresentada por João, que considera a
Jesus o “primogênito dos mortos”. Ele é primogênito
“de alguns mortos” ou de todos os mortos? A resposta
é óbvia: “e da parte de Jesus Cristo, a Fiel Testemunha,
o Primogênito dos mortos e o Soberano dos reis da
terra. Àquele que nos ama, e, pelo seu sangue, nos
libertou dos nossos pecados” (Ap 1:5).

Já foi demonstrado que “primogênito” e “primícias”,


significam que Jesus tem a primazia. Nada mais que
isso. O verso a seguir comprova definitivamente essa
ideia: “Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o
princípio, o primogênito de entre os mortos, para em
todas as coisas ter a primazia” (Cl 1:18).
Nesta mesma direção temos João Batista, que
também nos revela algo sobre a PRIMAZIA de Jesus:

João testemunha a respeito dele e exclama: Este é


o de quem eu disse: o que vem depois de mim tem,

104
contudo, a primazia, porquanto já existia antes
de mim (Jo 1:15)

É este a favor de quem eu disse: após mim vem


um varão que tem a primazia, porque já existia
antes de mim (Jo 1:30).

Portanto são sobre essas bases que repousam a


primogenitura de Jesus e a Sua condição de ser as
primícias: Ele não é o primeiro a se levantar dentre os
mortos para não morrer novamente, mas “primícias”
por que Ele tem a primazia sobre os mortos e porque
todos eles só podem voltar à vida através do sacrifício
substitutivo de dEle!
Porém, Elias Soares insiste em dizer - sem qualquer
base para sua afirmação - que antes dEle “ninguém
ressuscitou em glória”. Obviamente essa é uma
afirmação temerária, que revela mais a rebeldia
humana do que conhecimento bíblico.
Adotando o princípio protestante de sola scriptura,
veremos que a argumentação do Pr. Soares é
destituída de base bíblica séria:

Entretanto, reinou a morte desde Adão até


Moisés, mesmo sobre aqueles que não pecaram à
semelhança da transgressão de Adão, o qual
prefigurava aquele que havia de vir (Rm 5:14).

105
É bem provável que esse texto se refira à
ressurreição de Moisés. Mesmo que alguém venha a
discordar dessa minha opinião (o que é viável, pois não
há um consenso quanto ao real significado de Romanos
5:14), a Bíblia declara que Moisés apareceu em
glória. E isso basta para o cristão que realmente
aceita a Bíblia como única regra de fé e prática:

Eis que dois varões falavam com ele: Moisés e


Elias, os quais apareceram em glória e
falavam da sua partida, que ele estava para
cumprir em Jerusalém (Lc 9:30-31).

Se a morte reinou até Moisés, por qual motivo a


morte deixou de reinar? Paulo esclarece: “Se, pela
ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte,
muito mais os que recebem a abundância da graça e
o dom da justiça reinarão em vida por meio de um só, a
saber, Jesus Cristo” (Rm 5:17). “A fim de que, como o
pecado reinou pela morte, assim também reinasse a
graça pela justiça para a vida eterna, mediante
Jesus Cristo, nosso Senhor” (Rm 5:21)
Pela abundância da graça e da justiça de Cristo,
temos como resultado a vida eterna. Sabemos que tal
promessa, em sua plenitude, está no futuro, porém,
essa graça é tão poderosa que pode ser disponibilizada
antes da glorificação final dos justos. Enoque (Gn

106
5:24), Moisés (Jd 1:9) e Elias (2Rs 2:1-12) são exemplos
disso!
A graça não veio a nós somente após a morte
de Jesus na cruz, pois de acordo com 2 Timóteo 1:9,
essa graça “nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos
tempos eternos”. Do mesmo modo, não é inviável
alguém ressuscitar em glória de forma particular antes
da ressurreição coletiva para a glória.

Avalie comigo:

√ Se a morte reinou até Moisés;


√ Se a graça nos foi concedida desde os tempos
eternos;
√ Se o pecado reinou para a morte e a graça
mediante Jesus passou a reinar para a vida eterna;
√ E se “a morte reinou até Moisés”;
√ Por qual motivo duvidaremos da ressurreição
de Moisés?

Simplesmente, não existe motivo.

Como bem disse Leandro Quadros no debate com


o Pr. Elias no programa “Vejam Só!”:

Moisés subiu ao Céu com uma espécie de cheque


pré-datado, que foi pago por Cristo na cruz. Se
Cristo tivesse desistido de morrer naquele

107
momento em que se angustiou no jardim do
Getsêmani, Enoque, Moisés e Elias teriam de
descer do Céu, pois ninguém pode estar lá sem o
pagamento da dívida pelo pecado realizado por
Jesus na cruz.

Veja que a glorificação de Moisés em nada afeta a


doutrina cristã de que só através de Jesus podemos ser
glorificados. Deus apenas decidiu dar a vida eterna
para seu filho Moisés antes da cruz, mesmo que a vida
eterna dele só pudesse ser concretizada no calvário.
Portanto, Cristo é primícias dos mortos, o
principal dentre eles, pois dEle depende a
glorificação de todos - seja antes ou durante a
glorificação coletiva, que ocorrerá por ocasião da 2a
Vinda dEle (1Co 15; 1Ts 4:13-18).
Desse modo, o argumento do Pr. Elias Soares de
Moraes se demonstra falso, ilógico e totalmente
infundado.
Diante do exposto, não há motivos legítimos para
não aceitar a ressurreição de Moisés, argumentando
que “na Bíblia não existe um verso que diga isso
explicitamente”.
Na verdade, devemos perguntar se existe na Bíblia
um único verso que diga que em algum momento a
“alma imortal” de Moisés foi “glorificada”, pois é nisso
que creem muitos imortalistas. Eles dizem que Moisés
estava como a “alma” ou “espírito desencarnado”, mas

108
isso nem por inferência pode ser demonstrado.
Imagine se teremos algum verso bíblico que mencione
tal fenômeno!
Os imortalistas não podem inferir essa ideia, pois a
glorificação ocorre só no corpo (veja 1Co 15).
Jamais um imortalista poderá comprovar que “a alma
de Moisés” foi glorificada por que essa heresia não
pode ser apoiada pelo pensamento hebraico. O
homem Moisés estava glorificado, e isso só poderia
ter ocorrido através da ressurreição do corpo. Não
existe exceção a essa regra (veja 1Co 15:51).
Em 2 Reis 2:11 lemos que Elias foi glorificado sem
ter conhecido a morte: “Indo eles andando e falando,
eis que um carro de fogo, com cavalos de fogo, os
separou um do outro; e Elias subiu ao céu num
redemoinho.”
Notemos: Elias só poderia ter passado pelos
portões da cidade celestial se estivesse
transformado, ou seja, glorificado. Isso ocorreu
bem antes de Paulo ter escrito o texto a seguir: “Eis
que vos digo um mistério: nem todos dormiremos,
mas transformados seremos todos” (1Co 15:51).
Se Elias (e também Enoque - ver Gn 5:24 e Hb 11:5)
pôde ser glorificado antes da glorificação geral e
coletiva dos justos, por que Moisés também não o
poderia? É muito mais lógico crermos que se Elias
apareceu glorificado, Moisés também apareceu de
maneira glorificada. Não há um porquê de

109
imaginarmos que “Elias era real e Moisés, só uma
visão” ou que “Elias apareceu em corpo e Moisés, era
uma alma penada”. Absurdo!
Fazer o que o Pr. Elias faz - dar um sentido
totalmente restritivo ao termo “primícias” - não honra
em nada a verdade bíblica. Tais homens piedosos -
Enoque, Moisés e Elias - receberam tal honra
antecipadamente, sem que isso diminuísse em nada
“Aquele que é antes de todas as coisas”, que tem a
primazia: Jesus, o Pai da Eternidade (Is 9:6).

110
RESUMO
Para concluirmos, vejamos o seguinte esboço que
elaborei com o Prof. Leandro Quadros:

- Varões = Homens

- Varões # de “Almas”

Lucas 9:30 diz que dois varões


falavam com Jesus

Portanto, os “homens”
Moisés e Elias falaram
com Cristo

Enoque, Moisés e Elias foram


transformados e glorificados
individualmente (Gn 5:24; Hb
Lucas 9:31 diz que os dois 11:5; 2Rs 2:1-12)
varões apareceram em
glória
Os demais justos serão
transformados e glorificados
coletivamente (1Co 15:51; Fp
3:21)

Sendo que todos dependem da


ressurreição de Cristo para serem
glorificados (Enoque, Moisés, Elias
e todos os demais justos), Deus
não está preocupado em se deter
numa questão tão irrelevante:
se Jesus é ou não o “primeiro” a
ser ressuscitado e glorificado para
“não morrer mais”.

111
Diante de tais fatos, não é de admirar que o
teólogo não adventista Arthur E. Bloomfield em seu
livro O Futuro Glorioso do Planeta Terra afirme
categoricamente:

No monte da transfiguração, apareceram dois


homens que conversavam com o Senhor Jesus
acerca do que Ele estava para realizar. Neste
caso, são dados os nomes. Eram Moisés e Elias.
Bem podem ser eles os dois candeeiros que estão
perante o Deus da terra; pois Moisés representa
aqueles que morreram e ressuscitarão,
enquanto que Elias representa aqueles que nunca
morrerão, mas serão arrebatados para o céu
quando ocorrer o arrebatamento77

VOCÊ SABIA?...

Que a Bíblia Apologética de Estudo, produzida


pelo Instituto Cristão de Pesquisas (ICP), mesmo “sem
querer”, reconheceu a glorificação de Moisés? No
comentário sobre Mateus 17:3, no item 5 da resposta
apologética, Jamierson Oliveira, editor-chefe, contradiz
abertamente seu amigo, o Pr. Elias Soares.

77 Arthur E. Bloomfield, O Futuro Glorioso do Planeta Terra, 6a ed. (Curitiba,


PR: Betânia, 1987), p. 164.

112
Escreveu Jamierson Oliveira: “o diálogo ocorreu
entre Jesus, Elias e Moisés, em corpos glorificados”78.

Esperamos que Oliveira continue assim:


comprometido com a verdade acerca da glorificação de
Moisés, e não com a tese infundada de seu amigo Elias
Soares de Moraes.

78 Bíblia Apologética de Estudos, 2a ed. (Jundiaí, SP: Instituto Cristão de


Pesquisas, 2005), p. 928.

113
ARTIGO 3

As ‘Primícias’ em Tg 1:18, Rm 16:5 e 1Co 16:15

A primeira vez que tive contato com o Pr. Elias

Soares de Moraes foi quando eu participava do

Programa A Verdade Para o Tempo do Fim, na rádio

Musical FM 105.7. Depois de alguns anos ele lançou

seu livro, Perguntas Difíceis de Responder, vol. 4, onde

se propõe a dar uma resposta à minha argumentação

sobre o significado do termo “primícias” nas Escrituras.

É interessante observar alguém se dedicar tanto a

uma causa, escrevendo um livro para tentar refutar

muitas colocações que fiz naqueles tempos áureos na

rádio Musical FM. Tenho o prazer de ter o citado livro

autografado e, após lê-lo, desejei de coração que um

dia o Pr. Elias Soares permita que Deus use seu

conhecimento para defender todas as verdades bíblicas,

ao invés de ir contra o ensino bíblico que apresentei

sobre a ressurreição de Moisés.

114
A seguir, disponibilizarei nesse artigo parte de

minha argumentação usada no referido programa de

rádio. Todavia, acrescentei outros argumentos para

desconstruir as novas ideias sugeridas por Elias Soares

em sua mais nova obra, mais especificamente nas

páginas 328-349.

A TESE DO PR. ELIAS SOARES

Segundo o Pr. Elias, é inadequado o uso que fiz de

Tiago 1:18 para explicar o real significado do termo

“primícias”:

Tiago (1:18) não está afirmando, nesta

passagem, que somos as primícias, mas, para

que fôssemos como as primícias ’ . Ser como as

primícias é bem diferente de ser as primícias.79

Será que o Pr. Soares “demonstrou” que estou

errado quando afirmo que também somos as primícias

no sentido de categoria, não em ordem cronológica?

79 Elias Soares de Moraes, Perguntas Difíceis de Responder, vol. 4, p. 347.

115
Leiamos o texto: “Pois, segundo o seu querer, ele nos

gerou pela palavra da verdade, para que fôssemos

como que primícias das suas criaturas” (Tg 1:18 )

Agora, veja como o texto é traduzido na versão

Almeida, Revista e Corrigida: “Segundo a sua vontade,

ele nos gerou pela palavra da verdade, para que

fôssemos como primícias das suas criaturas”.

Note que a palavra “como” é uma conjunção

conformativa, não uma figura comparativa, conforme a

frase a seguir: “ela adula o menino, como fazem todas

as mães”.

A Bíblia Judaica Completa nos fornece uma

interessante tradução, que captou bem o sentido que o

apóstolo Tiago tinha em mente ao escrever o texto:

“Tendo feito sua decisão, ele nos gerou mediante uma

Palavra confiável, para que pudéssemos ser uma

espécie de primeiros frutos de tudo o que ele criou”.

O tradutor da referida Bíblia, David H. Stern, faz o

seguinte comentário sobre esse verso: “Nós somos uma

116
espécie de primeiros frutos e tudo o que ele criou,

conforme inferido de Rm 8:19-23, 29 e 1Co 15:20,

23”.80

Observamos que o comentarista afirma que somos

uma espécie de primícias.

A Bíblia King James, traduz Tiago 1:18 dizendo

que “nós seremos uma espécie de primeiros frutos”. É

nítido neste texto que Tiago não está fazendo uma

mera comparação, como alega Elias Soares. O autor

inspirado vai além: ele está na verdade fazendo uma

afirmação, ou seja: ele e aqueles, a quem ele se

referiu em sua epístola, eram as primícias das

criaturas de Deus.

80 H. Stern, David, Comentário do Novo Testamento Judaico, 1a ed.


(Curitiba, PR: Atos, 2008), p. 790.

117
ROMANOS 16:5

Esse é mais um verso mal compreendido pelo Pr.

Elias Soares de Moraes. Leiamos: “saudai igualmente a

igreja que se reúne na casa deles. Saudai meu querido

Epêneto, primícias da Ásia para Cristo” (Rm 16:5).

Será que Epêneto foi “o primeiro a ser convertido

na Ásia”, como imagina o Pr. Soares? Gostaria de

deixar que outros respondessem por mim. Você verá

que para estudiosos sérios, “primícias” aqui significa

apenas que Epêneto tinha a proeminência.

O Léxico do Novo Testamento Grego/Português,

de F. Wilbur Gingrich e Frederick W. Danker,

reimpresso pela Vida Nova em 1991, na página 27,

assim explica Romanos 16:5:

Primícias, os primeiros frutos de qualquer

colheita, consagrados antes dos outros poderem

usar - Rm 11:16 (cf. Nm 15. 18-21). Fig. Rm

16:5, I Co 15:20; Ap. 14:4 (...)

118
Note que esses eruditos relacionam os versos

bíblicos que são o foco de nosso estudo, colocando

inclusive 1 Coríntios 15:20, que afirma que Jesus é as

“primícias dos mortos”, na categoria de um texto que

apresenta uma expressão figurada (Fig.).

Infelizmente, fazendo um verdadeiro desfavor para

os leitores, Elias Soares afirma:

Quando o Léxico Grego do Novo Testamento, da

Edições Vida Nova, afirma que a palavra

primícias é aplicada a Epêneto no sentido

figurado, o autor não está errado. Pois a palavra

primícias era um termo técnico para designar o

molho ou feixe que era apresentado a Deus na

festa das primícias e que agora, o apóstolo

Paulo toma de empréstimo, de maneira bastante

apropriada, para descrever Epêneto e outros

personagens do Novo Testamento, como tendo o

primeiro lugar no sentido cronológico,

mostrando dessa forma que, assim como após a

colheita do molho das primícias, a colheita da

safra aconteceria, na Ásia menor, Deus colheria

119
ainda outros frutos, como podemos notar no

livro de Atos e em outras partes do Novo

Testamento.81

A seguir destacarei algumas afirmações do

interlocutor:

1. O uso termo “primícias” para pessoas com um

sentido “figurado” é correto.

2. O interlocutor busca incutir a ideia de que

“primícias” sempre significa “primeiro em uma

sequência cronológica”

Porém, a nota da Bíblia de Estudo Palavras-Chave

Hebraico e Grego, editada pela Casa Publicadora das

Assembleias de Deus, contradiz a superficial explicação

do Pr. Elias Soares:

(Resith) o primeiro, em lugar, tempo, ordem ou

posição (especificamente uma primícia): -

princípio, primícias, melhor (coisa) principal, obra-

primeira, mais excelente, primeiro fruto, primeira

(melhor) parte, novo.

81 Moraes, Perguntas Difíceis de Responder, vol. 4, p. 330.

120
Substantivo que significa o princípio, o primeiro, o

principal, o melhor, as primícias. Esta palavra,

que aparece cinquenta e uma vezes no Antigo

Testamento, tem a honra de ser a primeira palavra

escrita em toda a Bíblia (Gn 1:1) Em outras

ocasiões, a palavra indica o mais elevado de

alguma coisa, i.e., o melhor ou mais excelente,

tal como as melhores partes das ofertas (1Sm 2:29);

o melhor dos despojos (1 Sm 15:21); ou o melhor

dos óleos (Amós 6:6) [...]82

Não preciso dizer mais nada. Afinal, a editora da

denominação religiosa a qual o Pr. Soares pertence não

concorda com ele.

1 CORÍNTIOS 16:15

Outro verso distorcido pelo autor de Perguntas

Difíceis de Responder, vol. 4, é 1 Coríntios 16:15: “E

agora, irmãos, eu vos peço o seguinte (sabeis que a

82Bíblia de Estudo Palavras-Chave Hebraico e Grego, 2a ed. (Rio de Janeiro:


CPAD, 2011), p. 7225-7226.

121
casa de Estéfanas são as primícias da Acaia e que se

consagraram ao serviço dos santos)...”

Quero lhe explicar o significado de “primícias”

nesse verso. Para isso, uma breve contextualização

histórica será necessária.

De Atenas a Corinto havia uma distância de

aproximadamente de 80 km (alguns calculam 100 km).

Paulo pôde ir de Atenas a Corinto pelo mar,

desembarcando em Cencreia, distante 11,2 km, ou por

terra, pelo caminho de Eleusis.83

Paulo chegou primeiro em Atenas e lá faz

conversos. A cidade de Atenas está na região da Acaia,

de modo que não precisa de muito raciocínio para

entender que os primeiros conversos da Acaia eram de

Atenas, não os futuros conversos de Corinto.

Isso é mais do que suficiente para demonstrar que

o uso do termo “primícias” aplicado à família de

83 Enéas Tognini, Geografia da Terra Santa e das Terras Bíblicas (São Paulo:
Agnos, 2009), p. 428 (segundo a versão em PDF).

122
Estéfanas tem o sentido de principal. Nada mais do

que isso.

Acaia era uma região que fazia parte da Grécia

Continental. Não era uma cidade, um bairro, mas uma

região assim como São Paulo, que tem várias cidades

que formam o Estado de São Paulo.

Acaia possuía duas cidades importantes que eram

Atenas e Corinto. Sendo assim, Estéfanas, para

merecer o título de “o primeiro cristão” em Acaia,

tinha que ser o primeiro cristão batizado em Acaia.

Porém, esta carta Paulo está enviando para Corínto e

Estéfanas e sua família eram de lá.

Mas Atenas também estava na região da Acaia e,

segundo o livro de Atos dos Apóstolos, os primeiros

conversos eram de Atenas. Depois é que Paulo foi

para Corinto:

Quando ouviram falar de ressurreição de mortos,

uns escarneceram, e outros disseram: A respeito

disso te ouviremos noutra ocasião. A essa altura,

Paulo se retirou do meio deles. Houve, porém,

123
alguns homens que se agregaram a ele e creram;

entre eles estava Dionísio, o areopagita, uma

mulher chamada Dâmaris e, com eles, outros

mais (At 17:32-34).

Portanto, os primeiros conversos da região de

Acaia foram os atenienses, dentre eles Dionísio,

Dâmaris e com eles, outros mais. Não foram Estéfanas

e sua família!

Entretanto, apesar da clareza de tais informações

bíblicas e histórias, assim se posiciona Elias Soares

sobre esse verso:

Em primeiro lugar Paulo não está afirmando que

Estéfanas, como indivíduo, é as primícias da Acaia,

ao contrário, ele afirma que a casa ou a família de

Estéfanas é as primícias da Acaia.84

Elias Soares contesta minha exposição tendo como

“base” as palavras“casa, família”. Ele alega que, como

não é citado que houve famílias se convertendo, isso

não habilitaria os crentes atenienses a serem

84 Moraes, Perguntas Difíceis de Responder, vol. 4, p. 331.

124
considerados como as primícias, ou seja, os primeiros

conversos da Acaia.

Porém, a Bíblia é bastante clara. Veja esses textos:

“Depois disto, deixando Paulo Atenas, partiu para

Corinto” (At 18:1). Leia agora 1 Coríntios 1:16 e veja

que foi após a partida de Paulo de Atenas é que

ocorreu a conversão de Estéfanas e de sua família em

Corinto: “Batizei também a casa de Estéfanas; além

destes, não me lembro se batizei algum outro”.

Sendo assim, fica evidente que o uso de

“primícias” para Estéfanas se refere à proeminência

desse líder. Nada mais do que isso.

Alguém pode duvidar que os primeiros cristãos da

região de Acaia tenham sido os atenienses, pois em

Atos 17:34 é dito que eles apenas “creram”, sem com

isso terem se convertido e batizados. Vamos recorrer à

Bíblia de Estudo Palavras-Chave, no seu “Dicionário do

Novo Testamento”, pág. 2355, no verbete nº 4100, que

explica o significado da palavra “crer” (do grego

pisteuo):

125
Usada em um sentido absoluto, crer, com o

significado de ser um cristão (Mc 15.32; Lc

22.67; Jo 1.7; 12.39; At 2.44; 4.4, 32; 14.1; 17.12,

34; 19.18; Rm 4.11; 1 Co 1.21; Gl 3.22; 1 Ts 1.7; 1

Pe 2.7) (Grifo acrescido)

Como podemos observar, em conformidade com a

informação da Bíblia de Estudo Palavras-Chave, “crer”

em Atos 17:34 equivale a se tornar um cristão. Diante

desse fato, fica demonstrado que na região da Acaia os

atenienses foram os primeiros cristãos no sentido de

ordem cronológica, não Estéfanas. Ele era as

“primícias” no sentido, de ser o principal líder na

igreja de Corinto.

Outro detalhe importante é que, de acordo com o

MAPA número 15 da Bíblia de Estudo Palavras-Chave,

fica claro que Paulo esteve primeiro em Atenas e

depois seguiu para Corinto - não o contrário.

Do mesmo modo, Jesus é chamado de “primícias”

dentre os mortos por ter Ele a primazia sobre todas as

coisas, conforme Paulo revela em Colossenses 1:18:

126
“Ele é a cabeça do corpo, da igreja. Ele é o princípio, o

primogênito de entre os mortos, para em todas as

coisas ter a primazia”;

Percebeu, leitor? A questão abordada por Paulo

em relação a Cristo como “primícias” não é se o

Salvador é o “primeiro” numa cronologia, mas no

sentido de prioridade, excelência, primado, de ter

Ele a primazia em todas as coisas.

Todo esse esforço inútil do Pr. Elias Soares de

Moraes visa apenas defender a heresia da imortalidade

natural da alma. Infelizmente, o Pr. Soares tem feito

com que muitas pessoas sinceras - porém, desatentas -

aceitem que Moisés não esteve de fato presente no

monte de transfiguração em corpo, como ensina o texto

bíblico.

E você, leitor? Ficará com a Bíblia ou com

doutrinas de homens?

127
Nos últimos anos participei de 2 debates sobre
"A disputa pelo corpo de Moisés" e sobre
"A Ressurreição de Moisés" no programa "Vejam Só!".
Veja alguns dos comentários:
Clique NAS IMAGENS
para acessar os melhores
debates apologéticos
com adventistas,
e seminários preparados pelo
Prof. Leandro Quadros

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