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Orientador: Prof. Msc. José Francisco Quaresma Soares da Silva.

Instituto Federal do Paraná

Banca Prof. Msc. Larissa Miranda Júlio


examinadora: Instituto Federal do Paraná

Prof. Msc. Márcia Cristina dos Reis


Instituto Federal do Paraná
AGRADECIMENTOS

Ao Prof. Msc. José Francisco Quaresma Soares da Silva, meu


orientador, que me guiou não somente na construção desta pesquisa, mas esteve
igualmente presente em todos os momentos do curso, sendo além de orientador, um
amigo de todas as horas.

À Prof. Msc. Larissa Miranda Júlio, que mesmo não sendo minha
orientadora, em muito colaborou, não só no desenvolvimento deste trabalho, mas
em todos os momentos do curso.

À Prof. Msc. Márcia Cristina dos Reis, que com muita paciência
auxiliou não somente a mim, mas toda a turma, no processo de construção de
nossas pesquisas.

A todos aqueles que abraçaram a ideia de criar a primeira turma do


curso Técnico em Arte Dramática do IFPR, inédito no rol de cursos dos Institutos
Federais Brasileiros. Ideia inicialmente tão utópica, e que se concretizou devido à
luta e esforço daqueles que a acolheram. Agradeço então, a todos que contribuíram
para a criação e amadurecimento deste curso.

E agradeço principalmente à minha família, que sempre me apoiou;


ao Newton Benetti Silva, meu grande companheiro, que sempre me incentiva e
ajuda em tudo, juntamente com sua família; ao Caosito, que sempre esteve ao meu
lado enquanto produzia este trabalho; e a todos meus amigos e companheiros de
curso.
TIBÚRCIO, Desiree Bueno. A gênese criativa da maquiagem e sua relação com
o figurino no processo cênico teatral. 2013. 40 f. Trabalho de Conclusão de Curso
(Técnico em Arte Dramática) – Instituto Federal do Paraná, Campus Jacarezinho,
Jacarezinho, 2013.

RESUMO

Pensando nas indagações com relação a maquiagem no contexto da criação do


espetáculo teatral, o presente trabalho traz como objeto de estudo a gênese criativa
deste elemento. Para tanto, foi considerada a análise da concepção da maquiagem,
em seu laboratório de criação, considerando que este elemento, como se tem
atualmente, é fruto de todo um processo que caminhou junto com a humanidade,
remontando o período pré-histórico. Esta pesquisa se embasa na compreensão da
historicidade deste elemento e sua importância e função para o fenômeno cênico. Ao
mesmo tempo se observa a consonância entre a maquiagem e o figurino. Para
realizar esta pesquisa, foi adotada uma metodologia exploratória-descritiva, cuja
pesquisa bibliográfica se deu com a utilização de fontes secundárias de obras
nacionais e internacionais; bem como o uso de fotografias como dados primários.
Com base nisso, é analisado este elemento que tanto contribui para fenômeno
teatral.

Palavras-chave: Maquiagem. Figurino. Caracterização. Diálogo


LISTA DE FIGURAS

Figura 1 – Estudo da maquiagem cênica...................................................................26


Figura 2 – Apresentação dos cosméticos...................................................................27
Figura 5 – Estudo da uniformização da pele..............................................................29
Figura 6 – Estudo da uniformização da pele..............................................................29
Figura 7 – Estudo da concepção da maquiagem.......................................................30
Figura 8 – Estudo da concepção da maquiagem.......................................................31
Figura 9 – Estudo da concepção da maquiagem.......................................................32
Figura 10 – Maquiagem finalizada..............................................................................32
Figura 11 – Sally, The nightmare before christmas.....................................................33
Figura 12 – Reprodução da personagem Sally..........................................................34
Figura 13 – Reprodução da personagem Sally..........................................................35
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

IFPR Instituto Federal do Paraná


SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO.....................................................................................................10
1.1 JUSTIFICATIVA...............................................................................................10
1.2 OBJETIVOS.....................................................................................................12
1.2.1 Objetivo Geral...............................................................................................12
1.2.2 Objetivos Específicos...................................................................................12

2 METODOLOGIA..................................................................................................13

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA...........................................................................14
3.1 MAQUIAGEM: DAS ORIGENS À ERA MEDIEVAL........................................14
3.2 DO RENASCER MODERNO À COMTEMPORANEIDADE............................17
3.3 FUNÇÕES DA MAQUIAGEM – A MAQUIAGEM CÊNICA..............................22
3.4 O FIGURINO CÊNICO E SUA RELAÇÃO COM A MAQUIAGEM...................24

4 A CONCEPÇÃO DA MAQUIAGEM E SEU DIÁLOGO COM O FIGURINO NO


PROCESSO CÊNICO TEATRAL PERFUME DE VINHAÇA.....................................26

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................37

REFERÊNCIAS...........................................................................................................39
10

1 INTRODUÇÃO

O processo de construção teatral é permeado por uma série de


elementos artísticos que atuam direta ou indiretamente na peça, para que se dê a
consonância do espetáculo. Cada um desses elementos pode existir isoladamente,
mas para que haja a síntese teatral, é necessário que ocorra uma consonância entre
as propostas estéticas entre cada um deles.
Nesse contexto, a maquiagem integra a Soma de Elementos
proposta por Magaldi (1965, p. 7); e por si só seria apenas maquiagem, atuando e
contribuindo em outras áreas e situações, presente no cotidiano profissional e
pessoal. No entanto, para o teatro, a maquiagem é muito mais do que um retoque
estético: é um elemento que, além de contribuir para a caracterização do
personagem, é também a máscara do ator, presente em todo espetáculo, mesmo
que seja apenas como retoque.
Assim, em observação ao que recomenda Magaldi (1965, p.7), no
sentido de o espetáculo ser uma síntese de todos os elementos artísticos postos em
cena, há a necessidade de a maquiagem se correlacionar com os elementos que
compõem a encenação. É importante ressaltar que é tênue a linha que separa a
maquiagem da indumentária, portanto, a relação entre ambos deve ser priorizada no
momento de suas concepções.
Nesse sentido o presente trabalho apresenta sua justificativa,
objetivos e metodologia na primeira etapa da pesquisa, para trazer em sequência a
fundamentação teórica, na qual esta se foca na historicidade do tema, bem como as
funções da maquiagem e sua relação com o figurino.
Para exemplificação do estudo deste elemento, a última etapa é
trabalhada com o uso de fotografias das aulas do componente curricular
Caracterização: figurino e maquiagem, ofertadas no curso Técnico em Arte
Dramática, do Instituto Federal do Paraná (IFPR). As fotos são de autoria do
estudante Régis Inácio.

1.1 JUSTIFICATIVA

Tendo em vista que atualmente a maquiagem é um elemento


amplamente utilizado para fins puramente estéticos, cujos valores estão
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intrinsecamente ligados ao estigma social do consumismo de massa, “os conselhos,


as informações e as imagens da beleza fazem parte de uma lógica de produção-
consumo-comunicação de massa” (LIPOVETSKY, 2000, p.154-155). Por isso,
busca-se aqui analisar a maquiagem por outra perspectiva.
Em consideração ao acima exposto, o presente trabalho traz uma
abordagem cujo olhar se voltará para os fins artísticos da maquiagem, pois a partir
do momento em que a perspectiva do olhar de seu uso se volta para uma faceta
cultural, dá-se a quebra desse estigma, trazendo consigo uma relevância social e
cultural.
Além disso, deve-se considerar, também, o índice de pesquisa na
área, na qual, apesar da possibilidade de encontrar estudos no exterior, a produção
teórica no Brasil se dá em línguas estrangeiras, tendo-se então a necessidade de
contribuir nacionalmente para o crescimento dos estudos acerca da maquiagem, em
língua portuguesa, conforme exalta Costa (2011, p. 117):

Mesmo com tanta importância na contextualização do processo histórico do


homem a pesquisa de maquiagem no Brasil ainda não alcançou lugar de
destaque. O material de pesquisa que é produzido nesta área aqui no Brasil
é, muitas vezes, feito em línguas estrangeiras, pois o mercado exterior se
interessa pelo produto. Por esse motivo é difícil encontrar pesquisas sobre
maquiagem em português.

Por conseguinte, a maquiagem é um dos elementos que colaboram


para a efetividade do acontecimento teatral, e, portanto deve estar em consonância
com tudo aquilo que constitui um espetáculo, o que contribui para que se realize
uma pesquisa acerca de sua criação, uma vez que “a maquiagem é um elemento
que deve estar devidamente harmonizado com os demais estabelecendo uma
unidade visual. O recurso faz com que toda a concepção do espetáculo gire em
torno de um mesmo” (ANDRADE, 2010, p. 117)
Nesse contexto, é importante ressaltar que “a caracterização teatral,
portanto, abarca a construção visual do rosto, os recursos corporais e vocais
utilizados para construir as personagens, bem como os figurinos.” (MAGALHÃES,
2010, p. 173). E no âmbito da construção do personagem, tem-se no figurino como
um dos elementos que se relaciona com a maquiagem, uma vez que ambos
compõem os pilares da caracterização do personagem. Dessa forma, o diálogo entre
maquiagem e figurino é fundamental para que, juntamente com as demais
linguagens primar pela síntese do espetáculo.
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1.2 OBJETIVOS

1.2.1 Objetivo Geral

Visando a caracterização dos personagens, pretende-se, com o


presente trabalho analisar a gênese criativa da maquiagem, considerando a
historicidade deste elemento e sua importância para o fenômeno cênico; ao mesmo
tempo em que verificar-se-á como será efetuado a junção entre a maquiagem e o
figurino.

1.2.2 Objetivos Específicos

a) identificar por meio da historicidade a importância da maquiagem


para o fenômeno cênico;
b) discorrer sobre o figurino e sua significância no teatro;
c) analisar o processo de criação da maquiagem na criação cênica.
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2 METODOLOGIA

A metodologia deste trabalho tem seus alicerces no método


exploratório-descritivo, no qual, segundo Quadros (2011, p. 41) a pesquisa
exploratória “tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema,
com vistas a torná-lo mais explícito. Assim, pode envolver levantamento
bibliográfico, bem como entrevistas com pessoas experientes no problema
pesquisado”.
Por outro lado, recorrendo-se ao mesmo pesquisador, “as pesquisas
descritivas, salientam-se àquelas que têm por objetivo estudar as características de
um grupo” (QUADROS, 2011, p. 41). Nesse contexto, “algumas pesquisas
descritivas são, juntamente com as exploratórias, as que habitualmente realizam os
pesquisadores sociais preocupados com a atuação prática.” (QUADROS, 2011, p.
42).
O aporte teórico deste trabalho dá-se por meio da pesquisa
bibliográfica, utilizando fontes secundárias de obras nacionais e internacionais,
visando o aprofundamento do tema trabalhado para uma melhor compreensão do
processo criativo do fenômeno teatral. Dessa forma, Cruz e Ribeiro (2004, p. 17)
consideram como pesquisa bibliográfica aquela que “levanta dados dos trabalhos já
feitos sobre o mesmo tema estudado no momento e leva ao aprendizado sobre uma
determinada área”. Além disso, foram utilizadas fotografias como fonte de coleta de
dados primários, visando a exemplificação da presente pesquisa.
14

3 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.1 MAQUIAGEM: DAS ORIGENS À ERA MEDIEVAL

Ao se considerar a origem etimológica do vocábulo “maquiagem” ele


remonta inicialmente a “trabalhar”, datado no ano de 1450. Foi no século XVIII que
se encontrou a primeira relação com um significado teatral, que trazia “pintar o rosto”
como valor denotativo, bem como sua relação estrita com a máscara:

A etimologia do vocábulo não é fácil. A forma recente deste transitivo direto


remonta a 1450, ao francês “maquiller”, de significado “trabalhar”. Passou
pelo teatro do séc. XVIII, já com o sentido de “pintar o rosto”, proveniente do
picardo antigo “maquier” (fazer), e, este, do holandês “maken id”, a resultar
nos comparativos inglês e português. O vocábulo “máscara”, proveniente do
italiano “maschera” (1348-1353) a abrigar a acepção de “pessoa
disfarçada”, tem como base “masca”, do baixo-latim, com diversos
significados ao longo dos séculos. O italiano “maschera” ainda é tido como
derivado do árabe “mashara” (“bufão, ridículo”), que sofreu outras
influências na Europa, mas que redundaram em muitos cognatos de língua
portuguesa, como por exemplo: máscara, mascaração, mascaramento e
maquilhado/maquiado/maquilado. (PEREIRA, 2006 apud MAGALHÃES
2010, p. 2).

No entanto, a história do uso da maquiagem é ainda mais antiga que


sua origem etimológica, abarcando épocas tão longínquas quanto a própria história
do teatro, que encontra suas primeiras manifestações ainda na pré-história: “Para o
selvagem, de qualquer tribo, de qualquer região e de qualquer época, representa um
signo que lhe confere posição social, como também pode ter uma função religiosa
em seus ritos e cerimônias” (ANDRADE, 2010, p. 176)
As origens da maquiagem trazem-na como um elemento que era
utilizado diversificadamente, conforme Andrade, (2010, p. 176), “o homem das
cavernas já se valia dela em seus rituais religiosos para personificar divindades, ou
entidades que tinham sempre como objetivo estabelecer um elo de comunicação
entre os planos terrestre e sagrado”.
Além do sentido ritualístico, a maquiagem também colaborava para
a proteção corporal, como faziam os egípcios, que utilizavam sua célebre sombra
para proteger os olhos da luz excessiva do sol:

Não podemos nos esquecer de que em várias circunstâncias o recurso da


maquiagem serviu para que o homem encontrasse algum tipo de proteção
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contra fenômenos naturais. Exemplo disso é a sombra negra, ou verde,


aplicada sobre as pálpebras dos egípcios, que ajudava a rebater os raios
solares, atuando assim como uma espécie de óculos escuros. (ANDRADE,
2010, p. 176)

Ainda na África, a maquiagem estava ligada aos rituais religiosos;


segundo Peixoto (1986, p. 14) “o jogo teatral, a noção de representação, nasce
essencialmente vinculada ao ritual mágico e religioso primitivo” assim, com o teatro
vestindo suas primeiras roupagens, sob esse aspecto:

Em muitas sociedades africanas, os povos usam sua própria pele como um


meio de expressão e criatividade. A face e o corpo são a tela em que esses
pintores africanos exibem sua arte. A decoração da pele transforma o corpo
numa escultura e o eleva ao status de obra artística. (LEITE, 2004, p. 76)

No teatro asiático ocorre a alternância entre o uso de máscaras e da


maquiagem, “no Vietnã, como na China, o uso de máscaras parece ter sido
substituído pelos rostos pintados nos diferentes tipos de teatro musical” (LEITE,
2004, p. 131). Considerando igualmente a maquiagem teatral como recurso
significativo para a “máscara” do ator,

a maquiagem pode ser observada como uma máscara que se move sobre o
rosto do ator, de acordo com suas expressões, oferecendo maiores
garantias para que o intérprete atinja a plenitude da construção de sua
personagem. Em qualquer situação, quando se faz utilizar conscientemente,
a maquiagem pode realçar alguns aspectos ou exagerá-los de forma
intensificada e histriônica. Para o profissional do palco, costuma-se dizer
que o ato de maquiar-se é o último passo em direção à totalidade da
construção de outro ser. (ANDRADE, 2010, p. 176)

Dessa forma, partir do momento que a máscara em si, passa a ser


substituída pelo uso da maquiagem, tem-se então a “máscara” em seu conceito de
construção do personagem, que contribui para a transformação do ator na
representação do outro.
Assim, embora enquanto processo, o teatro coexista em conjunto
com a origem do homem, para Peixoto (1986, p. 10), é na Grécia que se dá o marco
de sua gênese, com Téspis, o primeiro ator. Inicialmente com os Ditirambos, ou os
rituais Dionisíacos, que darão origem ao teatro grego, tem-se também, o uso da
maquiagem, sob a forma dos Borrados:

Na Grécia, temos o uso dos Borrados, nos celebrantes a Dionísio, com uso
de farinha ou argila branca seus rostos eram borrados ficando com uma
aparência do “Não-Eu”. (LEITE, 2004, p. 168)
16

Considerando o assimilamento da cultura grega pela romana, é


compreensível que com a maquiagem não fosse diferente. Por meio dos atores
cômicos, os romanos igualmente incorporaram o uso da farinha no teatro, conforme
nos explica Leite (2004, p. 169):

Conhecidos como ‘Enfarinhados’, eles umedeciam o rosto e com a


aderência de farinha jogada sobre este, obtinham um efeito não real,
burlesco, cômico (A cor branca como base vai acompanhar toda a história
de atores cômicos e vai dar a base, futuramente, da maquiagem de todo
palhaço circense ou teatral).

Além do uso pelos atores, “os romanos costumavam fazer orgias,


com direito a muito vinho e música, fato que contribuiu para o uso cada vez mais
sobrecarregado e diferente da maquiagem” (LOPS, 2009, p. 22). Considerando os
valores religiosos, advindos com a ascensão do cristianismo, torna-se
compreensível a repulsa pelo uso da maquiagem, no período seguinte, o medievo.
O Império Romano se viu ruindo progressivamente e conforme se
dava seu enfraquecimento, o cristianismo se fortalecia. O período que sucede a
época clássica é compreendido como Idade Média, termo que por si só já vem
carregado de preconceitos renascentistas; a Idade Média carrega o estigma daquilo
que é mediano, de um período que se encontra entre a civilização clássica, e a
moderna.
Igualmente conhecida como Idade das Trevas, este foi um período
de escuridão e medo, e isso se reflete na maquiagem, Lops (2009, p. 22) afirma que
“o uso desses produtos foi praticamente abandonado na maior parte do continente
europeu e, durante toda a Idade Média, o pensamento religioso falou mais alto que a
vaidade”, além disso, “a igreja aliava as pessoas que usavam maquiagem ao
demônio”, fato que contribuía para as perseguições marcadas pela inquisição.
Durante a Idade Média, a pele extremamente alva refletia o ideal da
beleza, pois mostrava a origem nobre da pessoa, que diferente dos servos, não
necessitava ficar ao sol e trabalhar no campo, “as cores não mais eram usadas com
frequência e muitas moças usavam sanguessugas coladas ao rosto para sugar o
excesso de sangue, tornando-se assim com a aparência mais pálida” (LOPS, 2009,
p. 22). As pesquisas esclarecem que o uso da farinha, o qual já vinha desde o
período greco-romano foi acrescido pelo uso de mel e óleo.
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3.2 DO RENASCER MODERNO À CONTEMPORANEIDADE

Após cerca de 1000 anos, a humanidade começa a renascer


gradualmente da Idade das Trevas; os iluministas, pensadores renascentistas,
compreendiam este período como início da modernidade, uma era de
desenvolvimento de novas técnicas e do início da ciência. O homem deste novo
período vê-se livre dessa escuridão que se perpetuou na Europa durante o período
medieval, e por isso, o termo “Renascimento”.
É neste período que a maquiagem volta à cena, segundo Lops
(2009, p. 23) foi com a rainha da França, Catarina de Médicis, que a maquiagem
renasceu: “a rainha trouxe a vaidade de volta às mulheres e lançou novos conceitos
de beleza, as ‘moscas’ (mouche em francês), que consistia em pedaços de tecido
escuro, cortados em rodelas pequenas e usadas como pintas nos rostos”. De
instrumento demoníaco, na Idade Média, a maquiagem passa a ser comumente
utilizada no Renascimento, e isso abrangia todos os níveis sociais:

Os homens e as mulheres pintavam seus rostos e corpos de branco usando


pó de arroz ou até farinha de trigo. As bochechas e as bocas eram rosadas
e os olhos eram delineados em preto. A pele branca causava uma aparência
saudável, e muitos procuravam pintar as veias do pescoço ressaltando-as,
desta forma daria a aparência de pele quase transparente. (LOPS, 2009, p.
23).

A maquiagem nesse período era amplamente utilizada tanto por


homens quanto por mulheres e segundo Lops (2009, p. 23), era um dos principais
assuntos dos homens da nobreza, apesar das tentativas da igreja em impedir seu
uso.
O século XIX é marcado pelo Romantismo, a mulher passa a ser
idealizada, e o padrão neste período beira a delicadeza angelical, “eram poucas as
mulheres que se maquiavam. Preferiam beliscar as bochechas e morder a boca para
dar uma aparência rosada. Somente em teatros ou bordeis é que as mulheres
usavam maquiagens mais carregadas.” (LOPS, 2009, p. 25). É interessante ressaltar
que desde o período clássico as mulheres eram proibidas de atuar, já que nessa
época elas não eram consideradas cidadãs, com o tempo, além de serem proibidas
de atuar ainda sofreram o estigma de serem consideradas prostitutas.
As mudanças advindas com o movimento Naturalista/Realista
trazem consigo o ideal de verossimilhança e o uso da maquiagem deste período
18

reflete o pensamento da época, e isso se dá igualmente no palco, uma vez que


“qualquer alteração facial pela maquiagem deve ser imperceptível aos olhos do
espectador, produzindo o efeito de que o que ele vê é verdadeiro, real, verossímil”
(MAGALHÃES, 2010, p. 177). No entanto, Magaldi (1965, p. 46) ressalta o perigo da
obsessão pela cópia do real e o que isso pode trazer de malefício para o espetáculo,
considerando que o realismo, “por sua vez, nos excessos, incorre em riscos
prejudiciais. Um perigo é a reconstituição arqueológica, outro a fotografia.”
Mesmo com a era moderna remontando o período que compreende
o Renascimento, é no século XX que se tem o marco do Modernismo. O início do
século é lembrado como um período de desenvolvimentos e transformações, no qual
viam-se mudanças de grande relevância principalmente nas artes, com as
vanguardas artísticas, e pressentia-se um ar de prosperidade: “chega finalmente o
século XX e com ele um ideal de refinamento e jovialidade, sem exageros” (LOPS,
2009, p. 27).
No início do século XX, tem-se a Primeira Guerra Mundial, e os
adventos provindos desta, ecoam na estética, pois “os homens precisavam ir para a
guerra e as mulheres precisavam ajudar substituindo a mão de obra masculina”
(LOPS, 2009, p. 27). Isso faz com que haja uma maior liberdade estética: a mulher
passa a desempenhar trabalhos predominantemente masculinos, e a moda feminina
de outrora não se encaixa mais, uma vez que o que vigora a partir de então é a
praticidade.
A maquiagem continua em alta, segundo Lops (2009, p. 27), são
inaugurados salões de beleza, e tem-se a criação de novos produtos estéticos, bem
como do Day of Beauty (Dia da Beleza). Além disso, “os cosméticos se tornaram
produtos de uso geral. Em 1921 em Paris, o batom é embalado em um tubo e
vendido em cartucho.” (SCHNEIDER; REIS; THIVES, 2010, p. 5).
Os “loucos anos 20” - período de festa - é aquele no qual se
comemora o pós-guerra. As feministas clamam pelos direitos das mulheres, e a
maquiagem passa a traduzir esse ideal libertário, e, também mais ousada, sedutora.
Segundo Lops (2009, p. 28) “as mulheres usavam o rímel, pintavam os olhos de
preto usando sombras, passavam rouge nas bochechas em exagero, e pintavam a
boca em formato de coração deixando os cantos da boca sem cor”.
O surgimento do cinema se dá em pleno século XIX, e na década de
20, quando se encontra em pleno desenvolvimento, e sua ascensão é notória; neste
19

período os filmes ainda não são em cores, e faltavam matizes em cinza para
amenizar o contraste entre o preto e o branco. Os atores utilizavam talco para
atenuar o brilho, além disso, o cinema dessa época necessitava de uma iluminação
excessivamente intensa e em pouco tempo os atores acabavam suados:

Os filmes da época em preto e branco não dispunham de matizes de cinza


suficientes para que pudessem ter uma imagem de qualidade, menos
esbranquiçada. O uso do talco piorava a situação quando usado para conter
os suores dos rostos dos atores devido às longas horas de filmagem sob
holofotes extremamente potentes (LOPS, 2009, p. 27-28)

Procurando solucionar essa questão, Max Factor 1 desenvolve um


produto próprio para o uso no cinema, o pancake, cujo nome em inglês remete à sua
consistência sólida e que revolucionaria a maquiagem, e é usado ainda hoje nos
palcos de teatro. Na década de 30, tem-se o início do cinema em cores, e com isso,
a concepção da maquiagem no cinema se modifica, uma vez que agora é possível
ousar. A estrela de cinema Marilyn Monroe tornou-se ícone como figura feminina e
teve sua imagem vangloriada e copiada, usando batom vermelho nos lábios e
maquiagem clara, atraindo e intensificando sua feminilidade. (SCHNEIDER; REIS;
THIVES, 2010, p. 5.).
Além disso, segundo Lops (2009, p. 30), a maquiagem nesse
período focava a região dos olhos, na qual era comum se redesenhar as
sobrancelhas, para isso, as mulheres depilavam-nas ou as tingiam. Embora haja
crescente variedade de cosméticos no mercado, é a partir dos anos 40 que as
mulheres começam a ter mais liberdade financeira para comprar sua própria
maquiagem, fruto dos movimentos feministas dos anos 20. A sobrancelha volta a
crescer de maneira natural, com alguns retoques feitos no salão, os tons escuros
são evidenciados pelo batom marcante (LOPS, 2009, p. 31-32).
Apesar da década de 50 ser célebre, e contar com a presença de
mulheres marcantes e famosas como Marilyn Monroe, ou Brigitte Bardot, poucas
mudanças se viram entre os anos 40 e 50 no âmbito da maquiagem. Na década
seguinte o foco ainda se mantém nos olhos, no entanto o batom vermelho,
marcante, passa a ser claro, quando não branco (LOPS, 2009, p. 32-34).
Com os anos 70, têm-se inúmeras mudanças sociais, entre elas o
movimento hippie, segundo Lops (2009, p. 36), “eles usavam muitas cores, tudo em

1
Maximilian Faktorowicz, maquiador polonês e fundador da marca de cosméticos Max Factor.
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exagero e psicodélico. Tudo nesta época parece exagerado”. Além disso, Lops
(2009, p. 37) ainda fala sobre o movimento andrógino, no qual os homens tornam-se
mais femininos esteticamente; o black power era comumente utilizado; e os punks
traziam uma aparência mais agressiva, na tentativa de chocar a sociedade. As
mulheres faziam uso de uma maquiagem com aspecto mais natural durante o dia,
ousando nas cores à noite. Schneider, Reis e Thives (2010, p. 5) afirmam que:

Na década de 70 as cores de maquiagem tornaram-se populares,


acompanhando as coleções de alta-costura francesa, italiana e inglesa.
Dior, Chanel, Yves Saint Laurent e todos os outros grandes fabricantes
ousavam e enchiam os olhos das mulheres de todo mundo. (SCHNEIDER;
REIS; THIVES, 2010, p. 5).

O movimento hippie finda nos anos 80, e a extravagância entra em


cena, “a beleza vira uma competição”, afirma Lops (2009, p. 38). Esta é uma década
na qual seguem os exageros, tudo é muito colorido, os cabelos ganham muito
volume, o corte no estilo “mullets” torna-se extremamente popular, “as mulheres
querem agora brilho, sofisticação e luxo, elas queriam se manter bonitas de qualquer
forma” (LOPS, 2009, p. 38). A indústria de cosméticos precisa acompanhar a
tendência, e nesse sentido, Schneider, Reis e Thives (2010, p. 5) afirmam que “na
década de 80 são lançadas as fórmulas evoluídas para cosméticos pigmentados”.
As extravagâncias típicas dessa época, também se expressam na
maquiagem, “os lábios usam os batons vermelhos, as sombras eram usadas em
diversas cores, os blushes realçavam as bochechas, e o gloss iluminava a boca das
mulheres” (LOPS, 2009, p. 38). No entanto, as tendências da estética passam a ser
cada vez mais transitórias e já no final da década, veem-se mudanças: a concepção
de vida saudável está em voga e a maquiagem passa a ter um ar mais natural em
contraposição aos excessos de até então.
Se o caráter da estética já estava se tornando cada vez mais
momentâneo, com os anos 90 torna-se ainda mais efêmero, pois agora “as
tendências não duravam mais que seis meses” (LOPS, 2009, p. 39). Os grandes
nomes da indústria dos cosméticos tornam-se cada vez mais importantes, e
começam a ditar tendências: “nos anos 90 a era do benefício visível ganha
importância vital, Dior e Givenchy alterando mais uma vez a história da moda &
make-up. (SCHNEIDER; REIS; THIVES, 2010, p. 5).
As grandes marcas tornam-se referências sociais, visando o
21

consumismo de massa, o mercado dos cosméticos é cada vez mais intenso e


apelativo, Vita (2008, p. 146) afirma que “na realidade, a década de 90 foi a das
mudanças rápidas, das tendências que quase não duravam e das certezas que
seriam desmentidas em pouco tempo.” É a década em que se intensifica a ideia de
sociedade da informação, tudo se esvai com agilidade e rapidez.
Com isso, a maquiagem necessita se adaptar, pois diferente dos
períodos anteriores na qual as tendências se mantinham por séculos, agora as
mudanças ocorrem conforme a alternância das estações do ano, e a maquiagem
necessita acompanhar o frenesi do efêmero. Então, nota-se que “o sucesso das
feiras de beleza e cosmética no Brasil mostram que esse segmento está cada vez
mais competitivo do que jamais esteve, com tecnologia de ponta e ocupando lugar
de destaque no mercado nacional” (VITA, 2008, p. 148).
Segundo Bauman (2000, p. 8) este período marca o início da
“modernidade líquida”, que traz a necessidade de inovações numa velocidade cada
vez mais intensa, contudo, esta volatilidade pode auxiliar no sentido de que, na
medida em que ocorre uma transitoriedade de tendências a cada semestre, tem de
se criar novos cosméticos para acompanhar a demanda, e nesse sentido, “podemos
hoje nos beneficiar de produtos que colorem, tratam, limpam, perfumam e protegem
a pele e cabelos, como nunca visto antes na história da humanidade” (SCHNEIDER;
REIS; THIVES, 2010, p. 5).
Deste modo, a maquiagem pode ser delimitada entre aquelas de
caráter comercial, que são próprias para o consumo do público em geral, de fácil
aplicação, com uma quantidade média de pigmentos e de mercado dinâmico; as de
caráter profissional, próprios para aqueles cujo trabalho depende dela, com fixação
mais forte do que o normal, e ampla abundância de cores, cujo comércio se dá em
locais especializados; e, por último, a maquiagem de caráter teatral, que como a
anterior possui uma forte fixação e grande variedade nas cores, encontradas em
lojas especializadas. (SCHNEIDER; REIS; THIVES, 2010, p. 6)
Como se pôde notar, a maquiagem tem nos seus primórdios o ideal
da personificação, utilizada inicialmente para a representação de divindades em ritos
religiosos, e mais tarde para a caracterização do personagem. Com o decorrer do
tempo, ela passou a colaborar para a correção de imperfeições e para a acentuação
de algumas características no rosto.
Atualmente, a maquiagem de uso cotidiano é a mais comercializada.
22

Segundo Andrade (2010, p. 176) “a maquiagem cotidiana, usada em larga escala


pelas mulheres, mas hoje também utilizada pelos homens para corrigir imperfeições,
parte da ideia de que a sua principal função é construir um ‘eu’ idealizado”. Este tipo
de maquiagem colabora para a formação de uma identidade, na qual,

os indivíduos contemporâneos lançam ou resgatam maquiagens sociais,


articulando de diversos modos a práxis enunciativa da maquiagem, [...] as
contemporâneas têm valor de absoluto, sob um regime de exclusão e
concentração (MAGALHÃES, 2010, p. 211).

Nesse sentido, a maquiagem no contexto atual traz consigo uma


imagem cujo semblante beira a frivolidade, uma vez que as grandes marcas do
mercado de cosméticos trazem a cada semestre novas coleções com padrões pré-
estabelecidos, na qual a sociedade deve usar para se “estar na moda”. No entanto,
este trabalho visa trazer uma nova visão do uso da maquiagem, suas mais variadas
funções, e como isso pode contribuir para a maquiagem cênica, foco desta
pesquisa.

3.3 FUNÇÕES DA MAQUIAGEM – A MAQUIAGEM CÊNICA

De instrumento ritualístico para uma ferramenta de formação de


identidade, Pavis (1999, p. 231) apresenta o conceito de maquiagem como uma arte
cambiante, que traz consigo funções que transitam entre diferentes necessidades e
culturas. Nesse sentido o autor ainda atribui quatro distintas funções, na qual ela
pode ser utilizada para embelezar, codificar o rosto, teatralizar a fisionomia e
estender a maquiagem.
A função de embelezamento, proposta por Pavis (1999, p. 231),
nada mais é do que aqueles pequenos reparos que visam tanto esconder defeitos,
quanto enaltecer particularidades faciais, embora isso seja mais comumente
utilizado no cotidiano, também o é no palco.
A codificação do rosto trata-se do uso da simbologia obtida por meio
da maquiagem, normalmente com o uso de cores específicas. Como exemplificação,
Pavis (1999, p. 232) cita o tradicional teatro chinês, que se baseia nas
“correspondências entre cores e características sociais: branco para os intelectuais,
vermelho para os heróis leais, azul escuro para as personagens orgulhosas, prata
para os deuses etc.”.
23

Ao se teatralizar a fisionomia, a maquiagem colabora para a


caracterização do personagem, trazendo consigo uma função semelhante à da
máscara, a qual se apropria do rosto do ator para dar vida ao personagem. De
acordo com Pavis (1999, p. 232) “ela joga com a ambiguidade constitutiva da
representação teatral: mescla de natural e artificial, de coisa e de signo”.
E por último, a função na qual a maquiagem se estende para além
do rosto, quando o corpo inteiro passa a ser maquiado; assim, ela deixa de ser um
elemento meramente caracterizante para entrar no rol dos “objetos de
representação” Pavis (1999, p. 232), isto é, a maquiagem estendida torna-se então
parte do cenário. Tem-se a renúncia do caráter psicológico, passando então, para
um “sistema significante”.
A maquiagem cênica em Andrade (2010, p. 176) se relaciona com a
função de teatralizar a fisionomia, conforme Pavis (1999, p. 232), uma vez que em
ambas contribuem para a construção do personagem, auxiliando o ator a conceber
traços do psicológico do personagem, por meio da maquiagem:

No âmbito teatral, a maquiagem funciona como mais um dos elementos


empregados para construir uma personagem que, em síntese, é diferente
do ator que a interpreta. Vale dizer que por meio dessa estratégia, debaixo
dos refletores, o ator torna-se mais convincente e acredita comunicar melhor
para a platéia a complexidade psicológica da personagem de acordo com as
intenções do autor. A maquiagem, associada aos outros elementos que
ajudam a compor uma personagem, permite ao ator recuperar um jogo de
aparências, experimentando situações diversas, chegando inclusive a
colocar-se no lugar do outro e até mesmo a assimilar a sua sombra, o seu
vulto, o rastro da sua passagem. A maquiagem sintetiza e traduz parte
expressiva da criação do ator. Ela destaca principalmente aquele aspecto
que, de imediato é notado pela platéia. A pintura facial atua como um
excelente recurso para que o intérprete chegue mais perto do ponto de
encontro com o outro ser que irá representar. (ANDRADE, 2010, p. 176
-177)

Já para Magalhães (2010, p. 172-173), a maquiagem vem como


contributo na caracterização do personagem, e nesse sentido, “cenicamente, para o
atuante, a caracterização é um conjunto de técnicas que possibilitam a ele a
construção da personagem criada anteriormente pelo autor ou por processos
colaborativos”. Deste modo, é imprescindível que o maquiador compreenda o que se
deseja criar por meio da maquiagem, pois a sua obra está intrinsicamente ligada ao
trabalho de construção do ator e do encenador:
24

Compreender que a maquiagem faz parte da construção da identidade


figurativa de um sujeito actante encarnado, do fazer persuasivo que se
estabelece entre enunciador e enunciatário, construído dentro de uma
práxis enunciativa, torna-se fundamental para a “leitura” dos rostos e dos
corpos constantemente mutáveis. (MAGALHÃES, 2010, p. 201).

Com relação ao conjunto de técnicas, e do trabalho desenvolvido


pelo maquiador, Schneider, Reis e Thives (2010, p. 7) falam sobre os meios
necessários para se criar a maquiagem artística, na qual o maquiador tem uma
ampla gama de elementos, e por intermédio de sua técnica poderá explorar toda a
sua criatividade para a concepção de seu trabalho:

Existem diversos meios de criar uma maquiagem artística, que vai desde
um trabalho abstrato, com uma organização de cores, texturas, linhas,
formas, harmonias, ritmo e movimento, até a forma de expressar a natureza,
como por exemplo, flores, plantas, paisagens, estendendo-se a teatro,
carnaval, festa, beleza, estudo, eventos. É uma forma de o maquiador
explorar a sua sensibilidade e a sua criatividade. O domínio da técnica do
profissional com relação a essa arte é fundamental para a execução de um
trabalho, podendo observar mudanças não só nos padrões estéticos
corporais ditados pela indústria cultural, mas também pelas manifestações
artísticas que acabam por vestir de cultura os corpos nus que representam.

Dessa forma, a maquiagem cênica depende igualmente da técnica


utilizada pelo profissional, pois, para a síntese teatral, não são somente os
elementos que compõe o espetáculo que devem estar harmonizados e
integralizados, mas toda a equipe trabalha igualmente em consonância.

3.4 O FIGURINO CÊNICO E SUA RELAÇÃO COM A MAQUIAGEM

Para que o ator possa conceber seu personagem, ele conta com
recursos que contribuem para a caracterização. Dentre tais elementos “a
indumentária também reclama funcionalidade tanto em relação ao texto como ao
físico do ator” (MAGALDI, 1965, p. 48).
Considerando que o trabalho entre o figurinista e o maquiador deva
ser consonante, para que no resultado final não haja divergências entre as duas
formas de criação, o estudo entre a relação destes torna-se essencial. Schneider,
Reis e Thives (2010, p. 12) trazem o figurino como um “conjunto de elementos
visuais” que agrega a maquiagem como parte inerente desse conjunto:

O figurino pode ser definido também como um conjunto de elementos


visuais do ato cênico (encenação) que faz referência direta ao corpo do ator
25

ou atriz e que se destina a vestir a personagem que se representa em


determinado contexto dramático. Este conjunto de elementos visuais, que
vai desde as peças de vestuário propriamente ditas até as máscaras,
cabeleiras, maquiagem e acessórios diversos, como jóias e armas, é
trabalhado pelo figurinista de acordo com as necessidades do texto
dramático, da direção do espetáculo teatral e da proposta estética
estabelecida para este último. Mais do que fazer referência ao corpo do ator,
o traje de cena apenas adquire sentido e capacidade de significar quando
se encontra sobre o corpo do ator em cena. (SCHNEIDER; REIS; THIVES,
2010, p. 12).

Neste sentido, a maquiagem torna-se um instrumento que


complementa a indumentária. No entanto, sendo ainda a maquiagem um elemento
que pode ser construído de maneira isolada, este não deve desconsiderar a
totalidade do espetáculo. As autoras explicam a função do figurinista durante o
processo da montagem teatral, que consiste na elaboração da maquiagem a ocorrer
na finalização do processo de construção do espetáculo teatral, juntamente com a
“carpintaria do traje”:

[...] o figurinista deve estar atento a todas as etapas do processo de


montagem teatral, iniciado, em geral, por uma idéia central definida pelo
diretor, que estabelecerá a forma e conceito geral do trabalho, passado, por
conseguinte, aos demais integrantes da equipe de trabalho que realizarão
efetivamente a peça. O figurinista se encontra justamente no interior deste
grupo de trabalho, onde pode e deve trocar informações com direção,
cenógrafo, produtores e atores. Outro momento importante é a leitura do
texto dramático, ou do roteiro da encenação, de onde podem ser retiradas
as primeiras idéias de figurino. A finalização desse processo cheio de etapas
se dá com a feitura, ou “carpintaria” do traje, que acompanhado da
maquiagem e dos acessórios entrará para a estreia do espetáculo.
(SCHNEIDER; REIS; THIVES, 2010, p. 24).

Em Pavis (2005, p. 170) tem-se a efetiva relação entre os elementos


do espetáculo: “o cenário colado ao corpo do ator se torna figurino, o figurino que se
inscreve em sua pele se torna maquiagem: a maquiagem veste tanto o corpo como
a alma daquele que a usa, daí sua importância estratégica [...] para o ator, no palco”.
Nesse contexto, cenário, figurino e maquiagem tornam-se todos uma única peça:
elementos que se complementam num todo, o espetáculo cênico.
26

4O EXPERIMENTO DA MAQUIAGEM COMO EXERCÍCIO DE


CARACTERIZAÇÃO DO ATOR

Para o estudo da maquiagem cênica, realizado no desenvolvimento


do componente curricular Caracterização: figurino e maquiagem ofertada no curso
Técnico em Arte Dramática do IFPR, foi pedido a cada estudante que trouxesse
imagens de referência como guia de trabalho de pesquisa. As fotos aqui
apresentadas foram feitas durante as referidas aulas, são de autoria de Régis Inácio,
estudante do curso Técnico em Arte Dramática.

Figura 1 – Estudo da maquiagem cênica

Fonte: Dados primários (2012)

Também, foi solicitado que cada discente trouxesse uma toalha


branca para cobrir a mesa de trabalho. A orientação é de que a cor branca reflete a
luz no rosto do ator, e auxilia a visualização do processo criativo, além de facilitar na
localização dos cosméticos e acessórios que normalmente se destacam no branco
da toalha. O estudo dos cosméticos, que é o material básico utilizado para a
construção da maquiagem, foi apresentado nas aulas:
27

Figura 2 – Apresentação dos cosméticos

Fonte: Dados primários (2012)

Figura 3 – Apresentação dos cosméticos

Fonte: Dados primários (2012)

Com as devidas considerações feitas em relação aos cosméticos


para a maquiagem cênica, foram realizados os apontamentos no que diz respeito à
preparação da pele. A pele do ator deve estar limpa o suficiente para receber a
maquiagem. Recomenda-se prender o cabelo com uma faixa ou algo semelhante
para que o maquiador tenha maior mobilidade, sem precisar se preocupar com os
fios caindo no rosto do ator, ou atrapalhando seu trabalho.
28

A uniformização da pele dá-se posteriormente a sua limpeza e


preparação. O pancake branco é o cosmético mais utilizado atualmente, pois a cor
branca, como vimos anteriormente, é a base da maquiagem desde o período
clássico, por intermédio da farinha. Para a aplicação do pancake, o maquiador deve
considerar uma linha imaginária dividindo o rosto do ator pela metade, em partes
iguais, o cosmético é aplicado suavemente, partindo do meio, para as laterais do
rosto.

Figura 4 – Estudo da uniformização da pele

Fonte: Dados primários (2012)


29

Figura 5 – Estudo da uniformização da pele

Fonte: Dados primários (2012)

Figura 6 – Estudo da uniformização da pele

Fonte: Dados primários (2012)

Com a pele uniformizada é possível trabalhar na maquiagem em si,


30

que deve integralizar a construção do personagem. Além disso, o maquiador ainda


terá que considerar o tipo físico de cada ator, que difere no momento de criar a
maquiagem, conforme afirmam Schneider; Reis e Thives (2010, p. 3).

[...] os objetivos discutidos no decorrer de cada trabalho faz com que este
profissional tenha total respeito com as características de cada ser humano.
O formato do rosto, volume dos cabelos, tonalidade da pele e possíveis
distorções, espaçamento entre os olhos, distanciamento entre o nariz e a
boca, maçãs do rosto, formato do queixo, são apenas algumas
características que serão observadas em primeira instância, tanto do lado
da inspiração do “maquiador” quanto do lado do ser humano “artista”.

Na imagem a seguir já se tem o desenvolvimento da caracterização,


e pode-se perceber que o contorno dos olhos criado pelo professor do conteúdo
programático está respeitando o formato natural do rosto do estudante, bem como o
tamanho e espaçamento de seus olhos:

Figura 7 – Estudo da concepção da maquiagem

Fonte: Dados primários (2012)

Ao se considerar o formato natural do rosto, o maquiador consegue


exaltar os traços mais harmônicos, ou ocultar os defeitos, aproveitando aquilo que
lhe cabe na busca pela excelência da caracterização. O rosto, para o maquiador,
tem a mesma função que a tela, para o pintor:
31

Para o maquiador é fundamental a tarefa de representar a beleza por meio


da arte [...]. Assim como é importante um pintor expressar sua visão em
uma tela, o maquiador também usa do domínio dessa arte para expor em
um corpo ou rosto suas ideias, sua visão, sua forma de se expressar.
(SCHNEIDER; REIS; THIVES, 2010, p. 3).

Nesse mesmo sentido, o Prof° Msc. José Francisco Quaresma


Soares da Silva, na figura 8, faz uso dos traços naturais do estudante para
reproduzir o personagem idealizado, utilizando-se do rosto como uma tela viva. Para
isso, ele cria traços, formas e volumes por meio das sombras e das cores,
procurando exaltar a expressividade cênica:

Figura 8 – Estudo da concepção da maquiagem

Fonte: Dados primários (2012)

Na figura 9, a estudante aplica os conhecimentos adquiridos com as


aulas. Ela também faz uso de seus traços naturais para alcançar o personagem
pretendido; da mesma forma em que é feito na imagem anterior (figura 8):

Figura 9 – Estudo da concepção da maquiagem


32

Fonte: Dados primários (2012)

Figura 10 – Maquiagem finalizada

Fonte: Dados primários (2012)


33

A tentativa da reprodução da maquiagem de um personagem pode


ser literal, como nas figuras 12 e 13, nas quais se tem como referência a
personagem Sally, do longa The nightmare before christmas (figura 11):

Figura 11 – Sally, The nightmare before christmas

Fonte: Dados primários (2012)

Como a maquiagem pretendida trata-se de personagem de


referência criada em stop motion2, seus traços, embora humanizados, são próprios
para a animação, com proporções irreais, que quando transpostas para a realidade
humana, seriam consideradas como proporções deformadas.
A expressividade da personagem Sally está principalmente no olhar,
sendo que para transmitir isso, tornam-se exageradamente grandes, o que não
condiz com a realidade humana. Nesse sentido, ao se buscar a reprodução literal de
um personagem com tais características, o maquiador terá de procurar técnicas
próprias para a construção dessa maquiagem.

2
Técnica de animação construída quadro a quadro, normalmente por meio de fotografias
sequenciais.
34

Figura 12 – Reprodução da personagem Sally

Fonte: Dados primários (2012)


35

Figura 13 – Reprodução da personagem Sally

Fonte: Dados primários (2012)


36

Esta maquiagem também foi fruto dos conhecimentos adquiridos


com as aulas do curso Técnico em Arte Dramática. Para sua realização, o olhar foi
ampliado com recursos de maquiagem, utilizando como base a pálpebra do olho. O
olhar engrandecido se perde caso o olho real seja aberto, o que não impede que se
tenha a caracterização, uma vez em que o olho se mantenha fechado. A confusão
do olhar duplo também pode ser aproveitada, caso seja essa a intenção do
maquiador.
37

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A presente pesquisa foi fruto das indagações tangentes com respeito


à gênese criativa da maquiagem e sua relação com o processo de construção do
figurino, no espetáculo teatral, sendo ambos elementos que dialogam e estão
integralizados entre si.
Neste sentido, foi realizada uma investigação histórica do uso da
maquiagem, revisitando diversos estudos acerca deste elemento. Sua historicidade
foi abordada desde os primórdios, os quais remontam a pré-história e chegam até o
período atual.
Por conseguinte, foram apresentadas e analisadas as principais
funções da maquiagem, tais sejam embelezar, codificar o rosto, teatralizar a
fisionomia e estender a maquiagem. A ênfase deste estudo se deu naquelas que
compreendiam a maquiagem cênica.
Pode-se observar que a maquiagem cênica contribui para a
construção e caracterização do personagem. Além disso, a maquiagem se relaciona
com o figurino, uma vez que este também tem importante papel para a construção e
caracterização do personagem.
Neste sentido, pode-se então discorrer sobre o figurino em si e sua
importância para o teatro, bem como a relação entre ambos – figurino e maquiagem
– no processo de construção teatral. Tais elementos atuam como recursos cênicos
que dialogam o todo.
É importante ressaltar que a maioria dos grupos teatrais dificilmente
conta com um profissional específico para a maquiagem ou o figurino. É comum a
divisão de tais tarefas entre os integrantes do grupo, sendo muitas vezes o próprio
ator a criar e aplicar sua maquiagem, o que não diminui a importância destes
elementos.
Além disso, a maquiagem cênica exige determinados cuidados: é
importante que o local em que se irá trabalhá-la seja bem iluminado; deve-se
ponderar a incidência da luz no rosto dos atores; a qualidade dos cosméticos
também fará diferença, uma vez que a própria iluminação ou fatores externos, como
o sol e a chuva (no caso de teatro de rua), podem contribuir para a perda da
maquiagem durante a apresentação.
Por conseguinte, o capítulo final da pesquisa traz a experimentação
38

da maquiagem cênica e é apresentado visualmente. De autoria do aluno Régis


Inácio, as fotografias deste capítulo são fruto de estudo e experimentação da
maquiagem cênica durante o período de realização do curso técnico em Arte
Dramática do IFPR. Foram desenvolvidas no componente curricular Caracterização:
figurino e maquiagem.
Tais imagens colaboram para a exemplificação visual daquilo que foi
exposto nos capítulos anteriores e complementam a pesquisa como um todo. Foram
trabalhados, portanto, o estudo da maquiagem cênica; os cosméticos; a
uniformização da pele; a concepção e a finalização da maquiagem.
39

REFERÊNCIAS

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MAGALHÃES, Mônica Ferreira. Maquiagem e pintura corporal: uma análise


semiótica. Tese (Doutorado em Estudos Linguísticos) - Universidade Federal
Fluminense, Niterói, 2010.

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cinema. São Paulo: Perspectiva, 2005.

____________. Dicionário de teatro. Perspectiva: São Paulo, 1999.

PEIXOTO, Fernando. O que é teatro. 8. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986.

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Jacare zinho: UENP, 2011.
40

SCHNEIDER, Maris Estela; REIS Mariana; THIVES Fabiana. Tendência do


mercado da maquiagem: conceito da arte e da tecnologia. Balneário Camburiú:
Universidade do Vale de Itajaí, 2010. Disponível em: <http://siaibib01.univali.br/
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Estados Unidos: Touchstone Pictures, 1993. 1 DVD (76 min), animated, black &
white, color, DTS surround sound, letterboxed, special edition, NTSC.

VITA, Ana Carlota. História da maquiagem, da cosmética e do penteado. São Paulo:


Anhembi Morumbi, 2008.

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