You are on page 1of 99

81,9(56,'$'()('(5$/'(8%(5/Æ1',$

)$&8/'$'('($57(6),/262),$(&,Ç1&,$662&,$,6
'(3$57$0(172'(0Ò6,&$($57(6&Ç1,&$6
+$%,/,7$d­2(0,167580(172%$&+$5(/$'2(09,2/­2

$0Ò6,&$3238/$5(2$55$1-292&$/
8PDSURSRVWDGHPpWRGRSUiWLFR

&$5/2652%(572)(55(,5$'(0(1(=(6-Ò1,25

8%(5/Æ1',$±$%5,/'(
81,9(56,'$'()('(5$/'(8%(5/Æ1',$
)$&8/'$'('($57(6),/262),$(&,Ç1&,$662&,$,6
'(3$57$0(172'(0Ò6,&$($57(6&Ç1,&$6
+$%,/,7$d­2(0,167580(172%$&+$5(/$'2(09,2/­2

$0Ò6,&$3238/$5(2$55$1-292&$/
8PDSURSRVWDGHPpWRGRSUiWLFR

7UDEDOKR ILQDO DSUHVHQWDGR HP FXPSULPHQWR


GD GLVFLSOLQD 3HVTXLVD HP 0~VLFD  &XUVR
+DELOLWDomR HP LQVWUXPHQWR %DFKDUHODGR HP
9LROmR PLQLVWUDGD SHOD SURIHVVRUD &tQWLD
7KDLV 0RUDWR H VRE RULHQWDomR GR SURIHVVRU
)OiYLR6DQWRV

&$5/2652%(572)(55(,5$'(0(1(=(6-Ò1,25

8%(5/Æ1',$±$%5,/'(
  &DQWi VHMD Oi FXPX I{
6L D G{ I{ PDLV JUDQGL TXL R SHLWR
&DQWi EHP PDLV IRUWL TXL D G{

*LOGHV %H]HUUD
$JUDGHFLPHQWRV

$JUDGHoR DQWHV GH WXGR D PLQKD PmH 0DUL 1HLGH PHX SDL &DUORV H PHX
LUPmR /~FLR TXH PH GHUDP WRGR R VXSRUWH H FDULQKR QD KRUD HP TXH HX PDLV
SUHFLVHLHDPLQKDPXVD6LPRQHFRPSDQKHLUDGHWRGDVDVKRUDVTXHWRUQDDYLGD
PDLVYLYD
$JUDGHoR DR PHVWUH 6pUJLR )UHLWDV SRU DSUHVHQWDUPH HVWH YDVWR  H EHOR
PXQGRTXHpRGDKDUPRQLDHSRULQFHQWLYDUPHDH[SORUiOR
$JUDGHoR DR PHVWUH )OiYLR 6DQWRV TXH PH RULHQWRX QHVWH WUDEDOKR H FXMR R
FRQYtYLRPHDFUHVFHQWRXHQTXDQWRP~VLFRHHQTXDQWRVHUKXPDQR
$JUDGHoRDRPHVWUH+HUPLOVRQ %XGL *DUFLDSHODVViELDVHSURYHLWRVDVGLFDV
TXHHQULTXHFHUDPHVWHWUDEDOKR
$JUDGHoR jV PLQKDV DPLJDV GR 4XDUWHWR 9DJD 0XQGR -XOLDQD 9kQLD H $QD
3DXODSHORLPHQVRSULYLOpJLRGHFDPLQKDUPRVMXQWRVQHVWD EHODWDUHIDGHOHYDU DUWH
jVSHVVRDV
$JUDGHoR D WRGRV RV DPLJRV H SURIHVVRUHV TXH FRQWULEXtUDP LQGLUHWDPHQWH
SDUDDUHDOL]DomRGHVWHWUDEDOKRWDLVFRPRPHXVSURIHVVRUHVGHLQVWUXPHQWR6DQGUD
$OIRQVRH)DQXHO0DFLHO$UHJHQWHGR&RUDOGD8)8(GPDU)HUUHWWL RVSURIHVVRUHV
&DUORV$OEHUWR6WRUWLH3HJJ\6WRUWLHPLQKDVDPLJDV5DTXHO3HSSHH0LFKHOH
Sumário

Introdução ---------------------------------------------------------------------------------- 2
Elementos Básicos ----------------------------------------------------------------------- 3
intervalos -------------------------------------------------------------------------------- 3
escalas ----------------------------------------------------------------------------------- 6
Os acordes e o campo harmônico --------------------------------------------------- 12
A voz ------------------------------------------------------------------------------------------- 22
extensão e tessitura ------------------------------------------------------------------- 22
nota de cobertura e registro vocal --------------------------------------------------- 24
Movimento entre as vozes ----------------------------------------------------------- 26
Análise melódica ------------------------------------------------------------------------- 29
notas reais ------------------------------------------------------------------------------- 30
notas auxiliares ------------------------------------------------------------------------- 32
Encadeamento de acordes ----------------------------------------------------------- 42
Encadeamento de acorde com nota em comum ---------------------------------- 43
Encadeamento de acordes sem nota em comum --------------------------------- 44
Encadeamento do acorde de dominante com sétima ----------------------------- 44
Inversões -------------------------------------------------------------------------------- 47
Arranjo a duas vozes ------------------------------------------------------------------- 50
contracanto passivo -------------------------------------------------------------------- 50
contracanto ativo ----------------------------------------------------------------------- 53
melodia em bloco ---------------------------------------------------------------------- 55
Arranjo a três vozes em bloco ------------------------------------------------------ 59
Arranjo a quatro vozes em bloco -------------------------------------------------- 62
Contracanto a três, quatro ou mais vozes ------------------------------------- 65
O Arranjo completo --------------------------------------------------------------------- 67
exemplo 1 - Canto do Povo de um Lugar ------------------------------------------- 69
exemplo 2 - Arrastão ------------------------------------------------------------------ 71
exemplo 3 - San Vicente -------------------------------------------------------------- 82
exemplo 4 - Colheita ------------------------------------------------------------------- 85
exemplo 5 - Araruna ------------------------------------------------------------------- 90
Conclusão ----------------------------------------------------------------------------------- 94
Bibliografia --------------------------------------------------------------------------------- 95
2

Introdução

Na comunidade uma das práticas mais comuns de produção musical é o


canto coral. Nas escolas, nas igrejas, nas empresas, nos bairros, surgem corais
a cada dia. Com isso criou-se a necessidade de repertório específico para esta
formação que é, na sua maioria, composto de arranjo de música popular. Uma
das formas mais comuns dos regentes adquirirem novos repertórios é trocando
partituras com outros regentes ou fazendo os próprios arranjos das músicas
que pretende trabalhar.
O canto é uma das formas mais comuns de produção musical em várias
culturas. A história da música na sociedade ocidental tem sua gênese na
prática da música vocal. A partir desta prática foi sendo desenvolvida e
construída toda a gama de conhecimentos que nos servem de suporte para a
nossa criação musical. A possibilidade de utilizar o som como modo de
expressão acaba levando o indivíduo a querer conhecer cada vez mais as
diversas “maneiras”, que nada mais são do que as diversas técnicas que o
ajudarão a produzir música.
Podemos classificar as infinitas técnicas em dois tipos: As técnicas de
produção do som e as técnicas de organização do som. As primeiras são
aquelas que se preocupam com a performance, com o modo como o som está
sendo produzido no instrumento e com as melhores possibilidades de execução
para um determinado resultado sonoro. São as técnicas de canto, de piano, de
percussão, de flauta, e tantas outras, e para cada instrumento temos as
técnicas para tocar determinado estilo, e dentro de cada estilo temos as várias
escolas e linhas de pensamentos. As técnicas de organização do som são todas
as teorias musicais criadas ao longo da história da música de uma determinada
sociedade. As escalas, os sistemas, as regras de organização destes sistemas e
o significado de determinadas estruturas musicais fazem parte deste conjunto
de “maneiras” de compor o som. O foco desta pesquisa será uma dessas
técnicas de organização do som, que é a criação de arranjos de música popular
para grupos vocais. Duas perguntas são levantadas neste trabalho, que são as
seguintes: Como fazer arranjos para as várias formações vocais? Como
sistematizar um material didático para pessoas que se interessem em escrever
este tipo de arranjo?
O objetivo geral deste trabalho é elaborar um material didático voltado
especificamente para a técnica de criação de arranjos vocais. A necessidade
deste trabalho surge pelo fato de que na região do Triângulo Mineiro são raros
os regentes de coros que conhecem as técnicas de arranjo vocal e com isso
acabam tendo que depender de um repertório já escrito. Os regentes que se
interessam em aprender a fazer este tipo de arranjo acabam encontrando um
outro problema, a falta de material específico. Existem muitos livros sobre
arranjo e vários livros nas áreas que subsidiam esta técnica, tais como
harmonia, contraponto, técnica vocal, etc, porém é raro achar livros que
sintetizem e direcionem para a escrita de arranjos de música popular nas várias
formações vocais.
3

Elementos básicos
Há elementos musicais básicos que o arranjador precisa dominar para o
desenvolvimento de um bom trabalho. Neste capítulo revisaremos alguns
destes elementos considerados essenciais. São estes os intervalos, as escalas,
os acordes e o campo harmônico. Será necessário que o leitor já tenha domínio
da escrita e leitura musical, principalmente em clave de Sol e clave de Fá, pois
não é objetivo deste trabalho o estudo destes elementos, assim como, também,
não é objetivo deste trabalho o estudo dos sinais de alteração como os
sustenidos e bemois.

Intervalos

Ao longo da história da música ocidental, o homem desenvolveu


sistemas de organização sonora para poder ter um domínio melhor dos
elementos musicais no momento da criação artística. Um destes elementos é o
Tom que representa uma "medida" para se avaliar a "distância" entre as notas
musicais. A menor unidade adotada na música ocidental é o 1/2 Tom. Veja
abaixo as distância entre as notas musicais naturais expressas em Tom.

O intervalo representa a relação entre duas notas musicais. Poderia se


dizer que o intervalo é a "distância" entre duas notas. Os intervalos são
classificados numericamente (segunda, terça, quarta, quinta, etc...) e
qualitativamente (justos, menores, maiores, diminutos, aumentados, etc...). No
que se refere a classificação numérica, ela é feita da seguinte forma:
4

Os intervalos que ultrapassam uma oitava seguem a mesma lógica


apresentada acima, porém são chamados de intervalos compostos. Então a
nona na verdade é uma segunda composta, a décima primeira é uma
quarta composta e assim por diante.
Quanto a classificação em termos qualitativos, os intervalos podem se
apresentar da seguinte forma:

• Os intervalos de quarta, quinta e oitava são intervalos Justos.

• Os intervalos de segunda, terça, sexta e sétima são intervalos


Maiores ou Menores.

Quanto aos intervalos aumentados e diminutos, estes serão abordados


mais adiante.
O que define se o intervalo é maior, menor ou justo é a quantidade de
tons e semitons que existe entre as notas. Veja o quadro abaixo.

Segunda menor - 1/2 tom


Segunda maior - 1 tom

Terça menor - 1 tom e 1/2


Terça maior - 2 tons

Quarta justa - 2 tons e 1/2

Quinta justa - 3 tons e 1/2

Sexta menor - 4 tons


Sexta maior - 4 tons e 1/2

Sétima menor - 5 tons


Sétima maior - 5 tons e 1/2

Oitava justa - 6 tons

Exemplos
5

Os intervalos podem aparecer melodica ou harmonicamente, isto não


interfere na sua classificação.

Quanto aos intervalos aumentados e diminutos, a regra é a seguinte:

• Quando se aumenta em 1/2 tom um intervalo Justo ou Maior o


intervalo passa a ser chamado de aumentado.

• Quando se diminui em 1/2 tom um intervalo Justo ou menor o


intervalo passa a ser chamado de diminuto.

Exemplos

Inversão de intervalos

A inversão de um intervalo ocorre quando trocamos a posição das


mesmas notas de modo que a nota que estava mais aguda passa a ser mais
grave em relação a outra.

3 menor 6 maior 5 justa 4 justa

Quando um intervalo é invertido resulta que:

• Um intervalo Maior quando invertido passa a ser Menor e vice-versa.

• Um intervalo Justo quando invertido continua sendo Justo.

• Um intervalo Aumentado quando invertido passa a ser Diminuto e vice-versa.

• A soma numérica entre o intervalo e sua inversão sempre vai resultar em 9.


6

Deste modo a inversão de um intervalo de 2 maior é 7 menor. Veja alguns


exemplos abaixo. (obs: J= justo, M= maior, m= menor, A= aumentado, D=
diminuto)

Podemos concluir o seguinte:

(um é inversão do outro)


2 7

3 6

4 5

Escalas

As escalas surgiram em diversas culturas e estão presentes nas mais


variadas manifestações artísticas no mundo todo. Elas são uns dos elementos
fundamentais na organização sonora e, consequentemente, na criação artística.
Na cultura ocidental, a forma de composição e utilização destas escalas foi
sendo modificada ao longo do tempo, possibilitando o surgimento de diversos
sistemas de organização e estruturação musical. O que define uma escala é a
forma como as notas são organizadas em relação a uma nota específica, que
lhe serve como referência. Esta nota específica é conhecida também como
tônica da escala. Iremos abordar apenas as principais escalas presentes na
música tonal e modal, pois na música popular estes são os sistemas de
organização sonora mais comumente utilizados.
As escalas que serão abordadas são as seguintes:
• Escala maior
• Escala menor (natural, harmônica e melódica)
• Escalas modais
Todas estas escalas mencionadas acima são de 7 notas. Existem
várias escalas com vários números de notas que, porém, não serão
abordadas aqui.
7

Escala Maior

A escala maior é estruturada da seguinte forma:

1º nota 2º nota 3º nota 4º nota 5º nota 6º nota 7º nota 8º nota


da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

Sendo assim se estabelecermos a nota Ré como tônica teremos as


seguintes notas para formar a escala de Ré maior:

A de Dó maior fica assim:

A de Fá maior fica assim:

Conseqüentemente os intervalos que cada nota forma com a tônica são


os seguintes:

T 2M 3M 4J 5J 6M 7M 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom
8

Escala Menor

A escala menor aparece de três formas, menor natural, menor


harmônica e menor melódica. Das três, a menor natural serve como
referência sendo as outras duas uma variação da primeira.

Menor natural

1º nota 2º nota 3º nota 4º nota 5º nota 6º nota 7º nota 8º nota


da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

Menor harmônica - a sétima nota é auterada 1/2 tom acima em relação a natural.

1º nota 2º nota 3º nota 4º nota 5º nota 6º nota 7º nota 8º nota


da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 + 1/2 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom 1/2 Tom

Menor melódica - a sexta e a sétima são auteradas 1/2 tom acima em relação a natural. (Obs:
ela só tem esta estrutura quando tocada no sentido ascendente. Quando ela é tocada no sentido
descendente sua estrutura volta a ser iqual a da menor natural)

1º nota 2º nota 3º nota 4º nota 5º nota 6º nota 7º nota 8º nota


da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala da escala
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

Sendo assim se estabelecermos a nota Ré como tônica teremos as


seguintes notas para formar a escala de Ré menor natural, harmônica e
melódica respectivamente:

menor natural

menor harmônica

menor melódica
9

Conseqüentemente os intervalos que cada nota forma com a tônica são


os seguintes:

menor natural

T 2M 3m 4J 5J 6m 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

menor harmônica

T 2M 3m 4J 5J 6m 7M 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 + 1/2 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom 1/2 Tom

menor melódica

T 2M 3m 4J 5J 6M 7M 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

As Escalas Modais

As escalas modais (ou modos) deram origem às escalas maiores e


menores vistas anteriormente. Ao todo temos sete escalas modais e cada uma
delas tem um nome grego. Estas escalas formam a base da criação musical
dentro de um sistema chamado modal. As escalas maiores e menores, vistas
anteriormente, são a base de outro sistema de organização musical chamado
de tonal. Para maiores esclarecimentos sobre estes sistemas recomendamos
que o leitor consulte um bom livro sobre história da música ocidental.
Duas das escalas modais são exatamente iguais às escalas maior e
menor natural. As outras têm apenas uma nota que a difere destas duas
escalas (com exceção de um dos modos que tem duas notas que o difere). Esta
nota é chamada de nota característica do modo. Veja a seguir o nome e a
característica de cada uma das escalas modais.
10

modo Jônico - Ele é exatamente igual a escala maior.

T 2M 3M 4J 5J 6M 7M 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

modo Dórico - Ele é igual a escala menor natural com exceção de uma nota, a 6M

T 2M 3m 4J 5J 6M 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

modo Frígio - Ele é igual a escala menor natural com exceção de uma nota, a 2m.

T 2m 3m 4J 5J 6m 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

modo Lídio - Ele é igual a escala maior com exceção de uma nota, a 4A.

T 2M 3M 4A 5J 6M 7M 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

modo Mixolídio - Ele é igual a escala maior com exceção de uma nota, a 7m.

T 2M 3M 4J 5J 6M 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

modo Eólio - Ele é exatamente igual a escala menor natural.

T 2M 3m 4J 5J 6m 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom
11

modo Lócrio - Ele é o único modo que têm duas notas características, a 2m e a 5D. O resto é
igual a escala menor natural.

T 2m 3m 4J 5D 6m 7m 8J
(Tônica) (Tônica)

1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom 1 Tom


1/2 Tom 1/2 Tom

Veja abaixo um exemplo dos sete modos tendo a nota Dó como a tônica
da escala.

modo Jônico

modo Dôrico

modo Frígio

modo Lídio

modo Mixolídio

modo Eólio

modo Lócrio
12

Os Acordes e o Campo Harmônico

Os acordes são formados pela sobreposição de notas. Esta sobreposição


não é feita de qualquer maneira. A construção dos acordes é feita pela
sobreposição de notas musicais em relação intervalar de terças. Isto significa
que se pegarmos uma nota qualquer e introduzirmos uma outra nota terça
acima e depois introduzirmos outra nota terça acima desta última, isto resultará
em um acorde de três notas ao qual chamamos de Tríade. Veja o exemplo
abaixo:

Nota Lá
Nota Sol (Terça acima do fá)
(Terça acima do mi)
Nota Fá
Nota Mi (Terça acima do ré)
(Terça acima do dó)
Nota Ré
Nota Dó (Fundamental)
(Fundamental)

Se acrescentarmos mais uma terça acima da última nota da tríade


teremos um acorde de quatro notas ao qual chamamos de Tétrade.

Nota Si Nota Dó
(Terça acima do sol) (Terça acima do lá)

Nota Sol Nota Lá


(Terça acima do mi) (Terça acima do fá)

Nota Mi Nota Fá
(Terça acima do dó) (Terça acima do ré)

Nota Dó Nota Ré
(Fundamental) (Fundamental)

Consequentemente os intervalos formados por cada nota do acorde em


relação à fundamental são os seguintes:

Tríades Tétrades

Sétima
Quinta Quinta
Terça Terça
Fundamental Fundamental
13

Porém uma questão é levantada: Qual o tipo de terça, qual o tipo de


quinta e qual o tipo de sétima (no caso das tétrades) são usados para a
construção do acorde? A este questionamento temos a seguinte resposta:

Tipos de intervalos usados na construção de acordes

7M ou 7m ou 7D

5D ou 5J ou 5A

3M ou 3m

F(fundamental)

Com isso surgiu 4 tipos básicos de tríades e 5 tipos básicos de tétrades


que são os seguintes:

Tríade maior Tríade menor Tríade diminuta Tríade aumentada

5J 5J 5D 5A
3M 3m 3m 3M
F F F F
exemplos tendo o Dó como Fundamental

Tétrade maior Tétrade maior Tétrade menor Tétrade menor Tétrade diminuta
com 7M com 7m com 7m com 7m e 5D
(conhecido
também como
meio-diminuto)

7M 7m 7m 7m 7D
5J 5J 5J 5D 5D
3M 3M 3m 3m 3m
F F F F F
exemplos tendo o Dó como Fundamental
14

As cifras

Faz parte da prática comum na música popular a harmonia ser indicada


por cifras. Cada um dos tipos de acordes vistos anteriormente têm uma cifra
correspondente. Cada número e letra da cifra são indicações da constituição do
acorde. Veja a seguir o que significa cada um desses elementos que formam as
cifras.

Fundamental do acorde

A B C D E F G
lá si dó ré mi fá sol

Tipo de Terça

• Quando a terça do acorde é menor, a letra que representa a fundamental é seguida


de um "m" minúsculo.

• Quando a terça do acorde é Maior, a letra que representa a fundamental não é


seguida por nenhuma letra específica.

Tipo de Quinta

• Quando a Quinta do acorde é diminuta, ela é indicada na cifra com um (b5).

• Quando a Quinta do acorde é aumentada, ela é indicada na cifra com um (#5).

• Quando a Quinta do acorde é Justa, nada é indicado na cifra.

Tipo de Sétima

• Quando a Sétima do acorde é Maior, ela é indicada na cifra com um 7M.

• Quando a Sétima do acorde é Menor, ela é indicada na cifra com um 7.

• A sétima diminuta só aparece na tétrade diminuta. O símbolo que representa este tipo de
acorde é uma pequena bola no lado direito da cifra. (por exemplo: Cº)

Deste modo temos as seguintes cifras para cada tipo de acorde (será
usada a nota dó como exemplo de fundamental dos acordes).

Tríades
C Cm Cm(b5) C(#5)
Dó maior Dó menor Dó menor com quinta Dó com quinta
diminuta aumentada
Trétrades
C7M C7 Cm7 Cm7(b5) Cº
Dó maior com Dó maior com Dó menor com Dó menor com Dó diminuto
sétima maior sétima menor sétima menor sétima menor e
quinta diminuta
(ou dó meio-
diminuto)
15

Outros exemplos

C# Dó sustenido maior

Dm Ré menor

F#m7 Fá sustenido menor com sétima menor

Am7(b5) Lá menor com sétima menor e quinta diminuta

Gb(#5) Sol bemol maior com a quinta aumentada

E7 Mi maior com sétima menor

D7M Ré maior com sétima maior

Fº Fá diminuto (tétrade)

As notas de tensão ou tensões disponíveis

As notas de tensão ou tensões disponíveis são notas que podem ser


acrescentadas aos acordes básicos vistos anteriormente, enriquecendo o som
destes mesmos acordes sem mudar seu valor funcional básico. Estas notas
também surgem a partir da sobreposição de terças. Veja o exemplo abaixo:

13 (nota de tensão)

11 (nota de tensão)

9 (nota de tensão)

Fundamental
16

De acordo com Sérgio Freitas em seu trabalho Teoria da Harmonia


aplicada à música popular (1996) temos o seguinte:

" O termo " Dissonância" é evitado no jargão atual da música


popular, pelas conotações que lhe são tradicionalmente atribuídas; a
valoração das notas mudou muito e o termo "Tensão Disponível" é aceito
com mais facilidade para tratar de sons absorvidos e assimilados e
portanto, cheios de qualidades totalmente "consonantes" na atual prática
harmônica. O gradual alcance de estatuto de Tensão Disponível, e
portanto, de nota liberada para o uso, que os sons não pertencentes ao
acorde adquiriram, se processou ao longo de um período assistemático, de
prática heterogênea e circunstancial, onde as notas auxiliares foram
ganhando espaço, aumentaram de duração, passaram a acontecer com
maior freqüência e ousadia nos tempos fortes, deixaram de ser preparadas
e resolvidas e foram inovadoramente ficando no acorde.(...) a tensão está
para a função apenas como um complemento, um adicional que intensifica
e destaca, mas não altera ou modifica, uma atribuição harmônica já
definida."

As notas de tensão são indicadas na cifra da seguinte forma:

(9) = Nona maior (2M)


(b9) = Nona menor (2m)
(#9) = Nona aumentada (2A)
(11) = Décima primeira justa (4J)
(#11) = Décima primeira aumentada (4A)
(13) = Décima terceira maior (6M)
(b13) = Décima terceira menor (6m)
Obs: Com relação a 6 (sexta maior), ela será abordada mais adiante.

Para cada tipo de acorde básico temos um conjunto de tensões


disponíveis. Veja o quadro abaixo:

Acordes Básicos Tensões Disponíveis


X7M (9) (#11) "6"
X7 (9),(b9),(#9) (#11) (13),(b13)
Xm7 (9) (11) "6"
Xm7(b5) (9) (11) (b13)
Xº (Qualquer nota um tom acima de qualquer uma das notas do acorde)

Os acordes do tipo X7M e Xm7 são acordes que podem ter a Sétima
substituída pela Sexta maior (6). Estas notas são intercambiáveis, podendo
aparecer uma no lugar da outra, mas pode, também, aparecer a sexta e a
sétima juntas. Nos demais acordes a sétima não pode ser substituída pela
sexta pois eles perderiam suas características funcionais, por isso para estes
acordes convencionou-se utilizar o termo (13) ou (b13) para representar o
acréscimo de uma sexta maior ou menor no acorde.
O acorde do tipo X7M pode, eventualmente, aparecer com a quinta
aumentada (#5), e o acorde do tipo X7 pode aparecer com a (#5) ou (b5).
17

Exemplos

C7M(9) Dó maior com sétima maior e nona

Fº(b13) Fá diminuto com décima terceira menor

D7(b9) Ré maior com sétima menor e nona menor

Am6 Lá menor com sexta

Bb7(#5) Si bemol maior com sétima menor e quinta aumentada

E7(9) Mi maior com sétima menor e nona maior

Db6 Ré bemol maior com sexta

C7(13) Dó maior com sétima menor e décima terceira maior

Disposição e inversão dos acordes básicos

Os acordes indicados pelas cifras podem aparecer em qualquer


disposição, não alterando desta forma, a progressão harmônica. Veja o
exemplo abaixo:

Exemplo: Algumas disposições para o acorde de C7M(9)

Perceba no exemplo acima que a nota Dó é a nota mais grave em todos


os exemplos. Quando pretende-se colocar uma das outras notas do acorde no
baixo (nota mais grave), este acorde é chamado de invertido. Na cifra a
inversão é indicada da seguinte maneira:

C7M/E Dó maior com sétima maior e com o mi no baixo

Iremos abordar mais detalhadamente a inversão de acordes no capítulo


"encadeamento de acordes".
18

O Campo Harmônico Diatônico

O campo harmônico diatônico é o conjunto de acordes gerados a partir


da sobreposição de terças sobre cada uma das notas da escala. Estes acordes
constituem um "vocabulário" básico para a estruturação harmônica da música
dentro do sistema tonal.
Ao utilizarmos a escala maior como base temos o que é chamado de
"Campo Harmônico Diatônico Maior". Veja abaixo o campo harmônico diatônico
de dó maior.

Tríades

C Dm Em F G Am Bm(b5)

Tétrades

C7M Dm7 Em7 F7M G7 Am7 Bm7(b5)

Se utilizarmos a escala de ré maior, ou de mi maior, ou qualquer outra


escala maior, os tipos de acorde que foram formados no exemplo acima se
repetem. Deste modo iremos representar o campo harmônico utilizando
números romanos.

Tríades

I IIm IIIm IV V VI VIIm(b5)

Tétrades

I7M IIm7 IIIm7 IV7M V7 VI7M VIIm7(b5)

A partir do campo harmônico podemos entender melhor um outro


conceito muito importante na música tonal chamado de "Funções harmônicas".
De acordo com Sérgio Freitas temos o seguinte:

" As funções estão para a harmonia como classes gramaticais,


como tipos de categorias que se diferenciam segundo suas características
particulares de sonoridade e de suas capacidades de expressão no
desenrolar do fato harmônico. Na definição, atribuição, sistematização e
entendimento das aplicações destas funções harmônicas, um critério
19

possível, é o de uma organização embasada na dualidade conceptual de


repouso/movimento."

Com isso surgiu três classes funcionais básicas: a "Tônica", a


"Dominante" e a "Subdominante". Sobre isto Sérgio Freitas escreve o seguinte:

" A teoria funcional , para a qual só existem três classes de


funções harmônicas, entende que para o polo conceptual "repouso" a
função harmônica correspondente é a da Tônica, termo de domínio que
implica na ausência do "movimento". No outro extremo, em contradomínio
que implica no abandono de um estado de repouso, após uma cuidadosa e
histórica observação sobre as características principais do "movimento",
estabeleceu-se a subdivisão em dois sub-movimentos. Um primeiro, de
"afastamento do repouso", correspondente à função harmônica de
Subdominante e um segundo, de "aproximação do repouso",
correspondente à função harmônica de Dominante."

Deste modo os acordes do campo harmônico maior foram agrupados de


acordo com suas funções. Veja o quadro abaixo:

Função Tônica Função Subdominante Função Dominante


I III VI II IV V7 VII
ausência da quarta nota da presença da quarta nota da presença da quarta nota da
escala (nota fá em dó maior) escala e ausência da sétima nota escala e da sétima nota da escala
da escala(nota si em dó maior)

Sobre este agrupamento Sérgio Freitas escreve o seguinte:

"É importante destacar no entanto que, o estabelecimento de


convencionalismos sintático-semânticos desta ordem de grandeza são,
antes de tudo, resultados de processos culturais extremamente complexos.
Assim, por mais que os argumentos lógico-explicativos forjados pelas
teorias da harmonia sejam convincentes, interessantes e úteis na
explicação desta matéria, seria uma ingenuidade histórica o não admitir
aprioristicamente, que esta hierarquia funcional dos graus da escala, tem
origem primeira em um acordo técnico e estético que se estabeleceu ao
longo da história da prática de música harmônica. A classificação funcional
dos acordes do campo harmônico diatônico é uma conquista cultural, se
estabeleceu no uso, possui uma etimologia totalmente empírica, vivenciada
e experimentada. É resultado - hoje normatizado e metodologicamente
elaborado - de uma intuição e fazer coletivos, exercitados pelos músicos ao
longo dos muitos anos de prática tonal."

O campo harmônico diatônico menor é construído a partir das três


escalas menores. Veja a seguir o campo harmônico diatônico menor de dó.
20

Tríades

Menor
Natural

Cm Dm(b5) Eb Fm Gm Ab Bb

Menor
Harmônica

Cm Dm(b5) Eb(#5) Fm G Ab Bm(b5)

Menor
Melódica

Cm Dm Eb(#5) F G Am(b5) Bm(b5)

Tétrades

Menor
Natural

Cm7 Dm7(b5) Eb7M Fm7 Gm7 Ab7M Bb7

Menor
Harmônica

Cm(7M) Dm7(b5) Eb7M(#5) Fm7 G7 Ab7M Bº

Menor
Melódica

Cm(7M) Dm7 Eb7M(#5) F7 G7 Am7(b5) Bm7(b5)

Na prática, os acordes que são utilizados mais comumente e que


representam uma "síntese" da tonalidade menor são os seguintes:

Tríades

Im IIm(b5) bIII IVm V bVI bVII


bIII(#5) IV VIIm(b5)

Tétrades

Im7 IIm7(b5) bIII7M IVm7 V7 bVI7M bVII7


Im(7M) bIII7M(#5) IV7 VIIº
21

Deste modo, o quadro das funções harmônicas para os acordes da


tonalidade menor fica da seguinte forma:

Função Tônica Função Subdominante Função Dominante


I bIII IIm(b5) IV(menor ou maior) V7 VIIº
bVI bVII
ausência da sexta menor da presença da sexta nota da escala presença da quarta nota da
escala (nota lab em dó maior) (nota lab ou la em dó maior) escala e da sétima nota da escala
menor harmônica (fá e si natural
em dó)

Com isso encerramos esta revisão dos principais elementos básicos ao


qual o arranjador precisa dominar para desenvolver de uma maneira mais
fluente o seu ofício.
22

A Voz

Ao escrever um arranjo é importante conhecer as características e as


limitações do(s) instrumento(s) que será utilizado para execução deste arranjo.
No nosso caso este instrumento é a voz. Cada ser humano tem a sua própria
voz com as suas próprias peculiaridades, porém convencionou-se agrupar esta
infinidade de tipos vocais em seis grupos básicos. Cada um destes grupos têm
suas características e propriedades. São eles:

• Soprano Agudo

Vozes Femininas • Meio-soprano


• Contralto
• Tenor
Vozes Masculinas • Barítono
• Baixo Grave

Extensão e Tessitura

Em cada tipo vocal encontramos um conjunto de notas delimitado pela


nota mais grave e pela nota mais aguda que lhe é possível emitir. Este conjunto
é chamado de extensão. Segundo Eládio Perez-González em seu livro
Iniciação a Técnica vocal, "Uma voz cultivada tem geralmente duas oitavas"
(2000, p122). Veja, abaixo, a extensão de cada uma das vozes.

Extensão

• Soprano →

• Meio-soprano →

• Contralto →
Observação: Apesar da
melodia do Tenor ser escrita
• Tenor → na Clave de Sol, o som real
que é emitido está uma oitava
abaixo.

• Barítono →

• Baixo →
23

Extensão das vozes no piano

Soprano
Meio-soprano
Contralto
Tenor
Barítono
Baixo

Dó 3
(Dó Central)

ou

É importante considerar que esses limites não podem ser aplicados para
todos os cantores pois a extensão individual pode variar muito, mesmo em
pessoas com a mesma classificação vocal.
Tessitura é o conjunto de notas que é emitido confortavelmente e com
maior homogeneidade. Geralmente a tessitura tem um alcance de uma décima
(uma oitava + uma terça).

Tessitura das vozes

• Soprano (mi 3 ao sol 4) • Meio-soprano (dó 3 ao mi 4) • Contralto(lá 2 ao dó 4)

Tessitura

Extensão

• Tenor (mi 2 ao sol 3) • Barítono (dó 2 ao mi 3) • Baixo (fá 1 ao dó 3)


24

Nota de cobertura e registro vocal

Quando se está cantando um conjunto de notas na região grave e estas


notas vão subindo para região aguda ocorre, em um determinado momento, o
que é chamado de fenômeno de cobertura. Este fenômeno acontece devido a
contração súbita do músculo cricotireóideo (que é o músculo esticador das
pregas vocais). As cordas ficando mais esticadas apresentam maior superfície
ao estímulo nervoso e, consequentemente, a voz pode continuar subindo sem
machucar a laringe. A nota ao qual, a partir dela, ocorre este fenômeno é
chamada de nota de cobertura. Esta nota é diferente para as vogais abertas
(A, É, Ó) e para as vogais fechadas (U, Ô, Ê, I). Cada uma das vozes tem a sua
nota de cobertura característica. As conseqüências em relação ao timbre é que
após a cobertura ocorre uma descontração da laringe e, com isso, ela desce
alguns milímetros, sendo assim, há um reforço dos harmônicos graves e isto faz
com que o timbre fique mais "profundo" e mais "escuro", daí o nome de
cobertura.

Nota de cobertura

Vogais Vogais
Fechadas Abertas

• Soprano • Tenor
A partir desta nota
ocorre a cobertura

• Meio-soprano • Barítono

• Contralto • Baixo

O registro vocal define em qual região do nosso corpo (tórax ou


cabeça) vai ocorrer a vibração mais significativa no momento da emissão
sonora. Quando estamos no chamado "registro de peito" os harmônicos graves
serão valorizados e quando estamos no "registro de cabeça" os harmônicos
agudos serão valorizados. Segundo Eládio Pérez-González "Partindo do registro
de peito, com vibração torácica, a partir de uma determinada nota, essa voz
passa para o registro de cabeça. (...)na mudança de registro todas as vogais,
abertas e fechadas, passam do registro de peito para o de cabeça" (2000, p79).

Mudança de registro
(Nas vozes masculinas ela ocorre uma oitava abaixo do que está indicado)
• Soprano e Tenor • Meio-soprano e Barítono • Contralto e Baixo
25

Observações

• Num coro misto tradicional as vozes são agrupadas em Soprano, Contralto,


Tenor e Baixo. De um modo geral os meio-sopranos cantam junto com os
contraltos e os barítonos junto com os baixos. Pode existir casos em que alguns
meios-sopranos estejam cantando no naipe dos sopranos e alguns barítonos no
naipe dos tenores, porém, não é o mais comum.

• A extensão mais utilizada para a escrita coral é a seguinte:

Soprano

Contralto

Tenor

Baixo

• Ao escrever um arranjo para um grupo específico, seja ele um coro, um


quarteto, um quinteto, um octeto, etc, é importante que o arranjador conheça
bem as características e as limitações deste mesmo grupo, tais como timbre,
afinação, nível técnico, extensão e tessitura específica e tantas outras
características que forem relevantes para um bom desempenho na hora de
executar a peça.

• Fazer com que a linha melódica de cada voz fique dentro da tessitura e em
torno da região central, se possível. Se ela fica muito próxima do limite grave a
voz perde volume e a projeção pode ficar comprometida. Quando ela fica
próxima do limite agudo há um desgaste muito grande e dificulta, em alguns
casos, a afinação e a homogeneidade do timbre. Nos casos onde mais de um
tipo de voz executa a mesma melodia, procure trabalhar com as notas comum
a tessitura de ambas, quando isto não for possível procure trabalhar com a
tessitura mais grave, pois diminui os riscos de danificar a voz.

• A sonoridade é, também, um fator importante na hora de escolher a região


(grave, média ou aguda) das notas que cada voz irá executar. As vezes o ideal
em termos de conforto vocal é sacrificado em favor de uma sonoridade
pretendida. Quando isto acontecer é preciso tomar muito cuidado para não
fazer algo que posteriormente não possa ser executado.
26

Movimento entre as vozes

Na realização da escrita à duas ou mais vozes surge uma seqüência de


intervalos formados pelas notas presentes nas melodias. A forma como estes
intervalos se relacionam define o tipo de movimento que ocorre entre as vozes,
que são os seguintes:

Movimento Contrário

Ocorre quando as vozes se movimentam em direção contrária.

Este é o movimento que permite maior "independência" e "contraste". É


considerado por alguns autores o ideal de "equilíbrio".

Movimento Oblíquo

Ocorre quando uma voz se movimenta e a outra permanece fixa.

Este movimento permite um certo "contraste" e uma certa


"independência" , porém não igual ao movimento contrário.
27

Movimento Direto

Ocorre quando as vozes se movimento na mesma direção, mas não


conservam os mesmos intervalos entre si.

Diminui bastante o nível de "contraste" e "independência". Procura-se


evitar as quintas e oitavas diretas principalmente entre as vozes extremas( a
mais aguda e a mais grave), porém há situações em que é muito difícil evitá-
las. Quando isto ocorrer procure utilizar com moderação.

quintas e oitavas diretas

Movimento Paralelo

Ocorre quando as vozes se movimentam na mesma direção e conservam


o mesmo intervalo.

É o movimento com menor nível de "contraste" e "independência", por


isso neste movimento são evitadas as chamadas consonâncias perfeitas
(oitavas e quintas justas) pois elas "fundem" ainda mais as vozes.
28

Análise dos movimentos

Numa escrita a três ou mais vozes é preciso analisar todas as


combinações de movimentos que ocorrem simultaneamente entre todas as
vozes envolvidas. Esta análise deve ser feita ao longo de todo o arranjo para
evitar situações indesejadas. Veja no exemplo abaixo um trecho de um arranjo
para coro misto a Capella feito a partir de uma música de Villa-Lobos chamada
Cantilena nº3. É preciso analisar os movimentos entre Soprano e Contralto,
Soprano e Tenor, Soprano e Baixo, Contralto e Tenor, Contralto e Baixo, Tenor
e Baixo. Observe os vários tipos de movimento que ocorre simultaneamente ao
longo da peça. Para uma visualização mais fácil vamos destacar apenas os
movimentos que ocorrem na passagem do penúltimo compasso para o último.

Arranjo: Carlos Menezes Júnior

• Entre Soprano e Contralto → Movimento Contrário


• Entre Soprano e Tenor → Movimento Oblíquo
• Entre Soprano e Baixo → Movimento Contrário
• Entre Contralto e Baixo → Movimento Direto
• Entre Contralto e Tenor → Movimento Oblíquo
• Entre Tenor e Baixo → Movimento Oblíquo
29

Análise Melódica

Ao observar a melodia e a harmonia de uma determinada música pode-


se notar que cada nota da melodia têm uma relação com o acorde onde ela
está inserida. Descobrir e entender esta relação é o objetivo da análise
melódica. Se observarmos, por exemplo, um trecho da melodia da música Asa
Branca de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira temos o seguinte:

Esta nota é a Quinta

Esta nota é a Terça do Esta nota é a


acorde de Dó maior Fundamental do
acorde de Fá maior

É muito importante para o arranjador identificar esta relação entre os


acordes e a melodia pois ao escrever as outras vozes ele saberá quais notas
serão importantes para que se perceba o discurso harmônico da música.
Cada nota acaba cumprindo uma determinada função melódica. Com
isso podemos, basicamente, dividir estas notas em dois tipos funcionais, que
são os seguintes:

• Notas que têm uma função estrutural em relação a harmonia. São


as notas das tríades ou tétrades ou notas de tensão. Estas notas além
de terem uma importância na horizontal, elas também têm uma
importância na vertical. Elas são conhecidas como "notas reais" ou
"notas da Harmonia".

• Notas que não têm uma função estrutural em relação a harmonia.


Elas cumprem uma função ornamental dentro da construção
melódica. São notas que não pertencem ao acorde, contudo, não
interferem na harmonia. Sua importância é apenas na horizontal e
acabam servindo de "enfeite" para as "notas reais". São conhecidas
como "notas estranhas ao acorde" ou "notas melódica" ou "notas
auxiliares" e tantos outros nomes que serão abordados
posteriormente.
30

Notas Reais

Como já foi dito anteriormente, as notas reais são as notas que também
fazem parte da harmonia. Elas podem ser notas do acorde, seja tríades ou
tétrades, ou notas de tensão. Veja no exemplo abaixo a análise melódica de um
trecho da música A Paz de Gilberto Gil e João Donato.

6M 3M e 5J Fundamental, 3m e 7m Fundamental
(nota de tensão) (notas da tríade) (notas da tétrade) síncopa
( adiantou o acorde)

Observe que as notas que aparecem na melodia acima participam


diretamente da estrutura harmônica. Elas estão presentes nos acordes e
estabelecem uma relação intervalar com a fundamental de cada um destes
mesmos acordes.
Para facilitar a escrita da análise melódica iremos adotar a mesma
simbologia utilizada por Ian Guest em seu livro "Arranjo - Método Prático"
(1996), que é a seguinte:

• Quando o intervalo entre a melodia e a fundamental do acorde for


2M (Segunda Maior), 3M, 4J, 5J, 6M, 7M, ou os compostos (9M, 11J,
13M), iremos apenas indicar pelo número da seguinte forma: 2, 3, 4,
5, 6, 7, 9, etc. Quando a fundamental estiver na melodia vamos
indicar com "F".

• Quando o intervalo entre a melodia e a fundamental do acorde for


menor, diminuto ou aumentado, basta acrescentar os sinais de
alteração nos respectivos números. ex:
- 6 menor = b6;
- 11 aumentada = #11
- 3 menor = b3
- 5 diminuta = b5
Então a análise do exemplo acima ficaria da seguinte maneira:

Veja outros exemplos de análise melódica indicando apenas as notas


reais.

Exemplo A: 1º parte da música


6 Arrastão
3 5de Edu
F Lobo
b3 Fe Vinícius
b7 de Moraes.
anacruse b3 F
31

Veja outros exemplos de análise melódica indicando apenas as notas


reais.

Exemplo A: 1º parte da música Arrastão de Edu Lobo e Vinícius de Moraes.

5 b3 5 b7 5 3
F

5 b3 5 b7 5 3
F

b7 b3 5 b7 9 b7 5

Exemplo B: 1º parte da música Trem Azul de Lô Borges e Ronaldo Bastos

Síncopa

7 7 7 7 7 7 7 7 7 7 7 7
7

7 7 7 7 7 7 7 7 7 7 7 7 7

Ao fazer a análise melódica podemos entender com maior clareza como


a música foi estruturada, não só em termos de sua relação com a harmonia
mas também como os ritmos e os intervalos melódicos se apresentam nas
frases e como estas frases se relacionam entre si, com isso temos uma melhor
noção do todo. Observe que na música Arrastão a 2º frase é uma repetição
literal da 1º frase 1 tom acima, e a 3º frase é uma repetição da 1º frase uma
terça acima. No caso do Trem Azul, a melodia é construída utilizando apenas a
sétima maior de cada acorde.
32

Notas Auxiliares

São notas que estabelecem uma relação de interlocução com as notas


reais. Estas notas cumprem muito mais uma função ornamental do que
estrutural, não modificando a harmonia de um determinado trecho. Elas são
coadjuvantes dentro da construção melódica na música tonal, nem por isso
deixam de ter uma grande importância na concepção da obra musical pois
possibilitam que uma simples tríade desdobre-se em um número ilimitado de
ocorrências musicais.
As notas auxiliares também são conhecidas como "Notas estranhas ao
acorde", "Notas melódicas", "Notas de ornamentação", "Notas de figuração
melódica", "Notas acidentais", "Notas estranhas a harmonia", etc.
Saber identificar na melodia quando uma nota tem uma importância
estrutural (no que se refere a harmonia) ou ornamental é de grande proveito
para o arranjador pois ele acaba tendo uma consciência maior de como a
melodia foi construída em relação a harmonia e, ao fazer a condução das
demais vozes, terá mais parâmetros para decidir quais e como serão colocadas
as notas para que a estrutura harmônica não seja prejudicada, pois ao
comprometer esta estrutura é comprometida também a inteligibilidade da obra
como um todo.
Estas notas podem ser divididas em 6 tipos que são:
• Passagem
• Bordadura
• Apojatura
• Retardo
• Antecipação
• Escapada

Cada uma delas tem uma característica bem peculiar e técnicas


específicas de como utilizá-las sem comprometer a clareza e a fluidez do
discurso harmônico. De um modo geral são dois os principais parâmetros que
caracterizam estas notas: 1) a posição métrica (forte ou fraca) em relação a
nota real (nota do acorde); 2) como a nota é resolvida ou preparada.
33

Notas de Passagem

São notas que ligam por grau conjunto (intervalos de 2M ou 2m) duas
notas reais diferentes sendo estas do mesmo acorde ou não. Ela sempre
aparece em posição métrica fraca em relação a nota real.

nota de passagem nota de passagem

Veja um exemplo de nota de passagem presente na Suíte do Pescadores


de Dorival Caymmi.

Elas podem ser diatônicas (usando notas da tonalidade indicada) ou


cromáticas (usando notas da escala cromática) e podem aparecer em grupos de
duas ou mais.

notas de passagem
notas de passagem

Note no primeiro exemplo que considerar a nota ré como uma tensão


acrescentada ao acorde de Dó maior transformando-o em um C(9) não condiz
com o que está acontecendo em termos harmônicos pois a sonoridade não é a
de um Dó maior com nona acrescentada apesar da nota Ré aparecer durante a
execução deste acorde. O mesmo acontece com os demais acordes deste
mesmo exemplo. Esta observação vale para todas as notas auxiliares
(passagem, bordadura, apojatura, etc...). É preciso saber diferenciar quando
uma nota representa uma tensão acrescentada ou apenas uma "nota auxiliar".
Quando a nota é uma tensão ela adquire uma importância tanto melódica
quanto harmônica, fazendo parte também da estrutura vertical da música. No
caso das "notas auxiliares" sua importância é apenas na horizontal. Em
algumas músicas isto é mais evidente, porém em outras a diferença
não é tão clara e uma mesma nota pode ter várias interpretações.
34

É possível utilizar notas de passagem, simultaneamente, em duas ou


mais vozes sem comprometer a clareza harmônica. Para isto é preciso ter
alguns cuidados tais como:

• Quando utilizadas em movimento paralelo, manter entre si


intervalos de 3º e 6º.
• Quando utilizadas em movimento contrário podem manter
qualquer intervalo.
P
P

P
P

P
P
P

P P
P

Bordadura

A bordadura ocorre entre uma nota real e a sua repetição imediata. Ela
sempre aparece por grau conjunto (2M ou 2m) e em posição métrica fraca em
relação a nota real. A bordadura pode ser superior ou inferior, diatônica ou
cromática.

Bordadura

Bordadura
Bordadura
35

Alguns cuidados que se deve tomar quando for utilizar a bordadura na


condução de vozes:
• Não fazer bordadura em uníssono.

mau efeito

• Quando utilizadas simultaneamente em duas ou mais vozes


em movimento paralelo, manter entre si intervalos de 3º e 6º.

• Quando utilizadas simultaneamente em duas ou mais vozes


em movimento contrário podem manter qualquer intervalo.

A bordadura pode aparecer de forma sucessiva, ou seja, a nota superior e a


nota inferior antes da resolução na nota real.
36

Apojatura

A Apojatura é uma nota melódica que precede a nota real por grau
conjunto (2M ou 2m). É como se, momentaneamente, esta nota tomasse o
lugar da nota real para logo em seguida resolver na mesma. A apojatura ocorre
em posição métrica forte em relação a nota real. Ela pode ser superior ou
inferior, diatônica ou cromática. O valor da figura rítmica da aporjatura pode ser
maior ou menor que o valor da figura rítmica da nota real.

Apojatura
Apojatura

Apojatura Apojatura

Alguns cuidados que se deve tomar quando for utilizar a apojatura na


condução de vozes:
• Quando a nota que a apojatura está momentaneamente
substituindo aparece simultaneamente em uma outra voz uma
oitava acima o efeito não é recomendado. Não significa que
nunca possa ser usado, porém a harmonia perde um pouco a
sua clareza. Quando ela aparece uma oitava abaixo o efeito não
causa problema.

Tomar um cuidado
maior com este efeito

É mais recomendado
37

• Não é recomendado a apojatura em uníssono

Não é recomendado

• Quando utilizadas simultaneamente em duas ou mais vozes


em movimento paralelo, manter entre si intervalos de 3º e 6º.

• Quando utilizadas simultaneamente em duas ou mais vozes


em movimento contrário podem manter qualquer intervalo.

Apojaturas

A apojatura pode ser precedida por qualquer outra nota auxiliar.

Apojatura
Passagem

Entre a apojatura e a resolução podem aparecer outras notas, tanto reais


como auxiliares.
Apojatura
Apojatura

resolução
Apojatura resolução resolução
38

Retardo

O retardo é uma espécie de apojatura preparada. Ele também ocorre em


posição métrica forte em relação a nota do acorde e resolve por grau conjunto
na mesma. A diferença em relação a apojatura é que no retardo a nota é
preparada no acorde imediatamente anterior como uma consonância (nota
real). O retardo pode ser superior ou inferior, diatônico ou cromático. Entre o
retardo e sua resolução também podem aparecer outras notas intercaladas.
Todas as recomendações citadas para a apojatura valem para o retardo.

Retardo

Retardo

Antecipação

Na antecipação a nota real do próximo acorde é antecipada. É como um


"retardo" ao contrário. Ela ocorre em posição métrica fraca em relação a nota
real e pode ser alcançada por grau conjunto ou por salto.

Antecipação
Antecipação

Antecipação
39

Segundo Maria Luisa Priolli em seu livro "Harmonia - da concepção


básica a expressão contemporânea" (1986), existe também a antecipação
indireta. Ela ocorre quando uma nota do próximo acorde é antecipada mas a
resolução ocorre em outra nota do acorde.

Antecipação indireta

Deste modo numa condução de vozes, uma voz pode antecipar a nota de
outra voz.

Para outros autores a antecipação indireta é chamada de escapada,


porém para a autora existe uma distinção entre antecipação indireta e
escapada. Esta distinção será abordada logo em seguida.

Escapada

Maria Luisa Priolli escreve em seu livro o seguinte: "Embora seja uso
chamar a antecipação indireta de escapada, esta denominação é indevida, pois
a verdadeira escapada não antecipa nota alguma, uma vez que, a autêntica
escapada é estranha ao acorde imediatamente àquele em que ela se encontra"
(1986). Com isso a escapada é uma nota que não pertence nem ao acorde em
que ela está inserida e nem ao acorde posterior. Ela ocorre em posição métrica
fraca em relação a nota real e pode ser alcançada por grau conjunto e resolvida
por salto, ou alcançada por salto e resolvida por grau conjunto.

Escapada
40

A escapada pode ocorrer de forma sucessiva.

Escapadas sucessivas

• Quando utilizadas simultaneamente em duas ou mais vozes


em movimento paralelo, manter entre si intervalos de 3º e 6º.

Observações Finais

Para facilitar a escrita da análise melódica iremos adotar a seguinte


simbologia:

• Nota de Passagem = P
• Bordadura = B
• Apojatura = Ap
• Retardo = R
• Antecipação = An
• Escapada = E

Estes termos e definição sobre as notas auxiliares não são um consenso


entre os teóricos. Podemos encontrar nos vários livros de harmonia e teoria
musical nomes diferentes para a mesma situação ou nomes iguais para
situações distintas. Deste modo, quando uma análise é feita, pode ocorrer
diferentes interpretações sobre determinadas notas. Mais importante do que
classificar as notas quanto ao seu tipo é a possibilidade de entender com maior
clareza como a melodia é conduzida e estruturada ao longo do tempo e qual é
o sentido sonoro que estes conjuntos de notas têm.
41

Exemplos

Exemplo 1: 1º parte da música Oceano de Djavan

5 F 7 P 9 F b7 b13 b5 P An
5 b3 F

F P b3 5 Ap b3 5 E An F

5 P b7 13 5 B b3 5 F F 13
b7
sincopa

Exemplo 2: 1º parte da música Mesmo de Brincadeira do 14 Bis.

F 5 F An B F An 3 F 5 Ap b3 3 Ap F 3 F F

3 F 5 F 3 An b3 An
P b7 F P b7

b3 An b3 Ap F b7 b3 P 3 Ap 5 3 Ap F 5
42

Encadeamento de acordes

A progressão harmônica é um dos principais elementos que definem a


própria música tonal. A forma como esta progressão é conduzida através das
vozes é o que chamamos de encadeamento. Na prática da música tonal através
da sua história foi sendo construído um conjunto de procedimentos voltados
para desenvolvê-la e aprimorá-la, resultando em um conjunto de técnicas que
poderiam ou não serem utilizadas pelos compositores na criação de suas obras.
Neste capítulo estudaremos uma destas técnicas que já faz parte da prática
comum da música tonal. Tão importante quanto saber quais notas devem ser
usadas para formar determinado acorde é saber como estas notas estão
dispostas ao longo de uma progressão harmônica, pois em um arranjo vocal, as
vozes irão executar melodias simultâneas e a construção destas melodias
depende diretamente de como os acordes estão sendo encadeados. Estas
técnicas foram extraídas dos livros tradicionais de harmonia, que foram escritos
dentro de um determinado contexto histórico da música ocidental. É preciso
ficar claro que o estudo destas técnicas tem como objetivo dar uma noção
básica de como o encadeamento é praticado de uma forma geral. Não significa
que em um arranjo vocal é preciso seguir "a risca" os procedimentos aqui
abordados, eles servirão apenas como uma referência ao qual, a partir deles,
possamos ter parâmetros para melhor decidir que caminho escolher.
Por uma questão didática iremos dividir este estudo em quatro partes:
1º) Encadeamento de acordes com nota em comum
2º) Encadeamento de acordes sem nota em comum
3º) Encadeamento do acorde de Dominante com Sétima (V7)
4º) Inversões

Todos os encadeamentos serão para quatro vozes, sendo elas Soprano,


Contralto, Tenor e Baixo. Os limites de extensão impostos para cada vozes será
o mesmo adotado para a escrita coral. A distância entre as vozes adjacentes
não deve passar de uma oitava com exceção do baixo, ou seja, entre o naipe
de soprano e contralto e entre o naipe de contralto e tenor não deve ter uma
distância superior a uma oitava, entre o naipe de tenor e baixo este limite pode
ser excedido.

não é recomendado não é recomendado aceitável


43

Encadeamentos de acordes com nota em comum

Neste momento iremos trabalhar apenas com acordes no estado


fundamental. Significa que o baixo irá cantar apenas a nota fundamental de
cada acorde. A regra básica muito utilizada na prática comum da música tonal é
a seguinte:

• A nota ou as notas comuns aos dois acordes se repetem na mesma


voz, o restante se movimenta para as notas mais próximas.

nota comum

notas comuns

• Duplicar apenas a fundamental, de preferência, ou a quinta. Evite


duplicar a terça.

• Quando as vozes se movimentam para a nota mais próxima pode


ocorrer, em algumas delas, duas opções de notas iqualmente próximas. Neste
caso escolha aquela que faça com que o conjunto das outras vozes se
movimente menos. Por exemplo, na progressão acima, no quarto compasso
onde aparece o Cm, o naipe do contralto está cantando a nota sol. A próxima
nota pode ser ou o lá ou o fá. Se a opção fosse o fá, o tenor teria que saltar
uma quarta para alcançar o lá. Esta não seria a melhor opção.

Se o contralto for para o fá, o


tenor terá que ir para o lá. Melhor opção
Não é a melhor opção
44

Encadeamentos de acordes sem nota em comum

No encadeamento de acordes que não têm notas em comum a regra


básica é a seguinte:

• As três vozes superiores (soprano, contralto e tenor) movem-se em


direção oposta ao movimento do baixo, sempre buscando as notas de maior
proximidade.

Veja abaixo o encadeamento de acordes com e sem notas em comum.

Encadeamento do acorde de dominante com sétima (V7)

O acorde de dominante com sétima é o acorde que aparece no V grau


do campo harmônico maior e menor com a sétima menor acrescentada (V7).
Na harmonia tradicional, este acorde têm um tratamento especial, pois a sétima
menor acrescentada a um acorde maior faz surgir um trítono (quarta
aumentada ou quinta diminuta) entre a terça e a sétima do acorde. Este
intervalo é considerado bastante "dissonante" ao longo da história da música
tonal. Esta dissonância deve ser devidamente resolvida. Com isso surgiu
algumas regras básica para o encadeamento V7 → I. Estas regras básicas são
as seguintes:
45

• A terça do V7 resolve na fundamental do I. A sétima do V7 resolve na


terça do I. A quinta do V7 resolve na fundamental do I. A fundamental do V7
quando em outra voz que não seja o baixo resolve na quinta do I. Veja o
quadro e os exemplos abaixo.

V7 I

Fund. 5J
(em outra voz sem ser no baixo)
7m 3(M ou m)
5J Fund.
3M Fund.
Fund. Fund.
(no baixo)

Exemplo 1 Exemplo 2

3 F 7 3

7 3 F
3
5 F
F 5

F F F F

Repare que no exemplo 1 o V7 está completo (F, 3, 5 e 7) e isto


resultou em um I com a fundamental triplicada e sem a quinta (F, F, 3, F). No
exemplo 2 o V7 está incompleto (F, 3, 7, F) e isto resultou em um I completo
(F, 3, 5, F). Isto ocorre no encadeamento V7→ →I de qualquer tonalidade, seja
maior ou menor. É importante lembrar que isto é um procedimento comum no
ensino da harmonia e não uma regra intransponível pois o arranjador irá lidar
com situação diversas e estas regras servirão apenas como referência.
46

O Acorde Diminuto com função Dominante

A tétrade diminuta (F, 3m, 5dim, 7dim) quando aparece numa


progressão harmônica cumprindo uma função de dominante, ela deve ser vista
como um V7(b9) sem a fundamental. Isto significa que em Dó maior as
notas do V7 são as seguintes: Sol, Si, Re, Fá. Se acrescentarmos a nona
menor e tirarmos a fundamental teremos: Si, Ré, Fá, Lab. O acorde
resultante é o Bº. As regras de resolução são as mesmas do V7, porém com o
acréscimo da nona menor que resolve na quinta do acorde de tônica.
Veja os quadros abaixo.

V 7(b9) I

b9 5J
7m 3(M ou m)
VIIº 5J Fund.
3M Fund.
Fund. Fund.
(ausente no acorde diminuto)

G 7(b9) C

Láb Sol
Fá Mi
Bº Ré Dó
Sí Dó
Sol Dó
(ausente no acorde diminuto)
47

Inversões

Quando uma das outras notas do acorde, que não a fundamental, é a


nota mais grave, temos uma inversão. No que se refere a condução de vozes,
cada tipo de inversão tem um tratamento especial, deste modo vamos dividir o
estudo deste item em três partes:
1º) A Primeira Inversão
2º) A Segunda Inversão
3º) As inversões do acorde de V7

A Primeira Inversão

Ela ocorre quando a Terça do acorde está no baixo.

• Duplicar preferencialmente a fundamental ou a quinta. Se


eventualmente a terça for duplicada procure não envolver as vozes extremas
(soprano com o baixo) e dê preferencia ao movimento contrário entre as duas
vozes envolvidas.

• Numa condução de vozes a utilização da primeira inversão possibilita a


criação de uma linha do baixo mais "melodiosa". Ela pode aparecer em
qualquer situação em que é possível o estado fundamental, sendo raro sua
utilização no final e no começo de uma música.

A Segunda Inversão

Ela ocorre quando a Quinta do acorde está no baixo.


48

• Um acorde em segunda inversão geralmente não é seguido de outro


acorde em segunda inversão.

Dois acordes consecutivos


em segunda inversão.
Geralmente isto é evitado

• O intervalo de quarta formado entre o baixo e a fundamental faz com


que esta inversão tenha um tratamento especial. Por isso evita-se, de uma
forma geral, que o baixo salte para uma segunda inversão ou salte de
uma segunda inversão. Deste modo o baixo chega e sai de uma segunda
inversão apenas por grau conjunto ou como nota repetida.

Saltou de uma segunda inversão. Saltou para uma segunda inversão.


Não é recomendado Não é recomendado

Grau conjunto. Repetição.


É recomendado É recomendado
49

Inversões do acorde de dominante com sétima (V7)

O acorde de dominante com sétima (V7) pode aparecer no estado


fundamental, na 1º inversão (terça no baixo), na 2º inversão (quinta no baixo),
ou na 3º inversão (sétima no baixo). O princípio de encadeamento é o mesmo
visto no ítem Encadeamento do acorde de dominante com sétima. Logo,
quando a Terça do V7 estiver no baixo (1º inversão) ela é resolvida na
fundamental do I, quando a Quinta do V7 estiver no baixo (2º inversão) ela
é resolvida na fundamental do I e quando a Sétima do V7 estiver no baixo
(3º inversão) ela é resolvida na Terça do I, nas 1º inversão deste.

1º inversão 2º inversão 3º inversão


50

Arranjo a duas vozes


Elaborar um arranjo a duas vozes consiste em criar uma linha melódica
que acompanhe a melodia e a harmonia da música escolhida. As possibilidades
de criação desta segunda melodia são muitas, então para facilitar o estudo
iremos agrupar em dois tipos básicos. Um deles é o que chamaremos de
Melodia em Bloco que consiste na criação de uma segunda voz com o ritmo
exatamente igual ao da melodia principal. Quando o ritmo da segunda voz for
diferente da melodia principal, criando deste modo uma certa independência
entre as duas melodias, denominaremos de Contracanto. Esta nomenclatura é
uma convenção utilizada ao longo deste trabalho. Outras definição destes
termos podem ser encontradas em trabalhos de outros autores.
Por uma questão didática iremos subdividir o arranjo a duas vozes de
acordo com o livro "ARRANJO - método prático" de Ian Guest (1996). Esta
subdivisão resulta nos seguintes tópicos:
• Contracanto Passivo
• Contracanto Ativo
• Melodia em Bloco

Contracanto Passivo

O contracanto passivo consiste em criar uma melodia cujo as notas


tenham a mesma duração do acorde em que ela está inserida. O ritmo do
contracanto segue o ritmo harmônico. Veja alguns exemplos:

Exemplo 1: Trecho da música Asa Branca de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira

Observe que o ritmo do contracanto


segue o ritmo da harmonia
51

Exemplo 2: Trecho da música Planeta Sonho do 14 Bis.

Exemplo 3: Trecho da música Vira Virou de Kleiton e Kledir.

Exemplo 4: Trecho da música Eu Sei que Vou de Amar de Tom Jobim e Vinícius de Moraes.
52

Cuidados a serem tomados na elaboração de um contracanto

• Definir a tonalidade ideal para o tipo de voz que irá cantar a melodia principal,
levando em consideração o tipo de grupo que irá interpretar (coral, quarteto
feminino, quarteto masculino, etc.) e a sonoridade pretendida (mais vibrante,
mais suave, mais escuro, mais claro, etc.). Não esquecer de escrever o
contracanto de acordo com o tipo de voz que irá cantá-lo.

• As notas utilizadas na construção do contracanto são apenas as notas do


acorde (tríades ou tétrades básicas) ou notas de tensão. A escolha destas notas
vai variar de acordo com o estilo. Na Bossa Nova, por exemplo, as tensões são
muito bem vindas, assim como as sétimas e as terças, quando for utilizar notas
do acorde (veja exemplo 4). No Sertanejo e em alguns outros estilos regionais,
geralmente não se utiliza tensões e raramente a sétima é usada (a não ser nas
dominantes), privilegiando as notas das tríades básicas (veja exemplo 1). É
importante, também, tornar o contracanto o mais "cantável" possível.

• Evitar o intervalo de segunda menor entre as melodias pois isto pode


comprometer a clareza de ambas.

Segunda menor
não é recomendado

• Evitar cruzamento de vozes ( que é o fato de uma voz, que estava cantando
mais grave que a outra, passar a cantar mais agudo). Não significa que isso
nunca possa ocorrer, porém se a intenção é ter melhor clareza melódica o
cruzamento pode atrapalhar.

• Tomar cuidado com os uníssonos e as oitavas pois isso pode diminuir o


contraste e gerar um certo "vazio", a não ser que a intenção seja esta.

• Não esquecer de ficar sempre atento com a análise dos movimentos entre as
vozes (contrário, oblíquo, direto e paralelo) e com a análise melódica do canto
e do contracanto.
53

Contracanto Ativo

O contracanto ativo consiste em criar uma melodia que tenha uma


movimentação rítmica maior do que o contracanto passivo e mais independente
em relação ao ritmo harmônico criando, deste modo, um contraste ainda maior
em relação a melodia principal. Um exemplo muito conhecido de contracanto
ativo é o da música Andança de Paulinho Tapajós, Edmundo Souto e Danilo
Caymmi.

Etc...

O contracanto ativo pode surgir espontaneamente ou pode ser


desenvolvido a partir de um contracanto passivo. Veja o exemplo abaixo:

Contracanto Passivo
da música Vira Virou.

Contracanto Ativo feito


a partir do contracanto
passivo.
54

Os cuidados a serem tomados na elaboração do contracanto ativo são os


mesmos do contracanto passivo com o acréscimo de algumas particularidades
tais como:

• Pode ser utilizado notas auxiliares (bordaduras, apojaturas, passagens, etc...).


Quando isso ocorrer é preciso ficar atento as recomendações abordadas no
ítem "análise melódica" .

• Evitar grandes distâncias entre canto e contracanto. Geralmente procura-se


não passar de uma décima (Terça + Oitava). Quando a distância passar deste
intervalo é recomendado voltar o mais rápido possível para uma distância
dentro deste limite. Uma distância muito grande entre as melodias pode criar
uma sensação de "buraco" entre as mesma, por isso ela não é recomendada, a
não ser que a intenção seja esta.

Veja abaixo um exemplo de um contracanto ativo a duas vozes feito para


música Arrastão de Edu Lobo e Vinícius de Moraes:
55

Melodia em Bloco

Esta técnica consiste em criar uma melodia com o mesmo ritmo da


melodia principal. Geralmente o texto das duas melodias é o mesmo. Com isso
surge o desafio de criar um canto interessante e melodioso que soe bem com a
melodia principal e que se ajuste a harmonia. Veja os exemplos abaixo:

Exemplo 1: Trecho da música San Vicente de Milton Nascimento

Exemplo 2: Trecho da música Quem te viu, quem te vê de Chico Buarque


56

Os cuidados a serem tomados na elaboração da melodia em bloco são os


mesmos do contracanto passivo e ativo com o acréscimo de algumas
particularidades tais como:

• O análise do movimento entre as vozes adquire uma importância ainda maior,


pois é a partir dos movimentos que poderá ser explorado os contrastes entre as
duas melodias já que o ritmo estará amarrado ao ritmo da melodia principal.

• Evitar, na medida do possível, saltos melódicos com intervalos aumentados


ou diminutos e as sétimas, pois são intervalos que podem dificultar a
execução do arranjo e podem comprometer a "fluidez" melódica.

Salto melódico formando


uma 4 aumentada.
Não é recomendado

Veja abaixo uma análise das duas melodias e de alguns movimentos entre elas.

Exemplo 3: Trecho da música Canção amiga de Milton Nascimento e Carlos Drumond


Terças
movimento Paralelas movimento
Esta é a segunda voz Obliquo Obliquo

5 P P P 5 F 5 5 P 3 P 5 P 3
3

A melodia principal
está na voz da F F F P P 3 P P F B F
contralto movimento
F 3 Contrário
3 F 3 F

5 5 B F
An 3 P 3
57

Estes três tipos de arranjo a duas vozes não precisam aparecer


separados, eles podem ser usados de diversas formas em um mesmo arranjo.
Isto irá depender da criatividade e da necessidade de cada um.

Exemplo: Arranjo Completo para duas vozes da música Asa Branca de Luiz Gonzaga e
Humberto Teixeira
58

Este arranjo foi feito para um grupo vocal de idosas que estava no início
de suas atividades. As integrantes não tinham muita experiência com o canto,
por isso uma das prioridades na elaboração do arranjo foi de fazê-lo o mais fácil
possível. A tessitura da segunda voz não excede uma sexta e procurou-se
utilizar preferencialmente os graus conjuntos e, em alguns momentos, saltos
pequenos como de terça ou quarta.
59

Arranjo a Três vozes em Bloco

No arranjo a três vozes surge a possibilidade de formar acordes com a


sobreposição das melodias. Sendo assim o discurso harmônico se faz presente
nas vozes mesmo que estas estejam sem um acompanhamento rítmico-
harmônico (como o violão, piano, baixo, etc...). Porém isso depende de como o
arranjo será escrito. Em músicas onde são utilizadas apenas as tríades, As três
melodias serão suficientes para que estes acordes apareçam completos. Porém
em uma música cujos acordes utilizados são tétrades com acréscimo de notas
de tensão, as três vozes não serão suficientes para apresentar a sonoridade
completa do acorde. Com isso serão escolhidas para as melodias as notas mais
adequadas para produzir uma sonoridade mais coerente com a harmonização.
Veja abaixo dois exemplos de arranjo a três vozes, um utilizando apenas tríades
e outro utilizando tétrades com acréscimo de tensões. Observe a análise
melódica de ambos.

Exemplo 1: Trecho da música Mesmo de Brincadeira do 14 Bis

Arranjo: Carlos Menezes Júnior

F 5 F An B F An 3 F 5 P 3 3 Ap F 3 F F

F 3 5 3 5 F 3 F F 5 F 5 5

F 3 P P 5 5 3
F 3 5 3 3 5 3

análise igual aos três


primeiros compassos

3 F 5 F 3

5 F
F 5 3

5 3 F 3 5
60

Exemplo 2: Trecho da música Corcovado de Tom Jobim

Arranjo: Carlos Menezes Júnior

5 11 F b7 5

síncopa
3 5
b3

6 b9 b7

11 9 Ap 3 7 6
F

b7 9 F 5
b5

3 F b7 b3 3

Tudo que foi exposto para a elaboração de um arranjo a duas vozes


vale, também, para a elaboração de um arranjo a três vozes com o acréscimo
de algumas particularidades, tais como:

• Não ultrapassar a distância de uma oitava entre as vozes adjacentes.

Distância maior que uma


oitava.
Não é recomendado

• Priorizar a utilização da terça dos acordes, pois ela define a sonoridade do


tipo maior ou menor destes mesmos acordes. Não significa que ela nunca possa
faltar, mais quando isso acontece o som característico do acorde fica
enfraquecido. Nas tétrades as sétimas também são priorizadas, além da terça.

• Evitar duplicar as notas. Quando isso ocorrer procure duplicar a fundamental


ou a quinta, evite duplicar a terça ou a sétima.
61

Exemplo 3: Arranjo completo da música Recolher de Artur Andrade

Este arranjo foi feito para o Quarteto Vocal Vaga Mundo que tem como
formação três vozes femininas e uma masculina. O arranjo foi elaborado para
três vozes a capella (sem acompanhamento). A voz 1 e a voz 2 estão em
uníssono. Para um quarteto vocal, mudar a posição do uníssono pode mudar a
sonoridade de todo o arranjo. Observe que o arranjo começa com um uníssono
e posteriormente em duas vozes. Só depois da segunda fermata que surge a
terceira voz. Este efeito de ir abrindo as vozes progressivamente é um recurso
que pode ser utilizado na elaboração de um arranjo, seja ele a duas, três,
quatro ou mais vozes.
62

Arranjo a Quatro vozes em Bloco

No arranjo a quatro vozes surge a possibilidade de se trabalhar com a


clássica formação do coro misto (Sopranos, Contraltos, Tenores e Baixos). Para
trabalhos à capella, sem acompanhamento instrumental, esta formação permite
uma gama de possibilidades muito maior do que trabalhos a duas ou três
vozes. A sonoridade dos acordes, sejam tríades ou tétrades, fica mais completa
e aumentam as opções de se trabalhar com as notas de tensão. Veja no
exemplo abaixo um arranjo completo para quatro vozes a capella da mesma
música apresentada no item Arranjo a três vozes em bloco.
63

Se compararmos os dois arranjos veremos que a tonalidade está distinta.


As linhas melódicas também estão diferentes. Este arranjo também começa em
uníssono e depois em três vozes com o baixo "oitavando" a melodia das
sopranos. Depois da segunda fermata o arranjo passa a ser a quatro vozes.
Todas as recomendações vistas para arranjos a duas e a três vozes são
válidas para arranjo a quatro vozes, com o acréscimo de mais algumas, tais
como:

• Quando for necessário omitir alguma nota do acorde para acrescentar alguma
nota de tensão, geralmente omiti-se a quinta.

• Ter um cuidado maior com a linha do baixo, pois é ela que dá maior
sustentação harmônica ao conjunto. Ficar atento a todas as recomendações
expostas no item "Encadeamento de acordes".

• Ficar atento aos movimentos entre as vozes, principalmente entre a linha do


baixo e a linha do soprano. Privilegiar os movimentos contrários e oblíquos
quando a intenção for dar maior contraste e equilíbrio entre estas mesmas
vozes.
64

Veja no exemplo abaixo a análise melódica das quatro vozes de um


trecho do arranjo da música "Encontros e Despedidas" de Milton Nascimento e
Fernando Brant. Observe também os movimentos entre as vozes.

síncopa

F 5 b3 b7 b7 4 3 7 6

5 F 5 b3 b3 F b7 3

b3 5 F 5 5 9 5

F 3 F F F b3 F F

7 F P b7 4 b9 5 Ap F

3 3 b5 b7 b3

F b5 b3 P 5 3 b7

5 F F F

• Observe nos dois últimos compassos que a sensível, que está na voz do tenor,
não resolve na fundamental do Am7 e sim na sétima. Este recurso é muito
utilizado em arranjos a quatro vozes que utilizam tétrades. A sétima ou a nona
substituem a fundamental quando ela não está no baixo.
65

Contracanto a três, quatro ou mais vozes

O contracanto passivo ou ativo, de acordo com o que foi visto no item


"Arranjo a duas vozes", pode ser utilizado em um arranjo com três ou mais
vozes. As possibilidades de utilização deste recurso são muitas, pois pode-se
combinar as vozes de infinitas maneiras, misturando ou não as técnicas de
contracanto passivo e ativo. Veja os exemplos abaixo.

Exemplo 1: Trecho de um arranjo da música San Vicente de Milton Nascimento e Fernando Brant
feito para coro misto a capella.

Etc...

Exemplo 2: Trecho de um arranjo da música Canto do Povo de Algum Lugar de Caetano Veloso
feito para coro misto a capella.

Etc...
66

Exemplo 3: Trecho de um arranjo da música Sertanejo de Luis Dillah feito para o quarteto vocal
Vaga Mundo

Etc...

Todas as recomendações vistas nos ítens anteriores são válidas para este
ítem. A combinação da várias formas de se trabalhar o contracanto possibilita
uma gama enorme de sonoridades que pode ser explorada. É através do fazer,
ouvir, corrigir, experimentar, etc..., que o arranjador vai adquirindo fluência na
escrita de seus arranjos.
67

O arranjo completo

Ao elaborar um arranjo completo deve-se, antes de tudo, refletir sobre


os objetivos deste arranjo. Algumas perguntas devem estar presente na mente
do arranjador, tais como: O que eu quero expressar com este arranjo? Por que
e para quem ele está sendo feito? Qual a sonoridade que eu pretendo produzir?
Antes de começar a escrevê-lo é recomendado planejá-lo como um todo. Ao
fazer o planejamento devemos pensar em alguns pontos tais como:

• Quais as características do grupo que irá executá-lo.

• Qual ou quais serão as vozes que irão cantar a melodia principal. É


importante lembrar que esta melodia não precisa, necessariamente, ficar na
mesma voz o tempo todo, ela pode ir mudando de voz ao longo do arranjo.

• Qual a tonalidade ideal para que o arranjo tenha a sonoridade pretendida.

• Como será trabalhado cada seção da música(1º estrofe, 2º estrofe, refrão,


etc...).

• Como será a forma geral do arranjo (se terá ou não introdução, interlúdios e
coda e qual será o número de repetições).

• Quais as técnicas que serão usadas e em quais momentos (Contracanto


passivo a duas vozes, melodia em bloco a quatro vozes, contracanto a três
vozes, uníssono, etc...).

Somente depois deste planejamento é que deve-se começar a escrever o


arranjo no papel pautado. É recomendado escrevê-lo no sistema de 11 linhas
ao qual apenas dois pentagramas estão presentes, um com Clave de Sol e o
outro com Clave de Fá conforme figura abaixo.

De um modo geral, somente depois de terminado o arranjo no sistema de 11


linhas que as melodias são escritas separadamente em cada pentagrama, pois
deste modo tem-se um controle melhor das extensões, das distâncias e dos
movimentos entre as vozes. Veja a seguir outras recomendações para uma boa
escrita de um arranjo.
68

• Procurar ser coerente com o estilo da música.

• Tocar cada melodia separadamente para saber como está soando e tocá-las
simultaneamente para saber o resultado sonoro do conjunto. É muito
importante ouvir o que está sendo escrito pois isto possibilita uma consciência
melhor da sonoridade do arranjo, evitando algumas surpresas desagradáveis.

• Não hesitar em apagar tudo e recomeçar quando isto for necessário. Muitas
vezes para chegar num resultado ideal é preciso refazer várias e várias vezes o
mesmo arranjo.

• Não hesitar em experimentar idéias novas, mesmo quando elas contradizem o


que já está estabelecido na prática comum. Porém é preciso ter cuidado para
que elas realmente expressem aquilo que foi pretendido, e que estas idéias
sejam coerentes e inteligíveis. Criatividade e bom senso são elementos
fundamentais que devem estar presentes no trabalho de um arranjador.
69

Exemplos de arranjos completos com comentários

Exemplo 1: Arranjo completo da música Canto do Povo de Algum Lugar de Caetano Veloso
70

Este arranjo foi feito para o Coral da Universidade Federal de Uberlândia.


A música, originalmente, é dividida em três estrofes nas quais a mesma melodia
é repetida três vezes. O arranjo foi concebido da seguinte maneira: A melodia
está o tempo todo na voz das Sopranos, a 1º estrofe está em uníssono, a 2º
estrofe começa a duas vozes em bloco e no final abre em três vozes, a 3º
estrofe está a quatro vozes em bloco, ao voltar para a 1º estrofe é utilizado o
recurso de contracanto a quatro vozes e assim vai até o final da 2º estrofe, no
final volta a ser quatro vozes em bloco e assim termina o arranjo. A harmonia é
simples, praticamente é utilizado apenas tríades. Não é utilizado notas de
tensão.
71

Exemplo 2: Arranjo completo da música Arrastão de Edu Lobo e Vinícius de Moraes


72
73
74
75
76
77
78
79
80
81

Este arranjo foi feito para o Quarteto Vocal Vaga Mundo no qual eu
participo como cantor, violonista e arranjador. Este quarteto é formado por três
vozes femininas e uma masculina. A melodia principal está o tempo todo na voz
masculina com exceção de uma das seções. O arranjo como um todo é dividido
da seguinte forma: seções A(compassos 1-32), B(compassos 33-67), C(compassos 68-83),
A´(compassos 84-32), B´(compassos 85-115) e Coda(compassos 116-Fim). Tanto na seção A
como na A´ é utilizado o contracanto nas vozes femininas. No caso da primeira
e da segunda voz, elas cantam em uníssono e é utilizado um recurso de
"pergunta e resposta" entre elas e a melodia principal. Na seção B e B´ o
recurso utilizado foi o de melodias em bloco. Na seção C apenas as vozes
femininas cantam, começando em uníssono e depois dividindo em 3 vozes em
bloco. Na Coda são criadas três melodias diferentes e independentes que vão
caminhando para o final.
82

Exemplo 3: Arranjo completo da música San Vicente de Milton Nascimento e Fernando Brant
83
84

Este arranjo é um exemplo de que a melodia principal não precisa


necessariamente ficar na mesma voz o tempo todo. Ela caminha entre as
vozes. Com isso é acrescentado um certo contraste devido e esta mudança. Ao
longo do arranjo são utilizadas várias técnicas que vão deste o uníssono até o
contracanto a quatro vozes. A melodia é repetida três vezes ao longo da peça,
mudando apenas a letra. Cada uma das repetição é trabalhada de uma forma
diferente, apesar de terem, também, elementos em comum.
85

Exemplo 4: Música Colheita de Carlos Menezes Júnior feito para coro misto a capella.
86
87
88
89

Esta música é uma composição feita para quatro vozes e ficou em 3º


lugar no "2º Prêmio Guerra Peixe de composição" realizado no Rio de Janeiro
no ano de 1999 pela Escola de Música Villa-Lobos e pela FUNARJ. Nesta música
estão presentes vários recursos de escrita vocal, um deles é o de utilizar as
vozes para fazer uma base ritmo-harmônica. Esta base proporciona um certo
contraste com os momentos em que as quatro vozes cantam em bloco. É
trabalhado uma harmonia que utiliza deste a sonoridade modal até uma
sonoridade mais contemporânea como cromatismos e seqüências harmônicas
não convencionais.
90

Exemplo 5: Arranjo completo da música Araruna Originária dos índios Parakanâ do Pará feito
para o quarteto vocal Vaga Mundo.
91
92
93

Este arranjo começa com um solo de uma das vozes femininas e depois
entra um uníssono das três vozes femininas. Logo em seguida a voz 2 canta a
melodia o tempo todo enquanto as outras vozes vão fazendo um contracanto
utilizando os motivos apresentados na melodia principal e assim vai até a coda,
onde há uma retomada do primeiro estrofe da música, porém, a duas vozes em
bloco e termina em uníssono.
94

Conclusão

Trabalhar com a criação musical é, antes de tudo, um processo empírico.


Os tratados e teorias acerca da música na nossa cultura sempre vieram como
tentativas de entender e sistematizar aquilo que um dia foi experimentado
enquanto prática musical. O conhecimento que foi sendo gerado durante todos
estes anos constituiu a base para as novas gerações de artistas. E estes, por
sua vez, foram desenvolvendo e acrescentando elementos novos para a
produção musical em suas respectivas épocas. Sendo a arte uma expressão
humana, ela tem sua origem na subjetividade. As regras e as recomendações
que são passadas através do ensino da harmonia devem ser encaradas como
"dicas" de organização dos elementos musicais e não como leis imutáveis. A
sonoridade e o que ela pode representar enquanto expressão devem ser as
principais preocupações para aqueles que pretendem trabalhar com a criação
musical.
95

Bibliografia

CHEDIAK, Almir. Harmonia e improvisação. Rio de Janeiro: Lumiar, 1986.


Volumes 1, 2.

FREITAS, Sérgio. Caderno de classe da disciplina LEM 1. 1997. 64p. Cursos


de graduação em música, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia.

_____________. Teoria da Harmonia aplicada à Música Popular. 1996.


Cursos de graduação em música, Universidade Federal de Uberlândia,
Uberlândia.

GUEST, Ian. Arranjo. Rio de Janeiro: Lumiar, 1996. Volumes 1, 2, 3.

MED, Bohumil. Teoria da Música. 4.ed., Brasília: Musimed, 1996. 420p.

PÉREZ-GONZÁLEZ, Eladio. Iniciação à técnica vocal. Rio de Janeiro: Eladio


Perez-González, 2000. 212p.

PISTON, Walter. Armonia. Barcelona: Labor, 1993.

PRIOLLI, Maria Luisa de Mattos. Harmonia: da concepção básica a expressão


contemporânea. Rio de Janeiro: Casa Oliveira de Música, 1986. Volume 2.
153p.

SCHOENBERG, Arnold. Fundamentos da Composição Musical. São Paulo:


Edusp, 1991. 272p.

SCHOENBERG, Arnold. Tratado de Armonía. Madrid: Real Musical, 1974.


501p.

STORTI, Carlos Alberto. Introdução a regência. Uberlândia: EDUFU, 1987.


40p.

You might also like