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A IDENTIFICAÇÃO E VALORAÇÃO DO PATRIMÔNIO EM CIDADES

NOVAS

FREITAS, VALÉRIA T. (1); SILVA, RICARDO D. (2)


1. UNIPAR. Departamento de Arquitetura e Urbanismo
Av. Brasil, 1123 - Zona 01 - CEP 87205-130
valeria@unipar.br

2. UEM. Departamento de Arquitetura e Urbanismo – DAU


Avenida Colombo, 5790 - Zona 07 - Bloco 32 - CEP 87020-900
rdsilva@uem.br

RESUMO

As cidades novas representam um ideal de cidade e evidenciam uma atitude empreendedora, dentro
da visão mercadológica de empreendedores comprometidos com objetivos em grande escala. Na
formação dessas cidades a expressão de cultura e de identidade da região estão representadas nos
edifícios existentes. O intenso processo de Colonização promovido pela CTNP no Norte paraense, a
partir da década de 1930, caracterizou-se pela implantação de mais de sessenta cidades, num
processo rápido de ocupação e construção. As cidades planejadas no chamado Norte Novíssimo,
território que se estende das proximidades do município de Maringá até o rio Paraná e o rio Piquiri em
direção ao Noroeste do Estado, os principais municípios são: Paranavaí, Cianorte e Umuarama. Em
tão pouco tempo as cidades planejadas foram grandes canteiros de obras que resultaram em
experimentações arquitetônicas vernaculares e reproduções de arquétipos nacionais e internacionais.
Entretanto, a valorização do presente se destaca em meio ao turbilhão da cidade em crescimento
onde as antigas construções são substituídas ou modificadas num fluxo contínuo. As cidades novas
vieram substituír um sistema complexo de organização espacial e funcional voluntário. Há que se
considerar, portanto que o panorama das cidades planejadas deve ter variantes de valor do
patrimônio em outras cidades, nascidas da formação espontânea. Considera-se que as práticas no
período de implantação das cidades novas ocorreram transformações radicais, e que as contradições
formais inerentes ao sistema de produção (divisão de espaços e justaposição tecno-prática)
constituíram a infraestrutura visível de uma imagem física da cidade moderna. A questão do tempo e
das transformações em cidades novas é um aspecto importante no que se refere à preservação, pois
a expressão de cultura e identidade da região estão representadas nos edifícios existentes e que é
preciso ser avaliada para que o patrimônio local seja identificado, valorizado e preservado.

Palavras-chave: patrimônio; patrimônio cultural; patrimônio em cidades novas;

1º Simpósio Cientifico ICOMOS Brasil


Belo Horizonte, de 10 a 13 de maio de 2017
A IDENTIFICAÇÃO E VALORAÇÃO DO PATRIMÔNIO EM CIDADES
NOVAS

Contexto

As cidades novas representam um ideal de cidade propagada como uma atitude


empreendedora, dentro da visão mercadológica de empreendedores comprometidos com
objetivos em grande escala.

O início do século XX foi palco de inovações e experimentações na arquitetura e no


urbanismo. As reverberações do movimento moderno na arquitetura e os modelos de
planejamento urbano no contexto internacional produziram, respectivamente, modelos
consolidados no território nacional e implantações de núcleos urbanos com traçados
específicos. O trabalho de profissionais formados em grandes centros como São Paulo e
Rio de Janeiro e outros centros foram inspiração para o urbanismo e para arquitetura nas
cidades planejadas do Paraná, fenômeno que ocorreu em diversas partes do território
brasileiro:

“A arquitetura moderna brasileira recebeu influência da arquitetura


internacional, mas tomou forma própria ao se desenvolver nacionalmente. A
sua difusão a nível regional e local, mesmo entre paradigmas e
antagonismos, assumiu um caráter próprio e de conteúdo híbrido, que
remete à sua complexidade e particularidade, de relevância permanente,
principalmente nas cidades novas do norte do Paraná. Tais
experimentações arquitetônicas que denotam um desejo de modernização
formou ao longo dos anos um conjunto de memória, um conteúdo que
reflete na sua temporalidade um ideal de nação, que tem sido registrado em
todo território brasileiro. (FREITAS, 2016).

No contexto paranaense de 1930 e 1960, a venda de terras ocorreu através de vinte e seis
companhias imobiliárias loteadoras que promoveram a expansão imobiliária e a colonização
agrícola. Entre essas, a Companhia de Terras Norte do Paraná – CTNP, companhia de
origem inglesa que posteriormente foi vendida para brasileiros.

O objetivo era formar uma rede de cidades implantadas a cada cem quilômetros, ligadas
através da rede ferroviária, de modo a facilitar o escoamento da produção, e entre estas a
cada 10 ou 15 km ficariam os patrimônios, centros comerciais e abastecedores
intermediários. (LUZ, 1997. STEINKE, 2007. DALBERTO, 2009). A vasta área entre
Londrina e Cianorte foi loteada e vendida a milhares de colonos até pelo menos o fim da
Segunda Guerra quando a Companhia de Terras Norte do Paraná – CTNP foi vendida à
empresários brasileiros e deu origem a Companhia Melhoramentos do Norte do Paraná
(CMNP).

Na formação dessas cidades a expressão de cultura e de identidade da região estão


representadas nos edifícios. Sob essa perspectiva, as terras da Companhia de Terras Norte
do Paraná podem ser consideradas um grande laboratório de Culturas Espaciais. Yamaki
(2003) afirma que os projetistas de origens e formações variadas marcaram com seus
traços, a micro e a macro morfologia, o espaço que seria vivido por dezenas de etnias. Na
formação dessas cidades a como um dado puro, mas sim em identidades fluídas e em
constante transformação (CASTELLS, 2000, p. 24).

As reflexões apresentadas nesse artigo fazem parte das investigações de 2015 a 2017 para
dissertação de mestrado “ A Igreja Matriz Nossa Senhora de Fátima edificada em madeira
em Cianorte: patrimônio cultural e arquitetônico, além de ser um exemplar da construção
arquitetura em madeira por sua cobertura em arco parabólico, o edifício é um exemplar da
disseminação da arquitetura moderna na região, fenômeno que ocorreu em diversas partes
do território brasileiro. Durante a pesquisa o edifício foi inventariado e analisado no contexto
de cidades novas.

Cianorte, uma das cidades novas

Para compreensão de cidades novas, o termo aqui utilizado para tratar do fenômeno de
construção de núcleos urbanos, “novas cidades”, refere-se de forma geral a comunidades
“planificadas e criadas conscientemente em resposta a objetivos claramente formulados”,
pressupondo, “a existência de uma autoridade ou organização suficientemente efetiva para
assegurar o lugar, reunir os recursos necessários e exercer um controle contínuo até que a
cidade alcance um tamanho viável”. (Galantay, 1977: 15).
Para a compreensão do conjunto de circunstâncias à volta do que se conhece sobre cidades
novas (CNs), cita-se a contribuição conceitual de Trevisan:

“Resumidamente, conceituo CNs como núcleos urbanos criados: 1) pelo


desejo do poder público ou da iniciativa privada e concretizado em ações
específicas; 2) que buscam atender, ao menos de início, a uma ou mais
funções dominantes (administrativa, de colonização, ferroviária, de
relocação, balneária, satélite etc.); 3) implantados num sítio previamente
escolhido; 4) a partir de um projeto urbanístico; 5) elaborado e/ou
desenvolvido por agente(s) definido(s) – eventualmente profissional (is)
habilitado(s); e 6) em um limite temporal determinado, implicando inclusive
em um momento de fundação razoavelmente preciso”. (TREVISAN, 2009,
p.14)

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Sobre os vários exemplares de cidades novas identificados no século XX e examinados por
Trevisan, o autor cita:

[...]“ revelar um país de inúmeras cidades projetadas, distante de uma visão


que, quase sempre, reconhece apenas quatro exemplares: Belo Horizonte,
Goiânia, Brasília e Palmas, tendo como delimitação temporal a
Proclamação da República (ou a origem de Belo Horizonte, 1893) e a última
Constituição Federal (ou a origem de Palmas, 1989). Para isso, dividiu-se o
período de cem anos em quatro, cujos exemplares mais significativos
seriam analisados (história, traçado urbano, projetista etc.). (TREVISAN,
2009, introdução).

Coulon (1993, p. apud TREVISAN) afirma que as Cidades Novas estão inscritas, numa
produção espaço-temporal, como testemunhas físicas da evolução das práticas num
período de transformações radicais, e que as contradições formais inerentes ao sistema de
produção (divisão de espaços e justaposição tecno-prática) constituíram a infraestrutura
visível de uma imagem física da cidade moderna.
A urbanização do Norte do Paraná deu-se no 1º período da Revolução Industrial no Brasil
(1930-1956), Santos (1993) destaca que ocorre uma verdadeira distinção entre um Brasil
urbano e um Brasil agrícola, o que resultou em “áreas agrícolas contendo cidades
adaptadas às suas demandas e (...)”. Moura (2004) afirma que o Brasil e o Paraná deixaram
de ser uma população tipicamente rural se transformando em urbana até os anos 50, onde
as cidades foram expandidas ou construídas para abrigar contingentes de pessoas atraídas
“pelas perspectivas acenadas pelos setores produtivos urbanos ou involuntariamente
destituídos da possibilidade de permanência num campo tecnificado – e a qualidade
auferida pelo modo de vida urbano”.
A crise mundial de 1929 causou impactos no cenário econômico brasileiro e desdobramento
diferenciado no Paraná, pois nesse período o governo brasileiro procurou deter o plantio de
café para que não aumentasse o estoque do produto. Foi um período em que as plantações
de café foram interditadas em vários estados que tinham mais de cinquenta milhões de pés
de café. (FREITAS; SEIXAS; DALBERTO, 2016).
O intenso processo de Colonização promovido pela Companhia Melhoramentos Norte do
Paraná, a partir da década de 1930, caracterizou-se pela implantação de mais de sessenta
cidades no território paranaense, num processo rápido de ocupação e construção. As
cidades planejadas no chamado Norte Novíssimo, território que se estende das
proximidades do município de Maringá até o rio Paraná e o rio Piquiri em direção ao
Noroeste do Estado, os principais municípios são: Paranavaí, Cianorte e Umuarama.
O quadro da colonização do estado paranaense mostra o auge do plantio do café, abrange
os projetos de áreas novas de povoamento e a construção da ferrovia que proporciona
pontos de escoamento das safras. A Companhia Melhoramentos Norte do Paraná – CMNP,
foi construindo uma imagem desbravadora e pungente, na afirmação da capacidade de
solucionar as questões sociais das cidades através de seus empreendimentos, entretanto,
Souza (2015, p. 47) discorda quando afirma que havia uma dualidade entre o discurso e
ação da CMNP, enquanto agente do capitalismo, pois a estratégia de vendas era a imagem
da realização de um povoamento com foco social, mas o interesse era executar um projeto
de forma disciplinada para obter lucros nas etapas do processo de colonização.
A partir de 1930, o Norte do Paraná passou por um processo de regionalização resultando
em três subterritórios: o Norte Velho – desde a divisa com São Paulo até o rio Tibagi, o
Norte Novo – da região do rio Tibagi passando por Londrina, até as margens do rio Ivaí, e o
Norte Novíssimo – ao longo do rio Ivaí e do Piquiri. Entre os autores que citam essa divisão,
Suzuki (2007) afirma que “é primordial observar que a forma e o tempo de desenvolvimento
do norte do Paraná deram-se diferentemente das outras regiões do país, ocorreu em
etapas”. Conforme Cancian (1981, p.50) a cafeicultura paranaense processou-se nas três
fases, sendo a primeira correspondente à ocupação do Norte Velho – a partir do século XlX
e início do século XX, culminando com a crise de 1929. A segunda fase a partir de 1930,
ocorrida de forma lenta até o fim da Segunda Guerra Mundial e depois acelerando. A
terceira, entre as décadas de 1940 e 1960, quando encerrada a expansão da cafeicultura
paranaense. Durante as etapas desenvolveu-se uma arquitetura local.
As cidades de Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama (Figura 8), planejadas pela CTNP -
Companhia de Terras Norte do Paraná formam um eixo e constituem quatro polos
centralizadores de cidades menores à sua volta, segundo o plano de ocupação proposto
para as Regiões Norte e Noroeste do estado, essa é a ocupação do chamado Norte
Novíssimo, iniciada na década de 1950. O avanço foi planejado pela CMNP, expandindo na
década de 1960, quando houve aumento considerável populacional de imigrantes em busca
pela “terra roxa”, repercutindo em surgimento de novos municípios. Segundo Fonseca
(2006), isso ocorreu devido a ascensão da economia cafeeira na região houve abertura das
frentes de povoamento.
A ligação entre as cidades foi estratégica, Seixas et al (2017) afirma que Cianorte seria um
dos pontos de conexão, a fim dessa rede a fim de escoar a produção agrícola e
posteriormente industrial:

“A estratégia proposta pela companhia previa que algumas cidades seriam


destinadas a se tornarem maiores, teriam assim maior relevância entre as
cidades menores denominadas patrimônios, situadas entre 10 a 15
quilômetros uma da outra, esse plano foi executado e transformou as terras
paranaenses em atrativo para muitos que vinham em busca de
prosperidade “. (SEIXAS, 2017)

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Cianorte está inserida pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) no Norte
Novíssimo até 1968, e em 1989 o mesmo denominou a região de Noroeste e em 1991
Mesorregião Noroeste Paranaense. Corrêa (2002) afirma que a partir de 1980, a expressão
muda porque as condicionantes que permitiam essa diferenciação foram alteradas em sua
concretude, e uma nova regionalização põe-se em marcha.
Ao designar como pioneiros todos que vieram no início da ocupação, o discurso dominante
oculta a diversidade de classe e transmite a ideia de que todos tinham os mesmos
interesses e chances de progredir (TOMAZI, 1997). No âmbito econômico, a bibliografia
aponta que a urbanização no Norte do Paraná deu-se no início de intensa industrialização
do país. (MENEGUETTI, 2009, p. 71). Por meio da exploração do mate, da madeira e do
café é que a industrialização do Paraná começa a se forjar. Além disso, em particular no que
se refere ao café os ciclos econômicos ajudaram também a ampliar a urbanização,
paranaense.
Entre 1930 e 1955, período da quarta etapa de industrialização brasileira, foi o momento em
que a indústria recebeu muitos investimentos dos ex-cafeicultores dos principais centros
produtores e também em logística. A riqueza natural da região e a fertilidade do solo para
produção agrícola atraiu grande contingente migratório que vinha de zonas paulistas, onde
não havia mais capacidade produtiva para cultura cafeeira.
Este panorama de crescimento contínuo foi respaldado no contexto político do país,
representado pela Era Vargas. O país passa a ser repensado no âmbito de um processo de
consolidação político-econômica. A década de 1930 representou um período de
profundas mudanças, através de uma série de reformas que desencadearam um processo
de centralização institucional e política (REZENDE, 2012).
Houve uma promoção da regionalização oficial do Brasil incorporando a noção de região no
pensamento e na prática do e sobre o Estado. Moraes (2005) fala sobre uma identidade
nacional versus identidade nacional, estratégias oligárquicas versus estratégia nacional,
hegemonia política versus interesses de um Estado igualitário” e afima:

“Vargas define brasilidade como somatório das culturas regionais do país,


concepção que estimula um surto de construção de identidades e de
criação e tradições em diferentes partes do território nacional, como
estratégia mesma de alocação das elites locais no projeto de construção do
Brasil moderno “. (MORAES, 2005, p.98)

O interior do Brasil passa a ser visto como marco da identidade necessária para a
construção ideológica nacional, “a busca de variantes estéticas projetou cidades e
elementos do poder metropolitano (militar, religioso e burguês) e valorou o local na
perspectiva exógena produzida no território colonial “ (COSTA; SUZUKI, 2012).
Para Luz (1997), o sistema rodoferroviário teve um papel crucial na implantação das cidades
novas do Paraná, incluindo Cianorte. A forma com que as cidades polo e as demais no norte
do Paraná foram distribuídas, criando uma rede de cidades ligadas à ferrovia, demonstra
características de concepção inglesa do town and country planning, ou seja, do ideário
Garden city como se viu anteriormente. Esta característica é peculiar à região e difere do
planejamento de outras áreas brasileiras de colonização.
A autoria do Plano urbano original de Cianorte é do engenheiro Jorge Macedo Vieira (1894-
1978), o projeto de 1955, última cidade por ele planejada. Macedo Vieira também participou
nos projetos de Londrina, Maringá, Pontal do Sul e Águas de São Pedro. Seus projetos
apresentam características de ideias urbanísticas circulantes na época. Conforme afirmação
de Seixas:

“A última cidade planejada por Vieira foi Cianorte, em 1955, como em


Maringá também não conheceu o sítio pessoalmente, também planejou-a
sob levantamento topográfico enviado pela CMNP. A experiência dos
trabalhos anteriores e o amadurecimento de algumas ideias são
demonstradas na combinação de linhas retas, curvas e geometrias
combinadas de modo a propor o que seria uma das características obras da
sua carreira“. (SEIXAS et al, 2017)

Embora Macedo Vieira não tenha vindo a Cianorte, o anteprojeto contempla o cuidado com
a topografia. Seixas et al (2017) destaca algumas soluções inovadoras como “prioridade ao
eixo monumental, áreas verdes preservadas permeando a cidade em um sistema
hierárquico de vias intercalado a praças, proporcionando fluidez ao tráfego”. Com relação ao
traçado da malha e a sobreposição de características dos movimentos cidade-jardim e city
beautiful, Bonfato (2008) denomina de hibridismo, enquanto que Dalberto (2009, p.46)
afirma que “a boa forma alcançada no plano original de Cianorte é fruto do desenvolvimento
de um pensamento que buscava a qualidade do espaço urbano”.
Segundo Freitas, Seixas e Dalberto (2016), a inauguração da cidade de Cianorte em 1953,
seguindo a estratégia de propaganda da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, foi
divulgada em jornais e revistas, onde a cidade nova abriu-se aos interessados em plantar
café nas férteis terras da região, atraídos pela imagem de credibilidade da Companhia.
Kohhepp (1991, p.79) destaca esse processo como “avanço especulativo da fronteira
cafeeira”.
A divulgação ocorreu em diversos jornais regionais, como “ Folha de Londrina” e “ A Hora”,
respectivamente veículos de informação de Londrina e Maringá (Figura 1). Entre os vários
artigos da “Folha de Londrina”, cabe destacar o de 7 de agosto de 1953 entilulado:
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“Cianorte, hino de fé no destino grandioso do Paraná” , com subtítulo “ Cometimento que
confirma a decisão inabalável da gente do Setentrião em continuar sua obra ciclópica e
extraordinária – A Selva estuante”, qualificando a cidade como “ terra das melhores entre as
melhores...”, finaliza pedindo para Melhoramentos “fazer nascer mais cidades”, para mais
gente “que virá acudindo ao chamado da terra gorda e rocha que espera acolhe-la com a
mesma maternidade, seja ela dos países distantes ou seja de outros quadrantes da nossa
pátria mesmo”.

Figura 1 – Divulgação sobre inauguração de Cianorte


Fonte: Folha de Londrina (1953)

O jornal “A Hora”, de Maringá, em um dos diversos exemplares que falam da inauguração


de Cianorte, enaltece a cidade como “mais um notável empreendimento colonizador e
urbanístico da Cia. Melhoramentos Norte do Paraná”. O artigo tem o título: “Duas cidades
símbolos”, referindo-se também à Maringá. As estratégias de venda foram empregadas
similarmente em todas as cidades citadas, primeiro o anúncio do empreendimento, depois a
preparação na divulgação da festa de inauguração e a propaganda contínua da venda dos
lotes com os atributos das terras novas planejadas.

Em Cianorte, o urbanístico para Cianorte Jorge Macedo previu 3 eixos principais de


estruturação viária e urbana, com definição dos edifícios e espaços públicos. As áreas
públicas do plano original sofreram mudanças principalmente ao longo da avenida Brasil –
eixo monumental, às quais são destacadas por Dalberto (2009). Nos dois outros eixos,
avenidas Bahia e Souza Naves as praças foram mantidas. Das construções propostas no
plano original. (Figura 2).

Figura 2 – Anteprojeto de Cianorte, 1955


Fonte: adaptado de SEIXAS, Marcia V. A. C. BOVO, Marcos C. (2017)

Os eixos projetados permanecem e muitas das construções em madeira foram demolidas ao


longo do eixo principal da cidade, nos dois outros eixos, mas as construções mistas
(madeira e alvenaria) que permanecem, porém já bastante alteradas, já estão sendo
demolidas para novas demandas do mercado imobiliário. A urgência de renovar a paisagem
urbana e o anseio pelo uso de materiais atuais estão presentes nas cidades do norte
paranaense. “A paisagem das cidades novas é marcada por essa espécie de tripé –
construção/ demolição/ reconstrução”, afirma Paula (2011, p.15), embora essa ação exista
em todas as cidades, a autora acentua: “mas nas cidades novas tais práticas são intrínsecas
à sua condição de terem sido iniciadas no século XX”. A exemplo disso a demolição de um
dos mais antigos edifícios do eixo principal de Cianorte, na Av. Souza Naves: a Casa União
de Ferragens, bem próxima a Igreja Matriz de Cianorte. O edifício de arquitetura simples,
possuía treliças de madeira executadas pelos primeiros carpinteiros locais. (Figura 3).

“As cidades permanecem em seus eixos de desenvolvimento mantêm a


posição dos seus traçados, crescem segundo a direção e com o significado
de fatos mais antigos, muitas vezes remotos, do que os fatos atuais. Às

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vezes, esses fatos permanecem idênticos, são dotados de uma vitalidade
contínua, às vezes se extinguem; resta então a permanência da forma, dos
sinais físicos, do locus”. (ROSSI, 1995).

Conforme aponta Babkov (1998), o essencial num projeto da cidade era: Praça Principal,
Comércio, Praça da Igreja, Escola e Cemitério, que constituíam o centro e limite imaginário.
Para Yamaki (2000), existem referenciais dos planos das Cidades Jardins Inglesas
passíveis de serem observados: “O anteprojeto de Maringá e o projeto de Cianorte,
evidenciam na localização da Praça Central um platô alto, o eixo de ligação, entre a Estação
e a Praça, “enclousure “ das Praças, a otimização do sítio natural, vegetação e caminhos
existentes, a relação formal-informal do traçado”.

Figura 3 – Dia de demolição da Casa União de Ferragens, na Av. Souza Naves, Cianorte (2017)
Fonte: Eleutério Langowiski

Portanto, Cianorte encontra-se disposta nesta rede de cidades, com o traçado urbano
planejado, como parte desta porção planejada de forma inédita no país até então sua
implantação em 1953, coincidiu com a última década da expansão cafeeira, com declínio a
partir de 1960” (STEINKE, 2002).
Os estudos e levantamentos à cerca da morfologia urbana das cidades novas e o processo
de implantação dos projetos da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná foram
registrados e inventariados por vários autores como REGO (2009) e YAMAKI (2000),
STEINKE (2007), ROSANELI (2009), CORDOVIL (2008 e 2010), ANDRADE (2000).
Entretanto, Fernandes e Gomes (2004) refutam que os processos de transformação urbana
e urbanística das cidades brasileiras no século XX ainda não foram problematizadas
enquanto campo teórico, revelando uma constituição ainda fraca dessa área dos estudos
urbanos e que em grande parte são descritivos, esses trabalhos continuam a elencar um
conjunto de dados e informações cuja formulação e construção conceitual permanecem
como instigante e complexo desafio aos pesquisadores da área e ponderam:

“Mas são os estudos sobre história do urbanismo, indubitavelmente, que


constituem a grande mudança em relação ao balanço anterior indicando
muito claramente que estamos frente à constituição de um novo campo
temático de pesquisa. Processos da constituição da disciplina, e seus
campos de influência, circulação das idéias, planos e projetos elaborados
para as cidades brasileiras, seus principais protagonistas e as contradições
entre as cidades idealizadas por arquitetos, urbanistas e planejadores e a
cidade real, são os principais objetos privilegiados nesse campo de
estudos”. (FERNANDES e GOMES, 2004).

A fim de aprofundar tal tema, em 1999, o livro “Urbanismo no Brasil: 1895-1965”, de Maria
Cristina da Silva Leme, aprofunda o tema trazendo relato e análise crítica das ideias do
século XX para a cidade brasileira, da concepção à materialização, através de artigos de
pesquisadores que abordam o tema em oito cidades no Brasil. Bonduki (1999) afirma a
participação de oito capitais e suas correspondentes universidades, estimulou e reforçou a
pesquisa nessa área, consolidando fontes e acervos de pesquisa e publicações pertinentes
à produção referente sobretudo à primeira metade do século XX.

Dento dos campos de influência citados por Fernandes e Gomes (2004) a morfologia das
cidades novas constituem base para o estudo da produção arquitetônica e a linguagem
construtiva de suas edificações, um fio de análise importante para entendimento da
circulação de ideias e no sentido da identificação do patrimônio cultural. As primeiras
edificações dessas cidades foram estabelecidas com rapidez, considerando que nas
práticas do período de implantação das cidades novas ocorreram transformações radicais, e
que as contradições formais inerentes ao sistema de produção (divisão de espaços e
justaposição tecno-prática) constituíram a infraestrutura visível de uma imagem física da
cidade moderna. Ao longo do tempo, à medida da implantação das cidades novas e a
consolidação de ocupação das terras loteadas, a paisagem urbana modificou-se
rapidamente, portanto os primeiros edifícios, seus autores e suas formas marcam um tempo
importante na construção da identidade local. Alguns permanecem na paisagem como

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relíquias outros já foram substituídos por novas construções e apenas existem em fontes
imagéticas e na memória coletiva.

Identificando para valorizar e preservar

As cidades novas vieram substituír um sistema complexo de organização espacial e


funcional voluntário. Há que se considerar, portanto que o panorama dessas cidades
planejadas tem variantes de valor do patrimônio em relação a outras cidades, nascidas da
formação espontânea. Em tão pouco tempo essas cidades planejadas foram grandes
canteiros de obras que resultaram em experimentações arquitetônicas vernaculares e
reproduções de arquétipos nacionais e internacionais. Identificando os primeiros edifícios
comerciais construídos nas cidades e novas verifica-se as construções em madeira, com
fachadas simples e as construções mistas com detalhes modernistas nas fachadas. Nas
residências há variedade de tipos, dependendo da cidade analisada.

Nas primeiras cidades da Companhia Melhoramentos Norte do Paraná, destaca-se a forma


manual de derrubada da mata e imediata consolidação de construções da madeira extraída.
Na década de 1950, o Estado do Paraná foi um dos maiores produtores de madeira do
mundo, e suas madeiras eram consideradas como uma das melhores no Brasil. Entretanto,
nos anos seguintes, poucos exemplares arquitetônicos foram projetados considerando todas
as possibilidades desse material (DUDEQUE, 2001). A arquitetura em madeira decorrente
da construção dessas cidades constitui um acervo histórico emblemático no contexto
paranaense o qual tem sido inventariado e estudado.
A abundante reserva florestal paranaense, com matas nativas e possibilidade de extração
da madeira, permitiu que essa matéria-prima fosse largamente empregada nas cidades
colonizadas pela CMNP – Companhia Melhoramentos Norte do Paraná. Segundo Oliveira
(2001), “pela própria conformação de suas matas, o Paraná sempre contou, ao longo da sua
História, com expressiva variedade de madeiras”. No período de 1940 – 1960, as empresas
da madeira, realizavam diferentes transformações do material e passaram a fazer parte da
economia dos municípios paraenses:

“ [...] à medida que iam sendo colonizadas as terras do Norte e Sudoeste do


Paraná e ampliada a rede de transportes rodoviárias e ferroviária, mais
áreas da Mata Atlântica e de Araucárias iam se tornando disponíveis para
exploração”. (OLIVEIRA, 2001, P.30)
Dudeque (2001, p.342) afirma que “o Paraná foi um dos maiores produtores de madeira do
mundo; as madeiras eram uma das melhores do mundo; as espessuras, larguras e
comprimentos podiam saciar as mais variadas especificações”. A peroba rosa era
abundante no Paraná, segundo Hoffmann (2009), “também caracterizou as construções do
período da ocupação do norte novo e do noroeste do Paraná, fato esse resultado da
expansão da colonização”. As primeiras construções foram executadas por carpinteiros
locais, que segundo Yamaki (2007), destacam o uso de espécies locais, de técnicas
vinculadas aos imigrantes e particularidades na forma de construir que diferenciam a
produção de edificações em madeira do norte do Paraná de outras localidades. Essas
técnicas reuniam um conhecimento tácito, inerente às tradições aprendidas e ao
conhecimento de trabalho artesanal de imigrantes e descendentes de outros povos que
participaram da ocupação regional paranaense. “As casas eram construídas prioritariamente
com tábuas de peroba e alguns ranchos com lascas de palmito, estes cobertos com
tabuinhas retiradas com facões apropriados”. (IPAC, 1995).

A apropriação dessas influências culturais impregnou-se na construção civil local, que era
predominantemente em madeira, produzindo uma arquitetura popular com traços de
tradição e originalidade, ou seja, com caraterísticas próprias. O conhecimento da arquitetura
vernacular em madeira não foi ensinado em escolas, portanto foi desaparecendo, e, ao
longo do tempo, outros métodos construtivos foram inseridos no contexto global das cidades
novas.
No Paraná existem pesquisas sobre a arquitetura em madeira já desenvolvidas por autores
como Zani (2003), Berriel (2011), Yamaki (2000), Kohlrausch (2007), Hoffmann (2016), são
estudos históricos e reflexão sobre sua preservação no Paraná.
Sobre a arquitetura em madeira trazida por imigrantes, há um acervo bibliográfico
importante com temas pesquisados em outros locais, que são referências e apoio científico
para essa pesquisa. Obras como Arquitetura em Madeira na região de Londrina, pesquisada
por Zani (2003 e 2005); a Casa Eslavo-Paranaense, objeto de estudo de Larocca Júnior,
Larocca e Lima (2008) e as Igrejas Ucranianas, pesquisadas por Batista, Imaguirre e Corrêa
(2009). As capelas em madeira de Maringá são inventariadas por Hoffmann (2016). Porém,
na região do norte e noroeste paranaense há muito a ser levantado e inventariado.

Atualmente, devido à falta de preservação material e documental, parte da memória


histórica e cultural regional vem se perdendo junto aos muitos exemplares de arquitetura em
madeira já extintos. Portanto, ações preservacionistas e propostas de preservação da
memória de edificações e de técnicas construtivas em madeira do período da ocupação na
região mostram-se oportunas e urgentes.
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Além da arquitetura em madeira, disseminação da arquitetura moderna na região, fenômeno
que ocorreu em diversas partes do território brasileiro:

“A arquitetura moderna brasileira recebeu influência da arquitetura


internacional, mas tomou forma própria ao se desenvolver nacionalmente. A
sua difusão a nível regional e local, mesmo entre paradigmas e
antagonismos, assumiu um caráter próprio e de conteúdo híbrido, que
remete à sua complexidade e particularidade, de relevância permanente,
principalmente nas cidades novas do norte do Paraná. Tais
experimentações arquitetônicas que denotam um desejo de modernização
formou ao longo dos anos um conjunto de memória, um conteúdo que
reflete na sua temporalidade um ideal de nação, que tem sido registrado em
todo território brasileiro. (FREITAS, 2016).

O período de implantação das cidades novas paranaenses no início do século XX coincide a


propagação do movimento moderno no Brasil. Ao mesmo tempo em que seus protagonistas
atingem notoriedade e a repercussão do seu trabalho no cenário mundial, no âmbito
nacional a disseminação do modernismo ocorreu em todo Brasil, via profissionais dos
grandes centros e através das leituras populares das formas modernas. Notifica-se a
grandiosa repercussão na exposição Brazil Builds, em 1943, que estabeleceu um vínculo de
imagem de progresso ao país, elevando a arquitetura moderna a um status de arquitetura
oficial, com uma atribuição visual com significância do hodierno, “nuances” de
contemporaneidade almejada pela nação e alcançando admiração popular (SEGAWA,
1997). A arquitetura brasileira passou a ser considerada expressão do novo, segundo
Veloso (2006, p. 372) artistas e intelectuais europeus passaram a viajar para o Brasil na
busca por inspiração cultural. Portanto, muitas construções comerciais e residenciais da
década de 1960 e 1970 possuem características modernistas.
Segundo Mahfuz (2002), a arquitetura moderna rompeu com a arquitetura classicista
realizada até esse momento que consistia na imitação dos estilos arquitetônicos, e substituiu
essa imitação pela ideia autônoma de forma. Na dinâmica dos referenciais modernos no
país, a arquitetura moderna brasileira foi internacionalmente reconhecida a partir da
construção do Ministério da Educação e Saúde no Rio de Janeiro (1930-1940), e com o
projeto da Pampulha (1940-1944). A construção de Brasília (1956) representou a
concretização do ideal de modernização e de arquitetura oficial do governo, a qual já havia
se propagando desde a era Vargas. A partir dessa época ressonâncias formais
manifestaram-se em território nacional e internacional.
Atualmente as discussões sobre o patrimônio moderno e sua preservação tem sido
amplamente expostos no Brasil e no contexto internacional. No caso do patrimônio moderno
brasileiro, a implementação de política de preservação ocorreu via arquitetos ligados ao
movimento moderno e buscou proteção ao passado, valorizando o patrimônio histórico e
artístico nacional, para formar um futuro baseado no ideário progressista de nação.

“A especificidade da preservação do patrimônio cultural no Brasil tendo à


frente os arquitetos ligados ao movimento de renovação arquitetônica,
definiu o critério de seleção dos bens tombados, o qual se baseava no
conceito de excepcionalidade. A definição do valor excepcional tentava
equilibrar preservação e desenvolvimento, nos moldes da Carta de Atenas
do CIAM”. (RODRIGUES, 2005).

A preservação dos bens ligados à arquitetura está diretamente relacionada à identificação e


o reconhecimento de sua importância cultural. Sabe-se que a edificação histórica pode ter
valores, mas “o primeiro impacto será sempre emocional, pois é um símbolo de uma
identidade cultural e continuidade, como herança de um povo”. (FEILDEN, 1994 apud
NAPPI, 2007). Em se tratando de identificação e reconhecimento, ressalta-se a importância
de inventariar e O fato de explicitar e, se possível documentar, é chamar a atenção para a
sua dimensão cultural e a possibilidade de perda dos marcos referenciais. (LONDRES in
MOTTA & SILVA, 1998 p.38). Conhecer é o primeiro passo para preservar as referências
culturais, por isso a importância do inventário está em contribuir para a identificação e
reconhecimento do patrimônio local pela população e viabilizar a prática oficial da
preservação na cidade através das instituições e órgãos públicos.

As ações da trajetória do patrimônio cultural no Brasil refletiram no contexto paranaense.


Durante a década de 1930, a política patrimonial no Paraná desenvolveu-se num período
em que se detectam as dificuldades para definir uma identidade regional. Assim, em 1935,
houve conscientização do tema e criado o Conselho Superior de Defesa do Patrimônio
Cultural do Paraná, um órgão para atuar na defesa e salvaguarda do patrimônio cultural do
Estado, cujas atribuições incluíam a defesa das riquezas naturais, artísticas, literárias e
históricas e a vigilância para “evitar a evasão da coleção de indumentária, filatélica, armas e
quaisquer outras que se relacionam com a riqueza cultural e estética do Paraná, propondo a
sua aquisição pelo Estado” (LEI38/1935).
As ações preservacionistas foram pioneiras, no fim da década de 1940, com a criação
Divisão do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural, um órgão normativo e consultivo no
estado para assessorar o SPHAN na política patrimonial nacional e regional. Através da
elaboração da Lei 112/1948 o governo do Paraná instaurou um setor responsável pela
defesa restauração dos momentos e objetos artísticos e históricos regionais, bem como a
conservação das paisagens e formações naturais características do Estado. A lei de
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tombamento foi efetivada em 1950. Em 1953, nas comemorações do centenário do Estado,
foi aprovada a lei 1211, a primeira lei a dispor sobre o patrimônio histórico, artístico e natural
do Paraná. De acordo com seu artigo estabelece:

“Constitui o patrimônio histórico, artístico e natural do Estado do Paraná o


conjunto dos bens móveis e imóveis existentes no Estado e cuja
conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos
memoráveis da história do Paraná, quer por seu excepcional valor
arqueológico ou etnográfico, bibliográfico ou artístico, assim como os
monumentos naturais, os sítios e paisagens que importa conservar e
proteger pela feição notável com que tenham sido dotados pela natureza ou
agenciados pela indústria humana florestas existentes no território nacional
e as demais formas de vegetação, reconhecidas de utilidade às terras que
revestem, são bens de interesse comum a todos os habitantes do País,
exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que a legislação
em geral e especialmente esta Lei estabelecem”. (LEI1211/1953)

A partir de 1960, as ações de conservação e preservação passaram a englobar além dos


bens arquitetônicos as manifestações culturais, materiais e simbólicas dos segmentos
sociais. Em 1989, seguindo a constituição federal de 1988, que destacou a cultura como um
direito de todos, a Constituição do Paraná instituiu que “ os bens materiais e imateriais
referentes ‘as características da cultura no Paraná constituem patrimônio comum que deve
ser preservado através do Estado, com a cooperação da comunidade”. (CONSTITUIÇÃO
Estadual, 1989, Seção II, artigo 191, p. 101).

As considerações sobre o patrimônio histórico mundial refletiram no estabelecimento de


políticas nacionais, bem como regionais. Os conceitos internacionais são contemplados e
inseridos no contexto brasileiro, ao longo dos anos, mas ganhou notoriedade na
amplificação da noção de patrimônio – calcada na instância histórica e artística até meados
do século XX – para um patrimônio cultural, aliada à ampliação do alcance desta noção em
função do fenômeno da globalização (LAGUNES, 2013). As expressões específicas se
tornam mais abrangentes, como afirma Castriota (2009, p. 84), com o tempo o uso do termo
sofre uma ampliação e um deslocamento, sendo utilizado hoje em uma série de expressões,
que abrangem uma gama de fenômenos muito mais ampla que a inicial.

Através de experiências artísticas como as do modernismo, a América Latina em linhas


gerais, iniciou a idealização de uma modernização e busca por uma identidade nacional,
aproximadamente em meados das décadas de 1920-30. “A adesão ao movimento moderno
no campo cultural, desencadeia em países latino-americanos um processo de valorização
dos aspectos locais, arraigados à tradição, que conduz inclusive ao reconhecimento dos
monumentos históricos nacionais”. (CERÁVOLO, 2010, p. 124).
Embora exista o fenômeno da globalização e seus efeitos nas interpretações sobre cultura,
arquitetura e arte, a preservação do patrimônio é um campo de proeminência no contexto
social atualmente. Ao logo do século XX houve transformação do entendimento sobre o
patrimônio, sobretudo pelo reconhecimento de que a sociedade é composta por grupos
sociais com interesses diferenciados, pertencimentos múltiplos, interesses conflitantes e
contraditórios e não se pode falar em identidade como um dado puro, mas sim em
identidades fluídas e em constante transformação (CASTELLS, 2000, p. 24).
A globalização, as redes de cidades ou os patrimônios da humanidade são ideias que “não
têm validade para a maioria das pessoas, pois o seu acesso efetivo aos bens e serviços
distribuídos conforme a hierarquia urbana depende do seu lugar socioeconômico e também
do seu lugar geográfico” (SANTOS, 2007, prefácio). No contexto pós-moderno as cidades,
os lugares e os patrimônios são crescentemente submetidos à lógica capitalista, que todas
as coisas, materiais ou não, são transformadas em mercadorias negociáveis (HARVEY,
2005).
No contexto apresentado observa-se que na região do Paraná, a prática realizada há
décadas como ação de preservação de imóveis enquadrados como possuidores de valores
consiste na identificação e reconhecimento do patrimônio histórico edificado e então o
tombamento, porém com relação ao patrimônio moderno a prática se faz há pouco tempo.
O imaginário coletivo está voltado a obras do século XIX, mas com a criação do Docomomo
Brasil juntamente à Universidade Federal da Bahia – UFBA, em 1992, a documentação de
edifícios e sítios modernos tem se tornado um instrumento de salvaguardar o patrimônio
cultural, além de promover o tema nos seminários nacionais. Embora seja um evento
acadêmico, os as discussões têm permeado e fomentado as instâncias públicas
responsáveis. Entre 2002 e 2007, esteve vinculado com a Universidade de São Paulo -
USP, nas unidades de São Carlos e São Paulo e desde 2008 a sede é na Universidade
Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS, em Porto Alegre. O Docomomo Paraná, criado em
2005, vinculado ao Grupo de Pesquisa Teoria e História de Arquitetura e Urbanismo da
PUCPR. O 1º Seminário Docomomo Paraná teve como tema: Constituição da Arquitetura
Moderna no Paraná e aconteceu em Curitiba, entre 17 e 18 de agosto de 2006, na PUCPR.
A sua décima edição ocorreu em Curitiba, de 15 a 18 de outubro de 2016, abordando o
Brutalismo.
As discussões entre a identificação, valoração e preservação são temas presentes no
âmbito nacional e no Paraná. A valorização do presente se destaca em meio ao turbilhão da
cidade em crescimento onde as antigas construções são substituídas ou modificadas num
fluxo contínuo, pois as cidades estão em constante transformação. Considerando que Paula
(2011) “ nas cidade novas, tudo é histórico, pois tudo está se fazendo ou se fez em um

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tempo tão próximo, que não dispomos dos instrumentos oferecidos pelo tempo histórico
para definir o que é necessário e premente preservar (o que compõe a paisagem urbana a
muito, muito tempo)”.

A colonização do Norte do Paraná constitui uma das experiências de organização do


território e de projeto de Cidades Novas, mais significativas realizadas no Brasil no século
XX. (YAMAKI, 2003). A questão do tempo e das transformações em cidades novas é um
aspecto importante no que se refere à preservação, pois a expressão de cultura e identidade
da região estão representadas nos edifícios existentes e que é preciso ser avaliada para que
o patrimônio local seja identificado, valorizado e preservado.

No contexto apresentado observa-se que na região do Paraná, a prática realizada há


décadas como ação de preservação de imóveis enquadrados como possuidores de valores
consiste na identificação e reconhecimento do patrimônio histórico edificado e então o
tombamento, porém com relação ao patrimônio moderno a prática se faz há pouco tempo.

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