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Paulista

Revista
Volume 16
Número 2
Abril/Junho 2017

de Reumatologia
ISSN 1809-4635

Sociedade Paulista de Reumatologia

Lúpus eritematoso sistêmico,


da bancada ao consultório

conselho editorial
Edgard Torres dos Reis Neto
Samuel Katsuyuki Shinjo
Sandra Hiroko Watanabe www.reumatologiasp.org.br
Fórum de Debates 2017
em Reumatologia
Sempre às terças-feiras, às 20 horas

Local: Associação Médica Brasileira – Auditório Nobre “Prof. Dr. Adib Jatene”
– Rua São Carlos do Pinhal, 324 – Bela Vista (próximo ao Maksoud Plaza
Hotel) – São Paulo – SP.

Estacionamento conveniado: Feller Estacionamentos – Rua São Carlos do


Pinhal, 200 – Bela Vista (esquina com a Alameda Joaquim Eugênio de Lima).

Local da confraternização: Avenida Paulista Hotel – Rua São Carlos do


Pinhal, 200 – Bela Vista (esquina com a Alameda Joaquim Eugênio de Lima).

Próximos encontros:
Participe e incentive a participação
de seus colegas reumatologistas. • 1o de agosto – usp/sp
Após os debates, você é nosso • 5 de setembro – usp/
convidado para degustar um ótimo ribeirão preto
jantar no restaurante do hotel.
• 3 de outubro – unisa
Paulista
Revista

de Reumatologia
Órgão Oficial da Sociedade Paulista de Reumatologia

Conselho Editorial
Edgard Torres dos Reis Neto, Samuel Katsuyuki Shinjo, Sandra Hiroko Watanabe

Editores Associados
Eduardo Ferreira Borba Neto, Dawton Y. Torigoe

Sociedade Paulista de Reumatologia


DIRETORIA EXECUTIVA 2016/2017 Comissão de Educação Médica
Célio Roberto Gonçalves, Cristiano Barbosa Campanholo, Flávio Calil
Presidente: Eduardo Ferreira Borba Neto
Petean, Júlio Cesar Bertacini de Moraes, Manoel Barros Bértolo, Rita
Vice-Presidente: Rubens Bonfiglioli Nely Vilar Furtado

Diretora Científica: Danieli Castro Oliveira de Andrade Representantes da Reumatologia Pediátrica


Cláudia Saad Magalhães, Clovis Artur Almeida da Silva, Maria Teresa
1ª Secretária: Sandra Hiroko Watanabe S. L. R. Ascensão Terreri, Paulo Roberto Stocco Romanelli, Rosa Maria
Rodrigues Pereira, Simone Appenzeller, Virgínia Paes Leme Ferriani
2ª Secretária: Simone Appenzeller
Comissão de Ética Médica e Defesa Profissional
1ª Tesoureira: Renata Ferreira Rosa Eduardo de Souza Meirelles, José Marques Filho, Marco Tadeu Moreira
2° Tesoureiro: Renê D. Ribeiro de Oliveira de Moraes

Comissão de Mídia Eletrônica e Social (Site)


Conselho Fiscal e Consultivo
Herbert Klaus Mählmann, Leonardo Santos Hoff, Rodrigo Luppino Assad,
Ari Stiel Radu Halpern, José Carlos Mansur Szajubok, Luiz Carlos Latorre,
Michelle Remião Ugolini Lopes
Paulo Louzada Junior, Dawton Y. Torigoe
Comissão do Interior
Comissão Científica Araçatuba: Paulo de Tarso Nora Verdi; Barretos: Carolina Borges Garcia
Abel Pereira de Souza Jr., Alexandre Wagner Silva de Souza, Andrea Sasdelli; Bauru: Roberta de Almeida Pernambuco; Botucatu: Cláudia Saad
B. V. Lomonte, Carla Gonçalves Schahin Saad, Cristiano Barbosa Magalhães; Campinas: Ibsen Bellini Coimbra; Catanduva: Sandra Regina
Campanholo, Karina Bonfiglioli, Marcelo de Medeiros Pinheiro, Nafice Miyoshi; Marília: César Emile Baaklini; Ribeirão Preto: Flávio Calil Petean;
Costa Araújo, Paulo Roberto Stocco Romanelli, Rodrigo Luppino Assad, Santos: Jorge Eduardo Correa Clemente; São Carlos: Rogério Carvalho
Virgínia Fernandes Moça Trevisani, Zoraida Sachetto Vieira Chachá; São José do Rio Preto: Roberto Acayaba de Toledo; Sorocaba:
José Eduardo Martinez; Vale do Paraíba: José Roberto Silva Miranda
Departamento de Reumatologia da Associação Paulista de Medicina
2014-2017 Correspondência
Presidente: Ivone Minhoto Meinão; 1° Secretário: Henrique Carriço da Rua Maestro Cardim, 354, conjuntos 53, 71 e 72, CEP 01323-000, São
Silva; 2° Secretário: Plínio José do Amaral; Coordenadora Científica: Paulo, SP. Fone/fax: (11) 3284-0507
Deborah Colucci Cavalcante de Souza E-mail: reumatologiasp@reumatologiasp.com.br

Et Cetera Editora de Livros e Revistas


Direção: Kleber Kohn
Coordenação: Silvia Souza
Jornalista: Luciana C. N. Caetano (MTb 27.425)
Fones: (11) 3565-0226  /  3565-0231
etcetera@etceteraeditora.com.br / www.etceteraeditora.com.br
sumário

Editorial
  5 Lúpus eritematoso sistêmico
Eduardo Ferreira Borba Neto
Edgard Torres dos Reis Neto
Samuel Katsuyuki Shinjo
Sandra Hiroko Watanabe

Artigos
  6 Autoanticorpos no LES: da patogenia a sua importância na prática clínica
Sandra Gofinet Pasoto
Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfá

14 Nefrite lúpica: tratamento baseado nos consensos e casos refratários


Luciana Parente Costa Seguro
Eduardo Ferreira Borba Neto

19 Tratamento das lesões cutâneas no LES: visão do dermatologista


Mônica Ribeiro de Azevedo Vasconcellos

26 Biomarcadores no lúpus eritematoso sistêmico


Mariana Postal
Simone Appenzeller

30 Depressão, ansiedade e disfunção cognitiva no lúpus eritematoso sistêmico:


da fisiopatologia à abordagem neuropsicológica
Helena Alessi

35 Causas de mortalidade no LES e estratégias de prevenção


Emilia Inoue Sato

38 Lúpus eritematoso sistêmico, da bancada ao consultório: opinião do especialista,


desafios e perspectivas
Luiz Carlos Latorre

CAPA:  © Shutterstock by Boule/210081253


editorial

Lúpus eritematoso sistêmico


O lúpus eritematoso sistêmico sempre foi uma doença de grande destaque na medicina, pois envolve
todas as especialidades da clínica médica, inclusive a psiquiatria e a ginecologia/obstetrícia. Apesar
da diversidade de suas manifestações clínicas, houve grande avanço no diagnóstico e tratamento
da doença, especialmente nas últimas décadas, possibilitando melhora da sobrevida dos pacientes.
Assim, felizmente, o estigma do lúpus eritematoso sistêmico vem sendo superado graças aos avanços
no estudo da doença.
Nesta edição, intitulada Lúpus eritematoso sistêmico, da bancada ao consultório, os temas foram
selecionados a fim de proporcionar aos reumatologistas e demais colegas atualizações didáticas dos
principais aspectos que norteiam a sua prática clínica diária.
Com uma abordagem simples, experts na doença trouxeram importantes considerações a respei-
to dos temas escolhidos, entre eles a participação dos autoanticorpos em sua etiopatogenia e uma
visão sobre os principais quadros da doença. Ao se considerar uma maior sobrevida com melhor
qualidade para os pacientes, são abordados também aspectos de ordem psicológica e estratégias de
prevenção da mortalidade.
Por fim, temos uma perspectiva sobre os desafios no dia a dia do tratamento da enfermidade, que
continua encantando desde alunos da graduação até os mais renomados reumatologistas... inclusive
os autores desta publicação.

Eduardo Ferreira Borba Neto


Edgard Torres dos Reis Neto
Samuel Katsuyuki Shinjo
Sandra Hiroko Watanabe

Revista Paulista de Reumatologia 5 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):5


Artigo

Autoanticorpos no les: da patogenia a sua importância


na prática clínica
Sandra Gofinet Pasoto 1    Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfá 2

Introdução moléculas altamente conservadas e estão presentes em concentra-


Pode-se dizer que o lúpus eritematoso sistêmico (LES) é o protó- ções séricas moderadas a altas2. Contudo, com respeito a sua pos-
tipo das doenças inflamatórias crônicas sistêmicas. De fato, múl- sível participação na patogenia das lesões orgânicas, frequências,
tiplos sistemas orgânicos podem ser acometidos de forma simul- especificidade e também quanto a seu significado clínico, essas
tânea ou evolutivamente, levando a um espectro muito amplo reatividades compõem um grupo muito heterogêneo.
de apresentações clínicas, composto especialmente por mani- A avaliação do perfil de autoanticorpos é de fundamental im-
festações decorrentes do envolvimento mucocutâneo (tais como portância para a caracterização clínica do paciente com LES, ou
fotossensibilidade, diferentes formas de erupções cutâneas, seja, para o seu diagnóstico, seguimento clínico e também para o
alopecia, úlceras de mucosas, lesões vasculíticas), poliartral- prognóstico. O teste dos anticorpos antinucleares (ANA ou FAN)
gias/poliartrite, pleurite, pericardite, glomerulonefrite (hiper- através do método de imunofluorescência indireta (IFI) com as
tensão arterial sistêmica, hematúria microscópica, proteinúria, células HEp-2 é o primeiro a ser solicitado, sendo positivo em cer-
insuficiência renal aguda e crônica), alterações hematológicas ca de 99% dos pacientes com LES e compondo os critérios de clas-
(anemia, leucopenia, linfopenia, plaquetopenia) e acometimen- sificação dessa doença3,4. Todavia, o FAN é um teste de screening
to do sistema nervoso central (que pode ocasionar convulsões, altamente sensível, mas pouco específico para o diagnóstico do
psicose, meningite asséptica, síndrome cerebral orgânica, etc.). LES, ocorrendo também em muitas outras condições clínicas, au-
Além disso, seu curso evolutivo é caracterizado pela alternân- toimunes, infecciosas, neoplásicas e também em cerca de 15% dos
cia entre períodos de exacerbação (doença ativa) e remissão. A indivíduos saudáveis (principalmente idosos)5. Assim, na suspeita
etiologia do LES ainda é desconhecida, mas a sua patogênese é clínica de LES e também para o seguimento de tais pacientes, é
sabidamente autoimune. Nesse aspecto, uma das características mandatória a caracterização específica dessa reatividade, pois al-
mais marcantes do LES e que reflete a ativação policlonal das guns anticorpos são bastante relevantes do ponto de vista clínico
células B observada nessa doença consiste na produção de múl- no que se refere ao diagnóstico da doença, a seu monitoramento
tiplos autoanticorpos circulantes, levando à formação de imu- clínico e ao valor prognóstico5,6.
nocomplexos, os quais, desencadeando o processo inflamatório, Entre os principais autoanticorpos no LES, temos o anticorpo
constituem uma importante causa de lesão orgânica no LES1. anti-DNA de dupla hélice (anti-dsDNA) ou anti-DNA nativo e o anti-
De forma similar ao amplo espectro de manifestações clí- -Sm, os quais são marcadores sorológicos específicos dessa doença.
nicas do LES, também os autoanticorpos nessa doença formam O anticorpo anti-dsDNA pode ser detectado em cerca de 40% até
um grande conjunto heterogêneo de reatividades com distintas 70% dos pacientes com LES (variando de acordo com as diferentes
especificidades dirigidas a epítopos de moléculas altamente con- populações avaliadas e também com o método empregado para
servadas entre as espécies e constituintes de diferentes organelas a sua detecção) e a titulação de suas concentrações séricas é útil
celulares (tais como cromossomos, nucléolos, membrana nuclear, para o acompanhamento da atividade da doença, particularmen-
ribossomos, membrana celular), presentes em diferentes tipos de te da nefrite. O anticorpo anti-Sm é identificado em aproximada-
células (tais como células endoteliais, hemácias, neutrófilos, lin- mente 30% dos pacientes com LES e não tem valor no acompanha-
fócitos, plaquetas, células residentes renais e neurônios), além de mento da doença. O anticorpo anti-proteína P ribossomal (anti-P
moléculas constituintes da matriz extracelular. De fato, em uma ou anti-Rib-P), positivo em torno de 13% a 40% dos pacientes com
recente revisão da literatura, foram compilados 180 diferentes au- LES, está associado principalmente aos quadros psiquiátricos e,
toanticorpos descritos em pacientes com LES no período de 1960 mais recentemente, foi também associado à forma membranosa
a 20112. Tais anticorpos compartilham algumas características da nefrite lúpica. Os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B não são
gerais, a saber: são predominantemente da classe IgG, dirigidos a específicos do LES, mas podem ser detectados em cerca de 30-40%

1. Médica assistente, doutora. Disciplina de Reumatologia e Laboratório Como citar este artigo: Pasoto SG, Bonfá ESDO. Autoanticorpos
de Diagnóstico de Autoimunidade (Divisão de Laboratório Central – no les: da patogenia a sua importância na prática clínica.
DLC e Laboratório de Investigação Médica – LIM17). Hospital Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):6-13.
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. As autoras não contaram com apoio financeiro.
2. Professora titular da disciplina de Reumatologia. Coordenadora As autoras declaram não ter interesses associativos, comerciais,
do Laboratório de Investigação Médica – LIM17. Hospital das Clínicas de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. nos produtos e empresas descritos neste artigo.
E-mails para contato: sandra.pasoto@hc.fm.usp.br/
eloisa.bonfa@hc.fm.usp.br.

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Autoanticorpos no les: da patogenia a sua importância na prática clínica

e 10-15% desses pacientes, respectivamente, e estão associados é o anticorpo anti-Ro/SS-A, que não é específico do LES e ocorre em
com a fotossensibilidade, com o lúpus cutâneo subagudo, com o lú- cerca de 30-40% desses pacientes. Esse anticorpo é marcador da
pus neonatal e com a síndrome de Sjögren secundária ao LES. Há síndrome do lúpus neonatal, atribuída à transferência passiva da
ainda outros anticorpos mais raros, como o anti-proliferating cell IgG materna para o feto, a qual apresenta uma associação tempo-
nuclear antigen (anti-PCNA), presente em torno de 5% dos casos de ral bem definida com as manifestações cutâneas e cardíacas dessa
LES e cuja utilidade clínica é ainda pouco conhecida2,5,6. síndrome. De fato, o bloqueio cardíaco ocorre a partir da 20ª sema-
No presente artigo, faremos uma revisão sobre a importân- na de gestação, justamente quando se inicia a passagem transpla-
cia dos autoanticorpos na patogênese da doença e como biomar- centária da IgG materna para o feto13. Demonstramos em modelo
cadores de diagnóstico, de atividade clínica e de prognóstico. As experimental que a perfusão do anticorpo anti-Ro/SS-A é capaz de
metodologias mais adequadas para sua detecção serão também induzir bloqueio cardíaco de 3º grau em coração isolado de coelho
discutidas, principalmente quanto aos aspectos relevantes para a e esse efeito não ocorreu com a injeção de IgG normal ou de outra
interpretação dos resultados e o conhecimento sobre as limitações
especificidade14. Evidenciamos ainda que esse anticorpo foi capaz
de cada método.
de inibir o influxo de cálcio em miócitos isolados de coelho subme-
tidos ao patch-clamp15. Esses achados corroboram com a hipótese
Papel patogênico dos autoanticorpos no LES de que o anticorpo anti-Ro/SS-A é capaz de causar um distúrbio no
O número de autoanticorpos com evidências bem documentadas sistema de condução cardíaco, sugerindo assim um possível meca-
de seu possível papel patogênico no LES é bastante limitado. A nismo capaz de induzir o bloqueio cardíaco congênito.
comprovação da patogenicidade é difícil e requer a demonstra- O segundo anticorpo que abordaremos é o anti-proteína P
ção de associação clínica, reprodução em modelos experimentais ribossomal, o qual é específico para o LES e suas concentrações
e demonstração do mecanismo patogênico7. Esses critérios foram séricas apresentam flutuações relacionadas com os episódios de
preenchidos por um número bastante limitado de autoanticorpos, psicose decorrentes dessa doença17. Quanto ao possível papel pa-
os quais são apresentados na Tabela 1 (juntamente com os respec- togênico do anti-P no lúpus neuropsiquiátrico, existem evidências
tivos mecanismos propostos)8-23. in vitro e in vivo. Inicialmente, foi relatado que a membrana celu-
Abordaremos, como exemplo, dois desses anticorpos que fo- lar do neuroblastoma humano contém uma proteína reconhecida
ram extensivamente estudados por nosso grupo. O primeiro deles pelo anticorpo anti-P18. Posteriormente, foi demonstrado que esse

Tabela 1 Autoanticorpos com evidências mais consistentes de seu papel patogênico no LES.

Autoanticorpo Associação clínica Mecanismos de patogenicidade


Anti-dsDNA Nefrite • Formação/deposição de imunocomplexos no mesângio e nos capilares
glomerulares, com a consequente ativação do sistema complemento e
indução da resposta inflamatória8,9
• Ligação a proteínas presentes na membrana celular (α-actinina, laminina,
anexina II) das células residentes renais (células mensangiais, endoteliais,
tubulares, podócitos) levando a disfunções celulares8,9
• Internalização do anticorpo nas células residentes renais, levando à apoptose
dessas células8,9
• Indução da produção de INF-α pelas células dendríticas após a internalização
do anticorpo ligado ao receptor de Fc e liberação do respectivo DNA ligante
para a sinalização via TLR99*
aNu Nefrite • Ligação a fragmentos de cromatina expostos no mesângio e nos glomérulos,
formando imunocomplexos7,8,10
• Ligação às células residentes renais (células mensangiais, endoteliais, tubulares)
levando a disfunções celulares11
Anti-C1q Nefrite • Interferência com a via clássica do sistema complemento (como demonstrado
in vitro), diminuindo o clearance de células apoptóticas11,12
Anti-Ro/SS-A Lúpus neonatal • Inibição do influxo de cálcio em modelo de miócitos isolados, levando a alterações
funcionais no sistema de condução cardíaco13-15
Linfopenia • Linfotoxicidade demonstrada in vitro16
Anti-P LES neuropsiquiátrico • Inibição do influxo de cálcio em células neuronais através da ligação a uma
proteína específica localizada na membrana celular, levando a alterações no
eletro-oscilograma no hipocampo e também a distúrbios olfativos similares à
depressão no modelo murino17-21
Anti-NMDA LES neuropsiquiátrico • Atuação via ligação aos receptores NMDA, levando a alterações do fluxo de íons
através da membrana celular dos neurônios, internalização desses receptores nos
neurônios e indução de apoptose dessas células principalmente no hipocampo22,23
LES = lúpus eritematoso sistêmico; anti-dsDNA = anticorpo anti-DNA de dupla hélice; aNu = anticorpo antinucleossomo; anti-P = anticorpo antiproteína P
ribossomal; anti-NMDA = glutamate receptor antibodies (anti-receptor N-metil-D-aspartato).
* Nota: os diversos processos de morte celular podem ocasionar a liberação de diferentes moléculas de DNA, com diferentes propriedades imunogênicas.
Tais moléculas são apresentadas pelas células dendríticas aos linfócitos B autorreativos, levando à quebra da tolerância imunológica10,11.

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Pasoto SG, Bonfá ESDO

anticorpo se liga a uma proteína da membrana celular dos neurô- ocorre principalmente nos neutrófilos)10. No processo de apoptose,
nios, denominada neuronal surface P antigen, levando a alterações o DNA é liberado para o extracelular nos corpos apoptóticos, mi-
no influxo de cálcio celular e apoptose em culturas celulares19. cropartículas e também como free low-molecular-weight DNA (em
Além disso, o anticorpo anti-P humano purificado, quando injeta- decorrência de ser clivado pela ação das DNases). A necrose leva
do nos ventrículos cerebrais de camundongos, reproduziu um dis- principalmente à liberação de free high-molecular-weight DNA e,
túrbio olfativo análogo à depressão20. Mais recentemente, foram na NETose, o DNA secretado está acoplado aos neutrophil extra-
descritas alterações no eletro-oscilograma no hipocampo após a cellular traps (NET)10,26. Essa variedade de moléculas de DNA auto-
injeção do anticorpo anti-P humano purificado nos ventrículos ce- antigênicas certamente gera dificuldades em se estabelecer qual o
rebrais de ratos21. Apesar dessas evidências bastante sólidas, nem melhor substrato antigênico a ser utilizado nos ensaios para detec-
todos os pacientes com esses anticorpos apresentam as manifes- ção dos anticorpos anti-dsDNA.
tações clínicas relacionadas, sugerindo que talvez seja necessária Além disso, diferentes ensaios têm sido empregados para a
uma segunda condição (second hit), para que o distúrbio induzido detecção desse anticorpo, tais como imunodifusão, fixação do
pelo anticorpo possa ocorrer. complemento, ensaio Farr (imunoprecipitação com DNA marca-
do com radioisótopo como antígeno e solução saturada de sulfato
de amônia), imunoprecipitação com PEG (imunoprecipitação com
Relevância dos autoanticorpos
DNA marcado com radioisótopo como antígeno e polietileno glicol
para o diagnóstico do LES – PEG), IFI com C. luciliae, Elisa e ensaio multiplex26. Esses ensaios
Os autoanticorpos são muito úteis para o diagnóstico do LES e po- diferem quanto à natureza do substrato de DNA, como antígenos
dem preceder a doença em anos. O trabalho clássico de Arbuckle purificados de diferentes fontes (mamíferos, bactérias, protozo-
et al. (2003) demonstrou que 50% dos pacientes eram anti-dsDNA ários) e oligonucleotídeos sintéticos de dupla hélice. Tais dife-
positivo dois anos antes da primeira manifestação do LES24. E esse renças podem ocasionar resultados discrepantes. Por exemplo, o
padrão de preceder a doença em anos ocorreu também para ou- DNA do protozoário C. luciliae tem uma estrutura conformacional
tras especificidades de anticorpos observadas no LES. Ressalta-se, similar à do DNA nucleossomal, o que pode permitir a detecção
no entanto, que a presença do autoanticorpo isoladamente (ou de um determinado subgrupo dos anticorpos anti-dsDNA. Por
seja, sem manifestações clínicas) não é suficiente para o diagnósti- outro lado, o DNA purificado de fontes animais, diferentemente
co. Por outro lado, o achado do anticorpo específico indica a neces- dos oligonucleotídeos sintéticos, pode apresentar graus variáveis
sidade de uma vigilância mais próxima do paciente para um possí- de ligação com proteínas nucleares, particularmente as histonas.
vel diagnóstico precoce. Os anticorpos marcadores de doença, isto Além disso, existem diferenças entre os vários métodos quanto
é, aqueles que são praticamente restritos a uma patologia, apre- às condições da ligação antígeno-anticorpo, como, por exemplo,
sentam maior utilidade para o seu diagnóstico. Estão incluídos a concentração salina26. No momento, não existe um ensaio “pa-
nessa lista para o LES os anticorpos anti-dsDNA, antinucleossomo, drão-ouro” bem estabelecido. Para alguns pesquisadores, o en-
anti-Sm e antiproteína P ribossomal (lembrando que esse foi re- saio Farr estaria nessa posição, por detectar somente anticorpos
centemente relatado na hepatite autoimune)25. Esses anticorpos, de alta afinidade devido à concentração salina elevada (solução
no entanto, tem uma frequência variável na doença e, dessa for- de sulfato de amônia saturada) e ser um método quantitativo26,27.
ma, sua ausência não exclui o diagnóstico. É importante ressaltar O Elisa, comparado ao ensaio Farr, apresenta maior sensibilida-
que, para o diagnóstico, é necessário que o teste seja altamente de, por detectar anticorpos de alta e baixa afinidade; contudo,
específico, mesmo que a sensibilidade seja prejudicada, confor- sua especificidade é menor26,27.
me ilustrado na Tabela 2. Isso é particularmente relevante para o O ACR Ad Hoc Committee on Immunological Testing Guidelines,
anticorpo anti-dsDNA, pois o método de ensaio imunoenzimático através de extensa revisão da literatura, concluiu que os três mé-
(ELISA) perde muito em especificidade e deve ser confirmado pelo todos mais comumente empregados (ensaio Farr, Elisa e IFI com
método complementar de IFI utilizando o hemoflagelado Crithidia C. luciliae) apresentam boa correlação quando foram aplicados
luciliae como substrato antigênico26. em populações de pacientes, mas houve diferenças significativas
quando essas técnicas foram aplicadas a pacientes individuais. A
recomendação desse Comitê é que o anticorpo anti-dsDNA é útil
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice para o suporte diagnóstico do LES em um cenário clínico sugestivo
O anticorpo anti-dsDNA foi descrito pela primeira vez em 1957, dessa doença28.
quando foi detectado nos soros de pacientes com LES e, posterior- Posteriormente, o teste de Elisa foi recomendado como um tes-
mente, foi também encontrado na forma de imunecomplexos depo- te de screening para a detecção do anticorpo anti-dsDNA em gran-
sitados nos tecidos renais de pacientes com glomerulonefrite lúpica, des rotinas laboratoriais, seguido pelo teste complementar mais
sugerindo um papel patogênico nessa condição clínica (Tabela 1)7-11. específico de IFI com C. luciliae29.
O anticorpo anti-dsDNA é considerado um marcador sorológico do Os novos critérios de classificação do LES (Systemic Lupus In-
LES, já que é raramente detectado nos soros de indivíduos com ou- ternational Collaborating Clinics Classification Criteria for Systemic
tras doenças autoimunes, enquanto 40-70% dos pacientes com LES Lupus Erythematosus – SLICC, 2012) colocam como um item a pre-
são positivos para essa reatividade5-6. Caracteristicamente, essa rea- sença do anticorpo anti-dsDNA4. Contudo, os tipos de imunoensaio
tividade produz o padrão de IFI nuclear homogêneo no teste de FAN recomendados não são especificados. Há apenas a observação de
com células HEp-2, como ilustrado na Tabela 2. que, no caso do Elisa, o valor seja duas vezes acima ao da refe-
No núcleo das células, a molécula de DNA encontra-se ligada rência do laboratório4. Nesse aspecto, um artigo recente comparou
a várias proteínas, particularmente às histonas, formando as uni- quatro diferentes métodos para a detecção do anti-dsDNA: ensaio
dades estruturais conhecidas como nucleossomos (molécula de multiplex, imunoensaio fluoroenzimático (EliA), IFI com C. luciliae
DNA acoplada a um octâmero de histonas). O DNA e os nucleosso- e line blot30. Foi demonstrado que a especificidade desses ensaios
mos podem ser liberados das células, tornando-se acessíveis às cé- foi equivalente à da IFI com C. luciliae somente após o ajuste dos
lulas do sistema imune, como consequência de diversos mecanis- respectivos cut-offs para duas vezes acima ao valor de referência
mos de morte celular, como a apoptose, a necrose e a NETose (que do laboratório30.

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Tabela 2 Autoanticorpos com relevância na prática clínica do LES: diagnóstico da doença, diagnóstico das manifestações sistêmicas, seguimento da atividade da doença e valor
prognóstico2,5-7,13,17,22-53.
Autoanticorpo Padrão de FAN Frequência Específico? Apoio Associações Correlação Prognóstico Métodos
diagnóstico clínicas com atividade a longo prazo de detecção

Atividade geral
Anti-dsDNA 40-70% Sim Sim Nefrite ↓  Sobrevida renal
Atividade renal
IFI com C. luciliae
Farr, ELISA

Revista Paulista de Reumatologia


Sim Atividade geral
aNu 61-85% Sim Nefrite — ELISA
LES juvenil Atividade renal?

ID, CIE, HA,


Anti-Sm 20-40% Sim Sim ? Não —
ELISA, Wb

Atividade geral
Sim LES neuropsiquiátrico
Anti-P 13-40% Sim Atividade do SNC ↑  Sobrevida renal Wb, ELISA
(sem o anti-dsDNA)
LES juvenil GN membranosa

9
Atividade renal?
30-40% Sim Fotossensibilidade
Autoanticorpos no les: da patogenia a sua importância na prática clínica

LE cutâneo subagudo
Anti-Ro/SS-A LE cutâneo subagudo: 70-80% Não LE cutâneo subagudo Leuco/linfo/plaquetopenia Não — ID, CIE, ELISA, Wb
Púrpura palpável
LE neonatal: 90% LE neonatal Síndrome de Sjögren
10-15% Sim
LE cutâneo subagudo
Anti-La/SS-B LE subagudo: 30% Não LE cutâneo subagudo Não — ID, CIE, ELISA, Wb
Síndrome de Sjögren
LE neonatal: 90% LE neonatal
Antifosfolípides — 30-40% Não Sim Manifestações da SAF Não — ELISA
Atividade geral
Anti-C1q — 17-46% Não Não Nefrite ↓  Sobrevida renal ELISA
(com o anti-dsDNA)
Atividade renal
Anti-NMDA — 14-35% Não Não LES neuropsiquiátrico Atividade do SNC — ELISA

ID, CIE, HA,


Anti-U1RNP 20-30% Não Não Fenômeno de Raynaud Não —
ELISA, Wb

LES = lúpus eritematoso sistêmico; LE = lúpus eritematoso; GN = glomerulonefrite. Anti-dsDNA = anticorpo anti-DNA de dupla hélice; aNu = anticorpo antinucleossomo; anti-P = anticorpo antiproteína P ribossomal; anti-NMDA = glutamate
receptor antibodies (anti-receptor N-metil-D-aspartato). IFI = imunofluorescência indireta; Farr = imunoprecipitação com DNA marcado com radioisótopo como antígeno; ELISA = ensaio imunoenzimático; ID = imunodifusão dupla; CIE =

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contraimunoeletroforese; HA = hemaglutinação passiva; Wb = Western blotting. Imagens de IFI: aumento de 400x, fonte: Laboratório de Diagnóstico de Autoimunidade.
Pasoto SG, Bonfá ESDO

Anticorpo antinucleossomo a interpretação dos resultados deve sempre levar em considera-


O nucleossomo é a unidade fundamental da cromatina formada ção o contexto clínico do paciente. O Wb é um método mais elabo-
por uma molécula de DNA em torno de um octâmero de histonas rado, bastante específico e mais sensível que a CIE. De modo geral,
(H2A-H2B-H3-H4). O anticorpo antinucleossomo (aNu) produz o os métodos de Elisa e HA são considerados mais sensíveis e a CIE
padrão de IFI nuclear homogêneo no teste de FAN com células e o Wb, mais específicos32.
HEp-2 (Tabela 2). Esse autoanticorpo é detectado pela técnica de
Elisa e sua frequência no LES varia em torno de 61% a 85%, sendo Anticorpo antiproteína P ribossomal
considerado um marcador específico e também associado com a
O anticorpo antiproteína P ribossomal é considerado um mar-
atividade da doença e possivelmente com a nefrite lúpica2,5,6,8,11.
cador sorológico adicional para o LES, podendo ser detectado
Os pacientes com LES com antinucleossomo positivo são tam-
em 13% a 40% dos casos, dependendo das diferentes populações
bém geralmente positivos para o anticorpo anti-dsDNA, contudo,
avaliadas e dos métodos empregados para a sua detecção33. Esse
existem alguns pacientes que apresentam reatividade dirigida
anticorpo é dirigido a epítopos presentes em três fosfoproteínas
apenas para o nucleossomo. A maior relevância dos anticorpos
ribossômicas ácidas com pesos moleculares de 38, 19 e 17 kDa, de-
antinucleossomo na prática clínica refere-se principalmente a
nominadas de P0, P1 e P2, respectivamente, as quais se localizam
esses casos5,6.
na maior subunidade ribossômica (60S). O principal epítopo é um
Recentemente, foi publicada uma revisão sistemática e me-
domínio altamente conservado, localizado na extremidade carbo-
tanálise comparando o desempenho diagnóstico no LES dos anti-
xiterminal dessas proteínas e constituído por uma sequência de
corpos aNu e anti-dsDNA e foram observados respectivamente os
22 aminoácidos33.
seguintes resultados: sensibilidade: 59,9% vs. 52,4%; especificida-
No teste de FAN por IFI utilizando células HEp-2, o anticorpo
de: 94,9% vs. 94,2%; razão de chance para diagnóstico do LES: 41x
anti-P apresenta um padrão misto ou composto de IFI com mar-
vs. 28x e razão de chance para diagnóstico do LES juvenil: 146x
cação do citoplasma das células em interfase com um padrão
vs. 51x31. Nesse estudo, o aNu, diferente do anti-dsDNA, foi signi-
pontilhado fino denso e também com marcação dos nucléolos
ficativamente associado à atividade de doença medida por esco-
(Tabela 2). Contudo, ele não se constitui em um teste de rastreio
res internacionais e ambos os anticorpos não se correlacionaram
confiável para esse autoanticorpo, porque menos de 30% dos
significativamente com o acometimento renal31. Esses achados
soros positivos para anti-P pela técnica de Elisa são também
demonstram que o anticorpo antinucleossomo é relevante para o
positivos por IFI com células HEp-234. O anticorpo anti-P pode
diagnóstico do LES, parecendo ser especialmente útil para o diag-
ser pesquisado por vários métodos, tais como imunoprecipi-
nóstico do LES juvenil. Além disso, mostrou-se útil também para o
tação, radioimunoensaio, Wb e Elisa, sendo os dois últimos os
monitoramento da atividade de doença31.
mais usados35. O método “padrão-ouro” é o Wb, o qual apresen-
ta sensibilidade de 20% a 39,2% e especificidade de 96%34,36. Na
Anticorpo anti-Sm tentativa de padronização de um teste para o anticorpo anti-P
O anticorpo anti-Sm é um marcador sorológico específico do LES. com sensibilidade e especificidade adequadas, foi conduzido um
Sua presença sugere fortemente o diagnóstico dessa doença, inclu- estudo avaliando o método de Elisa com proteínas ribossomais
sive fazendo parte de seus critérios de classificação3,4. Pode ser de- humanas nativas purificadas (P0, P1 e P2) ou com o peptídeo car-
tectado em 20% a 40% dos pacientes com LES, sendo mais frequen- boxiterminal de 22 aminoácidos (C22) sintético como substratos
te em doentes da raça negra e asiáticos do que em caucasianos. A antigênicos37. A análise comparativa desses procedimentos mos-
associação entre a positividade do anticorpo anti-Sm e a presença trou que o teste de Elisa com o C22 sintético foi mais específico
de algumas manifestações clínicas do LES foi sugerida em alguns (81%) do que o ensaio utilizando proteínas ribossomais huma-
estudos, porém ainda permanece controversa. Não há correlação nas nativas37. Além disso, o teste de Elisa com o peptídeo sinté-
entre o grau de atividade do LES e as concentrações séricas do an- tico demonstrou melhor correlação com o escore de atividade
ticorpo anti-Sm5, 6. da doença37. De forma geral, ao considerarmos vários estudos,
Como teste de screening, a presença do anticorpo anti-Sm pode a técnica de Elisa empregando como antígeno o peptídeo C22
ser sugerida pelo teste do FAN com células HEp-2. Esse anticorpo apresenta sensibilidade de 7% a 67% e especificidade de 81% a
geralmente produz um padrão de IFI nuclear pontilhado grosso 96,1%, sendo que essa ampla variabilidade pode ser decorrente
(Tabela 2). Em seguida ao teste do FAN, é necessária a caracteriza- das diferentes características genéticas das várias populações
ção específica dessa reatividade através de outros métodos. Entre avaliadas, distintas distribuições étnicas e diferentes critérios
esses, os mais comumente empregados são: imunodifusão du- de seleção dos pacientes33. Um estudo multicêntrico internacio-
pla (ID), contraimunoeletroforese (CIE), hemaglutinação passiva nal mostrou que um método de Elisa utilizando como substrato
(HA), Elisa com proteínas purificadas, recombinantes ou peptíde- antigênico polipeptídeos recombinantes na forma de uma com-
os sintéticos e Western blotting (Wb). A técnica de ID foi a primei- binação de todas as três proteínas P com conformação similar
ra a ser empregada quando da descrição dos anticorpos dirigidos ao complexo nativo proporciona boa acurácia para a detecção
aos antígenos extraíveis do núcleo (ENA). É altamente específica, do anticorpo anti-P, com sensibilidade de 21,3% e especificidade
mas são necessárias altas concentrações séricas de autoanticor- de 99,3%38.
pos para a sua detecção. A CIE constitui um método altamente A prevalência do anti-P no LES varia muito entre diferentes
específico, mas com baixa sensibilidade. Quanto ao método de grupos étnicos, com maior frequência em pacientes asiáticos (36%)
HA, ele tem a vantagem de possibilitar a titulação dos anticorpos do que nos pacientes caucasianos ou afro-americanos (15%)38,39. A
anti-RNP, o que é importante para o diagnóstico da doença mista baixa frequência pode limitar a utilidade desse anticorpo para o
do tecido conectivo. A técnica de Elisa com antígenos purificados, diagnóstico do LES em certas populações, mas, em outras, o an-
recombinantes ou sintéticos é considerada altamente sensível, ticorpo anti-P foi detectado em cerca de um terço dos pacientes
específica e rápida. Entretanto, devido a sua alta sensibilidade, com LES, que é uma frequência semelhante à do anti-Sm38, 39. Esse
resultados falso-positivos podem ocorrer, principalmente quando anticorpo é também mais frequente no LES juvenil (26,7-42%) do
são detectadas baixas concentrações de anticorpos. Sendo assim, que no LES de início no adulto (6,5-7,7%)33.

Revista Paulista de Reumatologia 10 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):6-13


Autoanticorpos no les: da patogenia a sua importância na prática clínica

Anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B Além disso, esses anticorpos estão presentes nos soros de
Os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B estão presentes prin- 30% a 40% dos pacientes com LES, fazendo parte dos critérios
cipalmente nos soros dos pacientes com síndrome de Sjögren de classificação dessa doença3,4 e cerca de um terço desses pa-
primária, mas também podem ser detectados naqueles com LES, cientes desenvolve manifestações clínicas da SAF6. Contudo, deve
esclerose sistêmica, poli/dermatomiosite, doença mista do teci- ser lembrado que esses anticorpos não são específicos – a eleva-
do conectivo, artrite reumatoide e cirrose biliar primária. No ção transitória de suas concentrações séricas pode ocorrer em
LES, são encontrados em cerca de 30-40% e 10-15% dos casos, várias condições clínicas, tais como esclerose sistêmica, artrite
respectivamente, e uma de suas principais utilidades clínicas é reumatoide, doenças infecciosas (como sífilis, infecção pelo HIV,
o apoio ao diagnóstico, principalmente quando autoanticorpos tuberculose), uso de alguns fármacos (clorpromazina, procaina-
específicos dessa doença (anti-DNA de dupla hélice, antinucle- mida, hidralazina, propiltiouracil) e até em indivíduos saudáveis
ossomo, anti-Sm e anti-P) estão ausentes. Lembramos ainda que (2-5%)6. Desse modo, para a classificação da síndrome antifosfolí-
os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B não são associados à pide, são necessários a ocorrência do evento clínico além da pre-
atividade do LES5, 6. sença persistente desses anticorpos em níveis moderados a altos
Os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B são ainda muito úteis em, pelo menos, duas ocasiões separadas por um intervalo de,
para o diagnóstico do lúpus cutâneo subagudo, sendo detectados pelo menos, 12 semanas41.
em 70-80% e 30% desses pacientes, respectivamente6. Além disso, Os aCL(s) IgG/IgM são mais comumente detectados pela técni-
tais anticorpos são encontrados em cerca de 90% dos casos da sín- ca de Elisa. Tradicionalmente, resultados de 40 a 80 GPL/MPL, res-
drome do lúpus neonatal, especialmente com bloqueio cardíaco pectivamente, são considerados positivos moderados e > 80 GPL/
congênito6. Vários estudos sugerem que a presença do anticorpo MPL, positivos altos. O anti-b2GP1 IgG/IgM também é usualmente
anti-Ro/SS-A, com ou sem o anti-La/SS-B, independentemente do pesquisado por Elisa, devendo ser relatado como positivo ou ne-
tipo de doença autoimune materna, é o principal fator de risco gativo, juntamente com as unidades numéricas. O LAC é testado
para o desenvolvimento da síndrome do lúpus neonatal13. através de um ensaio coagulométrico41.
Como teste de screening, os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/
SS-B podem ser sugeridos pelo padrão de IFI nuclear pontilhado Anticorpos anti-histonas
fino no teste do FAN com células HEp-2. A sensibilidade do FAN va- Os anticorpos anti-histonas produzem o padrão de IFI nuclear ho-
ria com o tipo de substrato empregado, procedimento de fixação mogêneo no teste de FAN com células HEp-2 e são geralmente de-
e também com os anticorpos presentes no soro. As células HEp-2 tectados por Elisa. Podem ser encontrados em 70% dos pacientes
apresentam maior sensibilidade que o esfregaço de fígado de rato, com LES, mas são inespecíficos, podendo também ser detectados
pois esses tecidos expressam menores quantidades da proteína na artrite reumatoide, síndrome de Felty, síndrome de Sjögren e
Ro/SS-A. Ainda assim, cerca de 10% dos soros positivos para o an- esclerose sistêmica. A sua maior utilidade clínica reside no apoio
ticorpo anti-Ro/SS-A apresentam teste de FAN em células HEp-2 diagnóstico do lúpus induzido por fármacos, no qual são detecta-
negativo. Em seguida ao teste de FAN, é necessária a confirmação dos em 96% a 100% dos casos5,6.
da presença dos anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B através de
outras técnicas. Quando da descrição desses anticorpos, eles eram
detectados através da ID. Contudo, a técnica de CIE é mais rápida
Relevância dos autoanticorpos no apoio
e pode detectar anticorpos séricos presentes em menores concen- diagnóstico das manifestações clínicas do LES
trações, permitindo um incremento na sensibilidade em relação à
ID. A especificidade da CIE para a detecção dos anticorpos anti-Ro/
LES neuropsiquiátrico
SS-A é de cerca de 100%. Porém, uma subpopulação de soros com o Anticorpo antiproteína P ribossomal
anticorpo anti-La pode apresentar resultado falso-negativo com a
Vários estudos demonstraram uma associação positiva do anti‑P
CIE. Tal subpopulação pode ser identificada por Elisa. A técnica de
com depressão e psicose lúpica17,38,42. Contudo, outros estudos não
Elisa com antígenos purificados ou recombinantes é considerada
confirmaram os achados43,44,45. Essa discrepância pode ser decor-
rápida, sensível e específica para a detecção dos anticorpos anti-
rente de diferentes métodos para a detecção do anticorpo anti-P,
-Ro/SS-A e anti-La/SS-B. É fundamental que o antígeno utilizado
critérios distintos para estabelecer o diagnóstico do LES neurop-
seja altamente purificado, para evitar reações falso-positivas. Pode
siquiátrico, características demográficas e o tempo de coleta da
ainda ser empregado o Wb, que requer uma metodologia muito
amostra em relação a períodos de doença quiescente ou ativa33.
mais elaborada. A técnica de Wb, apesar de altamente específica,
Entretanto, é interessante que, em um grande estudo prospectivo
não é recomendada para a rotina de detecção desses anticorpos,
com pacientes com LES, foi observada uma associação positiva
principalmente por uma sensibilidade diminuída em relação ao
com as manifestações neuropsiquiátricas46. Essa grande coorte
anticorpo anti-Ro/SS-A40.
(n = 1.047) de pacientes com LES recentemente diagnosticado foi
avaliada prospectivamente por um período de até 10 anos para
Anticorpos antifosfolípides eventos neuropsiquiátricos definidos de acordo com as recomen-
Os anticorpos antifosfolípides compõem um grupo de reativida- dações do American College of Rheumatology46. Foram analisadas
des dirigidas a diferentes fosfolípides aniônicos de membranas as possíveis associações entre eventos neuropsiquiátricos e o
celulares – aqueles com maior relevância clínica são o anticorpo perfil de autoanticorpos séricos à época do diagnóstico de LES,
anticardiolipina (anti-CL), o anticorpo antibeta-2-glicoproteína-1 anti-P, anti-glutamate receptor antibodies (anti-NMDA), anticoa-
(anti-b2GP1) (dirigido a uma globulina de 50 kDa envolvida no gulante lúpico, anticardiolipina e anti-β2-glicoproteína-146. Du-
processo de regulação da coagulação sanguínea) e o anticorpo rante o estudo, 47,3% dos pacientes com LES apresentaram um
anticoagulante lúpico (LAC). Tais anticorpos são associados à sín- ou mais eventos neuropsiquiátricos. O anticorpo anticoagulante
drome antifosfolípide (SAF), a qual é caracterizada por tromboses lúpico positivo à entrada no estudo foi significativamente asso-
venosas e/ou arteriais e/ou eventos obstétricos tais como perda fe- ciado à ocorrência de trombose intracraniana subsequente e o
tal recorrente e abortos de repetição6. anti-P foi significativamente associado à psicose subsequente46.

Revista Paulista de Reumatologia 11 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):6-13


Pasoto SG, Bonfá ESDO

Uma recente metanálise mostrou que o anticorpo anti-P é signi- pontilhado grosso no teste de FAN em células HEp-2. Pode ser
ficativamente associado à erupção cutânea malar, úlcera oral, detectado pelos métodos de ID, CIE, HA, Elisa e Wb. No LES, está
fotossensibilidade e presença do anticorpo anti-dsDNA e poten- associado ao fenômeno de Raynaud (Tabela 2) 2,5,6.
cialmente associado com o LES neuropsiquiátrico e com o dano
hepático47. Relevância dos autoanticorpos para
o seguimento dos pacientes com LES
Anticorpo antirreceptor do glutamato (glutamate
(monitoramento da atividade de
receptor antibodies; anti-NMDA – anti-receptor
doença e valor prognóstico)
N-metil-D-aspartato)
O número de anticorpos úteis para o acompanhamento dos pa-
Os anticorpos dirigidos aos receptores do glutamato (anti-NMDA) cientes com LES é bastante limitado, pois para poucos foi demons-
podem ser detectados nos soros de 14% a 35% dos pacientes com trada uma associação entre a flutuação de suas concentrações sé-
LES, mas não são específicos dessa doença (ocorrem em outras ricas e a atividade da doença. Além disso, há poucas informações
condições neuropsiquiátricas). Várias evidências (estudos in vi- sobre o valor prognóstico dos autoanticorpos.
tro e modelos experimentais) sugerem a participação desses an-
ticorpos na patogenia das manifestações neuropsiquiátricas do
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice
LES, inclusive com um mecanismo de ação proposto (Tabela 1).
Na literatura, existem estudos que corroboram e outros que não Foi demonstrado que os títulos séricos do anticorpo anti-dsDNA se
confirmam a associação dos anti-NMDA com o LES neuropsiquiá- correlacionam com o grau de atividade geral da doença e com a
trico. Entretanto, vale ressaltar que a pesquisa desses anticorpos, atividade da nefrite lúpica49.
principalmente no líquido cefalorraquidiano, pode ser útil para o Nosso grupo acompanhou por 6 anos uma coorte de pacientes
diagnóstico do envolvimento neuropsiquiátrico no LES22,23. com LES com nefrite lúpica comprovada por biópsia e a o anti-
corpo anti-dsDNA associou-se a um pior resultado renal a longo
prazo52.
Nefrite lúpica
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice Anticorpo antinucleossomo
O anti-dsDNA apresenta uma associação bem conhecida com o O anticorpo antinucleossomo tem sido correlacionado com a ativi-
acometimento renal do LES48 e com a atividade renal49. dade geral da doença31.

Anticorpo antinucleossomo Anticorpo antiproteína P ribossomal


Existem dados conflitantes sobre a associação do aNu com a ne- Foi demonstrado que variações maiores que 5 vezes no título séri-
frite lúpica em estudos transversais e longitudinais31,48. Contudo, é co do anticorpo anti-P ocorrem durante o episódio de quadro psi-
interessante que esse autoanticorpo pode ser detectado em cerca quiátrico grave de psicose/depressão e podem até preceder essas
de 10% dos pacientes com nefrite lúpica e anticorpo anti-dsDNA manifestações clínicas17. Em alguns estudos, esse anticorpo tem
negativo5,31. sido associado à atividade renal no LES, embora existam resulta-
dos conflitantes na literatura33,38. Além disso, esse anticorpo tem
sido correlacionado com a atividade geral do LES33.
Anticorpo anti-C1q
No estudo de coorte conduzido por nosso grupo, o anticorpo
C1q é uma glicoproteína catiônica de 410-450 kDa, que se liga às anti-P isolado (na ausência do anti-dsDNA) associou-se a um me-
porções Fc de imunoglobulinas em imunecomplexos, iniciando a lhor resultado renal a longo prazo52.
ativação do complemento através da via clássica (Tabela 1)11, 12. Os
anticorpos anti-C1q são comumente detectados pelo método de
Elisa. Estão presentes nos soros de 17% a 46% dos pacientes com
Anticorpo anti-C1q
LES. Não são específicos dessa doença, mas estão associados ao O anticorpo anti-C1q correlaciona-se com a atividade geral de
acometimento renal e suas concentrações séricas correlacionam- doença e, especialmente, com a atividade renal48,50.
-se com a atividade da nefrite lúpica48,50. A presença concomitante dos anticorpos anti-dsDNA e anti-
-C1q foi associada a uma menor probabilidade de sobrevida renal
a longo prazo53.
Anticorpo anti-proteína P ribossomal
Nosso grupo identificou a associação desse anticorpo com a glome-
rulonefrite lúpica membranosa (classe V)51.
Agradecimentos
Agradecemos a Cleonice Bueno e Maria Filomena Rodrigues Pe-
reira pela dedicação na elaboração das imagens de imunofluores-
Outras manifestações clínicas
cência indireta.
O anticorpo anti-Ro/SS-A associa-se também às manifestações
hematológicas (anemia, leucopenia, linfopenia e plaquetopenia),
com a púrpura palpável, além da síndrome de Sjögren secundária
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Revista Paulista de Reumatologia 13 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):6-13


Artigo

Nefrite lúpica: tratamento baseado nos consensos


e casos refratários
Luciana Parente Costa Seguro 1    Eduardo Ferreira Borba NETO2

Introdução Terapia de Indução (3 a 6 meses)


O comprometimento renal no lúpus eritematoso sistêmico (LES) Os primeiros 3 a 6 meses de tratamento são fundamentais para o
ocorre em aproximadamente 60% dos pacientes e sua morbimor- controle da atividade renal e prevenção de danos, uma vez que
talidade ainda é alta, uma vez que pode determinar a progres- grande parte do dano renal está relacionada à atividade inflama-
são para insuficiência renal crônica e necessidade de diálise ou tória da doença11. Dessa forma, a terapia de indução visa a uma
transplante. resposta rápida e mantida1.
A nefrite lúpica (NL) apresenta graus distintos de gravidade de Nossos alvos são:
acordo com o tipo de glomerulonefrite, cursando com períodos de
1. obter alguma resposta em 3 meses;
atividade e remissão, mas que exigem um pronto reconhecimento
2. atingir remissão em 6 meses: completa (proteinúria menor
por parte dos reumatologistas para determinar uma intervenção
que 0,5g/24h; e função renal normal ou redução menor que
terapêutica precoce1. De fato, um retardo para se iniciar o trata-
10% do basal do paciente) ou parcial;
mento imunossupressor está associado a um aumento de risco de
3. reduzir dose de glicocorticoide.
recidivas de flares renais (RR 1,03 para cada 1 mês de retardo)2 e de
insuficiência renal crônica (HR 4,2 para um retardo > 6 meses)3-7. A terapia de indução da NL membranoproliferativa (classes
Por isso, não se deve atrasar o tratamento, mesmo que exista a III, IV e V) consiste no uso de glicocorticoide em altas doses (de
possibilidade de se realizar uma biópsia renal. acordo com a gravidade da nefrite) e no uso de imunossupressores
Talvez um dos pontos principais para o sucesso terapêutico (ciclofosfamida ou micofenolato mofetil)12.
da NL seja o esclarecimento e compreensão da importância da A metilprednisolona endovenosa, em pulsos diários de
adesão a todas as medidas que serão implementadas1,8. Neste sen- 500 mg a 1.000 mg por 3 dias consecutivos, apresenta início de
tido, merece destaque a manutenção do uso da hidroxicloroquina ação rápido e permite controle mais precoce da atividade re-
associada ao tratamento de todos os tipos de glomerulonefrites nal. Em nosso serviço fazemos uso preventivo de antiparasitá-
do LES1,8,9. rios antes dos pulsos de metilprednisolona. Uma opção é o uso
Atualmente está bem definido o conceito de terapia de indu- de ivermectina (duas doses de 200 mcg/kg: 1 e meio comprimido
ção e de manutenção no tratamento da NL1,8,9, ambas as etapas para pacientes com peso entre 36 e 50 kg; 2 comprimidos para
extremamente importantes para o sucesso. O uso dos agentes pacientes com peso entre 51 e 65 kg; 2 e meio comprimidos para
imunossupressores nessas fases, juntamente com diversas outras pacientes entre 66 e 79 kg; e 200 mcg/kg para aqueles com peso
medidas, pode contribuir positivamente não só para a obtenção acima de 80 kg).
de melhor controle do processo inflamatório, mas também para a O glicocorticoide oral (prednisona ou equivalente) também
preservação da função renal a longo prazo. Para isso, é importante está indicado até o controle da atividade lúpica. A dose inicial é 0,5
saber quais as nossas metas nessas etapas de tratamento. a 1 mg/kg/dia (de acordo com a gravidade) e, com a associação de
imunossupressores, é possível reduzir progressivamente a dose de
Objetivos do Tratamento prednisona em 5-10 mg/mês, visando a evitar danos relacionados
ao uso de glicocorticoide.
Os objetivos do tratamento são obter uma resposta rápida (em me-
Os protocolos de uso de imunossupressores que mostraram
ses) e mantida, com prevenção de danos (relacionados à atividade
evidência no controle da atividade renal são (Tabela 1):
da doença e/ou ao tratamento) e com preservação da qualidade de
vida10,11. Para isso, são essenciais a precocidade do diagnóstico e do 1. ciclofosfamida (CFF) endovenosa mensal 0,5 a 1,0 g/m2 por 6
tratamento, que deve ser agressivo de acordo com a gravidade da meses (NIH) – dose total por volta de 6 g;
doença (terapia de indução), além do uso prolongado de imunos- 2. CFF endovenosa 500 mg a cada 2 semanas por 3 meses (Euro-
supressores (terapia de manutenção), visando sempre à redução -lupus) – dose total 3 g;
da dose de glicocorticoides para a menor dose possível. 3. micofenolato mofetil (MMF) 3 g/dia.

1. Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da Como citar este artigo: Seguro LPC, Borba Neto EF. Nefrite lúpica:
Universidade de São Paulo (FMUSP). Médica assistente doutora tratamento baseado nos consensos e casos refratários. Rev Paul
da disciplina de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8.
de Medicina da Universidade de São Paulo . Os autores não contaram com apoio financeiro.
2. Professor livre-docente da disciplina de Reumatologia da Faculdade Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de
de Medicina da Universidade de São Paulo. propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse nos
E-mail para contato: lucianapc@gmail.com. produtos e empresas descritos neste artigo.

Revista Paulista de Reumatologia 14 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8


Nefrite lúpica: tratamento baseado nos consensos e casos refratários

Tabela 1 Terapia de indução da nefrite lúpica membranoproliferativa.

Terapia de indução – nefrite lúpica membranoproliferativa


(primeiros 3 a 6 meses)
Clearance de creatinina > 40 mL/min Clearance de creatinina ≤ 40 mL/min
Pulso de metilprednisolona Pulso de metilprednisolona
500-750 mg EV por 3 dias 750-1.000 mg EV por 3 dias
Prednisona Prednisona
0,5 mg/kg/dia VO no 1º mês 1 mg/kg/dia VO no 1º mês
Redução de 5 mg ao mês Redução de 5-10 mg ao mês
(após pulso metilprednisolona) (após pulso metilprednisolona)
MMF CFF EV (EuroLES) CFF EV (NIH)
3 g VO ao dia 500 mg a cada 14 dias 0,5- 1,0g/m2 1x/mês
(6 meses) (3 meses) (6 meses)
(dose inicial de 1 g /dia – 500 mg de 12/12h Total = 6 doses (3 g) Total = 6 doses (~ 6 g)
e aumento de 1 g/dia a cada 7 dias) (com pré-medicação) (com pré-medicação)
Vantagens: maior ação raça negra, menor Vantagens: avaliação mais frequente Vantagens: melhor aderência, maior
risco de falência gonadal do paciente, melhor aderência, maior biodisponibilidade
Desvantagens: aderência biodisponibilidade, menor risco de falência Desvantagens: maior risco de falência
gonadal gonadal, de citopenias e infecções
EV: endovenoso; MMF: micofenolato mofetil; CFF: ciclofosfamida.

O protocolo NIH mostrou-se superior ao uso isolado de glicocor- parcial na indução e parece ter maior ação na raça negra, porém
ticoide na sobrevida renal. No entanto, está associado à insuficiên- tem custo mais elevado que AZA. AZA é uma opção para pacientes
cia ovariana prematura, a citopenias e ao aumento no risco de in- com risco ou desejo gestacional.
fecções e a neoplasias (como câncer de colo uterino)13,14. O protocolo
Euro-lupus apresentou eficácia comparável ao NIH, com menor Hidroxicloroquina
risco de falência gonadal e infecções15,16. O uso de CFF endovenosa A hidroxicloroquina tem mostrado inúmeros benefícios e seu uso
tem grande vantagem, pois proporciona maior biodisponibilidade e está indicado em todos os tipos de glomerulonefrites do LES, exce-
melhor adesão medicamentosa. A CFF deve ser infundida com pré- to na presença de contraindicações. Diminui o risco de recidivas
-medicação pois pode causar mal-estar, náuseas e/ou vômitos. renais, previne dano, está associada a melhor prognóstico renal
O MMF apresentou eficácia similar a CFF NIH, com menor taxa quando associada aos imunossupressores, potencializa a ação do
de infecções bacterianas e hospitalizações17-19. Em casos de síndro- MMF e aumenta a chance de remissão na nefrite membranosa.
me nefrótica pura (sem hematúria, hipertensão), o ACR indica o Também melhora perfil lipídico, reduz risco de trombose e está
MMF como droga de primeira escolha20. associada a maior sobrevida24,25.
Em caso de nenhuma resposta após 3 meses, o tratamento de A hidroxicloroquina deve ser usada na dose de 400 mg/dia
indução deve ser reavaliado e, se necessário, deve ser iniciada (ou menor, ajustada para o peso: não exceder a dose de 5 mg/kg/
nova indução com outro protocolo. dia). Utilizar doses menores em caso de insuficiência renal. A ava-
liação oftalmológica deve ser realizada no início do tratamento
Terapia de manutenção (3 a 5 anos) com hidroxicloroquina (para exclusão de retinopatias prévias) e
anualmente em pacientes de alto risco (mais de 5 anos de uso de
Após a indução no tratamento da NL, um período de 3 a 5 anos de
hidroxicloroquina, crianças, idosos, disfunções de órgãos) pelo
manutenção com terapia imunossupressora é recomendado para
risco de maculopatia.
otimizar a resolução e evitar recidivas1.
Os protocolos de uso de imunossupressores que mostraram
evidência na terapia de manutenção são (Tabela 2):
Tabela 2 Terapia de manutenção da nefrite lúpica
1. azatioprina (AZA) 2 mg/kg/dia;
membranoproliferativa.
2. micofenolato mofetil (MMF) 2g/dia.

O glicocorticoide oral (prednisona ou equivalente) deve ser re-


Terapia de manutenção – nefrite lúpica membranoproliferativa
(3 a 5 anos)
duzido progressivamente sempre que possível para a prevenção de
danos relacionados a seu uso. Em geral, a partir de 10 mg/dia, a dose Prednisona
deve ser reduzida em 2,5 mg por mês, se possível. Redução de 2,5 mg ao mês a partir de 10 mg/dia
Na terapia de manutenção, AZA e MMF foram superiores ao AZA MMF
uso de CFF trimestral na prevenção do desfecho combinado de 2 mg/kg/dia 2 g VO ao dia
morte e insuficiência renal crônica 6 anos após o início do trata-
mento. MMF apresentou menor taxa de recidivas, de amenorreia Vantagens: opção em Vantagens: boa opção em
e de infecções quando comparado com CFF21.
pacientes com desejo pacientes com resposta parcial
gestacional, menor custo, indução, maior ação raça negra
A eficácia de MMF foi similar (estudo Maintain) ou superior
aderência Desvantagens: custo, aderência
(estudo ALMS) à de AZA para terapia de manutenção da nefri-
te lúpica22,23. MMF é uma boa opção para pacientes com resposta AZA: azatioprina; MMF: micofenolato mofetil.

Revista Paulista de Reumatologia 15 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8


Seguro LPC, Borba Neto EF

Medidas nefroprotetoras: da ao aumento nos níveis de colesterol. Além disso, a dislipi-


além da Imunossupressão demia acelera a progressão para insuficiência renal26. Dessa
forma, o uso de estatinas é recomendado para atingir alvo de
As medidas nefroprotetoras são fundamentais nos pacientes com
LDL < 100 mg/dL28.
nefrite lúpica e estão associadas à maior sobrevida renal, ao me-
5. Evitar drogas nefrotóxicas, em especial os anti-inflamató-
nor risco cardiovascular e à menor mortalidade26. Elas incluem
rios não hormonais (AINH). Além de não prescrever tais dro-
controle de pressão arterial (PA), de proteinúria (incluindo uso
gar, orientar os pacientes, pois é comum a automedicação
de antiproteinúricos) e de dislipidemia, além de evitar drogas ne-
com AINH.
frotóxicas e tabagismo e sempre checar aderência ao tratamento
6. Dieta hipossódica. O excesso de sal na dieta está associado
(Tabela 3).
ao aumento dos níveis de PA, amplia o efeito proteinúrico da
1. Controle de PA. A PA está intimamente relacionada à protei- hipertensão e inibe o efeito antiproteinúrico do iECA26.
núria. O American College of Rheumatology (ACR) sugere alvo 7. Cessar tabagismo. O tabagismo leva à hiperfiltração e ao
de PA de 130 x 80 mmHg para pacientes com nefrite lúpica20. aumento de proteinúria, e está associado à maior progressão
O Kidney Disease: Improving Global Outcomes (KDIGO) tam- para insuficiência renal26.
bém recomenda esse alvo de PA para nefropatias crônicas 8. Checar aderência. Má aderência é muito frequente no LES
proteinúricas27,28. e está associada à depressão e ao elevado número de com-
2. Controle de proteinúria. A proteinúria é o melhor pre- primidos prescritos32. O diagnóstico correto de má aderên-
ditor isolado de sobrevida renal a longo prazo na nefrite cia previne mudanças ou aumentos de dose desnecessários
lúpica. Além de ser um marcador, a proteinúria está envol- nos imunossupressores e em outras medicações. O paciente
vida no dano renal, pois induz ativação de complemento, precisa ser informado da importância do tratamento, do
inflamação e fibrogênese renal26. Nos estudos Euro-Lupus controle da proteinúria e das estratégias nefroprotetoras,
e MAINTAIN Nephritis Trial, proteinúria (12 meses após o bem como do impacto dessas medidas para a sua sobrevida
início da nefrite) de até 0,8 g/dia e 0,7 g/dia foi o melhor renal, para otimizar seu comprometimento e aderência ao
preditor de bom desfecho renal após 10 e 7 anos, respec- tratamento.
tivamente29,30. Em nosso serviço, em situação de vida real
Uma estratégia para otimizar as medidas nefroprotetoras
fora dos trials, proteinúria < 0,8g/dia na avaliação de 12
é o seguimento de perto dos pacientes com retornos precoces,
meses foi preditora de melhor desfecho renal em 7 anos31.
sempre checando PA e proteinúria e reforçando as orientações.
Além disso, o controle da proteinúria permite a redução da
Nesse sentido, o protocolo Euro-Lupus tem a vantagem de reali-
dose de glicocorticoide e evita aumentos desnecessários na
zar visitas a cada 15 dias no momento importante da terapia de
imunossupressão.
indução, além de garantir a aderência ao imunossupressor (uma
3. Uso de antiproteinúricos. Os medicamentos inibidores da
vez que é endovenoso e o médico sabe se o paciente recebeu).
enzima conversora de angiotensina (iECA) e os antagonistas
Em nosso serviço, a instituição de um protocolo rigoroso para 13
dos receptores de angiotensina II (ARAII) têm efeitos nefro-
pacientes que estavam na fase de terapia de manutenção para
protetores e antiproteinúricos além da ação anti-hiperten-
nefrite lúpica e mantinham proteinúria persistente > 1g/dia foi
siva. Estão associados à maior sobrevida renal26. Devem ser
associado ao melhor controle de PA, redução de proteinúria e da
usados sempre que possível nos pacientes com nefrite lúpi-
dose de prednisona. O protocolo consistia em retornos a cada 15
ca (função renal preservada e K < 5,5 mEq/L). Em pacientes
dias para checar PA, proteinúria, aderência e reforçar as orien-
com proteinúria persistente, é possível associar iECA e ARAII
tações nefroprotetoras, sem alteração nos imunossupressores.
(duplo bloqueio), com cuidados com hipotensão, insuficiência
Ao fim de 3 meses, 85% dos pacientes atingiram nosso alvo de PA
renal e hipercalemia.
< 130 x 80 mmHg e 62% atingiram nosso alvo de proteinúria < 1g/
4. Controle de dislipidemia. Pacientes com nefrite lúpica têm
dia [dado não publicado].
aumento de risco cardiovascular e a proteinúria está associa-

Outros cuidados
Tabela 3 Medidas nefroprotetoras além da 1. Dieta rica em cálcio e reposição de vitamina D. Alvo de vi-
imunossupressão. tamina D entre 40 e 60 ng/dL para evitar osteoporose induzida
Medidas nefroprotetoras por glicocorticoide e pelos benefícios imunológicos da vitami-
na D no LES33,34.
Controle de PA (alvo 130 x 80 mmHg) 2. Anticoncepção. Prescrever anticoncepcionais para mulheres
Controle de proteinúria (alvo < 0,8 g/24 h) em idade fértil com vida sexual ativa pelo uso de drogas tera-
togênicas (como CFF e MMF) e pelo risco gestacional alto (ma-
Uso de antiproteinúricos (iECA e/ou ARAII) terno e fetal) na vigência de nefrite lúpica em atividade. São
Controle de dislipidemia (alvo LDL < 100 mg/dL) opções: medroxiprogesterona (150 mg IM a cada 3 meses), de-
sogestrel 75 mcg/dia (uso continuo), DIU com levonorgestrel
Evitar drogas nefrotóxicas (em especial AINH)
e implante subdérmico de etonogestrel. Orientar método de
Dieta hipossódica barreira (camisinha) como método anticoncepcional associa-
Cessar tabagismo do e para prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.
3. Preservação ovariana. Em pacientes com desejo reproduti-
Checar aderência vo que vão receber altas doses de CFF, é possível usar análo-
PA: pressão arterial; iECA: inibidores da enzima conversora de angiotensina; gos de GnRH. Leuprolide 3,75 mg, via intramuscular, 1 x/mês,
ARA: antagonista do receptor da angiotensina II; AINH: anti-inflamatórios 10 dias antes da dose de CFF [35]. Pode causar sintomas de
não hormonais. menopausa.

Revista Paulista de Reumatologia 16 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8


Nefrite lúpica: tratamento baseado nos consensos e casos refratários

Casos refratários – outras opções de drogas Aguardamos mais avaliações sobre as melhores opções tera-
Em pacientes refratários, com proteinúria persistente > 1 g/dia, a pêuticas com imunossupressores e com imunobiológicos na ne-
primeira conduta é checar as estratégias nefroprotetoras. Caso este- frite lúpica refratária para promover um melhor controle dessa
jam otimizadas, algumas opções são o uso de medicamentos imuno- manifestação e aumentar a sobrevida renal dos pacientes.
biológicos e de inibidores da calcineurina, em especial o tacrolimus.
Referências
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-to-target in systemic lupus erythematosus: recommendations from an international
1. Rituximabe. Os principais estudos (Explorer e Lunar) não
task force. Ann Rheum Dis. 2014;73:958-67.
mostraram eficácia do uso do rituximabe na nefrite lúpica,
2. So MW, Koo BS, Kim YG, Lee CK, Yoo B. Predictive value of remission status after 6
talvez por falhas no desenho, nos objetivos e por comparar months induction therapy in patients with proliferative lupus nephritis: a retrospective
com tratamento eficaz36,37. No entanto, dados de relatos e sé- analysis. Clin Rheumatol. 2011;30:1399-405.
ries de casos mostram benefícios em casos refratários. Uma 3. Faurschou M, Dreyer L, Kamper AL, Starklint H, Jacobsen S. Long-term mortality
metanálise com 1.243 pacientes mostrou algum benefício do and renal outcome in a cohort of 100 patients with lupus nephritis. Arthritis Care Res.
uso de rituximabe na nefrite lúpica com taxa de remissão 2010;62:873-80.
completa de 36,1% e parcial de 37,4%38. O protocolo Rituxilup 4. Dall’era M, Stone D, Levesque V, Cisternas M, Wofsy D. Identification of biomarkers
that predict response to treatment of lupus nephritis with mycophenolate mofetil or
(esquema “steroid free”, associado a MMF) encontrou remis-
pulse cyclophosphamide. Arthritis Care Res. 2011;63:351-7.
são completa em 73% dos pacientes. Foi um estudo aberto em
5. Esdaile JM, Levinton C, Federgreen W, Hayslett JP, Kashgarian M. The clinical and renal
pacientes com nefrite lúpica ativa com creatinina máxima de biopsy predictors of long-term outcome in lupus nephritis: a study of 87 patients and
1,47 mg/dL39. review of the literature. Q J Med. 1989;72:779-833.
2. Rituximabe + belimumabe. Há relatos de eficácia em ne- 6. Ioannidis JP, Boki KA, Katsorida ME, Drosos AA, Skopouli FN, Boletis JN, Moutsopoulos
frite lúpica refratária do uso de rituximabe seguido de ma- HM. Remission, relapse, and re-remission of proliferative lupus nephritis treated with
nutenção com belimumabe. Há estudos randomizados em cyclophosphamide. Kidney Int. 2000;57:258-64.
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3. Abatacepte. Não mostrou efetividade para nefrite42, embora of renal biopsy and clinical variables in patients with lupus nephritis and normal serum
creatinine. Scand J Rheumatol. 1999;28:288-99.
necessite mais avaliações.
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Tacrolimus 9. Klumb EM, Silva CA, Lanna CC, Sato EI, Borba EF, Brenol JC, et al. Consensus of the
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O tacrolimus é um inibidor da calcineurina mais potente que a ci-
lupus nephritis. Rev Bras Reumatol. 2015;55:1-21.
closporina e com melhor perfil de eventos adversos (hipertensão,
10. Doria A, Gatto M, Zen M, Iaccarino L, Punzi L. Optimizing outcome in SLE: treating-to-
dislipidemia, hiperplasia gengival, hipertricose)43. As principais -target and definition of treatment goals. Autoimmun Rev. 2014;13:770-7.
evidências de seu uso vêm de trabalhos com população asiática, 11. Gladman DD, Urowitz MB, Rahman P, Ibañez D, Tam LS. Accrual of organ damage over
na qual já é considerada droga de primeira linha para indução time in patients with systemic lupus erythematosus. J Rheumatol. 2003 Sep;30(9):
de nefrite lúpica. Nas demais populações, é uma opção para in- 1955-9.
dução de nefrite lúpica refratária44. Pode ser usado isoladamente 12. Bertsias GK, Tektonidou M, Amoura Z, Aringer M, Bajema I, Berden JH, et al; European
(tacrolimus 3 mg de 12/12h) ou associado a MMF (tacrolimus 2 mg League Against Rheumatism and European Renal Association-European Dialysis and
de 12/12h + MMF 1 g/dia). Ao introduzir tacrolimus, é importante Transplant Association. Joint European League Against Rheumatism and European
Renal Association-European Dialysis and Transplant Association (EULAR/ERA-EDTA)
controlar PA e creatinina, bem como seu nível sérico (colhido no
recommendations for the management of adult and paediatric lupus nephritis. Ann
vale) após 3 dias de uso (manter entre 5-6 ng/mL). Rheum Dis. 2012;71:1771-82.
13. Austin HA 3rd, Klippel JH, Balow JE, le Riche NG, Steinberg AD, Plotz PH, Decker JL.
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As indicações de biopsia renal, de acordo com o ACR, são: protei-
14. Boumpas DT, Austin HA 3rd, Vaughn EM, Klippel JH, Steinberg AD, Yarboro CH, Balow
núria > 1 g/24h; proteinúria > 0,5 g/24h associada à hematúria ou JE. Controlled trial of pulse methylprednisolone versus two regimens of pulse cyclo-
cilindrúria; elevação de creatinina sem causa definida20. Desse phosphamide in severe lupus nephritis. Lancet. 1992;340:741-5.
modo, a biopsia está indicada na nefrite lúpica, mas sua realiza- 15. Houssiau FA, Vasconcelos C, D’Cruz D, Sebastiani GD, Garrido Ed Ede R, Danieli MG,
ção não deve atrasar o início do tratamento (iniciar o tratamento e et al. Immunosuppressive therapy in lupus nephritis: the Euro-Lupus Nephritis Trial, a
realizar a biopsia quando e se possível). randomized trial of low-dose versus high-dose intravenous cyclophosphamide. Arthri-
São fundamentais os cuidados pré-biopsia renal, para segu- tis Rheum. 2002;46:2121-31.
16. Houssiau FA, Vasconcelos C, D’Cruz D, Sebastiani GD, de Ramon Garrido E, Danieli MG,
rança do procedimento: controle de PA (< 140 x 90 mmHg); descar-
et al. Early response to immunosuppressive therapy predicts good renal outcome in lu-
tar infecções, em especial do trato urinário (urocultura negativa);
pus nephritis: lessons from long-term followup of patients in the Euro-Lupus Nephritis
parâmetros laboratoriais: hemoglobina > 10g/dL, hematócrito Trial. Arthritis Rheum. 2004;50:3934-40.
> 30%; TP/INR ≤ 1,2; TTPA/R ≤ 1,2; plaquetas ≥ 100.000/mm3; sus- 17. Ginzler EM, Dooley MA, Aranow C, Kim MY, Buyon J, Merril JT, et al. Mycopheno-
pender heparina não fracionada por 6 horas e heparina de baixo late mofetil or intravenous cyclophosphamide for lupus nephritis. N Engl J Med.
peso molecular por 12 horas antes da realização da biopsia; não 2005;353:2219-28.
usar anticoagulante oral; não usar AAS por 7 dias antes da biopsia; 18. Appel GB, Contreras G, Dooley MA, Ginzler EM, Isenberg D, Jayne D, et al; Aspreva Lu-
se diálise: realizar a biopsia pelo menos dentro de 12 horas após a pus Management Study Group. Mycophenolate mofetil versus cyclophosphamide for
induction treatment of lupus nephritis. J Am Soc Nephrol. 2009;20:1103-12.
última hemodiálise.
19. Appel AS, Appel GB. An update on the use of mycophenolate mofetil in lupus nephritis
Contudo, a biopsia poderá ser de grande auxílio se existir dú-
and other primary glomerular diseases. Nat Clin Pract Nephrol. 2009;5:132-42.
vida quando da não resposta a um determinado tratamento, pois
20. Hahn BH, McMahon MA, Wilkinson A, Wallace WD, Daikh DI, Fitzgerald JD, et al; Ame-
fornecerá dados mais concretos sobre a atividade inflamatória e o rican College of Rheumatology. American College of Rheumatology guidelines for scre-
grau de cronicidade. Nesse sentido, poderá ajudar sobremaneira ening, treatment, and management of lupus nephritis. Arthritis Care Res (Hoboken).
para uma decisão terapêutica. 2012;64:797-808.

Revista Paulista de Reumatologia 17 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8


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Revista Paulista de Reumatologia 18 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8


Artigo

Tratamento das lesões cutâneas no LES:


visão do dermatologista
Mônica Ribeiro de Azevedo Vasconcellos1

Introdução vir acompanhadas de atividade sistêmica importante. O lúpus su-


O lúpus eritematoso cutâneo (LEC) é classificado em vários subti- bagudo cursa, na maioria das vezes, com quadro cutâneo, articu-
pos morfológicos que apresentam aspecto histopatológico específi- lar, sintomas constitucionais e alterações hematológicas, caracte-
co, a chamada dermatite de interface. Lesões agudas, subagudas e rizando atividade moderada, mas pode haver comprometimento
crônicas/crônicas intermitentes representam esses subtipos espe- renal, neurológico em pequena porcentagem dos casos (10-15%).
cíficos. Embora qualquer lesão específica possa cursar no contexto Com relação ao subtipo discoide, existem dados variados, mas cos-
do lúpus eritematoso sistêmico (LES), as formas agudas e subagu- tuma acompanhar atividade sistêmica mais leve. Na prática clí-
das são mais prevalentes no LES. Lesões discoides frequentemente nica, a atividade e a gravidade da doença sistêmica são avaliadas
são observadas em indivíduos com acometimento exclusivamente usando uma combinação entre história clínica, exame físico geral,
cutâneo ou com poucas manifestações gerais, especialmente se de toda a pele e mucosas, estudos laboratoriais e de imagem para
forem localizadas no segmento cefálico. Quando disseminadas, órgãos específicos, bem como testes sorológicos.
geralmente ocorrem acompanhando a doença sistêmica e podem Devido a sua variabilidade clínica, a diferenciação entre os
ser muito refratárias ao tratamento. Outras formas de LEC crônico subtipos de LEC, especialmente entre lesões discoides dissemina-
são a paniculite lúpica/lúpus profundo, lúpus túmido (crônico in- das e subagudas pode gerar dúvidas, mas o diagnóstico preciso é
termitente) e perniose lúpica. As manifestações inespecíficas não necessário para bem avaliar a resposta ao tratamento, bem como
ocorrem apenas no LES e indicam atividade da doença sistêmica. a discriminação dos principais diagnósticos diferenciais, comor-
As principais são fenômenos vasculares e alopecias. bidades como infecções e toxicidade relativa aos medicamentos.
O LEC é uma condição heterogênea que impacta negativamen-
te a qualidade de vida, especialmente das mulheres mais jovens1. Prevenção
O acometimento cutâneo é frequente e influencia significativa- A radiação ultravioleta (RUV) é um dos principais fatores de ris-
mente a autoestima e a estigmatização do doente. co para o desencadeamento do LEC ou piora da doença. Já está
O objetivo do tratamento é reduzir a inflamação e as sequelas bem estabelecida essa relação por estudos de fotoprovocação4; a
e muitas vezes tem de ser individualizado. Embora poucos medica- fotoproteção inclui vários fatores, como readequação de hábitos,
mentos sistêmicos usados para o LEC encontrem embasamento em evitando-se atividades em áreas externas nos horários de maior
estudos controlados e randomizados, muitos já são aprovados para incidência de RUV e também proteção mecânica através de rou-
uso no LEC e existem guias e consensos que, baseados em evidên- pas, chapéus, filmes para vidros de autos e domésticos e óculos
cias variadas, orientam sobre as melhores opções terapêuticas2,3. escuros com lentes com proteção UV. Luzes artificiais halógenas
O Índice de Severidade e Área da Doença do Lúpus Eritemato- e fluorescentes emitem raios UV e são mais prejudiciais em curta
so Cutâneo (Clasi) é um instrumento amplamente utilizado para distância ou sem proteção plástica ou acrílica. A lâmpada artificial
estabelecer o grau de atividade das lesões cutâneas específicas do mais recomendável para ambientes é a de LED.
LE (eritema, descamação, alopecia não cicatricial) ou as sequelas Filtros solares, fundamentais na fotoproteção, são agentes quí-
(atrofia/alopecia cicatricial, discromias). A diminuição em quatro micos ou físicos (geralmente têm cor) que protegem a pele da RUV
pontos (20%) no índice é critério bastante específico para se classi- por reflexão, difração ou refração. Filtros solares devem proteger
ficar os pacientes em respondedores ou não respondedores. contra UVB (FPS ≥ 50) e contra UVA (nesse caso, os mais indicados
A atividade cutânea no LES é variável. Com relação às formas são à base de mexoryl XL). Podem ser usados em diversos veículos:
agudas, por exemplo, o eritema malar, acompanhado de febre, ar- loção, creme, creme gel, gel ou mousse, mas precisam ser aplica-
tralgia e leucopenia, é considerado atividade leve; entretanto, ele dos cerca de 20-30 minutos antes de eventual exposição aos RUV,
pode ocorrer com atividade sistêmica grave. Por outro lado, lesões em quantidade adequada (2 mg/cm2) e reaplicados 2-3 vezes ao
agudas bolhosas, com extensas áreas de descolamento, costumam longo do dia.

1. Médica. Mestre em Dermatologia e doutoranda em Medicina A autora não contou com apoio financeiro.
Translacional pela Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
de Medicina (Unifesp/EPM). Coordenadora do Grupo de Colagenoses de propriedade ou financeiros que representem conflito de
– Departamento de Dermatologia da Unifesp/EPM. interesse nos produtos e empresas descritos neste artigo.
E-mail para contato: vascmonica@gmail.com.
Como citar este artigo: Vasconcellos MRA. Tratamento das lesões
cutâneas no LES: visão de dermatologista. Rev Paul Reumatol.
2017 abr-jun;16(2):19-24.

Revista Paulista de Reumatologia 19 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):19-24


Vasconcellos MRA

Pacientes lúpicos com fototipo de Fitzpatrick III-VI podem ter gel). Irritação local é efeito adverso potencial. Existem trabalhos
baixa aderência à fotoproteção, talvez pela crença errônea de que demonstrando efeito benéfico do tazaroteno e evidências de efi-
a pele escura, por ter mais melanina, estaria mais protegida5. Po- cácia com uso de R-salbutamol a 5% creme nas lesões discoides12.
rém, é conhecido o fato de que, diferentemente do câncer de pele, Entretanto, nenhum dos dois é disponível em nosso pais.
o LES incide fortemente na população afrodescendente. Nesse es- Outra opção para as lesões verrucosas ou nas refratárias é a
tudo, os homens e indivíduos na faixa de 30-50 anos também tive- infiltração intralesional, intradérmica de acetonido de triamcino-
ram menos aderência às orientações de fotoproteção5. lona em suspensão, utilizando a concentração de 5-10 mg/ml, men-
Importante salientar que o intervalo entre a exposição aos salmente, até regressão das lesões.
RUVs e o desencadeamento de lesões cutâneas é muito variável,
de algumas horas a duas e até três semanas. Assim, muitos pa- Sistêmico
cientes frequentemente não relacionam a piora cutânea com a
Lesões discoides disseminadas, subagudas, paniculite, lesões
fotoexposição.
com potencial acentuado para deixar cicatrizes muito inestéti-
Em função da fotoproteção sistemática e dos medicamentos
cas e o próprio diagnóstico de LES são indicações de tratamento
utilizados, a verificação dos níveis de vitamina D e eventual su-
sistêmico.
plementação está recomendada. A utilização de anticoncepcionais
Num contexto de atividade cutânea importante e com outras
estrogênicos foi relacionada à piora do LEC.
manifestações sistêmicas que indiquem eventual tratamento com
Recomenda-se o questionamento detalhado quanto ao uso pré-
imunomoduladores ou imunossupressores, convém afastar a pos-
vio de medicamentos, particularmente naqueles com lúpus suba-
sibilidade de infecções preexistentes como hepatites virais B e C,
gudo (LESA) e com o início mais tardio da doença.6.7 Além disso,
infecção por HIV e tuberculose.
existem medicamentos que desencadeiam ou exacerbam a fotos-
sensibilidade, como, por exemplo, sulfonamidas que se associam
à piora do LES. Antimaláricos
A relação entre o hábito de fumar e menor resposta aos an- Os antimaláricos são a primeira indicação no LEC, porque as le-
timaláricos, bem como a influência dos substitutos da nicotina sões cutâneas respondem a esses agentes em 50-80% dos casos.
(gomas de mascar, adesivos e inalantes) sobre a eficácia desses Estão disponíveis comprimidos de difosfato de cloroquina (CQ)
medicamentos ainda necessita de melhor definição. Em estudo 250 mg e o sulfato de hidroxicloroquina (HCQ) 400 mg.
populacional na Suécia, observou-se incidência aumentada de Os mecanismos de ação ainda não são totalmente esclareci-
câncer não melanoma, câncer de boca, pulmão e linfoma nos pa- dos, porém são bem conhecidos seus efeitos anti-inflamatórios e
cientes fumantes com LES e atividade cutânea6. imunomoduladores, estabilizador de lisossomos, inibidor da si-
Finalmente, alguns pacientes podem apresentar prurido nalização dos receptores toll-like endossômicos. De fato, os anti-
acompanhando lesões cutâneas ativas ou eventualmente como maláricos reduzem a atividade do LES, especialmente a cutânea
um efeito adverso dos antimaláricos. A coçadura pode piorar as e articular, e também reduzem a frequência de surtos. A HCQ
lesões por causa de um fenômeno chamado isomórfico (reprodu- apresenta, ainda, alguns efeitos benéficos de longo prazo no LES,
ção das lesões pelo trauma) ou fenômeno de Köebner, que ocorre talvez por outros efeitos particulares como ação antiplaquetária
em várias dermatoses e também no LEC. sem aumentar o tempo de sangramento, ação hipoglicemiante,
redutora do colesterol total, fração LDL e triglicerídeos, bem com
Tratamento medicamentoso ação antimicrobiana.
A eficácia da CQ e HCQ parece ser semelhante, mas a HCQ é
Tópico mais bem tolerada e menos retinotóxica. Ainda assim, distúrbios
As lesões de LEC são responsivas aos corticosteroides (CE) tópicos gastrintestinais e hematológicos podem ocorrer. Hiperpigmenta-
e o uso de CE classes II (por exemplo, desonida, dexametasona) e ção, inicialmente descrita mais para o uso de DC, é descrita em
III (por exemplo, valerato de betametasona) é usual nas manifes- cerca de 30% dos paciente em uso de HCQ e pode estar acentuada
tações cutâneas do LES como terapia adjuvante. Preconiza-se a uti- quando associada ao uso de anticoagulantes13.
lização diferenciada na face e flexuras (acetato de hidrocortisona A dose convencional, considerando-se o peso ideal, é de 3-3,5
ou CE de tipo II), embora um dos poucos estudos controlados e ran- mg/kg/dia para DC e 6-6,5 mg/kg/dia para HCQ. Recomendações da
domizados tenha demonstrado maior eficácia de fato com os CE Academia Americana de Oftalmologia indicam como mais seguras
fluorados nas lesões discoides8. Por questão de efeitos indesejáveis para prevenção de retinopatia no longo prazo (5-10 anos) as doses
como atrofia, telangiectasia, estrias e dermatite relacionados aos de 2,3 mg/kg/dia para DC e 5 mg/kg/dia para HCQ14,15.
CE (ou dermatite perioral), não se recomenda usar o CE fluorado A avaliação oftalmológica prévia é obrigatória e, dependendo
por mais de 4-6 semanas. da idade e dos fatores de risco, o controle subsequente poderá ser
Os inibidores da calcineurina vêm demonstrando boa eficácia a cada 6 ou 12 meses. Se for possível a realização de exames oftal-
no LEC, com perfil de segurança superior aos CE9. Estudos mos- mológicos de imagem mais sensíveis para retinopatia, essa avalia-
traram resultados semelhantes quanto ao uso de tacrolimo 0,1% ção poderá ser prolongada em um ano e então em 5 anos.
pomada em relação ao 17-valerato de betametasona 0,01% creme, Nos pacientes com LES, o uso exclusivo de antimaláricos ge-
assim como comparativamente do pimecrolimo 0,5% creme em ralmente não é suficiente para controle da doença, mas eles são
relação ao propionato de clobetasol 0,05% pomada 10,11. Eventual- importantes no tratamento. Administração de HCQ também aju-
mente, eles podem ser usados sequencialmente aos CE, quando da a reduzir o uso de corticosteroides sistêmicos, reduz o dano
não ocorre resposta em 2 semanas. O custo dos inibidores de cal- adicional aos órgãos, diminui o efeito trombótico dos anticorpos
cineurina é bem superior ao dos corticosteroides tópicos e o efeito antifosfolípides. É uma droga segura, relativamente barata e pode
terapêutico inicial, mais lento. ser usada na gravidez. A HCQ pode ser benéfica não só no LES
Nas lesões refratárias ou nas hipertróficas/verrucosas pode-se mais leve, mas também naqueles pacientes com órgãos acometi-
usar os retinoides tópicos (ácido retinoico 0,05% creme ou 0,025% dos mais severamente e também pode ser benéfica na gravidez.

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Tratamento das lesões cutâneas no LES: visão de dermatologista

Corticosteroides sistêmicos Retinoides orais


A indicação de corticoterapia no LEC é pontual, podendo ser usada Retinoides são compostos com estrutura e mecanismo de ação seme-
prednisona na dose de 0,5-1 mg/kg/dia, por duas a quatro semanas, lhantes à vitamina A (retinol), com ação no crescimento e diferencia-
seguida de esquema regressivo até dose ≤ 7,5 mg/dia e suspensão ção celular. Estão disponíveis atualmente a acitretina (derivada do
assim que possível. Está indicada quando as lesões são muito ex- etretinato) e isotretinoina. Utilizados no tratamento de dermatoses
tensas e enquanto o antimalárico não atinge nível sérico adequa- como psoríase e acne. Alitretinoína é um novo retinoide oral ainda
do. A pulsoterapia com metilprednisolona IV em três dias conse- não disponível em nosso país, que foi empregada em três pacientes,
cutivos também ajuda muito no controle inicial da doença, assim um deles com LES e relatado resultado favorável em todos19,20.
como pacientes com LEC extenso e refratário. Primeiramente usado no LEC foi o etretinato, não mais dis-
Em estudo prospectivo, seccional cruzado, multicêntrico rea- ponivel17. Retinoides orais são considerados medicamentos de
lizado pelo Euscle, os CE sistêmicos foram o tipo de medicamento segunda linha para tratamento do LEC, particularmente lesões
sistêmico mais eficaz (94,3% dos 413 pacientes tratados) na tera- hipertróficas ou verrucosas21. Em estudo duplo-cego, multicêntri-
pia do LEC. O subtipo mais frequente (58,1%) e mais responsivo co, randomizado relatou-se que a eficácia de acitretina 50 mg/dia
(96,8%) foi o agudo16. (47%) foi comparável à de HCQ 400 mg/dia (50%) para tratamento
O LESA pode responder bem à pulsoterapia; foi demonstrado do LEC22. De modo geral, os relatos de caso mostram eficácia de
que pacientes com doença refratária responderam com um único 60-80% para acitretina e isotretinoina.
pulso de 1 g de metilprednisolona por três dias e melhora mantida No LEC, as doses de acitretina e isotretinoina são 0,2 a 1 mg/kg/
por dois a três meses17. dia; a resposta costuma ser rápida, em torno de 2 a 6 semanas após
Apesar de as lesões discoides serem responsivas a doses eleva- o início do tratamento, mas a recidiva ocorre frequentemente logo
das de CE sistêmico (1 mg/kg/dia), elas devem ser evitadas porque que se interrompe o medicamento.
geralmente ocorre rapidamente a recidiva das lesões e expõe o Os efeitos colaterais são xerose, secura de mucosas, hiperlipide-
doente a efeitos adversos. mia; metade dos pacientes queixa-se de queda de cabelos transitó-
Na paniculite, doses elevadas de ataque também são benéficas ria. Raramente, podem ocorrer mialgia, artralgia e toxicidade óssea.
para evitar lipoatrofia. Ambas as drogas são teratogênicas, necessitando de contracepção,
Já no contexto do LES, a manutenção de corticoterapia é mui- para a isotretinoina por um mês e para a acitretina por 2 anos.
tas vezes inevitável, as doses de ataque são mais elevadas, de 0,5
a 2 mg/kg/dia e recomenda-se a introdução de imunossupressor Dapsona
assim que possível para poupar o paciente dos efeitos adversos da A dapsona age por inibição da deidrofolato redutase; tem pro-
corticoterapia. priedade antimicrobiana e anti-inflamatória. Tem sido usada em
Vale notar que doses inferiores a 10 mg/dia não se associam a várias dermatoses neutrofílicas. Ela protege as células contra o
tantos efeitos adversos, mas sua eficácia em retardar o início da processo oxidativo mediado por neutrófilos, convertendo a mie-
doença, especialmente em relação à atividade cutânea, e o surgi- loperoxidade a um composto inativo; também bloqueia a quimio-
mento de dano orgânico, ainda não está bem estabelecido. taxia de neutrófilos.
Suplementação com vitamina D é imprescindível no uso pro- A dapsona é especialmente importante no tratamento das for-
longado da corticoterapia. mas bolhosas do LES, quando se observa infiltrado neutrofílico e
a presença de anticorpos contra o colágeno tipo VII. Entretanto,
Metotrexato (MTX) atua na atividade cutânea, sem interferir na atividade sistêmica.
O MTX inibe a enzima di-hidrofolato redutase e, portanto, a prolife- Também pode ser útil no tratamento das lesões mucocutâneas e
ração das células T. Seus efeitos anti-inflamatórios se devem a sua da urticária vasculite. Evidências provenientes de relatos de caso
ação na adenosina e também por induzir apoptose seletivamente e pequenas séries de pacientes demonstram alguma eficácia no
nas células T CD4+ proliferadas e ativadas além de inibição de IL-1. LESA e paniculite lúpica. Entretanto, nesses casos, a resposta favo-
Trata-se de medicamento já bem conhecido e utilizado como rável gira em torno de 1/3 dos pacientes23,24,25.
terapia de segunda linha com muito sucesso no tratamento do Recomenda-se dose inicial de 50 mg/dia e aumento progres-
sivo até 100-150 mg/dia, mediante monitorização para anemia
LESA e LED refratários, representando ótima opção terapêuti-
hemolítica. Os efeitos colaterais principais são a hemólise e me-
ca no LES. Em estudo subsequente à análise do uso intravenoso
themoglobinemia – especialmente em indivíduos deficientes em
em 43 pacientes, 15 deles receberam MTX agora subcutâneo, que
glicose-6-fosfato-desidrogenase (G6PD), agranulocitose e neuropa-
mostrou semelhante eficácia, além de ter aplicação mais fácil e
tia periférica (uso prolongado). Raramente, pode ocorrer síndro-
boa tolerabilidade18.
me de hipersensibilidade, quadro grave que cursa com a tríade
As doses usadas são de 15-25 mg uma vez por semana (0,2 mg/
febre, exantema e envolvimento de órgãos internos.
kg/semana), seguidas de ácido fólico 5 mg no dia subsequente,
para reduzir os efeitos adversos, que incluem queixas gastrintesti-
nais, úlceras orais, hepatotoxicidade, nefrotoxicidade, mielotoxici- Micofenolato mofetil (MMF)
dade. O MTX é teratogênico e tanto mulheres como homens devem O MMF inibe, de forma específica e não competitiva, a inosina
utilizar contracepção durante sua utilização. monofosfato desidrogenase de forma reversível. Essa enzima tem
A resposta tem início em 2-4 semanas e resposta completa é grande influência na proliferação dos linfócitos T e B e impede a
esperada em 6-8 semanas. apoptose dos linfócitos ativados. Converte-se em ácido micofenóli-
Embora não haja estudos comprovando sua segurança no uso co (MPS) após a ingestão.
prolongado no LEC, ela parece ser bem tolerada, mas é necessá- No LEC, as evidências baseiam-se em múltiplos relatos de
rio atenção aos fatores de risco para hepatotoxicidade associados, caso e pequenas séries, incluindo um estudo não randomizado,
como hepatites, alcoolismo, obesidade e diabetes tipo 2 e uso de prospectivo de 10 pacientes com LESA refratário, tratados com
medicamentos. MPS, mostrando que, tanto MMF como MPS são eficazes em todos

Revista Paulista de Reumatologia 21 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):19-24


Vasconcellos MRA

os subtipos de LEC refratários26-27. A recomendação para o MMF é mg/dia. Acompanharam os doentes por 8 anos. A resposta terapêu-
como tratamento de terceira linha, preferencialmente associado tica ocorreu em 58 (98%), sendo completa em 50 (85%). Enquanto
ao antimalárico. MPS é tratamento alternativo ao MMF. as formas discoides tenderam a recidivar e necessitar de períodos
A dose inicial de MMF é de 500 mg 2 vezes ao dia, que pode ser de manutenção mais prolongados, aqueles com LESA tiveram re-
aumentada até 3 g/dia. missão sustentada após a suspensão do medicamento.
Os efeitos adversos são sintomas gastrintestinais (náusea, vô- Aprovada para o tratamento do LEC, tem controle rigoroso em
mitos e diarreia), citopenias, hepatotoxicidade. Esses são efeitos função da teratogenicidade. A documentação, quando se usa a ta-
dose-dependentes. Os pacientes também podem apresentar maior lidomida, é essencial.
suscetibilidade para infecções, particularmente virais (por exem- A lenalidomida, análogo estrutural da talidomida, apresenta a
plo, herpes-zóster), infecções do trato respiratório, cistite. vantagem de menor risco de polineuropatia, embora também seja
Monitorização laboratorial mensal é mandatória para toxici- teratogênica e não seja de fácil disponibilidade pelo seu alto custo.
dade hematológica, hepática e renal.
Contracepção durante o tratamento e por 6 semanas após a Clofazimina
interrupção do tratamento.
Corante rimino-phenazidico lipofílico com propriedades antimi-
crobianas, anti-inflamatórias e imunossupressoras. Usado no tra-
Azatioprina tamento da hanseníase.
Precursor da 6-mercaptopurina, com propriedades imunossupres- Em 2005, estudo randomizado e controlado comparando clofa-
soras e citotóxicas, tem sido usada para várias doenças cutâneas, zimina 100 mg/dia e cloroquina (CQ) 250 mg/dia mostrou eficácia
incluindo o LEC. semelhante nas manifestações cutâneas do LES. Embora com efi-
Existem relatos de bons resultados em pacientes de LES com cácia comparável à cloroquina, 5 pacientes no grupo da clofazimi-
lesões discoides disseminadas28,29. na e um do grupo da CQ desenvolveram reações cutâneas graves.
Sua utilização foi também referida como favorável em ma- Sem conseguir determinar se decorreu do medicamento ou não, a
nutenção após pulsoterapia com ciclofosfamida em paciente com recomendação é que somente seja usada em pacientes de LEC sem
LES e lesões subagudas graves e refratárias30. doença sistêmica associada34.
Foi utilizada para lesões palmoplantares com bons resulta-
dos31; em outros estudos, apenas metade dos doentes de LED e Imunoglobulina endovenosa (IVIG)
LESA responderam favoravelmente32.
Extraído de pool de plasma de mais de 10 mil doadores. Pode ser
Em geral, no LEC sem alterações sistêmicas não é recomenda-
usado no LEC com ou sem doença sistêmica associada. Seu uso é
da a utilização da azatioprina, devido aos efeitos adversos e resul-
limitado pelo custo e achados controversos sobre eficácia.
tados controversos.
Dose de 1-2 g/kg a cada quatro semanas e então reduzido para
A dose usual é de 1-2,5 mg/kg/dia; a dose diária gira em torno
0,5 g/kg.
de 100-150 mg e deve ser reduzida ao longo do tratamento.
Os efeitos colaterais mais comuns são cefaleia, erupção urti-
Atividade reduzida da tiopurina metiltransferase (TPMP) acar-
cariforme, mas podem ocorrer meningite asséptica, insuficiência
reta risco de toxicidade por superdosagem; a dose pode ser eleva-
renal aguda, eventos tromboembólicos, anafilaxia em pacientes
da mediante avaliação do hemograma e transaminases. Interage
deficientes em IgA.
com alopurinol, entre outros medicamentos.
Vários relatos de casos e séries de pacientes mostram efeito
benéfico no LEC, porém, exacerbação das lesões no LESA e LES
Talidomida também foi descrita35.
Talidomida (alfa-N-phthalimido-glutarimida) tem efeito anti-infla-
matório potente. Inibe a síntese de TNF-alfa e apoptose induzida Ciclofosfamida
por UV, diminuindo assim a atividade inflamatória.
Agente alquilante, potente imunossupressor. Utilizada há bastante
É considerada um dos agentes mais eficazes no tratamento do
tempo em 9 pacientes com vários subtipos de LEC, com melhora
LEC refratário e grave. A talidomida foi usada com sucesso nos
classificada como excelente em 5 e moderada em 3. Em dois pa-
três subtipos de LEC. Porém, a neuropatia periférica ocorre em
cientes que suspenderam a medicação, não houve recidiva em 3
17-27% dos pacientes, é parcialmente, mas nem sempre, reversí-
meses e 23 meses36.
vel e, portanto, sua utilização fica significativamente limitada.
Apresenta diversos efeitos colaterais: anorexia, náusea, vômi-
Outros efeitos colaterais, mais comuns, são constipação, tontu-
to, diarreia, estomatite, mielossupressão, insuficiência ovariana,
ra, zumbido. Alterações menos comuns decorrentes do tratamento
cistite hemorrágica, alopecia, cardiomiopatia, malignidades.
são eventos trombóticos, amenorreia, edema. Os eventos trombó-
Como surgiram outras opções melhores, hoje o uso de ciclofos-
ticos podem ser venosos ou arteriais, que geralmente ocorrem nos
famida especificamente para LEC é incomum.
primeiros 6 meses de tratamento e são mais frequentes quando
existe presença de anticorpos antifosfolípides em paciente de LES.
Recomenda-se administração concomitante do antimalárico. Ciclosporina
Num primeiro esquema terapêutico, inicia-se com 50 mg/dia de Inibidor da calcineurina, a ciclosporina é um imunossupressor
talidomida, eleva-se a dose até 150 mg/dia e mantem-se até respos- utilizado com bons resultados em outras dermatoses como psoría-
ta clínica; a partir daí, reduz-se a dose para 50 mg em dias alterna- se; porém, no LEC, apresenta resultados apenas moderados e com
dos. Normalmente, a resposta se mantém mesmo com redução da efeitos adversos que somam às complicações do lúpus, como alte-
dose. Também pode ser usada como dose de resgate com duração ração renal. Pode eventualmente ser usada no LES para poupar o
menor e em seguida volta-se à manutenção. CE sistêmico. Pode ser usado na gravidez37.
Em 2012, Cortés-Hernández33 et al. estudaram 60 pacientes A dose é de 3-5 mg/kg/dia e os efeitos colaterais, hipertensão
consecutivos com LEC refratário e administraram talidomida 100 arterial, toxicidade renal.

Revista Paulista de Reumatologia 22 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):19-24


Tratamento das lesões cutâneas no LES: visão de dermatologista

Leflunomida proteção e medicamentos tópicos (corticosteroides e inibidores


Leflunomida é um medicamento imunomodulador com ação anti- de calcineurina) podem ser suficientes no controle da doença.
-inflamatória e imunossupressora. Como efeitos adversos podem Quando há indicação de tratamento sistêmico, os antimaláricos
ocorrer alopecia, eczema, prurido, xerose, vasculite, erupção li- são a primeira escolha, mas no contexto do LES, alterações em
quenoide. Precisa ser utilizada com cautela pois existem relatos órgãos vitais direcionam o tratamento e antimaláricos estão sem-
de exacerbação do LEC ou do LES concomitantemente ao uso da pre indicados, desde que não haja contraindicações. O metotre-
leflunomida38,39. xato é fundamental no controle e como poupador do corticoide.
Dapsona está indicada para atividade cutânea no LES bolhoso
com neutrofilia cutânea. Retinoides orais encontram indicação
Ésteres do ácido fumárico (FAEs)
específica nas formas verrucosas e talidomida pode ser indica-
Ação imunomoduladora, foi usado em três pacientes sendo 2 com da como medicamento de resgate, de uso pontual. Várias drogas
LED disseminado e 1 com perniose lúpica. Associação com HCQ e vêm sendo pesquisadas e aguardam mais evidências, como beli-
MMF. Estudo piloto, prospectivo, aberto de Fase II com 11 doentes mumabe, rituximabe, sirukumabe.
de LEC mostrou relativa segurança; os efeitos colaterais observa-
dos foram cefaleia e cólica abdominal40.
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Indicado como terapia adjuvante para acrescentar benefício
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controle adequado da atividade. Ainda não existe eficácia compro- 6. Gronhagen CM, Fored CM, Linder M, Granath F, Nyberg F. Subacute cutaneous lupus
vada como monoterapia. erythematosus and its association with drugs: a population-based matched case-con-
Usado na dose de 10 mg/kg a cada 2 semanas nas primeiras 3 trol study of 234 patients in Sweden. Br J Dermatol. 2012;167:296-305.
doses e depois a cada 4 semanas. Aprovado para LES desde 2012. 7. Lowe G, Henderson CL, Grau RH, Hansen CB, Sontheimer RD. A systematic review of
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musculoesqueléticos e cutâneos, porém, o estudo não focou qual- 8. Roenigk HH Jr, Martin JS, Eichorn P, Gilliam JN. Discoid lupus erythematosus. Diag-
nostic features and evaluation of topical corticosteroid therapy. Cutis. 1980;25:281-5.
quer órgão em especial41. Recentemente, Vashisht et al.42 estuda-
9. Kuhn A, Gensch K, Haust M, Schneider SW, Bonsmann G, Gaebelein-Wissing N, et
ram 5 pacientes com LES e atividade cutânea refratária e observa-
al. Efficacy of tacrolimus 0.1% ointment in cutaneous lupus erythematosus: a multi-
ram melhora em todos os parâmetros (Sledai, Clasi, PGA – Patient
center, randomized, double-blind, vehicle-controlled trial. J Am Acad Dermatol. 2011
Global Assessment) após 8-12 semanas. Estudo realizado em 67 Jul;65(1):54-64, 64.e1-2.
pacientes para verificar segurança e efetividade mostrou que foi 10. Barikbin B, Givrad S, Yousefi M, Eskandari F. Pimecrolimus 1% cream versus betame-
bem tolerado e efetivo, reduziu o número de surtos e a progressão thasone 17-valerate 0.1% cream in the treatment of facial discoid lupus erythematosus:
de dano; os órgãos mais beneficiados foram o sistema musculoes- a double-blind, randomized pilot study. Clin Exp Dermatol. 2009;34:776-80.
quelético (37,3%), a pele (22,4%) e os rins (23,9%)43. 11. Pothinamthong P, Janjumratsang P. A comparative study in efficacy and safety of 0.1%
tacrolimus and 0.05% clobetasol propionate ointment in discoid lupus erythematosus
by modified cutaneous lupus erythematosus disease area and severity index. J Med
Rituximabe Assoc Thai. 2012;95:933-40.
Anticorpo monoclonal quimérico anti-CD20. Estudos controlados, 12. Jemec GB, Ullman S, Goodfield M, Bygum A, Olesen AB, Berth-Jones J, et al. A rando-
randomizados, multicêntricos não comprovaram a eficácia an- mized controlled trial of R-salbutamol for topical treatment of discoid lupus erythema-
teriormente demonstrada em estudos abertos44,45. Porém, nesses tosus. Br J Dermatol. 2009;161:1365-70.
estudos, os grupos comparados receberam altas doses de corticos- 13. Bahloul E, Jallouli M, Garbaa S, Marzouk S, Masmoudi A, Turki H, et al. Hydroxychlo-
roquine-induced hyperpigmentation in systemic diseases: prevalence, clinical features
teroides e também receberam imunossupressores. Revisão siste-
and risk factors: a cross-sectional study of 41 cases. Lupus. 2017;0:1-5.
mática de 188 pacientes com doença grave, refratária, mostrou
14. Marmor MF, Kellner U, Lai TY, Lyons JS, Mieler WF. Revised recommendations on scre-
que 91% tiveram melhora significativa em, pelo menos, uma ma- ening for chloroquine and hydroxychloroquine retinopathy. Ophthalmology. 2011;118:
nifestação do lúpus46. 415-22.
15. Marmor MF, Kellner U, Lai TY, Melles RB, Mieler WF. Recommendations on screening
Sirukumabe for chloroquine and hydroxychloroquine retinopathy (2016 Revision). Ophthalmology.
2016;123:1386-94.
Anticorpo monoclonal anti-IL-6 humano: estudos de Fase I ainda 16. Sigges J, Biazar C, Landmann A, Ruland V, Patsinakidis N, Amler S, et al; EUSCLE Co-
não permitem conclusões sobre eficácia e segurança47. -Authors. Therapeutic strategies evaluated by the European Society of Cutaneous Lu-
pus Erythematosus (EUSCLE) Core Set Questionnaire in more than 1000 patients with
Conclusão cutaneous lupus erythematosus. Autoimmun Rev. 2013;12:694-702.
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Muitos são os medicamentos utilizados para o controle do LEC, cutaneous lupus. Arthritis Rheum. 1984;27:837-8.
com ou sem manifestações sistêmicas. Diversos avanços ocor- 18. Huber A, Tuting T, Bauer R, Bieber T, Wenzel J. Methotrexate treatment in cutaneous
reram, porém, permanece o desafio ante a heterogenicidade lupus erythematosus: subcutaneous application is as effective as intravenous adminis-
do lúpus eritematoso. Nas formas puramente cutâneas, a foto- tration. Br J Dermatol. 2006;155:861-2.

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Revista Paulista de Reumatologia 24 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):19-24


QUANDO SEU PACIENTE APRESENTAR ALTA ATIVIDADE DE
DOENÇA, APESAR DO TRATAMENTO COM ANTIMALÁRICO,
CORTICOIDE E IMUNOSSUPRESSOR, A ASSOCIAÇÃO DE
BENLYSTA É UMA OPÇÃO PARA O CONTROLE DO LES1,4

39% (n=305) de redução de risco relativo de um primeiro flare severo.*2


Redução de 69,3% da dose média de corticoide em 24 meses.**3
Melhora da fadiga em 8 semanas.2
85,1% (n=403) dos pacientes não apresentaram novos danos.5
*HR [95% IC; 0,61 (0.44,0.85) vs Placebo + terapia padrão (n=287)
** n inicial = 386 e n final = 255; 6,1 mg/dia representa uma redução de 69,3% de uma dose média inicial de 19,9 mg/dia

REAÇÕES ADVERSAS: MUITO COMUNS (>1/10): INFECÇÕES NÃO OPORTUNISTAS, VIRAIS OU BACTERIANAS; DIARREIA; NÁUSEAS. COMUNS (>1/100
E <1/10): LEUCOPENIA, REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE, DEPRESSÃO, DOR NAS EXTREMIDADES, REAÇÃO SISTÊMICA RELACIONADA À INFUSÃO.
INCOMUNS (>1/1.000 E <1/100): REAÇÕES ANAFILÁTICAS4. PRECAUÇÕES E ADVERTÊNCIAS: CASOS DE LEUCOENCEFALOPATIA MULTIFOCAL
PROGRESSIVA (LMP), PODEM OCORRER COM BELIMUMABE, ASSIM COMO COM OUTROS IMUNOSSUPRESSORES4. CONTRAINDICAÇÃO: PACIENTES
QUE APRESENTARAM ANAFILAXIA EM DECORRÊNCIA DE SEU USO4. INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS: NÃO FORAM REALIZADOS ESTUDOS DE
INTERAÇÃO COM O BELIMUMABE. EM ESTUDOS CLÍNICOS SOBRE PACIENTES COM LES, A ADMINISTRAÇÃO CONCOMITANTE DE MICOFENOLATO
MOFETIL, AZATIOPRINA, HIDROXICLOROQUINA, METOTREXATO, ANTIINFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES, ASPIRINAS E INIBIDORES DA HMG-COA
REDUTASE NÃO TEVE EFEITO EXPRESSIVO SOBRE AS EXPOSIÇÕES AO BELIMUMABE.4
Benlysta® pó liofilizado para solução para infusão intravenosa (belimumabe). Indicação: terapia adjuvante em pacientes adultos com lúpus eritematoso sistêmico (LES) ativo, que apresentam alto grau de atividade da doença (ex: anti-DNA positivo e baixo complemento) e que estejam em uso de tratamento padrão para
LES, incluindo corticosteroides, antimaláricos, AINEs ou outros imunossupressores. Contraindicação: pacientes que apresentaram anafilaxia em decorrência de seu uso. Advertências e precauções: Não se recomenda o uso de Benlysta® em combinação com terapia biológica ou com ciclofosfamida. A administração
de belimumabe pode resultar em reações à infusão e hipersensibilidade, que podem ser graves e fatais. No caso de reação grave, deve-se interromper a administração de belimumabe e administrar apropriado tratamento. Os pacientes com histórico de alergias a múltiplos medicamentos ou de hipersensibilidade
significativa podem ter risco aumentado de reações. A pré-medicação com um antihistamínico oral, com ou sem antipirético, pode ser administrada antes da infusão de Benlysta®. Os pacientes devem ser monitorados durante e por um período de tempo apropriado após a administração de Benlysta®. Também foram
observadas reações do tipo tardias, reações de hipersensibilidade não agudas, incluindo rash, erupções cutâneas, náusea, fadiga, mialgia, dor de cabeça e edema facial. O mecanismo de ação de belimumabe pode aumentar o risco para o desenvolvimento de infecções. Infecções graves, incluindo casos fatais, foram
relatados em pacientes com LES que receberam terapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Os pacientes que desenvolverem uma infecção durante o tratamento com belimumabe devem ser monitorados rigorosamente e deve-se considerar a interrupção da terapia imunossupressora. Os médicos devem ter cuidado
ao considerar o uso de belimumabe no caso de pacientes com infecções severas ou crônicas. O mecanismo de ação do belimumabe pode aumentar o risco potencial para o desenvolvimento de neoplasias. Em estudos clínicos não houve diferença na taxa de doenças neoplásicas entre o grupo tratado com belimumabe e
o tratado com placebo. Não se deve administrar vacinas com vírus vivos por 30 dias antes ou concomitantemente à belimumabe porque a segurança clínica não foi estabelecida. Houve mais relatos de óbitos com Benlysta® do que com placebo durante o período controlado dos estudos clínicos. Não houve predominância
isolada de causa das mortes. As etiologias incluíram infecção, doença cardiovascular e suicídio. Em estudos clínicos, as taxas de resposta do desfecho primário foram inferiores nos indivíduos negros do grupo Benlysta® em relação aos do grupo placebo. Benlysta® deve ser utilizado com cuidado em pacientes da raça
negra. Os pacientes que recebem Benlysta® devem ser instruídos a entrar em contato com seu profissional de saúde caso tenham casos novos ou agravados de depressão, pensamentos suicidas ou outras alterações de humor. Casos de Leucoencefalopatia Multifocal Progressiva (LMP), inclusive fatais, e que resultaram
em déficits neurológicos têm sido relatados em pacientes com LES que receberam farmacoterapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Caso a LMP seja confirmada, deve-se considerar a interrupção da terapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Uso em gravidez e lactação: Só se deve usar belimumabe
durante a gravidez se o possível benefício para a mãe justificar o risco potencial para o feto. Se a prevenção da gravidez for mandatória, mulheres férteis devem adotar os métodos anticoncepcionais adequados ao longo de toda a terapia com belimumabe e durante pelo menos quatro meses após a conclusão do
último tratamento com esse agente. Não se estabeleceu a segurança de belimumabe durante a lactação. Recomenda-se que a decisão a respeito do tratamento com belimumabe em lactantes seja tomada levando-se em consideração a importância da amamentação materna para o lactente, da medicação para a mãe,
e qualquer potencial efeito adverso tanto de belimumabe quanto da condição materna subjacente para o lactente. Categoria B de risco na gravidez. Reações adversas: Muito comuns (>1/10): infecções (não oportunistas), infecções bacterianas (por exemplo, bronquite, cistite), diarreia, náuseas. Comuns (>1/100
e <1/10): gastroenterite viral, faringite, nasofaringite, leucopenia, reação de hipersensibilidade, depressão, insônia, enxaqueca, dor nas extremidades, pirexia e reação sistêmica relacionada à infusão. Incomuns (>1/1.000 e <1/100): reação anafilática, angioedema, exantema, urticária. Raras (>1/10.000 a <1/1.000):
reações do tipo tardias, reações de hipersensibilidade não agudas. Interações medicamentosas: Não se realizaram estudos sobre interações medicamentosas de belimumabe. Em estudos clínicos sobre pacientes com LES, a administração concomitante de micofenolato mofetil, azatioprina, hidroxicloroquina,
metotrexato, anti-inflamatórios não esteroides, aspirina e inibidores da HMG-CoA redutase não teve efeito expressivo sobre as exposições ao belimumabe. Posologia: O esquema posológico recomendável para adultos é de 10 mg/kg nos dias 0, 14 e 28 e, depois disso, em intervalos de 4 semanas sendo administrado
por infusão intravenosa e devendo ser reconstituído e diluído antes da administração. Deve ser administrado por um profissional de saúde preparado para tratar reações de hipersensibilidade incluindo anafilaxia. A infusão deve ser feita durante o período de 1 hora. Não se deve administrar Benlysta® em infusão rápida
ou bólus. É possível desacelerar a taxa de infusão ou interrompê-la caso o paciente apresente reação infusional. Deve-se suspender imediatamente a infusão se o paciente tiver reação adversa com risco de vida. Os pacientes devem ser monitorados durante e por um período de tempo apropriado após a administração
de Benlysta®. Deve ser considerada a descontinuação do tratamento com Benlysta® quando não houver melhora no controle da doença após 6 meses de tratamento. Superdosagem: Existe uma experiência clínica limitada sobre superdosagem de belimumabe. Para dados completos sobre a segurança do medicamento,
a bula na íntegra deverá ser consultada e poderá ser solicitada à empresa através do Departamento de Informação Médica da GSK (SAC 08007012233 e/ou medinfo@gsk.com). USO ADULTO (a partir de 18 anos). VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. Reg. MS: 1.0107.0295 mBL_Benlysta_inj_GDS13_ L0752.

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Artigo

Biomarcadores no lúpus eritematoso sistêmico


Mariana Postal 1    Simone Appenzeller 2

Introdução 4. Estudos prospectivos. Após aplicação em estudos retrospec-


O lúpus eritematoso sistêmico (LES) é uma doença autoimune sis- tivos, o uso dos biomarcadores em estudos prospectivos,
têmica com períodos de atividade e remissão1. A incidência e pre- de preferência multicêntricos, é realizado para identificar
valência do LES varia entre estudos de acordo com as diferentes sensibilidade, especificidade e valor preditivo positivo e ne-
regiões geográficas e raça das populações estudadas. No Brasil, há gativo.
poucos estudos, sendo estimada uma incidência de 8,7 casos por 5. Impacto na doença. Nessa fase é determinado o impacto do
100.000 pessoas/ano em Natal e de 4,8 por 100.000 pessoas/ano em biomarcador no diagnóstico, curso da doença ou resposta ao
Cascavel e uma prevalência de 98 casos por 100.000 pessoas em tratamento.
Montes Claros2-4.
Embora a primeira descrição de LES tenha sido relatada em Biomarcadores e diagnóstico de LES
855 a.C. pelo arcebispo Hebernus5, o diagnóstico e tratamento do Não há critérios diagnósticos para o LES. Utilizamos, na prática,
LES permanece desafiador nos dias de hoje, devido a sua heteroge- critérios classificatórios, baseados em uma combinação de acha-
neidade na apresentação clínica, no curso da doença e na resposta dos clínicos e laboratoriais desenvolvidos para inclusão de pa-
ao tratamento. Diferenciar atividade de doença de diversos diag- cientes em estudos clínicos9. Esses critérios têm limitações quando
nósticos diferenciais presentes ao diagnóstico e na reativação da aplicados na prática clínica. O fator antinúcleo (FAN) é amplamen-
doença é fundamental para o tratamento adequado do paciente. te utilizado, apresentando uma elevada sensibilidade, porém, bai-
Esse processo poderia ser facilitado na presença de biomarcado- xa especificidade. Ao contrário, o anti-DNA dupla hélice e o anti-
res específicos para doença6,7. Neste artigo iremos revisar os prin- -SM apresentam elevada especificidade, mas baixa sensibilidade.
cipais biomarcadores associados ao diagnóstico da doença, a ativi- Outros anticorpos frequentemente avaliados em pacientes com
dade da doença e ao tratamento. LES, como anti-Ro, anti-La e anti-RNP, não são capazes de diferen-
ciar LES de outras doenças autoimunes. Na prática clínica, a falta
Biomarcadores: definição de padronização na dosagem de autoanticorpos também afeta a
Biomarcador pode ser definido como qualquer parâmetro objeti- sensibilidade10.
vamente mensurável e avaliado que possa atuar como indicador Os componentes solúveis do complemento C3, C4 e CH50 tam-
de um processo biológico normal, processo patogênico ou res- bém fazem parte dos exames rotineiramente solicitados, mas tam-
posta ao tratamento8. Ele pode ser um teste genético, bioquímico, bém não ocorrem somente no LES, podendo ser observados em
molecular ou um exame de imagem. Idealmente um biomarcador outras doenças autoimunes, infecções ou neoplasias10.
deveria ter uma sensibilidade e especificidade elevada com boa Como a ativação do complemento tem um papel fundamental
acurácia. Ainda deveria ter significado patológico, ser sensível a na patogênese do LES, estudos têm avaliado proteínas do com-
mudanças, de fácil obtenção e com boa relação custo-efetividade plexo ligadas a membrana celular como possíveis biomarcado-
para uso na prática clínica. Para que seja implementado na prá- res para o diagnóstico no LES11. Pacientes com LES apresentam
tica clínica, a identificação e validação de biomarcadores passa níveis elevados de C4d ligados a eritrócitos (sensibilidade 81% e
por 5 fases: especificidade de 91%), plaquetas (frequência de 18%, com es-
pecificidade de aproximadamente 100%), reticulócitos e linfóci-
1. Fase pré-clínica. Nessa fase investiga-se a presença de biomar- tos11. Em um estudo transverso, multicêntrico, a incorporação de
cadores em modelos animais ou em soro e urina de pacientes. C4d ligados a eritrócitos e plaquetas, em associação com FAN e
2. Desenvolvimento de testes. Nessa fase são desenvolvidos tes- anti-DNA nativo, entre outros, apresentou uma sensibilidade de
tes para melhor avaliar o biomarcador, e realizados testes em 80% e especificidade de 88% para o diagnóstico de LES. No estu-
pessoas saudáveis. do, a sensibilidade foi avaliada em relação a controles sadios e
3. Estudos retrospectivos. A análise de um possível biomarcador outras doenças autoimunes. A falta de controles com infecções e
em soros armazenados ajuda na identificação da sensibilida- neoplasias que dificultam o nosso diagnóstico na prática clínica,
de e possíveis associações. o custo e a limitada disponibilidade do exame podem ser um fa-

1. Biomédica. Pós-doutoranda no Laboratório de Autoimunidade da Como citar este artigo: Postal M, Appenzeller S. Biomarcadores no lúpus
Universidade Estadual de Campinas. eritematoso sistêmico. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):26-9.
2. Professora associada livre-docente na disciplina de Reumatologia As autoras não contaram com apoio financeiro.
da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de As autoras declaram não ter interesses associativos, comerciais,
Campinas. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
E-mail para contato: appenzellersimone@yahoo.com. nos produtos e empresas descritos neste artigo.

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Biomarcadores no lúpus eritematoso sistêmico

tor importante na incorporação na prática clínica até o presente Neutrophil gelatinase-associated lipocalin (NGAL) é expressa
momento12. em diversas células, incluindo os túbulos renais. Vários estudos
A identificação do aumento de níveis séricos de INF-α em pa- transversais têm investigado NGAL como biomarcador na nefrite
cientes com LES e a identificação de polimorfismos relacionados lúpica de adultos e crianças com sensibilidade elevada e especi-
com os genes induzidos pelo INF-α, levaram à hipótese de que ficidade variável29-31. Em estudos longitudinais, níveis urinários
INF-α poderia ser um biomarcador para o diagnóstico do LES. de NGAL estão correlacionados com atividade renal e seus níveis
Porém, alterações similares foram observadas em outras doenças se elevam 3-6 meses antes de um flare renal29-31. Contudo, NGAL
autoimunes e infecções13. A utilização de um painel diagnóstico e MCP-1 também não são específicas no LES e precisam ser ava-
com 3 genes induzidos pelo INF-α apresentou sensibilidade e espe- liadas no contexto individual de cada paciente. Ainda existem
cificidade de 70-80% para o diagnóstico de LES. várias outras moléculas em estudo, porém, faltam estudos longi-
tudinais para validação.
Biomarcadores e atividade de doença Dentre os marcadores para nefrite lúpica, os anticorpos anti-
nucleossomo e anticorpos anti-C1q foram extensivamente estuda-
A atividade de doença é avaliada por índices compostos como SLE
dos e demonstraram ser promissores biomarcadores para envol-
Disease Activity Index (Sledai)14, Systemic Lupus Activity Measure
vimento renal7. Os anticorpos antinucleossomo estão presentes
(Slam)15, European Consensus Lupus Activity Measure (Eclam)16 e
em 70-100% dos pacientes com LES e têm uma especificidade ele-
British Isles Lupus Assessment Group Index (Bilag)17, que envolvem
vada (até 97%) para o LES. Esses anticorpos são mais frequentes
uma combinação de sinais e sintomas clínicos e parâmetros labo-
em pacientes com nefrite. Além disso, alguns estudos relataram
ratoriais. Na prática clínica, nem sempre são utilizados de forma
que o antinucleossomo pode ser encontrado em pacientes que
rotineira, mas podem auxiliar na padronização da atividade de
anti-dsDNA consistentemente negativo32,33.
doença. Porém, não auxiliam em diferenciar atividade de doença
Os anticorpos anti-C1q foram encontrados em 30% a 60% dos
de infecção, por exemplo.
pacientes com LES e uma forte correlação entre a presença de an-
Muitos biomarcadores são utilizados em estudos transversais
ticorpos anti-C1q e envolvimento renal foi relatada7. Estudos tam-
e sua associação não se confirma em estudos longitudinais. Por
bém observaram que os níveis de anticorpos anti-C1q diminuíram
exemplo, a aumento da expressão de genes regulados pelo INF tipo
após o tratamento da nefrite lúpica. A ausência de anticorpos
1 tem sido associada à atividade do LES em estudos transversais,
anti-C1q foi relatada para exclusão de um diagnóstico de nefrite
porém, não foram sensíveis a mudanças em estudos longitudinais.
lúpica, bem como um aumento nesses anticorpos sugere apareci-
Mais estudos são necessários para avaliar se podem ser utilizados
mento de flare renal34,35.
para uma manifestação em específico18-21.
O comprometimento do SNC no LES é outro desafio na prá-
Outros biomarcadores estudados e que se correlacionaram
tica clínica36. A ressonância magnética estrutural é considerada
com Sledai foram plasmócitos CD 127 high (valor preditivo de
padrão ouro, mas muitas vezes encontra-se normal ou apresenta
78,9%)22,23, C4d ligado a reticulócitos, citocinas e níveis plasmáti-
alterações inespecíficas37. Técnicas funcionais têm sido utilizadas
cos de estimuladores de linfócitos B (BLyS), porém, até o presente
em pesquisa para identificar alterações na conectividade neuro-
momento, não estão disponíveis na prática clínica. Além da identi-
nal. A grande variabilidade das manifestações do SNC, porém, é
ficação da atividade de doença como um todo, vários estudos têm
um desafio na aplicabilidade dos achados na prática clínica.
procurado identificar biomarcadores para atividade renal ou sis-
Estudos têm demonstrado a existência de uma interação entre
tema nervoso central (SNC).
o sistema imunológico periférico e o SNC no LES. Alguns marca-
dores podem ser detectados tanto no líquido cefalorraquidiano
Atividade órgão-específica (LCR) quanto na circulação sanguínea periférica7. Os anticorpos
Atividade renal está associada a uma maior morbimortalidade no antineuronais foram os primeiros anticorpos a serem investi-
LES. A fisiopatologia da nefrite ainda não é totalmente conhecida gados no LES neuropsiquiátrico (NP), especificamente IgG, que
e não temos marcadores adequados para identificar atividade re- se liga a linhas celulares de neuroblastoma. Esses anticorpos
nal, resposta ao tratamento e o prognóstico renal. A identificação têm sido associados a outras doenças neurodegenerativas, mais
de biomarcadores pode auxiliar no tratamento mais personali- notavelmente as síndromes paraneoplásicas38. Seu papel como
zado da nefrite lúpica, principalmente porque a biópsia, padrão biomarcador ainda é controverso na literatura; alguns estudos
ouro para o diagnóstico da nefrite lúpica, nem sempre é disponível mostraram uma forte associação entre esses anticorpos e formas
ou conclusiva. difusas de LES NP39,40; no entanto, outros estudos demonstraram
Na prática utilizamos complemento e anti-DNA, porém eles que os antineuronais não são sensíveis nem específicos no LES
também podem estar alterados em atividade extrarrenal, não NP. Além disso, os anticorpos antineuronais reagem com uma
sendo, portanto, considerados bons biomarcadores para atividade grande variedade de antígenos neuronais, tornando um fraco
renal exclusiva24. biomarcador para o LES NP.
Monocyte chemoattractant protein-1 (MCP-1) é uma proteína Um dos mais promissores biomarcadores neuronais é o anti-
que atrai leucócitos e está envolvida na inflamação e no dano -N-methyl-D-asparate (anti-NMDA). O componente neuronal é um
renal da nefrite lúpica25-27. Seus níveis estão elevados na nefrite anticorpo anti-DNA de dupla hélice que reage com a subunidade
em atividade e sua especificidade para distinguir nefrite ativa de NR2 de um receptor neuronal de glutamato, o receptor NMDA.
nefrite inativa e atividade extrarrenal é 76% no LES juvenil27. Es- Em geral, os anticorpos anti-NMDA (mensurados por ensaios de
tudos têm sugerido que MCP-1 urinária poderá ser útil para dis- imunoenzimáticos) são detectados na circulação periférica de,
tinguir entre diferentes classes de nefrite, sendo seus níveis mais aproximadamente, 30% dos pacientes com LES. Um notável estu-
elevados na nefrite tipo III e IV28. Porém, estudos prospectivos e do demonstrou uma associação entre anticorpos anti-NMDA e al-
em diferentes populações são necessários antes da utilização des- terações do SNC, como depressão e prejuízo da memória de curto
se biomarcador na prática clínica. prazo. Outro estudo demonstrou uma associação com depressão,

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Postal M, Appenzeller S

9. Petri M, Orbai AM, Alarcón GS, Gordon C, Merrill JT, Fortin PR, et al. Derivation and va-
porém, não com distúrbio cognitivo. Alguns estudos não encon-
lidation of the Systemic Lupus International Collaborating Clinics classification criteria
traram associações significativas entre anticorpos anti-NMDA e
for systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2012;64:2677-86.
manifestações do SNC em pacientes com LES. Em contrapartida, 10. Manson JJ, Rahman A. Systemic lupus erythematosus. Orphanet J Rare Dis. 2006;1:6.
estudos mais recentes mostraram níveis no LCR aumentados em 11. Manzi S, Navratil JS, Ruffing MJ, Liu CC, Danchenko N, Nilson SE, et al. Measurement
pacientes com manifestações difusas do SNC quando comparados of erythrocyte C4d and complement receptor 1 in the diagnosis of systemic lupus
com pacientes com manifestações focais ou até mesmo indivíduos erythematosus. Arthritis & Rheumatism. 2004;50:3596-604.
saudáveis. Em conjunto, esses resultados sugerem que a determi- 12. Kalunian KC, Chatham WW, Massarotti EM, Reyes-Thomas J, Harris C, Furie RA, et al.
nação de anticorpos anti-NMDA no LCR pode ser mais útil para o Measurement of cell-bound complement activation products enhances diagnostic per-
formance in systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2012;64:4040-7.
diagnóstico de LES NP do que a determinação desses anticorpos
13. Toro-Domínguez D, Carmona-Sáez P, Alarcón-Riquelme ME. Shared signatures betwe-
no soro.
en rheumatoid arthritis, systemic lupus erythematosus and Sjögren’s syndrome unco-
O anticorpo anti-P ribossomal foi descrito, pela primeira vez, vered through gene expression meta-analysis. Arthritis Res Ther. 2014;16:489.
em pacientes com LES, em 198643. Embora a maioria dos estudos 14. Bombardier C, Gladman DD, Urowitz MB, Caron D, Chang CH. Derivation of the SLE-
relate uma prevalência de 10-20% de anti-P ribossomal em pacien- DAI. A disease activity index for lupus patients. The Committee on Prognosis Studies in
tes com LES adulto, sua prevalência no LES juvenil é de 20-42%44-46. SLE. Arthritis Rheum. 1992; 35: 630-40.
Esse anticorpo tem sido associado com psicose em pacientes com 15. Liang MH, Socher SA, Roberts WN, Esdaile JM. Measurement of systemic lupus erythe-
LES47. matosus activity in clinical research. Arthritis Rheum. 1988; 31: 817-25.
16. Bencivelli W, Vitali C, Isenberg DA, Smolen JS, Snaith ML, Sciuto M, et al. Disease acti-
O papel dos processos inflamatórios no LES NP vem sen-
vity in systemic lupus erythematosus: report of the consensus study group of the Euro-
do estudado. Estudos observaram um aumento nos níveis séri-
pean workshop for rheumatology research. III. Development of a computerized clinical
cos e do LCR de citocinas em pacientes com manifestações do chart and its application to the comparison clinical chart and its application to the com-
SNC. Houve, ainda, uma associação com achados de ressonância parison of different indices of disease activity. Clin Exp Rheumatol. 1992;10:549-54.
magnética38. A interleucina (IL)-6 mostrou ter uma associação 17. Isenberg DA, Rahman A, Allen E, Farewell V, Akil M, Bruce IN, et al. BILAG 2004. De-
com psicose nos pacientes LES NP e foi relatado ainda níveis ele- velopment and initial validation of an updated version of the British Isles Lupus Asses-
vados dessa citocina, na ausência de quebra da barreira hema- sment Group’s disease activity index for patients with systemic lupus erythematosus.
Rheumatology. 2005;44:902-6.
toencefálica48. Um estudo demonstrou níveis séricos de TNF-α
18. Rönnblom L, Eloranta M-L. The interferon signature in autoimmune diseases. Curr
aumentados em pacientes com LES com transtornos de humor
Opin Rheumatol. 2013;25:248-53.
e ansiedade49,50. 19. Bennett L, Palucka AK, Arce E, Cantrell V, Borvak J, Banchereau J, et al. Interferon and
É relatado na literatura que a IL-8 pode estar envolvida na granulopoiesis signatures in systemic lupus erythematosus blood. J Exp Med. 2003;
patogênese do LES NP, pois aumenta a permeabilidade à barrei- 197:711-23.
ra hematoencefálica(51. Estudos mostraram que os níveis de IL-8, 20. Landolt-Marticorena C, Bonventi G, Lubovich A, Ferguson C, Unnithan T, Su J, et al.
tanto séricos quanto do LCR, estavam aumentados em pacientes Lack of association between the interferon-alpha signature and longitudinal changes
in disease activity in systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 2009;68:1440-6.
com LES NP quando comparados a pacientes sem manifestações
21. Bauer JW, Petri M, Batliwalla FM, Koeuth T, Wilson J, Slattery C, et al. Interferon-regu-
de SNC e controles sadios51-53.
lated chemokines as biomarkers of systemic lupus erythematosus disease activity: a
Os mecanismos intrínsecos envolvidos no LES têm sido um validation study. Arthritis Rheum. 2009;60:3098-107.
desafio para a comunidade científica e o corpo clínico. Atualmen- 22. Jacobi AM, Odendahl M, Reiter K, Bruns A, Burmester GR, Radbruch A, et al. Correla-
te, os esforços estão dirigidos no sentido de explicar as possíveis tion between circulating CD27high plasma cells and disease activity in patients with
causas envolvidas no aparecimento da doença e no desenvolvi- systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2003;48:1332-42.
mento de determinadas manifestações clínicas. A medicina per- 23. Liu CC, Manzi S, Kao AH, Navratil JS, Ruffing MJ, Ahearn JM. Reticulocytes bearing C4d
sonalizada visa a tratar a saúde do paciente de maneira exclusi- as biomarkers of disease activity for systemic lupus eryhematosus. Arthritis Rheum.
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va, levando em conta todo o seu histórico e analisando cada caso
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413-24.
valia na identificação de atividade de doença e na identificação
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Revista Paulista de Reumatologia 29 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):26-9


Alessi H
Artigo

Depressão, ansiedade e disfunção cognitiva no lúpus


eritematoso sistêmico: da fisiopatologia à abordagem
neuropsicológica
Helena Alessi 1

Introdução alterações do humor com características depressivas, maníacas


As síndromes neuropsiquiátricas em pacientes com lúpus erite- ou mistas, ansiedade proeminente, síndrome do pânico e trans-
matoso sistêmico (LES) são comuns e apresentam características torno obsessivo-compulsivo14.
diversas. Podem ser classificadas em manifestações difusas, como Além de mais prevalentes do que na população geral3,15,16, dis-
depressão e psicose; ou focais, como mielite transversa e acidente túrbios psiquiátricos ocorrem independente da presença de ou-
vascular cerebral (AVC)1. Dentre as 19 síndromes neuropsiquiá- tras manifestações neurológicas6,7, e acometem duas vezes mais
tricas descritas pelo American College of Rheumathology (ACR), pacientes do sexo feminino17.
as mais frequentes entre pacientes adultos são: cefaleias (20- O estresse psicológico é apontado como um fator de risco para
40%), disfunção cognitiva (DC) (10-20%), transtornos de humor o desenvolvimento de transtornos psiquiátricos. Pacientes com
(10-20%), crises convulsivas (7-10%), doença cerebrovascular (7- LES apresentam níveis elevados de estresse psicológico quando
10%) e ansiedade (4-8%)2. Apesar das prevalências superiores às comparados a pacientes com outras doenças crônicas, como ar-
observadas na população geral3, permanece a discussão se tais trite reumatoide7, principalmente em relação a aspectos físicos e
síndromes são consequências diretas da doença autoimune ou se- emocionais. A presença de transtornos de ansiedade e depressão
cundárias a seus efeitos e a seu tratamento. A ocorrência de even- afeta diretamente a evolução e o tratamento da doença, por esta-
tos neuropsiquiátricos no LES está associada a pior prognóstico, rem associados a maiores taxas de desemprego, doença cardiovas-
diminuição da qualidade de vida, maiores taxas de abandono es- cular, incapacidade física, fraca aderência ao tratamento, maiores
colar e de desemprego4,5. índices de suicídio e morte17.
O perfil comportamental queixoso, emocionalmente depen-
dente e disfuncional para aspectos práticos do cotidiano é fre- Transtornos do humor
quente entre os pacientes com LES. Estudos mostram que mesmo
Transtornos do humor são reconhecidos pela Organização Mun-
indivíduos sem histórico de comprometimento neurológico apre-
dial de Saúde (OMS) como a principal causa de incapacitação pre-
sentam alterações neuropsiquiátricas difusas como depressão e
DC6,7. Modelos animais e estudos com pacientes demonstraram coce na população geral18. A prevalência de distúrbios depressivos
mudanças estruturais e funcionais em determinadas regiões cere- entre pacientes com LES é aproximadamente de 60%, enquanto o
brais como amígdala8, corpo caloso9 e hipocampo10,11, fundamen- diagnóstico de TDM atinge até 47% dos pacientes19.
tais para o processamento emocional e cognitivo. Outros estudos Os sintomas depressivos mais comuns são fadiga, tristeza, ir-
apontam alterações de fluxo sanguíneo cerebral12 e nas taxas de ritabilidade, dificuldade para iniciar o sono e alterações cogniti-
concentração de metabólicos referentes a lesão neuronal13, reve- vas19. Fatores como diagnóstico recente, perda da capacidade físi-
lando possíveis mecanismos de dano silenciosos. ca, atividade cutânea, mielite longitudinal e uso de prednisona em
Este artigo visa a discutir os principais aspectos biopsicosso- doses iguais ou superiores a 20 mg são preditores independentes
ciais relacionados com transtorno de humor, ansiedade e DC no de incidência de depressão no LES20.
LES, e apresentar evidências de diferentes técnicas utilizadas pela A importância da ativação sistêmica da doença na depressão
neuropsicologia para a abordagem dessas síndromes. é controversa19. Uma revisão sobre o papel da inflamação na sin-
tomatologia depressiva apontou que a indução de estados infla-
matórios em pessoas saudáveis ou doentes elevou a incidência
Distúrbios psiquiátricos mais frequentes no
de sintomas depressivos, associada aos níveis séricos de citocinas
LES pró-inflamatórias18. Estudos clínicos anteriores demostraram alte-
As principais manifestações psiquiátricas observadas entre pa- rações nos níveis séricos da neurotrofina BDNF21, de TNF-α22, de
cientes com LES incluem transtorno depressivo maior (TDM), anticorpos contra receptores NMDA N223 e anti-P ribossomal24. A

1. Neuropsicóloga. Doutoranda do Setor de Neurologia Geral e Ataxias, Agentes Financiadores: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
Departamento de Neurologia e Neurocirurgia, Universidade Federal São Paulo (Fapesp); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
de São Paulo. Nível Superior (Capes).
E-mail para contato: lealessi@yahoo.com.br. A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
Como citar este artigo: Alessi H. Depressão, ansiedade e disfunção de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
cognitiva no lúpus eritematoso sistêmico: da fisiopatologia à abordagem nos produtos e empresas descritos neste artigo.
neuropsicológica. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4.

Revista Paulista de Reumatologia 30 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4


Depressão, ansiedade e disfunção cognitiva no lúpus eritematoso sistêmico: da fisiopatologia à abordagem neuropsicológica

ativação da doença parece aumentar a vulnerabilidade para dis- tar de forma constante e permanente (ansiedade generalizada) ou
túrbios depressivos19, sendo um possível mecanismo inflamatório em crises agudas, que variam de frequência e intensidade (crises
da depressão no LES. de pânico). Os principais sintomas incluem irritação, sensações de
Exames de imagem de indivíduos com manifestações modera- angústia, agitação ou apreensão, aceleração mental, preocupações
das e severas de depressão apresentam alterações funcionais. No excessivas, generalizadas ou específicas, podendo haver também
LES, a ação de autoanticorpos contra estruturas e vasos do sistema reações físicas como taquicardia, aumento da sudorese, cefaleia,
nervoso central (SNC) provoca lesões anatômicas permanentes e mal-estar abdominal, tensão muscular, boca seca e insônia31.
formas de depressão refratárias ao tratamento. Nesses casos, exa- A ansiedade atinge mais de 40% dos pacientes com LES32, e
mes de ressonância magnética (RM) podem apresentar atrofias, pode manifestar-se juntamente com sintomas depressivos. Em
alterações de substância branca sugestivas de microangiopatia pacientes mais jovens, níveis aumentados de ansiedade são fator
ou desmielinização25, além de outras síndromes neurológicas. No de risco para o desenvolvimento de transtornos depressivos32.
entanto, a maior parcela dos pacientes possui flutuações do hu- Dano físico, elevadas doses de corticoides, dor física, fibromial-
mor, sem achados importantes nos exames de neuroimagem. Um gia, fadiga e escores reduzidos em questionários de qualidade de
interessante estudo com tomografia por emissão de fóton único vida foram associados a maiores níveis de ansiedade, assim como
(SPECT) em pacientes com LES e depressão demonstrou redução ativação da doença, independente da presença de depressão15.
do fluxo sanguíneo em regiões corticais frontais e temporais em Um estudo com pacientes sem TDM e sem uso de antidepressivos
relação ao grupo controle e ao grupo de pacientes sem manifesta- mostrou correlações positivas entre os títulos de TNF-α e IL-8 e os
ções psiquiátricas12. níveis de ansiedade, mas não com depressão33, sugerindo que os
Pacientes com LES sofrem impactos sociais, emocionais e de mecanismos fisiopatológicos da ansiedade e da depressão possam
qualidade de vida resultantes dos sintomas, do tratamento e das ser diversos.
restrições a que são submetidos. Alterações ocasionadas pela No período após o diagnóstico do LES, é comum observar o au-
doença, principalmente mudanças físicas, perda de capacidade mento da incidência de sintomas ansiosos, que advêm como rea-
profissional e funcional, alterações no aspecto da pele, ganho de ção adaptativa às mudanças ocasionadas pela doença34. O acesso
peso, alopecia, dor e deficiências físicas estão associados a maior a informações sobre o LES, seu tratamento e prognóstico tem um
impacto psicossocial26. Muitos pacientes relatam a sensação de fal- papel fundamental nesse período inicial, no qual o paciente preci-
ta de controle sobre a doença, seus corpos e seus projetos de vida. sa reformular projetos de vida e expectativas34. É importante que o
Nesse sentido, a presença dos sintomas depressivos pode inclusive profissional estimule o paciente a manifestar suas dúvidas sempre
intensificar a autopercepção e a valoração dos estigmas da doen- que possível, e lhe permita formular sua própria compreensão so-
ça27, induzindo a piora funcional geral. bre sua saúde e tratamento, ao invés de uma abordagem predomi-
Modelos humanos e animais demonstraram associação entre nantemente expositiva e informativa.
inflamação sistêmica e sintomas depressivos, inclusive no aumen- A utilização de questionários autorreferentes, como o inven-
to de tendências suicidas28. Ideações suicidas no LES variam de tário de ansiedade Beck29 (BAI), adaptado para o português, pode
10,5% a 34,4% e são um elemento relevante na investigação clí- ser útil na avaliação e acompanhamento dos sintomas ansiosos.
nica19. Indagar diretamente ao paciente sobre ideações suicidas é Escores superiores a 20 pontos são sugestivos de níveis moderados
uma estratégia eficiente de avaliação de risco. Cerca de 90% dos de ansiedade e indicam necessidade de tratamento psiquiátrico e
suicidas em geral apresentam alguma forma de doença psiquiátri- psicoterapêutico.
ca, incluindo TDM e distúrbios de abuso de substâncias28. Alguns
fatores de predisposição, como impulsividade, comportamento Disfunção cognitiva no LES
agressivo, diagnóstico de transtornos psiquiátricos e eventos ad-
A DC é uma das manifestações neuropsiquiátricas do LES e ocorre
versos na primeira infância também contribuem para o compor-
independente da presença de outras síndromes neurológicas. Seu
tamento suicida e devem ser investigados na anamnese. Eventos
curso é flutuante e atinge aproximadamente 80% dos pacientes
estressantes, como a perda do emprego, de um ente querido ou a
com formas leves a moderadas, enquanto casos de demência são
falta de controle sobre a doença, funcionam como possíveis gati-
raros22. Em alguns estudos, a DC foi associada à presença de anti-
lhos do comportamento suicida28. Tentativas prévias de suicídio
corpos antifosfolipídeo, depressão, uso de esteroides, diabetes e
são um fator preditor de risco, necessitando monitoramento e tra-
baixos níveis educacionais, mas raramente com a atividade sistê-
tamento psiquiátrico28.
mica da doença35.
Questionários de depressão, como o inventário de depressão
A fisiopatologia da DC no LES permanece em discussão e en-
de Beck29 (BDI), adaptado para o português, sugerem o grau da
volve diferentes processos fisiopatológicos, como vasculopatia,
sintomatologia (mínimo, leve, moderado e grave), e podem ser
produção de citocinas inflamatórias e ruptura da barreira hema-
úteis para mediar o diálogo com o paciente, assim como acompa-
toencefálica (BHE)36. Estudos sugerem que células da imunidade
nhar sua evolução. Escores acima de 20 pontos já indicam grau
adaptativa, infiltradas pelo espaço subaracnóideo, são capazes
de sofrimento moderado, e tratamentos psiquiátrico e psicológico
de atuar no funcionamento do SNC saudável e patológico, por
são indicados. O envolvimento da família ou da rede de apoio so-
meio da produção de substâncias pró-inflamatórias sintetizadas
cial também são determinantes para o sucesso do tratamento da
in loco28,37. A ação de autoanticorpos também contribui para a
depressão.
patogênese da DC no LES. Anticoagulante lúpico, anticorpos anti-
cardiolipina, anti-NMDA, inclusive contra o receptor NR2, abun-
Transtornos de ansiedade dante no hipocampo e na amígdala, foram associados com DC em
A ansiedade é uma resposta biológica normal do organismo, ca- paciente com LES1. Um estudo mostrou relação entre os títulos
racterizada por sensações de apreensão e desprazer, geralmente de anti-NR2 no líquido cefalorraquidiano (LCR) e maior atrofia
acompanhadas por sintomas autonômicos30. A exacerbação e per- hipocampal quando comparado a controles10. Atrofia cerebral,
severança da resposta ansiosa prejudicam a vida social e ocupacio- lesões de substância branca e AVC foram associados a piores de-
nal do indivíduo31. Os transtornos de ansiedade podem se manifes- sempenhos cognitivos2.

Revista Paulista de Reumatologia 31 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4


Alessi H

A DC é definida como um declínio do funcionamento mental confundidos com problemas de memória. São comuns as queixas
prévio documentado por avaliação neuropsicológica, realizada de de baixo rendimento acadêmico ou profissional, falhas na reten-
acordo com dados normativos populacionais38. O número de do- ção de informações e acontecimentos, perda frequente de objetos
mínios cognitivos alterados é um preditor de desemprego, e apro- e dificuldade de concentração em tarefas que exigem maior es-
ximadamente 40% dos pacientes abandonam o trabalho após três forço mental.
anos do diagnóstico5. A avaliação neuropsicológica utiliza testes e O processo de aquisição de novas memórias é hipocampo
tabelas de interpretação de resultados padronizados, a fim de ex- dependente e envolve três aspectos fundamentais: codificação,
plorar o funcionamento cognitivo de maneira objetiva. É um ins- armazenamento e recuperação de informações43. As alterações
trumento capaz de identificar até mesmo disfunções sutis, e pode de memória observadas nos pacientes com LES são variadas, e
ser útil para definir a extensão (focal ou multifocal) e a gravidade manifestam-se como déficits de memória episódica, semântica e
(declínio ou prejuízo) das alterações presentes38. memória de trabalho40. Indivíduos com LES apresentam desempe-
Apesar de a depressão alterar o funcionamento cognitivo, a nhos rebaixados em tarefas de memória operacional e de apren-
DC no LES não é totalmente explicada pelos sintomas depressivos. dizagem, mas costumam apresentar performance dentro dos parâ-
Um interessante estudo comparou o desempenho cognitivo de metros médios em tarefas de recordação com pistas.
indivíduos deprimidos, pacientes com LES sem depressão e com Estudos sobre preditores de DC no LES e em indivíduos idosos
depressão, e verificou falhas ainda maiores neste último grupo39. apontam para a relevância da escolaridade e da manutenção da
Pacientes com DC e RM aparentemente normal podem apresen- atividade mental no decorrer de toda a vida. Pacientes com LES
tar microlesões estruturais e alterações metabólicas de substância apresentam risco de desenvolvimento de demências aproximada-
branca, que sugerem mielopatia imunomediada subjacente, me- mente duas vezes mais elevado com relação à população geral44.
lhor identificada por espectroscopia41,49. A reserva cognitiva individual, moldada a partir de experiências
nas esferas intelectuais e emocionais, permite a alguns organis-
Avaliação dos principais domínios cognitivos no mos resistirem por mais tempo a insultos e danos cerebrais, ou
LES recuperarem-se mais prontamente45 e pode ser estimulada por
meio de ações educacionais e sociais.
O perfil da DC no LES é variado, porém apresenta envolvimento
frontal e subcortical acentuados38. A bateria neuropsicológica su-
gerida pelo ACR tem duração aproximada de uma hora e avalia os Contribuição da abordagem
seguintes domínios: atenção, memória, raciocínio abstrato, veloci- neuropsicológica para o tratamento das
dade de processamento psicomotor e funções executivas. O teste manifestações neuropsiquiátricas no LES
Montreal Cognitive Assessment (MoCA), por seu perfil executivo, é
No contexto do tratamento do paciente com LES, a abordagem
um teste de rastreio útil na identificação de alterações cognitivas
neuropsicológica oferece possibilidades de cuidado emocional,
no LES. Apresenta sensibilidade de 83% e especificidade de 73%
psiquiátrico e cognitivo, de acordo com o projeto terapêutico
na detecção de comprometimento cognitivo leve (CCL) com nota
de corte de 26 pontos42. Dificuldades na execução de atividades individual. Intervenções como a psicoterapia psicodinâmica, a
habituais, necessidade de apoio ou supervisão de terceiros para a terapia cognitivo-comportamental, treinamentos psicoeduca-
sua realização, queixas persistentes de memória e abandono das cionais, técnicas de relaxamento e meditação são práticas base-
atividades acadêmicas ou profissionais são indicativos da neces- adas em evidências para tratamento dos transtornos psiquiátri-
sidade de avaliação neuropsicológica formal, com ênfase nas fun- cos e da DC, e podem ser combinadas a fim de obter os melhores
ções executivas, no processamento de informações, na atenção e resultados.
memória. Uma metanálise com estudos randomizados sobre o efeito da
As funções executivas compreendem um complexo processa- psicoterapia em pacientes com LES mostrou redução nos níveis
mento mental, responsável por guiar a resposta adaptativa ante de ansiedade, depressão e melhora em aspectos de qualidade de
novas situações e desafios. Envolve quatro principais componen- vida, como dor, capacidade física, saúde mental, fadiga, estresse e
tes: controle voluntário; planejamento; ação voltada para um obje- atividade da doença46. As intervenções apresentaram duração mí-
tivo; e automonitoramento para o desempenho efetivo da tarefa43. nima de um mês, e incluíram métodos de terapia psicodinâmica,
Pacientes com disfunção executiva costumam apresentar dificul- terapia cognitivo-comportamental, biofeedback, aconselhamento,
dades na execução de tarefas relacionadas com o cuidado médico, treinamento de habilidades de comunicação, manejo da dor e do
como agendamento de exames e consultas em datas apropriadas, estresse. Quando associada a medicação antidepressiva, a psicote-
organização de documentos para pedidos referentes a medicação rapia promoveu o aumento da adesão e melhor resposta ao trata-
ou atestados médicos, falha na busca por soluções para viabilizar mento47, sugerindo um possível efeito top-down de regulação emo-
os tratamentos indicados, dificuldade de comparecer aos compro- cional, proporcionado pelo autoconhecimento e ressignificação de
missos no horário correto e repertório reduzido para resolução de experiências48.
problemas. Durante as consultas, podem expressar dificuldade na Técnicas de meditação apresentam potencial facilitador da
execução de tarefas que exigem diversas etapas, perda da linha neuroplasticidade e da regulação emocional, e tem sido usadas
do raciocínio durante o diálogo ou realização de uma ação, difi- como auxiliares no tratamento de diversas condições físicas e
culdade na tomada de decisões e desorganização para os aspectos mentais, incluindo transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade49,
práticos do cotidiano. fibromialgia e CCL. Os efeitos benéficos da meditação permane-
As alterações atencionais incidem sobre um ou mais proces- cem após a prática, e estão associados a níveis elevados e duráveis
sos subjacentes, como seleção de estímulos sensoriais relevantes, de bem-estar. Um estudo com programa de redução de estresse
capacidade de iniciação e inibição do comportamento atencional, baseado na técnica mindfulness de meditação, com duração de oito
sustentação da atenção, e ativação cerebral adequada para ma- semanas, observou aumento da densidade da substância cortical
nutenção do estado de vigilância43. Geralmente, distúrbios aten- em regiões envolvidas nos processos de aprendizagem, memória e
cionais manifestam-se como lapsos de informações, e podem ser regulação emocional50.

Revista Paulista de Reumatologia 32 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4


Depressão, ansiedade e disfunção cognitiva no lúpus eritematoso sistêmico: da fisiopatologia à abordagem neuropsicológica

8. Watson P, Storbeck J, Mattis P, Mackay M. Cognitive and emotional abnormalities in


A reabilitação cognitiva e o treinamento psicoeducacional
systemic lupus erythematosus: Evidence for amygdala dysfunction. Neuropsychol Rev.
englobam técnicas e estratégias que, quando incorporadas no
2012;22(3):252-70.
ambiente de treino, são generalizadas para outras situações do
9. Appenzeller S, Rondina JM, Li L, Costallat L, Cendes F. Cerebral and corpus callosum
cotidiano, resultando em melhora subjetiva e objetiva de queixas atrophy in systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2005 Sep;52(9):2783-9.
cognitivas52. Seu objetivo é remodelar e facilitar conexões sinápti- 10. Lauvsnes MB, Beyer MK, Kvaloy JT, Greve OJ, Appenzeller S, Kvivik I, et al. Association
cas desejadas. Estudos anteriores evidenciaram aumento cortical of hippocampal atrophy with cerebrospinal fluid antibodies against the NR2 subtype
de indivíduos submetidos a treinamentos de tarefas de habilida- of the n-methyl-d-aspartate receptor in patients with systemic lupus erythematosus
des específicas, como raciocínio abstrato, habilidades motoras, and patients with primary Sjögren’s syndrome. Arthritis Rheumatol. 2014 Dec;66(12):
3387-94.
treinamento aeróbico e habilidades cognitivas50. Um treinamento
11. Bódi N, Polgár A, Kiss E, Mester Á, Poór G, Kéri S. Reduced volumes of the CA1 and CA4-
psicoeducacional para pacientes com LES e queixas de memória
-dentate gyrus hippocampal subfields in systemic lupus erythematosus. Lupus. 2017
associou suporte psicossocial a técnicas e estratégias cognitivas, Mar 29;96120331770184.
para aprimorar o desempenho da memória em atividades cotidia- 12. Giovacchini G, Mosca M, Manca G, Della Porta M, Neri C, Bombardieri S, et al. Cerebral
nas51. Observou-se melhora objetiva nos escores de testes neurop- Blood Flow in Depressed Patients with Systemic Lupus Erythematosus. J Rheumatol.
sicológicos, e na metamemória, especificamente na autopercepção 2010;37(9):1844-51.
do funcionamento da memória. Segundo os autores, a metamemó- 13. Appenzeller S, Constallat LTL, Li LM, Cendes F. Magnetic resonance spectrocopy in the
ria possui fortes interações entre a confiança em suas habilidades evaluation of central nervous system manifestations in systemic lupus erythematosus.
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Apesar dos importantes impactos sociais, emocionais e de quali- vere anxiety rather than depressive symptoms in patients with systemic lupus erythe-
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alterações cognitivas e acompanhar o efeito dos tratamentos ad- 22. Postal M, Lapa AT, Sinicato NA, de Oliveira Peliçari K, Peres FA, Costallat LTL, et al. De-
ministrados pela equipe multidisciplinar. pressive symptoms are associated with tumor necrosis factor alpha in systemic lupus
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Revista Paulista de Reumatologia 34 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4


Artigo

Causas de mortalidade no LES e estratégias


de prevenção
Emilia Inoue Sato 1

Introdução sexo e idade. Não foi observada diferença significativa na SMR


O tratamento do lúpus eritematoso sistêmico (LES) tem melhorado para o sexo feminino e masculino4.
nas últimas décadas, mas a taxa de mortalidade de pacientes com Em metanálise mais recente, Lee YH et al. incluíram estudos
LES continua sendo maior que a observada na população geral. realizados até 2014, observando taxa de mortalidade em geral de
As causas de morte podem ser diretamente associadas à atividade 2,66 (95% IC 2,09-3,39) em pacientes com LES comparada à popu-
da doença, às intercorrências infecciosas ou a comorbidades fre- lação geral, não havendo diferença significativa entre homens e
quentemente encontradas nesses pacientes. Fatores étnicos, socio- mulheres e entre população caucasiana e oriental. Consideran-
econômicos, ambientais, culturais e o acesso ao tratamento podem do as taxas de mortalidade padronizada para causas específicas,
influenciar na frequência das comorbidades, do dano aos órgãos foram encontradas SMR de 4,98 (95% IC 3,87-6,39) para infecção;
e no prognóstico de vida, sendo, portanto, importante considerar 4,68 (95% IC 2,35-9,33) para doença renal e 2,25 (95% IC 1,30-
esses fatores na análise dos diferentes estudos. 3,89) para doença cardiovascular (DCV), não sendo observado
aumento para câncer em geral quando comparado com a popu-
lação geral5. Mas em nenhuma das metanálises foram incluídos
Taxa de sobrevida
estudos avaliando a mortalidade em países latino-americanos;
A sobrevida em 5 anos de pacientes com lúpus, que era de cerca
portanto, não podemos dizer que esta seja a realidade em países
de 50% na década de 1950, atualmente está torno de 95%, em
em desenvolvimento.
centros de referência em países desenvolvidos1. Nos EUA, a so-
Nos países desenvolvidos tem sido observada uma redução
brevida de 10 anos, nos anos 1975 a 1990 era de 64% a 87% e a
significativa das taxas de mortalidade por LES em geral, com que-
sobrevida de 20 anos, nos anos de 1990 a 2004, foi de 78%2. Parte
da acentuada da SMR específica para causas infecciosas e renal, o
da melhora observada em nações desenvolvidas reflete simples-
que não tem sido observado na mortalidade por doenças do siste-
mente a melhora das condições de saúde e da sobrevida. Entre
ma circulatório6.
1965 e 2005, houve redução da taxa de mortalidade de, pelo me-
Em estudo realizado por nosso grupo, avaliando todos os
nos, 70% na população geral1. Outro fator que pode influenciar
atestados de óbito do Estado de São Paulo em que o LES consta-
esses resultados é a inclusão de casos de menor gravidade de LES
va como causa básica de morte (n = 2.601), no período de 1985 a
nas coortes mais recentes, considerando-se que vários autoanti-
2004, a média de idade por ocasião do óbito foi de 35,3±15 anos,
corpos foram identificados mais recentemente, além da melhora
enquanto para a população geral foi de 57±24,3 anos, para o mes-
no tratamento de comorbidades como hipertensão arterial, in-
mo período. A média de idade de morte por LES no Estado de
fecções e insuficiência renal3.
São Paulo foi inferior à referida em estudos realizados em países
desenvolvidos.
Taxa de mortalidade padronizada (SMR) A análise da taxa de mortalidade dividindo os anos do estudo
A taxa de mortalidade padronizada compara a mortalidade de pa- em dois subperíodos não mostrou tendência de queda na mortali-
cientes com determinada doença com a observada na população dade por LES ao longo desse período. Observamos também que a
geral da mesma idade, sexo e ano do calendário; ela é a melhor taxa de mortalidade foi mais baixa para os indivíduos que tinham
maneira de se avaliar a mortalidade de pacientes com LES. A SMR mais anos de escolaridade7. Entretanto, como em nosso meio o ní-
tem sido utilizada para avaliar se a mortalidade em pacientes com vel de escolaridade tem associação com raça/etnia e perfil socio-
LES tem diminuído ao longo do tempo, comparada com a popula- econômico8, não foi possível avaliar se esse dado não foi afetado
ção geral. Estudos têm mostrado redução da SMR ao longo das últi- por outras variáveis que poderiam ter efeito confundidor.
mas décadas, mas ainda assim continua sendo significativamente Em estudo realizado no Estado de Washington, em pacientes
maior do que a observada na população geral3. hospitalizados, entre 2003 e 2011, Gross LB et al. encontraram
Uma metanálise realizada por Yurkovich M., incluindo 12 estu- 18.905 internações de pacientes com LES, com média de idade de
dos com 27.210 pacientes e ocorrência de 4.989 óbitos em pacien- 51 anos, 88,6% do sexo feminino. Embora o tempo de permanência
tes com LES, mostrou que eles tinham taxa de mortalidade 2,98 de internação não tenha sofrido modificação significativa, foi ob-
(IC95% 2,32-3,83) vezes maior que a população geral com mesmo servada redução da mortalidade de 3,12% em 2003 para 1,28% em

1. Professora titular de Reumatologia na Escola Paulista de Medicina da A autora não contou com apoio financeiro.
Universidade Federal de São Paulo. A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
E-mail para contato: eisato@unifesp.br. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
Como citar este artigo: Sato EI. Causas de mortalidade no LES e nos produtos e empresas descritos neste artigo.
estratégias de prevenção. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):35-7.

Revista Paulista de Reumatologia 35 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):35-7


Sato EI

2011 (p = 0,001) nesses pacientes. Neste estudo foi observada maior Insuficiência renal e infecções foram as causas mais frequen-
mortalidade entre os homens do que entre as mulheres (2,6% vs. tes de óbitos em coorte de pacientes latino-americanos com LES12.
1,8%) e a raça negra teve 2,8 vezes mais internação por LES do que Em estudo de perfil de mortalidade em pacientes com LES na
a branca, quando comparada com a população de Washington9. França, no período de 2000 a 2009, usando causas múltiplas de
Nível de escolaridade baixo foi associado a maior taxa de morte, foram analisados 1.593 certificados de óbitos relacionados
mortalidade em poucos estudos que avaliaram essa variável10-12. ao LES. A média de idade por ocasião de óbito foi de 63,5±18,4
No estudo de Studenski et al., baixo nível de escolaridade e raça anos. Nos certificados em que o LES foi considerado causa bási-
não caucasiana contribuíram de forma independente para maior ca de morte, as causas não básicas foram: DCV (49,5%), infecção
mortalidade13. (24,5%) e falência renal (23,2%). A mortalidade associada a DCV
e doenças renais foi maior em óbitos com idade menor que 40
Causas de óbito anos, enquanto a mortalidade associada às doenças infecciosas foi
maior em indivíduos com maior idade. A razão O/E foi maior que 1
Estudos da década de 1960 realizados nos EUA referiam que cerca
para doenças infecciosas 2,96 (95% IC 2,41-3,61), DCV 1,58 (95% IC
de 36% dos pacientes evoluíam com insuficiência renal terminal,
1,42-1,76) e doenças renais 3,29 (95% IC 2,21-4,73) quando compa-
sendo a principal causa de óbito. Estudos da última década, reali-
rada aos óbitos da população geral. Óbitos relacionados ao câncer
zados em países desenvolvidos, mostram que atividade da doença
foram menos observados que na população geral [razão O/E = 0,87
é a causa de óbito em cerca de 25% dos pacientes. Infecção, que
(95% IC 0,59-1,23)]15.
era a causa de morte mais importante na era pré-antibiótico, con-
No Brasil, encontramos média de idade por ocasião da mor-
tinua sendo um grave problema mesmo nos dias atuais. O uso de
te muito mais jovem do que a observada na França (35,8 vs. 63,5
imunossupressores mais potentes tende a aumentar o risco de in-
anos). No Brasil, doenças infecciosas e doença renal foram as cau-
fecções e frequentemente infecção e atividade de doença podem
sas mais associadas à morte, enquanto a DCV foi a principal causa
coexistir, contribuindo para o óbito1.
de morte associado ao lúpus na França14,15.
Conquanto a mortalidade por doenças cardiovasculares
Em estudo de 179 pacientes com LES em hospital universitário
(DCV)seja muito frequente em pacientes com LES em países
no Brasil, com seguimento médio de 3,3 anos, ocorreram 13 óbitos,
desenvolvidos, não há muitos estudos em países em desenvol-
sendo 5 por infecção e 5 por insuficiência renal, 1 por atividade
vimento. Estudo multicêntrico mostrou que a mortalidade por
do LES, 1 por causa indefinida e apenas 1 por DCV. As principais
DCV não tem reduzido significativamente em pacientes com LES,
causas de óbito foram infecção e insuficiência renal. Em análise
como o esperado, provavelmente refletindo a complexidade da
de regressão multivariável, o uso de ciclofosfamida, a síndrome
DCV nesses pacientes. Fatores de risco tradicionalmente associa-
antifosfolípide secundária e maiores escores de dano no início do
dos ao risco de DCV, como hipertensão arterial e dislipidemia, e
estudo foram associados ao óbito16.
outros fatores associados ao lúpus como o uso crônico de esteroi-
des, a duração e a gravidade da doença parecem contribuir para
o maior risco de DCV1. Estratégias de prevenção da mortalidade
Estudos da mortalidade analisando causas múltiplas de óbito Considerando que em nosso meio a atividade da doença, princi-
permitem avaliar melhor a influência de todas as causas e fatores palmente a renal e as doenças infecciosas como a septicemia e a
circunstanciais que contribuem para o óbito, sendo importantes pneumonia, são as causas mais frequentemente associadas à mor-
principalmente em doenças crônicas, pois podem fornecer subsí- te em pacientes com LES, as estratégias de prevenção devem ser
dios para medidas que possam prevenir esse desfecho. dirigidas ao melhor controle da atividade da doença e à prevenção
O primeiro estudo avaliando causas múltiplas de morte no LES e o tratamento adequado de infecções. O uso judicioso de imunos-
foi realizado por nosso grupo, analisando os atestados de óbito do supressores e a redução de corticoesteroides para a menor dose,
Estado de São Paulo no período de 1985 a 2007, com 4.815 ates- ou, se possível, a sua retirada, devem ser sempre considerados no
tados em que constava LES como causa básica ou não básica de tratamento a longo prazo.
óbito. A média de idade por ocasião do óbito foi de 35,8±15,1 anos, O diagnóstico e o tratamento da nefrite lúpica deve ser preco-
sem diferença significativa entre os sexos. Foi observado aumento ce, seguindo as orientações da Sociedade Brasileira de Reumato-
significativo da média de idade nos últimos 5 anos do estudo em logia para o manejo da nefrite lúpica. O tratamento de indução é
relação aos primeiros 5 anos, mas, a idade média de óbito conti- feito com solumedrol 1 g intravenoso por 3 dias, associado a um
nua bem menor do que a descrita em países desenvolvidos. Infec- imunossupressor (ciclofosfamida IV ou micofenolato de mofetila
ção e insuficiência renal foram as causas mais relatadas em todos ou sódico) e prednisona por via oral, com redução para a menor
os atestados de óbitos. A insuficiência renal e a septicemia foram dose possível em seis meses. Tem o objetivo de reduzir rapida-
reportados em 5,59 e 4,48 vezes, respectivamente, mais frequente- mente o processo inflamatório renal, com redução da proteinú-
mente nos óbitos de pacientes com LES do que na população geral ria, normalização do sedimento renal e manutenção dos níveis
(O/E). O/E foi menor que 1 para os óbitos por câncer em geral. Em- de creatinina (ou seu retorno à normalidade). A terapia de ma-
bora a tuberculose não tenha sido frequentemente relatada, sua nutenção deve ser feita com imunossupressores (azatioprina ou
ocorrência foi 4,86 vezes mais frequente em óbitos com LES do micofenolato de mofetila) e em mínima dose, ou, se possível, sem
que nos óbitos da população geral14. corticoesteroides. Os imunossupressores devem ser mantidos
Com relação às DCVs, observamos razão O/E menor que 1 por cerca de 3 anos, para se evitar recidiva da nefrite. A falta de
quando analisamos os óbitos em todas as faixas etárias. Entretan- resposta ao tratamento está associada ao pior prognóstico renal
to, quando analisamos os óbitos ocorridos antes dos 50 anos de e à maior chance de evoluir com dano renal, que por sua vez está
idade, encontramos razão O/E de 4,75 (95% IC 4,24-5,31) para DCV, associada à maior chance de óbito17.
sendo 3,35 (IC 95% 2.61-4.23) para doenças cerebrovasculares e de Por outro lado, o uso de imunossupressores mais potentes, so-
2,20 (1.57-3.01) para infarto agudo do miocárdio14. bretudo em nosso meio, onde as condições ambientais são inade-

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Causas de mortalidade no LES e estratégias de prevenção

quadas, com baixo nível socioeconômico e dificuldade de acesso possível, associado a imunossupressores, é a arte que deve exercer o
ao tratamento e acompanhamento médico, aumenta o risco de in- reumatologista que trata de pacientes com LES. Controlar as comor-
fecções. Atender às recomendações de vacinação em imunossupri- bidades também é muito importante e, para isso, o reumatologista
midos e a adequada antibioticoterapia em pacientes com infeção deve ser um bom clínico.
podem melhorar esse cenário tão desfavorável para os pacientes
com LES no Brasil. Referências
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Os óbitos por DCV em pacientes com LES não são frequentes
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como em países desenvolvidos, mas em pacientes abaixo dos 50
4. Yurkovich M, Vostretsova K, Chen WA, Zubieta JAA. Overall and cause-specific morta-
anos de idade, a taxa de mortalidade por DCV é significativamente lity in patients with systemic lupus erythematosus: a meta-analysis of observational
maior que a da população geral14. Desse modo, há necessidade de studies. Arthritis Care Res. 2014;66(4):608-16.
tratarmos adequada e rigorosamente os fatores de risco modifi- 5. Lee YH, Choi SJ, Di JD, Song GG. Overall and cause-specific mortality in systemic lupus
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tórios19, um estudo realizado em Taiwan mostrou que pacientes em 9. Gross LB, Ortiz JR, Okamura DM, Hayward K, Goss CH. Significant reductions in mor-
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aos pacientes que nunca usaram estatinas20. Na falta de respostas PMID: 26087254.
às medidas não medicamentosas, recomenda-se o uso de estatinas 10. Hersh AO, Trupin L, Yazdany J, Panopalis P, Julian L, Katz P, et al. Childhood-onset dise-
para manter níveis de LDL abaixo de 100 mg/dL nas pacientes com ase as a predictor of mortality in an adult cohort of patients with systemic lupus erythe-
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ciência renal são as causas mais frequentes, e, embora as DCVs não can inception cohort. Arthritis Rheum. 2010;62(3):855-62.
sejam muito frequentes, em óbitos abaixo dos 50 anos, o risco de 19. Tselios K, Koumaras C, Gladman DD, Urowitz MB. Dyslipidemia in systemic lupus
erythematosus: just another comorbidity? Semin Arthritis Rheum. 2016;45:604-6.
morte por DCV é significativamente maior do que na população ge-
20. Yu HH, Chen PC, Yang YH, Wang LC, Lee JH, Lin YT, et al. Statin reduces mortality and
ral, em nosso meio. Tratar adequadamente a atividade da doença,
morbidity in systemic lupus erythematosus patients with hyperlipidemia: A nationwide
sobretudo a nefrite, para reduzir o risco de evolução para insuficiên- population-based cohort study. Atherosclerosis. 2015;243:11-8.
cia renal, ao mesmo tempo em que se deve tratar as infecções in- 21. Soubrier M, Mathieu S, Hermet M, Makarawiez C, Bruckert E. Do all lupus patients
tercorrentes, com judicioso uso de corticoesteroides na menor dose need statin? Joint Bone Spine 2013;80:244-9.

Revista Paulista de Reumatologia 37 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):35-7


Artigo

Lúpus eritematoso sistêmico, da bancada


ao consultório: opinião do especialista,
desafios e perspectivas
Luiz Carlos Latorre 1

O lúpus eritematoso sistêmico (LES), por ser uma das mais acompanhamento psicológico. Muitas vezes essas alterações,
desafiadoras doenças da clínica médica, faz com que o reumato- mesmo não sendo permanentes, são fontes de depressão. Não
logista necessite sempre estar atualizado com relação aos cons- raro ocorre rompimento de relacionamentos afetivos por fal-
tantes avanços no conhecimento de sua etiopatogenia, diag- ta de informação. Esse fato é muito comum e deve sempre ser
nóstico e tratamento. Poucos especialistas não reumatologistas lembrado.
arriscam-se a seguir o paciente com a doença. Detalhes técnicos Ainda, na linha do acompanhamento multidisciplinar, o
e experiência clínica são fundamentais e levam, cada vez mais, reumatologista não deve retardar o apoio de outras especialida-
a um melhor controle da doença, com consequente melhora da des, quando detalhes no diagnóstico e conduta assim se façam
sobrevida e da qualidade de vida. necessários. Essas trocas de informações são extremamente
O tratamento vai muito além da prescrição de medicamen- úteis no tratamento.
tos, por mais atuais e com boa base em evidências. Uma melhor compreensão de sua etiopatogenia, modernas
No acompanhamento ambulatorial, a relação médico-pa- técnicas de diagnóstico e atualização constante em seu trata-
ciente é fundamental, desde o esclarecimento sobre a doença mento são desafios que devem ser enfrentados.
até as várias opções de tratamento, muitas delas a serem toma- Com relação ao tratamento, embora cada vez mais eficien-
das em decisão compartilhada. Esclarecer o paciente sobre a temente controlamos a doença, ainda estamos longe do ideal.
doença, prestar apoio psicológico adequado e assegurar boas O LES se comporta de modo não uniforme entre os pacientes,
perspectivas em seu controle são fundamentais para a aderên- de acordo com várias condições genotípicas e fenotípicas (sexo,
cia e sucesso no tratamento. raça, idade, órgão acometido, autoanticorpos, tipo de lesão his-
O paciente necessita e tem o direito de encontrar o médico tológica, etc.). A escolha medicamentosa ainda se apoia nas con-
ou a equipe, de modo fácil e rápido. Esse detalhe dá segurança dições fenotípicas. Escolhemos as opções terapêuticas baseados
ao doente, levando a um melhor controle de exacerbações ini- na experiência clínica e nas alterações fenotípicas acima cita-
ciais. Claro que isso é alcançado mais facilmente na medicina das. Estudos de farmacogenética poderão identificar melhor
privada do que no serviço público. Esse ponto favorece um me- qual o perfil genético do paciente que responderá melhor a uma
lhor controle na primeira condição. Centros de excelência em ou outra medicação, enquanto não identificamos os desenca-
assistência e ensino têm a obrigação de igualar essas condições deantes etiológicos e determinantes genéticos precisos.
e, efetivamente, o estão fazendo. Na década de 1980, o Dr. Alfred Steinberg, então importante
O apoio psicológico ao paciente é fundamental. Compar- reumatologista do Instituto Nacional de Saúde Americano, dizia
tilhar esse apoio com a ajuda de profissionais nessa área é que, embora soubesse tratar o LES tão bem quanto qualquer
mandatório. Nas condições comuns de jovens que apresentam, outro especialista, ainda não tinha certeza qual o tratamento
devido à doença ou a seu tratamento, lesões visíveis em áreas ideal. Acho que ainda estamos nessa fase.
como a face e, com o tempo, podem apresentar inúmeras le- No entanto, com certeza, constantemente caminhamos fir-
sões, muitas delas cicatriciais, há a necessidade de constante mes ao encontro desse tratamento ideal.

1. Membro da Comissão de LES da Sociedade Brasileira O autor não contou com apoio financeiro.
de Reumatologia. Reumatologista desde 1982. O autor declara não ter interesses associativos, comerciais,
E-mail para contato: latorrel@terra.com.br. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
Como citar este artigo: Latorre LC. Lúpus eritematoso sistêmico, nos produtos e empresas descritos neste artigo.
da bancada ao consultório: opinião do especialista, desafios e
perspectivas. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):38.

Revista Paulista de Reumatologia 38 Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):38


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PAULISTA DE
REUMATOLOGIA

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