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Revista
Volume 16
Número 2
Abril/Junho 2017
de Reumatologia
ISSN 1809-4635
conselho editorial
Edgard Torres dos Reis Neto
Samuel Katsuyuki Shinjo
Sandra Hiroko Watanabe www.reumatologiasp.org.br
Fórum de Debates 2017
em Reumatologia
Sempre às terças-feiras, às 20 horas
Local: Associação Médica Brasileira – Auditório Nobre “Prof. Dr. Adib Jatene”
– Rua São Carlos do Pinhal, 324 – Bela Vista (próximo ao Maksoud Plaza
Hotel) – São Paulo – SP.
Próximos encontros:
Participe e incentive a participação
de seus colegas reumatologistas. • 1o de agosto – usp/sp
Após os debates, você é nosso • 5 de setembro – usp/
convidado para degustar um ótimo ribeirão preto
jantar no restaurante do hotel.
• 3 de outubro – unisa
Paulista
Revista
de Reumatologia
Órgão Oficial da Sociedade Paulista de Reumatologia
Conselho Editorial
Edgard Torres dos Reis Neto, Samuel Katsuyuki Shinjo, Sandra Hiroko Watanabe
Editores Associados
Eduardo Ferreira Borba Neto, Dawton Y. Torigoe
Editorial
5 Lúpus eritematoso sistêmico
Eduardo Ferreira Borba Neto
Edgard Torres dos Reis Neto
Samuel Katsuyuki Shinjo
Sandra Hiroko Watanabe
Artigos
6 Autoanticorpos no LES: da patogenia a sua importância na prática clínica
Sandra Gofinet Pasoto
Eloisa Silva Dutra de Oliveira Bonfá
1. Médica assistente, doutora. Disciplina de Reumatologia e Laboratório Como citar este artigo: Pasoto SG, Bonfá ESDO. Autoanticorpos
de Diagnóstico de Autoimunidade (Divisão de Laboratório Central – no les: da patogenia a sua importância na prática clínica.
DLC e Laboratório de Investigação Médica – LIM17). Hospital Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):6-13.
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. As autoras não contaram com apoio financeiro.
2. Professora titular da disciplina de Reumatologia. Coordenadora As autoras declaram não ter interesses associativos, comerciais,
do Laboratório de Investigação Médica – LIM17. Hospital das Clínicas de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. nos produtos e empresas descritos neste artigo.
E-mails para contato: sandra.pasoto@hc.fm.usp.br/
eloisa.bonfa@hc.fm.usp.br.
e 10-15% desses pacientes, respectivamente, e estão associados é o anticorpo anti-Ro/SS-A, que não é específico do LES e ocorre em
com a fotossensibilidade, com o lúpus cutâneo subagudo, com o lú- cerca de 30-40% desses pacientes. Esse anticorpo é marcador da
pus neonatal e com a síndrome de Sjögren secundária ao LES. Há síndrome do lúpus neonatal, atribuída à transferência passiva da
ainda outros anticorpos mais raros, como o anti-proliferating cell IgG materna para o feto, a qual apresenta uma associação tempo-
nuclear antigen (anti-PCNA), presente em torno de 5% dos casos de ral bem definida com as manifestações cutâneas e cardíacas dessa
LES e cuja utilidade clínica é ainda pouco conhecida2,5,6. síndrome. De fato, o bloqueio cardíaco ocorre a partir da 20ª sema-
No presente artigo, faremos uma revisão sobre a importân- na de gestação, justamente quando se inicia a passagem transpla-
cia dos autoanticorpos na patogênese da doença e como biomar- centária da IgG materna para o feto13. Demonstramos em modelo
cadores de diagnóstico, de atividade clínica e de prognóstico. As experimental que a perfusão do anticorpo anti-Ro/SS-A é capaz de
metodologias mais adequadas para sua detecção serão também induzir bloqueio cardíaco de 3º grau em coração isolado de coelho
discutidas, principalmente quanto aos aspectos relevantes para a e esse efeito não ocorreu com a injeção de IgG normal ou de outra
interpretação dos resultados e o conhecimento sobre as limitações
especificidade14. Evidenciamos ainda que esse anticorpo foi capaz
de cada método.
de inibir o influxo de cálcio em miócitos isolados de coelho subme-
tidos ao patch-clamp15. Esses achados corroboram com a hipótese
Papel patogênico dos autoanticorpos no LES de que o anticorpo anti-Ro/SS-A é capaz de causar um distúrbio no
O número de autoanticorpos com evidências bem documentadas sistema de condução cardíaco, sugerindo assim um possível meca-
de seu possível papel patogênico no LES é bastante limitado. A nismo capaz de induzir o bloqueio cardíaco congênito.
comprovação da patogenicidade é difícil e requer a demonstra- O segundo anticorpo que abordaremos é o anti-proteína P
ção de associação clínica, reprodução em modelos experimentais ribossomal, o qual é específico para o LES e suas concentrações
e demonstração do mecanismo patogênico7. Esses critérios foram séricas apresentam flutuações relacionadas com os episódios de
preenchidos por um número bastante limitado de autoanticorpos, psicose decorrentes dessa doença17. Quanto ao possível papel pa-
os quais são apresentados na Tabela 1 (juntamente com os respec- togênico do anti-P no lúpus neuropsiquiátrico, existem evidências
tivos mecanismos propostos)8-23. in vitro e in vivo. Inicialmente, foi relatado que a membrana celu-
Abordaremos, como exemplo, dois desses anticorpos que fo- lar do neuroblastoma humano contém uma proteína reconhecida
ram extensivamente estudados por nosso grupo. O primeiro deles pelo anticorpo anti-P18. Posteriormente, foi demonstrado que esse
Tabela 1 Autoanticorpos com evidências mais consistentes de seu papel patogênico no LES.
anticorpo se liga a uma proteína da membrana celular dos neurô- ocorre principalmente nos neutrófilos)10. No processo de apoptose,
nios, denominada neuronal surface P antigen, levando a alterações o DNA é liberado para o extracelular nos corpos apoptóticos, mi-
no influxo de cálcio celular e apoptose em culturas celulares19. cropartículas e também como free low-molecular-weight DNA (em
Além disso, o anticorpo anti-P humano purificado, quando injeta- decorrência de ser clivado pela ação das DNases). A necrose leva
do nos ventrículos cerebrais de camundongos, reproduziu um dis- principalmente à liberação de free high-molecular-weight DNA e,
túrbio olfativo análogo à depressão20. Mais recentemente, foram na NETose, o DNA secretado está acoplado aos neutrophil extra-
descritas alterações no eletro-oscilograma no hipocampo após a cellular traps (NET)10,26. Essa variedade de moléculas de DNA auto-
injeção do anticorpo anti-P humano purificado nos ventrículos ce- antigênicas certamente gera dificuldades em se estabelecer qual o
rebrais de ratos21. Apesar dessas evidências bastante sólidas, nem melhor substrato antigênico a ser utilizado nos ensaios para detec-
todos os pacientes com esses anticorpos apresentam as manifes- ção dos anticorpos anti-dsDNA.
tações clínicas relacionadas, sugerindo que talvez seja necessária Além disso, diferentes ensaios têm sido empregados para a
uma segunda condição (second hit), para que o distúrbio induzido detecção desse anticorpo, tais como imunodifusão, fixação do
pelo anticorpo possa ocorrer. complemento, ensaio Farr (imunoprecipitação com DNA marca-
do com radioisótopo como antígeno e solução saturada de sulfato
de amônia), imunoprecipitação com PEG (imunoprecipitação com
Relevância dos autoanticorpos
DNA marcado com radioisótopo como antígeno e polietileno glicol
para o diagnóstico do LES – PEG), IFI com C. luciliae, Elisa e ensaio multiplex26. Esses ensaios
Os autoanticorpos são muito úteis para o diagnóstico do LES e po- diferem quanto à natureza do substrato de DNA, como antígenos
dem preceder a doença em anos. O trabalho clássico de Arbuckle purificados de diferentes fontes (mamíferos, bactérias, protozo-
et al. (2003) demonstrou que 50% dos pacientes eram anti-dsDNA ários) e oligonucleotídeos sintéticos de dupla hélice. Tais dife-
positivo dois anos antes da primeira manifestação do LES24. E esse renças podem ocasionar resultados discrepantes. Por exemplo, o
padrão de preceder a doença em anos ocorreu também para ou- DNA do protozoário C. luciliae tem uma estrutura conformacional
tras especificidades de anticorpos observadas no LES. Ressalta-se, similar à do DNA nucleossomal, o que pode permitir a detecção
no entanto, que a presença do autoanticorpo isoladamente (ou de um determinado subgrupo dos anticorpos anti-dsDNA. Por
seja, sem manifestações clínicas) não é suficiente para o diagnósti- outro lado, o DNA purificado de fontes animais, diferentemente
co. Por outro lado, o achado do anticorpo específico indica a neces- dos oligonucleotídeos sintéticos, pode apresentar graus variáveis
sidade de uma vigilância mais próxima do paciente para um possí- de ligação com proteínas nucleares, particularmente as histonas.
vel diagnóstico precoce. Os anticorpos marcadores de doença, isto Além disso, existem diferenças entre os vários métodos quanto
é, aqueles que são praticamente restritos a uma patologia, apre- às condições da ligação antígeno-anticorpo, como, por exemplo,
sentam maior utilidade para o seu diagnóstico. Estão incluídos a concentração salina26. No momento, não existe um ensaio “pa-
nessa lista para o LES os anticorpos anti-dsDNA, antinucleossomo, drão-ouro” bem estabelecido. Para alguns pesquisadores, o en-
anti-Sm e antiproteína P ribossomal (lembrando que esse foi re- saio Farr estaria nessa posição, por detectar somente anticorpos
centemente relatado na hepatite autoimune)25. Esses anticorpos, de alta afinidade devido à concentração salina elevada (solução
no entanto, tem uma frequência variável na doença e, dessa for- de sulfato de amônia saturada) e ser um método quantitativo26,27.
ma, sua ausência não exclui o diagnóstico. É importante ressaltar O Elisa, comparado ao ensaio Farr, apresenta maior sensibilida-
que, para o diagnóstico, é necessário que o teste seja altamente de, por detectar anticorpos de alta e baixa afinidade; contudo,
específico, mesmo que a sensibilidade seja prejudicada, confor- sua especificidade é menor26,27.
me ilustrado na Tabela 2. Isso é particularmente relevante para o O ACR Ad Hoc Committee on Immunological Testing Guidelines,
anticorpo anti-dsDNA, pois o método de ensaio imunoenzimático através de extensa revisão da literatura, concluiu que os três mé-
(ELISA) perde muito em especificidade e deve ser confirmado pelo todos mais comumente empregados (ensaio Farr, Elisa e IFI com
método complementar de IFI utilizando o hemoflagelado Crithidia C. luciliae) apresentam boa correlação quando foram aplicados
luciliae como substrato antigênico26. em populações de pacientes, mas houve diferenças significativas
quando essas técnicas foram aplicadas a pacientes individuais. A
recomendação desse Comitê é que o anticorpo anti-dsDNA é útil
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice para o suporte diagnóstico do LES em um cenário clínico sugestivo
O anticorpo anti-dsDNA foi descrito pela primeira vez em 1957, dessa doença28.
quando foi detectado nos soros de pacientes com LES e, posterior- Posteriormente, o teste de Elisa foi recomendado como um tes-
mente, foi também encontrado na forma de imunecomplexos depo- te de screening para a detecção do anticorpo anti-dsDNA em gran-
sitados nos tecidos renais de pacientes com glomerulonefrite lúpica, des rotinas laboratoriais, seguido pelo teste complementar mais
sugerindo um papel patogênico nessa condição clínica (Tabela 1)7-11. específico de IFI com C. luciliae29.
O anticorpo anti-dsDNA é considerado um marcador sorológico do Os novos critérios de classificação do LES (Systemic Lupus In-
LES, já que é raramente detectado nos soros de indivíduos com ou- ternational Collaborating Clinics Classification Criteria for Systemic
tras doenças autoimunes, enquanto 40-70% dos pacientes com LES Lupus Erythematosus – SLICC, 2012) colocam como um item a pre-
são positivos para essa reatividade5-6. Caracteristicamente, essa rea- sença do anticorpo anti-dsDNA4. Contudo, os tipos de imunoensaio
tividade produz o padrão de IFI nuclear homogêneo no teste de FAN recomendados não são especificados. Há apenas a observação de
com células HEp-2, como ilustrado na Tabela 2. que, no caso do Elisa, o valor seja duas vezes acima ao da refe-
No núcleo das células, a molécula de DNA encontra-se ligada rência do laboratório4. Nesse aspecto, um artigo recente comparou
a várias proteínas, particularmente às histonas, formando as uni- quatro diferentes métodos para a detecção do anti-dsDNA: ensaio
dades estruturais conhecidas como nucleossomos (molécula de multiplex, imunoensaio fluoroenzimático (EliA), IFI com C. luciliae
DNA acoplada a um octâmero de histonas). O DNA e os nucleosso- e line blot30. Foi demonstrado que a especificidade desses ensaios
mos podem ser liberados das células, tornando-se acessíveis às cé- foi equivalente à da IFI com C. luciliae somente após o ajuste dos
lulas do sistema imune, como consequência de diversos mecanis- respectivos cut-offs para duas vezes acima ao valor de referência
mos de morte celular, como a apoptose, a necrose e a NETose (que do laboratório30.
Atividade geral
Anti-dsDNA 40-70% Sim Sim Nefrite ↓ Sobrevida renal
Atividade renal
IFI com C. luciliae
Farr, ELISA
Atividade geral
Sim LES neuropsiquiátrico
Anti-P 13-40% Sim Atividade do SNC ↑ Sobrevida renal Wb, ELISA
(sem o anti-dsDNA)
LES juvenil GN membranosa
9
Atividade renal?
30-40% Sim Fotossensibilidade
Autoanticorpos no les: da patogenia a sua importância na prática clínica
LE cutâneo subagudo
Anti-Ro/SS-A LE cutâneo subagudo: 70-80% Não LE cutâneo subagudo Leuco/linfo/plaquetopenia Não — ID, CIE, ELISA, Wb
Púrpura palpável
LE neonatal: 90% LE neonatal Síndrome de Sjögren
10-15% Sim
LE cutâneo subagudo
Anti-La/SS-B LE subagudo: 30% Não LE cutâneo subagudo Não — ID, CIE, ELISA, Wb
Síndrome de Sjögren
LE neonatal: 90% LE neonatal
Antifosfolípides — 30-40% Não Sim Manifestações da SAF Não — ELISA
Atividade geral
Anti-C1q — 17-46% Não Não Nefrite ↓ Sobrevida renal ELISA
(com o anti-dsDNA)
Atividade renal
Anti-NMDA — 14-35% Não Não LES neuropsiquiátrico Atividade do SNC — ELISA
LES = lúpus eritematoso sistêmico; LE = lúpus eritematoso; GN = glomerulonefrite. Anti-dsDNA = anticorpo anti-DNA de dupla hélice; aNu = anticorpo antinucleossomo; anti-P = anticorpo antiproteína P ribossomal; anti-NMDA = glutamate
receptor antibodies (anti-receptor N-metil-D-aspartato). IFI = imunofluorescência indireta; Farr = imunoprecipitação com DNA marcado com radioisótopo como antígeno; ELISA = ensaio imunoenzimático; ID = imunodifusão dupla; CIE =
Anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B Além disso, esses anticorpos estão presentes nos soros de
Os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B estão presentes prin- 30% a 40% dos pacientes com LES, fazendo parte dos critérios
cipalmente nos soros dos pacientes com síndrome de Sjögren de classificação dessa doença3,4 e cerca de um terço desses pa-
primária, mas também podem ser detectados naqueles com LES, cientes desenvolve manifestações clínicas da SAF6. Contudo, deve
esclerose sistêmica, poli/dermatomiosite, doença mista do teci- ser lembrado que esses anticorpos não são específicos – a eleva-
do conectivo, artrite reumatoide e cirrose biliar primária. No ção transitória de suas concentrações séricas pode ocorrer em
LES, são encontrados em cerca de 30-40% e 10-15% dos casos, várias condições clínicas, tais como esclerose sistêmica, artrite
respectivamente, e uma de suas principais utilidades clínicas é reumatoide, doenças infecciosas (como sífilis, infecção pelo HIV,
o apoio ao diagnóstico, principalmente quando autoanticorpos tuberculose), uso de alguns fármacos (clorpromazina, procaina-
específicos dessa doença (anti-DNA de dupla hélice, antinucle- mida, hidralazina, propiltiouracil) e até em indivíduos saudáveis
ossomo, anti-Sm e anti-P) estão ausentes. Lembramos ainda que (2-5%)6. Desse modo, para a classificação da síndrome antifosfolí-
os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B não são associados à pide, são necessários a ocorrência do evento clínico além da pre-
atividade do LES5, 6. sença persistente desses anticorpos em níveis moderados a altos
Os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B são ainda muito úteis em, pelo menos, duas ocasiões separadas por um intervalo de,
para o diagnóstico do lúpus cutâneo subagudo, sendo detectados pelo menos, 12 semanas41.
em 70-80% e 30% desses pacientes, respectivamente6. Além disso, Os aCL(s) IgG/IgM são mais comumente detectados pela técni-
tais anticorpos são encontrados em cerca de 90% dos casos da sín- ca de Elisa. Tradicionalmente, resultados de 40 a 80 GPL/MPL, res-
drome do lúpus neonatal, especialmente com bloqueio cardíaco pectivamente, são considerados positivos moderados e > 80 GPL/
congênito6. Vários estudos sugerem que a presença do anticorpo MPL, positivos altos. O anti-b2GP1 IgG/IgM também é usualmente
anti-Ro/SS-A, com ou sem o anti-La/SS-B, independentemente do pesquisado por Elisa, devendo ser relatado como positivo ou ne-
tipo de doença autoimune materna, é o principal fator de risco gativo, juntamente com as unidades numéricas. O LAC é testado
para o desenvolvimento da síndrome do lúpus neonatal13. através de um ensaio coagulométrico41.
Como teste de screening, os anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/
SS-B podem ser sugeridos pelo padrão de IFI nuclear pontilhado Anticorpos anti-histonas
fino no teste do FAN com células HEp-2. A sensibilidade do FAN va- Os anticorpos anti-histonas produzem o padrão de IFI nuclear ho-
ria com o tipo de substrato empregado, procedimento de fixação mogêneo no teste de FAN com células HEp-2 e são geralmente de-
e também com os anticorpos presentes no soro. As células HEp-2 tectados por Elisa. Podem ser encontrados em 70% dos pacientes
apresentam maior sensibilidade que o esfregaço de fígado de rato, com LES, mas são inespecíficos, podendo também ser detectados
pois esses tecidos expressam menores quantidades da proteína na artrite reumatoide, síndrome de Felty, síndrome de Sjögren e
Ro/SS-A. Ainda assim, cerca de 10% dos soros positivos para o an- esclerose sistêmica. A sua maior utilidade clínica reside no apoio
ticorpo anti-Ro/SS-A apresentam teste de FAN em células HEp-2 diagnóstico do lúpus induzido por fármacos, no qual são detecta-
negativo. Em seguida ao teste de FAN, é necessária a confirmação dos em 96% a 100% dos casos5,6.
da presença dos anticorpos anti-Ro/SS-A e anti-La/SS-B através de
outras técnicas. Quando da descrição desses anticorpos, eles eram
detectados através da ID. Contudo, a técnica de CIE é mais rápida
Relevância dos autoanticorpos no apoio
e pode detectar anticorpos séricos presentes em menores concen- diagnóstico das manifestações clínicas do LES
trações, permitindo um incremento na sensibilidade em relação à
ID. A especificidade da CIE para a detecção dos anticorpos anti-Ro/
LES neuropsiquiátrico
SS-A é de cerca de 100%. Porém, uma subpopulação de soros com o Anticorpo antiproteína P ribossomal
anticorpo anti-La pode apresentar resultado falso-negativo com a
Vários estudos demonstraram uma associação positiva do anti‑P
CIE. Tal subpopulação pode ser identificada por Elisa. A técnica de
com depressão e psicose lúpica17,38,42. Contudo, outros estudos não
Elisa com antígenos purificados ou recombinantes é considerada
confirmaram os achados43,44,45. Essa discrepância pode ser decor-
rápida, sensível e específica para a detecção dos anticorpos anti-
rente de diferentes métodos para a detecção do anticorpo anti-P,
-Ro/SS-A e anti-La/SS-B. É fundamental que o antígeno utilizado
critérios distintos para estabelecer o diagnóstico do LES neurop-
seja altamente purificado, para evitar reações falso-positivas. Pode
siquiátrico, características demográficas e o tempo de coleta da
ainda ser empregado o Wb, que requer uma metodologia muito
amostra em relação a períodos de doença quiescente ou ativa33.
mais elaborada. A técnica de Wb, apesar de altamente específica,
Entretanto, é interessante que, em um grande estudo prospectivo
não é recomendada para a rotina de detecção desses anticorpos,
com pacientes com LES, foi observada uma associação positiva
principalmente por uma sensibilidade diminuída em relação ao
com as manifestações neuropsiquiátricas46. Essa grande coorte
anticorpo anti-Ro/SS-A40.
(n = 1.047) de pacientes com LES recentemente diagnosticado foi
avaliada prospectivamente por um período de até 10 anos para
Anticorpos antifosfolípides eventos neuropsiquiátricos definidos de acordo com as recomen-
Os anticorpos antifosfolípides compõem um grupo de reativida- dações do American College of Rheumatology46. Foram analisadas
des dirigidas a diferentes fosfolípides aniônicos de membranas as possíveis associações entre eventos neuropsiquiátricos e o
celulares – aqueles com maior relevância clínica são o anticorpo perfil de autoanticorpos séricos à época do diagnóstico de LES,
anticardiolipina (anti-CL), o anticorpo antibeta-2-glicoproteína-1 anti-P, anti-glutamate receptor antibodies (anti-NMDA), anticoa-
(anti-b2GP1) (dirigido a uma globulina de 50 kDa envolvida no gulante lúpico, anticardiolipina e anti-β2-glicoproteína-146. Du-
processo de regulação da coagulação sanguínea) e o anticorpo rante o estudo, 47,3% dos pacientes com LES apresentaram um
anticoagulante lúpico (LAC). Tais anticorpos são associados à sín- ou mais eventos neuropsiquiátricos. O anticorpo anticoagulante
drome antifosfolípide (SAF), a qual é caracterizada por tromboses lúpico positivo à entrada no estudo foi significativamente asso-
venosas e/ou arteriais e/ou eventos obstétricos tais como perda fe- ciado à ocorrência de trombose intracraniana subsequente e o
tal recorrente e abortos de repetição6. anti-P foi significativamente associado à psicose subsequente46.
Uma recente metanálise mostrou que o anticorpo anti-P é signi- pontilhado grosso no teste de FAN em células HEp-2. Pode ser
ficativamente associado à erupção cutânea malar, úlcera oral, detectado pelos métodos de ID, CIE, HA, Elisa e Wb. No LES, está
fotossensibilidade e presença do anticorpo anti-dsDNA e poten- associado ao fenômeno de Raynaud (Tabela 2) 2,5,6.
cialmente associado com o LES neuropsiquiátrico e com o dano
hepático47. Relevância dos autoanticorpos para
o seguimento dos pacientes com LES
Anticorpo antirreceptor do glutamato (glutamate
(monitoramento da atividade de
receptor antibodies; anti-NMDA – anti-receptor
doença e valor prognóstico)
N-metil-D-aspartato)
O número de anticorpos úteis para o acompanhamento dos pa-
Os anticorpos dirigidos aos receptores do glutamato (anti-NMDA) cientes com LES é bastante limitado, pois para poucos foi demons-
podem ser detectados nos soros de 14% a 35% dos pacientes com trada uma associação entre a flutuação de suas concentrações sé-
LES, mas não são específicos dessa doença (ocorrem em outras ricas e a atividade da doença. Além disso, há poucas informações
condições neuropsiquiátricas). Várias evidências (estudos in vi- sobre o valor prognóstico dos autoanticorpos.
tro e modelos experimentais) sugerem a participação desses an-
ticorpos na patogenia das manifestações neuropsiquiátricas do
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice
LES, inclusive com um mecanismo de ação proposto (Tabela 1).
Na literatura, existem estudos que corroboram e outros que não Foi demonstrado que os títulos séricos do anticorpo anti-dsDNA se
confirmam a associação dos anti-NMDA com o LES neuropsiquiá- correlacionam com o grau de atividade geral da doença e com a
trico. Entretanto, vale ressaltar que a pesquisa desses anticorpos, atividade da nefrite lúpica49.
principalmente no líquido cefalorraquidiano, pode ser útil para o Nosso grupo acompanhou por 6 anos uma coorte de pacientes
diagnóstico do envolvimento neuropsiquiátrico no LES22,23. com LES com nefrite lúpica comprovada por biópsia e a o anti-
corpo anti-dsDNA associou-se a um pior resultado renal a longo
prazo52.
Nefrite lúpica
Anticorpo anti-DNA de dupla hélice Anticorpo antinucleossomo
O anti-dsDNA apresenta uma associação bem conhecida com o O anticorpo antinucleossomo tem sido correlacionado com a ativi-
acometimento renal do LES48 e com a atividade renal49. dade geral da doença31.
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1. Doutora em Ciências Médicas pela Faculdade de Medicina da Como citar este artigo: Seguro LPC, Borba Neto EF. Nefrite lúpica:
Universidade de São Paulo (FMUSP). Médica assistente doutora tratamento baseado nos consensos e casos refratários. Rev Paul
da disciplina de Reumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):14-8.
de Medicina da Universidade de São Paulo . Os autores não contaram com apoio financeiro.
2. Professor livre-docente da disciplina de Reumatologia da Faculdade Os autores declaram não ter interesses associativos, comerciais, de
de Medicina da Universidade de São Paulo. propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse nos
E-mail para contato: lucianapc@gmail.com. produtos e empresas descritos neste artigo.
O protocolo NIH mostrou-se superior ao uso isolado de glicocor- parcial na indução e parece ter maior ação na raça negra, porém
ticoide na sobrevida renal. No entanto, está associado à insuficiên- tem custo mais elevado que AZA. AZA é uma opção para pacientes
cia ovariana prematura, a citopenias e ao aumento no risco de in- com risco ou desejo gestacional.
fecções e a neoplasias (como câncer de colo uterino)13,14. O protocolo
Euro-lupus apresentou eficácia comparável ao NIH, com menor Hidroxicloroquina
risco de falência gonadal e infecções15,16. O uso de CFF endovenosa A hidroxicloroquina tem mostrado inúmeros benefícios e seu uso
tem grande vantagem, pois proporciona maior biodisponibilidade e está indicado em todos os tipos de glomerulonefrites do LES, exce-
melhor adesão medicamentosa. A CFF deve ser infundida com pré- to na presença de contraindicações. Diminui o risco de recidivas
-medicação pois pode causar mal-estar, náuseas e/ou vômitos. renais, previne dano, está associada a melhor prognóstico renal
O MMF apresentou eficácia similar a CFF NIH, com menor taxa quando associada aos imunossupressores, potencializa a ação do
de infecções bacterianas e hospitalizações17-19. Em casos de síndro- MMF e aumenta a chance de remissão na nefrite membranosa.
me nefrótica pura (sem hematúria, hipertensão), o ACR indica o Também melhora perfil lipídico, reduz risco de trombose e está
MMF como droga de primeira escolha20. associada a maior sobrevida24,25.
Em caso de nenhuma resposta após 3 meses, o tratamento de A hidroxicloroquina deve ser usada na dose de 400 mg/dia
indução deve ser reavaliado e, se necessário, deve ser iniciada (ou menor, ajustada para o peso: não exceder a dose de 5 mg/kg/
nova indução com outro protocolo. dia). Utilizar doses menores em caso de insuficiência renal. A ava-
liação oftalmológica deve ser realizada no início do tratamento
Terapia de manutenção (3 a 5 anos) com hidroxicloroquina (para exclusão de retinopatias prévias) e
anualmente em pacientes de alto risco (mais de 5 anos de uso de
Após a indução no tratamento da NL, um período de 3 a 5 anos de
hidroxicloroquina, crianças, idosos, disfunções de órgãos) pelo
manutenção com terapia imunossupressora é recomendado para
risco de maculopatia.
otimizar a resolução e evitar recidivas1.
Os protocolos de uso de imunossupressores que mostraram
evidência na terapia de manutenção são (Tabela 2):
Tabela 2 Terapia de manutenção da nefrite lúpica
1. azatioprina (AZA) 2 mg/kg/dia;
membranoproliferativa.
2. micofenolato mofetil (MMF) 2g/dia.
Outros cuidados
Tabela 3 Medidas nefroprotetoras além da 1. Dieta rica em cálcio e reposição de vitamina D. Alvo de vi-
imunossupressão. tamina D entre 40 e 60 ng/dL para evitar osteoporose induzida
Medidas nefroprotetoras por glicocorticoide e pelos benefícios imunológicos da vitami-
na D no LES33,34.
Controle de PA (alvo 130 x 80 mmHg) 2. Anticoncepção. Prescrever anticoncepcionais para mulheres
Controle de proteinúria (alvo < 0,8 g/24 h) em idade fértil com vida sexual ativa pelo uso de drogas tera-
togênicas (como CFF e MMF) e pelo risco gestacional alto (ma-
Uso de antiproteinúricos (iECA e/ou ARAII) terno e fetal) na vigência de nefrite lúpica em atividade. São
Controle de dislipidemia (alvo LDL < 100 mg/dL) opções: medroxiprogesterona (150 mg IM a cada 3 meses), de-
sogestrel 75 mcg/dia (uso continuo), DIU com levonorgestrel
Evitar drogas nefrotóxicas (em especial AINH)
e implante subdérmico de etonogestrel. Orientar método de
Dieta hipossódica barreira (camisinha) como método anticoncepcional associa-
Cessar tabagismo do e para prevenção de doenças sexualmente transmissíveis.
3. Preservação ovariana. Em pacientes com desejo reproduti-
Checar aderência vo que vão receber altas doses de CFF, é possível usar análo-
PA: pressão arterial; iECA: inibidores da enzima conversora de angiotensina; gos de GnRH. Leuprolide 3,75 mg, via intramuscular, 1 x/mês,
ARA: antagonista do receptor da angiotensina II; AINH: anti-inflamatórios 10 dias antes da dose de CFF [35]. Pode causar sintomas de
não hormonais. menopausa.
Casos refratários – outras opções de drogas Aguardamos mais avaliações sobre as melhores opções tera-
Em pacientes refratários, com proteinúria persistente > 1 g/dia, a pêuticas com imunossupressores e com imunobiológicos na ne-
primeira conduta é checar as estratégias nefroprotetoras. Caso este- frite lúpica refratária para promover um melhor controle dessa
jam otimizadas, algumas opções são o uso de medicamentos imuno- manifestação e aumentar a sobrevida renal dos pacientes.
biológicos e de inibidores da calcineurina, em especial o tacrolimus.
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2. So MW, Koo BS, Kim YG, Lee CK, Yoo B. Predictive value of remission status after 6
talvez por falhas no desenho, nos objetivos e por comparar months induction therapy in patients with proliferative lupus nephritis: a retrospective
com tratamento eficaz36,37. No entanto, dados de relatos e sé- analysis. Clin Rheumatol. 2011;30:1399-405.
ries de casos mostram benefícios em casos refratários. Uma 3. Faurschou M, Dreyer L, Kamper AL, Starklint H, Jacobsen S. Long-term mortality
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uso de rituximabe na nefrite lúpica com taxa de remissão 2010;62:873-80.
completa de 36,1% e parcial de 37,4%38. O protocolo Rituxilup 4. Dall’era M, Stone D, Levesque V, Cisternas M, Wofsy D. Identification of biomarkers
that predict response to treatment of lupus nephritis with mycophenolate mofetil or
(esquema “steroid free”, associado a MMF) encontrou remis-
pulse cyclophosphamide. Arthritis Care Res. 2011;63:351-7.
são completa em 73% dos pacientes. Foi um estudo aberto em
5. Esdaile JM, Levinton C, Federgreen W, Hayslett JP, Kashgarian M. The clinical and renal
pacientes com nefrite lúpica ativa com creatinina máxima de biopsy predictors of long-term outcome in lupus nephritis: a study of 87 patients and
1,47 mg/dL39. review of the literature. Q J Med. 1989;72:779-833.
2. Rituximabe + belimumabe. Há relatos de eficácia em ne- 6. Ioannidis JP, Boki KA, Katsorida ME, Drosos AA, Skopouli FN, Boletis JN, Moutsopoulos
frite lúpica refratária do uso de rituximabe seguido de ma- HM. Remission, relapse, and re-remission of proliferative lupus nephritis treated with
nutenção com belimumabe. Há estudos randomizados em cyclophosphamide. Kidney Int. 2000;57:258-64.
andamento40,41. 7. Jacobsen S, Starklint H, Petersen J, Ullman S, Junker P, Voss A, et al. Prognostic value
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necessite mais avaliações.
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Tacrolimus 9. Klumb EM, Silva CA, Lanna CC, Sato EI, Borba EF, Brenol JC, et al. Consensus of the
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O tacrolimus é um inibidor da calcineurina mais potente que a ci-
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closporina e com melhor perfil de eventos adversos (hipertensão,
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de nefrite lúpica. Nas demais populações, é uma opção para in- 1955-9.
dução de nefrite lúpica refratária44. Pode ser usado isoladamente 12. Bertsias GK, Tektonidou M, Amoura Z, Aringer M, Bajema I, Berden JH, et al; European
(tacrolimus 3 mg de 12/12h) ou associado a MMF (tacrolimus 2 mg League Against Rheumatism and European Renal Association-European Dialysis and
de 12/12h + MMF 1 g/dia). Ao introduzir tacrolimus, é importante Transplant Association. Joint European League Against Rheumatism and European
Renal Association-European Dialysis and Transplant Association (EULAR/ERA-EDTA)
controlar PA e creatinina, bem como seu nível sérico (colhido no
recommendations for the management of adult and paediatric lupus nephritis. Ann
vale) após 3 dias de uso (manter entre 5-6 ng/mL). Rheum Dis. 2012;71:1771-82.
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As indicações de biopsia renal, de acordo com o ACR, são: protei-
14. Boumpas DT, Austin HA 3rd, Vaughn EM, Klippel JH, Steinberg AD, Yarboro CH, Balow
núria > 1 g/24h; proteinúria > 0,5 g/24h associada à hematúria ou JE. Controlled trial of pulse methylprednisolone versus two regimens of pulse cyclo-
cilindrúria; elevação de creatinina sem causa definida20. Desse phosphamide in severe lupus nephritis. Lancet. 1992;340:741-5.
modo, a biopsia está indicada na nefrite lúpica, mas sua realiza- 15. Houssiau FA, Vasconcelos C, D’Cruz D, Sebastiani GD, Garrido Ed Ede R, Danieli MG,
ção não deve atrasar o início do tratamento (iniciar o tratamento e et al. Immunosuppressive therapy in lupus nephritis: the Euro-Lupus Nephritis Trial, a
realizar a biopsia quando e se possível). randomized trial of low-dose versus high-dose intravenous cyclophosphamide. Arthri-
São fundamentais os cuidados pré-biopsia renal, para segu- tis Rheum. 2002;46:2121-31.
16. Houssiau FA, Vasconcelos C, D’Cruz D, Sebastiani GD, de Ramon Garrido E, Danieli MG,
rança do procedimento: controle de PA (< 140 x 90 mmHg); descar-
et al. Early response to immunosuppressive therapy predicts good renal outcome in lu-
tar infecções, em especial do trato urinário (urocultura negativa);
pus nephritis: lessons from long-term followup of patients in the Euro-Lupus Nephritis
parâmetros laboratoriais: hemoglobina > 10g/dL, hematócrito Trial. Arthritis Rheum. 2004;50:3934-40.
> 30%; TP/INR ≤ 1,2; TTPA/R ≤ 1,2; plaquetas ≥ 100.000/mm3; sus- 17. Ginzler EM, Dooley MA, Aranow C, Kim MY, Buyon J, Merril JT, et al. Mycopheno-
pender heparina não fracionada por 6 horas e heparina de baixo late mofetil or intravenous cyclophosphamide for lupus nephritis. N Engl J Med.
peso molecular por 12 horas antes da realização da biopsia; não 2005;353:2219-28.
usar anticoagulante oral; não usar AAS por 7 dias antes da biopsia; 18. Appel GB, Contreras G, Dooley MA, Ginzler EM, Isenberg D, Jayne D, et al; Aspreva Lu-
se diálise: realizar a biopsia pelo menos dentro de 12 horas após a pus Management Study Group. Mycophenolate mofetil versus cyclophosphamide for
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última hemodiálise.
19. Appel AS, Appel GB. An update on the use of mycophenolate mofetil in lupus nephritis
Contudo, a biopsia poderá ser de grande auxílio se existir dú-
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vida quando da não resposta a um determinado tratamento, pois
20. Hahn BH, McMahon MA, Wilkinson A, Wallace WD, Daikh DI, Fitzgerald JD, et al; Ame-
fornecerá dados mais concretos sobre a atividade inflamatória e o rican College of Rheumatology. American College of Rheumatology guidelines for scre-
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1. Médica. Mestre em Dermatologia e doutoranda em Medicina A autora não contou com apoio financeiro.
Translacional pela Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
de Medicina (Unifesp/EPM). Coordenadora do Grupo de Colagenoses de propriedade ou financeiros que representem conflito de
– Departamento de Dermatologia da Unifesp/EPM. interesse nos produtos e empresas descritos neste artigo.
E-mail para contato: vascmonica@gmail.com.
Como citar este artigo: Vasconcellos MRA. Tratamento das lesões
cutâneas no LES: visão de dermatologista. Rev Paul Reumatol.
2017 abr-jun;16(2):19-24.
Pacientes lúpicos com fototipo de Fitzpatrick III-VI podem ter gel). Irritação local é efeito adverso potencial. Existem trabalhos
baixa aderência à fotoproteção, talvez pela crença errônea de que demonstrando efeito benéfico do tazaroteno e evidências de efi-
a pele escura, por ter mais melanina, estaria mais protegida5. Po- cácia com uso de R-salbutamol a 5% creme nas lesões discoides12.
rém, é conhecido o fato de que, diferentemente do câncer de pele, Entretanto, nenhum dos dois é disponível em nosso pais.
o LES incide fortemente na população afrodescendente. Nesse es- Outra opção para as lesões verrucosas ou nas refratárias é a
tudo, os homens e indivíduos na faixa de 30-50 anos também tive- infiltração intralesional, intradérmica de acetonido de triamcino-
ram menos aderência às orientações de fotoproteção5. lona em suspensão, utilizando a concentração de 5-10 mg/ml, men-
Importante salientar que o intervalo entre a exposição aos salmente, até regressão das lesões.
RUVs e o desencadeamento de lesões cutâneas é muito variável,
de algumas horas a duas e até três semanas. Assim, muitos pa- Sistêmico
cientes frequentemente não relacionam a piora cutânea com a
Lesões discoides disseminadas, subagudas, paniculite, lesões
fotoexposição.
com potencial acentuado para deixar cicatrizes muito inestéti-
Em função da fotoproteção sistemática e dos medicamentos
cas e o próprio diagnóstico de LES são indicações de tratamento
utilizados, a verificação dos níveis de vitamina D e eventual su-
sistêmico.
plementação está recomendada. A utilização de anticoncepcionais
Num contexto de atividade cutânea importante e com outras
estrogênicos foi relacionada à piora do LEC.
manifestações sistêmicas que indiquem eventual tratamento com
Recomenda-se o questionamento detalhado quanto ao uso pré-
imunomoduladores ou imunossupressores, convém afastar a pos-
vio de medicamentos, particularmente naqueles com lúpus suba-
sibilidade de infecções preexistentes como hepatites virais B e C,
gudo (LESA) e com o início mais tardio da doença.6.7 Além disso,
infecção por HIV e tuberculose.
existem medicamentos que desencadeiam ou exacerbam a fotos-
sensibilidade, como, por exemplo, sulfonamidas que se associam
à piora do LES. Antimaláricos
A relação entre o hábito de fumar e menor resposta aos an- Os antimaláricos são a primeira indicação no LEC, porque as le-
timaláricos, bem como a influência dos substitutos da nicotina sões cutâneas respondem a esses agentes em 50-80% dos casos.
(gomas de mascar, adesivos e inalantes) sobre a eficácia desses Estão disponíveis comprimidos de difosfato de cloroquina (CQ)
medicamentos ainda necessita de melhor definição. Em estudo 250 mg e o sulfato de hidroxicloroquina (HCQ) 400 mg.
populacional na Suécia, observou-se incidência aumentada de Os mecanismos de ação ainda não são totalmente esclareci-
câncer não melanoma, câncer de boca, pulmão e linfoma nos pa- dos, porém são bem conhecidos seus efeitos anti-inflamatórios e
cientes fumantes com LES e atividade cutânea6. imunomoduladores, estabilizador de lisossomos, inibidor da si-
Finalmente, alguns pacientes podem apresentar prurido nalização dos receptores toll-like endossômicos. De fato, os anti-
acompanhando lesões cutâneas ativas ou eventualmente como maláricos reduzem a atividade do LES, especialmente a cutânea
um efeito adverso dos antimaláricos. A coçadura pode piorar as e articular, e também reduzem a frequência de surtos. A HCQ
lesões por causa de um fenômeno chamado isomórfico (reprodu- apresenta, ainda, alguns efeitos benéficos de longo prazo no LES,
ção das lesões pelo trauma) ou fenômeno de Köebner, que ocorre talvez por outros efeitos particulares como ação antiplaquetária
em várias dermatoses e também no LEC. sem aumentar o tempo de sangramento, ação hipoglicemiante,
redutora do colesterol total, fração LDL e triglicerídeos, bem com
Tratamento medicamentoso ação antimicrobiana.
A eficácia da CQ e HCQ parece ser semelhante, mas a HCQ é
Tópico mais bem tolerada e menos retinotóxica. Ainda assim, distúrbios
As lesões de LEC são responsivas aos corticosteroides (CE) tópicos gastrintestinais e hematológicos podem ocorrer. Hiperpigmenta-
e o uso de CE classes II (por exemplo, desonida, dexametasona) e ção, inicialmente descrita mais para o uso de DC, é descrita em
III (por exemplo, valerato de betametasona) é usual nas manifes- cerca de 30% dos paciente em uso de HCQ e pode estar acentuada
tações cutâneas do LES como terapia adjuvante. Preconiza-se a uti- quando associada ao uso de anticoagulantes13.
lização diferenciada na face e flexuras (acetato de hidrocortisona A dose convencional, considerando-se o peso ideal, é de 3-3,5
ou CE de tipo II), embora um dos poucos estudos controlados e ran- mg/kg/dia para DC e 6-6,5 mg/kg/dia para HCQ. Recomendações da
domizados tenha demonstrado maior eficácia de fato com os CE Academia Americana de Oftalmologia indicam como mais seguras
fluorados nas lesões discoides8. Por questão de efeitos indesejáveis para prevenção de retinopatia no longo prazo (5-10 anos) as doses
como atrofia, telangiectasia, estrias e dermatite relacionados aos de 2,3 mg/kg/dia para DC e 5 mg/kg/dia para HCQ14,15.
CE (ou dermatite perioral), não se recomenda usar o CE fluorado A avaliação oftalmológica prévia é obrigatória e, dependendo
por mais de 4-6 semanas. da idade e dos fatores de risco, o controle subsequente poderá ser
Os inibidores da calcineurina vêm demonstrando boa eficácia a cada 6 ou 12 meses. Se for possível a realização de exames oftal-
no LEC, com perfil de segurança superior aos CE9. Estudos mos- mológicos de imagem mais sensíveis para retinopatia, essa avalia-
traram resultados semelhantes quanto ao uso de tacrolimo 0,1% ção poderá ser prolongada em um ano e então em 5 anos.
pomada em relação ao 17-valerato de betametasona 0,01% creme, Nos pacientes com LES, o uso exclusivo de antimaláricos ge-
assim como comparativamente do pimecrolimo 0,5% creme em ralmente não é suficiente para controle da doença, mas eles são
relação ao propionato de clobetasol 0,05% pomada 10,11. Eventual- importantes no tratamento. Administração de HCQ também aju-
mente, eles podem ser usados sequencialmente aos CE, quando da a reduzir o uso de corticosteroides sistêmicos, reduz o dano
não ocorre resposta em 2 semanas. O custo dos inibidores de cal- adicional aos órgãos, diminui o efeito trombótico dos anticorpos
cineurina é bem superior ao dos corticosteroides tópicos e o efeito antifosfolípides. É uma droga segura, relativamente barata e pode
terapêutico inicial, mais lento. ser usada na gravidez. A HCQ pode ser benéfica não só no LES
Nas lesões refratárias ou nas hipertróficas/verrucosas pode-se mais leve, mas também naqueles pacientes com órgãos acometi-
usar os retinoides tópicos (ácido retinoico 0,05% creme ou 0,025% dos mais severamente e também pode ser benéfica na gravidez.
os subtipos de LEC refratários26-27. A recomendação para o MMF é mg/dia. Acompanharam os doentes por 8 anos. A resposta terapêu-
como tratamento de terceira linha, preferencialmente associado tica ocorreu em 58 (98%), sendo completa em 50 (85%). Enquanto
ao antimalárico. MPS é tratamento alternativo ao MMF. as formas discoides tenderam a recidivar e necessitar de períodos
A dose inicial de MMF é de 500 mg 2 vezes ao dia, que pode ser de manutenção mais prolongados, aqueles com LESA tiveram re-
aumentada até 3 g/dia. missão sustentada após a suspensão do medicamento.
Os efeitos adversos são sintomas gastrintestinais (náusea, vô- Aprovada para o tratamento do LEC, tem controle rigoroso em
mitos e diarreia), citopenias, hepatotoxicidade. Esses são efeitos função da teratogenicidade. A documentação, quando se usa a ta-
dose-dependentes. Os pacientes também podem apresentar maior lidomida, é essencial.
suscetibilidade para infecções, particularmente virais (por exem- A lenalidomida, análogo estrutural da talidomida, apresenta a
plo, herpes-zóster), infecções do trato respiratório, cistite. vantagem de menor risco de polineuropatia, embora também seja
Monitorização laboratorial mensal é mandatória para toxici- teratogênica e não seja de fácil disponibilidade pelo seu alto custo.
dade hematológica, hepática e renal.
Contracepção durante o tratamento e por 6 semanas após a Clofazimina
interrupção do tratamento.
Corante rimino-phenazidico lipofílico com propriedades antimi-
crobianas, anti-inflamatórias e imunossupressoras. Usado no tra-
Azatioprina tamento da hanseníase.
Precursor da 6-mercaptopurina, com propriedades imunossupres- Em 2005, estudo randomizado e controlado comparando clofa-
soras e citotóxicas, tem sido usada para várias doenças cutâneas, zimina 100 mg/dia e cloroquina (CQ) 250 mg/dia mostrou eficácia
incluindo o LEC. semelhante nas manifestações cutâneas do LES. Embora com efi-
Existem relatos de bons resultados em pacientes de LES com cácia comparável à cloroquina, 5 pacientes no grupo da clofazimi-
lesões discoides disseminadas28,29. na e um do grupo da CQ desenvolveram reações cutâneas graves.
Sua utilização foi também referida como favorável em ma- Sem conseguir determinar se decorreu do medicamento ou não, a
nutenção após pulsoterapia com ciclofosfamida em paciente com recomendação é que somente seja usada em pacientes de LEC sem
LES e lesões subagudas graves e refratárias30. doença sistêmica associada34.
Foi utilizada para lesões palmoplantares com bons resulta-
dos31; em outros estudos, apenas metade dos doentes de LED e Imunoglobulina endovenosa (IVIG)
LESA responderam favoravelmente32.
Extraído de pool de plasma de mais de 10 mil doadores. Pode ser
Em geral, no LEC sem alterações sistêmicas não é recomenda-
usado no LEC com ou sem doença sistêmica associada. Seu uso é
da a utilização da azatioprina, devido aos efeitos adversos e resul-
limitado pelo custo e achados controversos sobre eficácia.
tados controversos.
Dose de 1-2 g/kg a cada quatro semanas e então reduzido para
A dose usual é de 1-2,5 mg/kg/dia; a dose diária gira em torno
0,5 g/kg.
de 100-150 mg e deve ser reduzida ao longo do tratamento.
Os efeitos colaterais mais comuns são cefaleia, erupção urti-
Atividade reduzida da tiopurina metiltransferase (TPMP) acar-
cariforme, mas podem ocorrer meningite asséptica, insuficiência
reta risco de toxicidade por superdosagem; a dose pode ser eleva-
renal aguda, eventos tromboembólicos, anafilaxia em pacientes
da mediante avaliação do hemograma e transaminases. Interage
deficientes em IgA.
com alopurinol, entre outros medicamentos.
Vários relatos de casos e séries de pacientes mostram efeito
benéfico no LEC, porém, exacerbação das lesões no LESA e LES
Talidomida também foi descrita35.
Talidomida (alfa-N-phthalimido-glutarimida) tem efeito anti-infla-
matório potente. Inibe a síntese de TNF-alfa e apoptose induzida Ciclofosfamida
por UV, diminuindo assim a atividade inflamatória.
Agente alquilante, potente imunossupressor. Utilizada há bastante
É considerada um dos agentes mais eficazes no tratamento do
tempo em 9 pacientes com vários subtipos de LEC, com melhora
LEC refratário e grave. A talidomida foi usada com sucesso nos
classificada como excelente em 5 e moderada em 3. Em dois pa-
três subtipos de LEC. Porém, a neuropatia periférica ocorre em
cientes que suspenderam a medicação, não houve recidiva em 3
17-27% dos pacientes, é parcialmente, mas nem sempre, reversí-
meses e 23 meses36.
vel e, portanto, sua utilização fica significativamente limitada.
Apresenta diversos efeitos colaterais: anorexia, náusea, vômi-
Outros efeitos colaterais, mais comuns, são constipação, tontu-
to, diarreia, estomatite, mielossupressão, insuficiência ovariana,
ra, zumbido. Alterações menos comuns decorrentes do tratamento
cistite hemorrágica, alopecia, cardiomiopatia, malignidades.
são eventos trombóticos, amenorreia, edema. Os eventos trombó-
Como surgiram outras opções melhores, hoje o uso de ciclofos-
ticos podem ser venosos ou arteriais, que geralmente ocorrem nos
famida especificamente para LEC é incomum.
primeiros 6 meses de tratamento e são mais frequentes quando
existe presença de anticorpos antifosfolípides em paciente de LES.
Recomenda-se administração concomitante do antimalárico. Ciclosporina
Num primeiro esquema terapêutico, inicia-se com 50 mg/dia de Inibidor da calcineurina, a ciclosporina é um imunossupressor
talidomida, eleva-se a dose até 150 mg/dia e mantem-se até respos- utilizado com bons resultados em outras dermatoses como psoría-
ta clínica; a partir daí, reduz-se a dose para 50 mg em dias alterna- se; porém, no LEC, apresenta resultados apenas moderados e com
dos. Normalmente, a resposta se mantém mesmo com redução da efeitos adversos que somam às complicações do lúpus, como alte-
dose. Também pode ser usada como dose de resgate com duração ração renal. Pode eventualmente ser usada no LES para poupar o
menor e em seguida volta-se à manutenção. CE sistêmico. Pode ser usado na gravidez37.
Em 2012, Cortés-Hernández33 et al. estudaram 60 pacientes A dose é de 3-5 mg/kg/dia e os efeitos colaterais, hipertensão
consecutivos com LEC refratário e administraram talidomida 100 arterial, toxicidade renal.
19. Ruzicka T, Lynde CW, Jemec GB, Diepgen T, Berth-Jones J, Coenraads PJ, et al. Efficacy 34. Bezerra EL, Vilar MJ, da Trindade Neto PB, Sato EI. Double-blind, randomized, control-
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REAÇÕES ADVERSAS: MUITO COMUNS (>1/10): INFECÇÕES NÃO OPORTUNISTAS, VIRAIS OU BACTERIANAS; DIARREIA; NÁUSEAS. COMUNS (>1/100
E <1/10): LEUCOPENIA, REAÇÃO DE HIPERSENSIBILIDADE, DEPRESSÃO, DOR NAS EXTREMIDADES, REAÇÃO SISTÊMICA RELACIONADA À INFUSÃO.
INCOMUNS (>1/1.000 E <1/100): REAÇÕES ANAFILÁTICAS4. PRECAUÇÕES E ADVERTÊNCIAS: CASOS DE LEUCOENCEFALOPATIA MULTIFOCAL
PROGRESSIVA (LMP), PODEM OCORRER COM BELIMUMABE, ASSIM COMO COM OUTROS IMUNOSSUPRESSORES4. CONTRAINDICAÇÃO: PACIENTES
QUE APRESENTARAM ANAFILAXIA EM DECORRÊNCIA DE SEU USO4. INTERAÇÕES MEDICAMENTOSAS: NÃO FORAM REALIZADOS ESTUDOS DE
INTERAÇÃO COM O BELIMUMABE. EM ESTUDOS CLÍNICOS SOBRE PACIENTES COM LES, A ADMINISTRAÇÃO CONCOMITANTE DE MICOFENOLATO
MOFETIL, AZATIOPRINA, HIDROXICLOROQUINA, METOTREXATO, ANTIINFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDES, ASPIRINAS E INIBIDORES DA HMG-COA
REDUTASE NÃO TEVE EFEITO EXPRESSIVO SOBRE AS EXPOSIÇÕES AO BELIMUMABE.4
Benlysta® pó liofilizado para solução para infusão intravenosa (belimumabe). Indicação: terapia adjuvante em pacientes adultos com lúpus eritematoso sistêmico (LES) ativo, que apresentam alto grau de atividade da doença (ex: anti-DNA positivo e baixo complemento) e que estejam em uso de tratamento padrão para
LES, incluindo corticosteroides, antimaláricos, AINEs ou outros imunossupressores. Contraindicação: pacientes que apresentaram anafilaxia em decorrência de seu uso. Advertências e precauções: Não se recomenda o uso de Benlysta® em combinação com terapia biológica ou com ciclofosfamida. A administração
de belimumabe pode resultar em reações à infusão e hipersensibilidade, que podem ser graves e fatais. No caso de reação grave, deve-se interromper a administração de belimumabe e administrar apropriado tratamento. Os pacientes com histórico de alergias a múltiplos medicamentos ou de hipersensibilidade
significativa podem ter risco aumentado de reações. A pré-medicação com um antihistamínico oral, com ou sem antipirético, pode ser administrada antes da infusão de Benlysta®. Os pacientes devem ser monitorados durante e por um período de tempo apropriado após a administração de Benlysta®. Também foram
observadas reações do tipo tardias, reações de hipersensibilidade não agudas, incluindo rash, erupções cutâneas, náusea, fadiga, mialgia, dor de cabeça e edema facial. O mecanismo de ação de belimumabe pode aumentar o risco para o desenvolvimento de infecções. Infecções graves, incluindo casos fatais, foram
relatados em pacientes com LES que receberam terapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Os pacientes que desenvolverem uma infecção durante o tratamento com belimumabe devem ser monitorados rigorosamente e deve-se considerar a interrupção da terapia imunossupressora. Os médicos devem ter cuidado
ao considerar o uso de belimumabe no caso de pacientes com infecções severas ou crônicas. O mecanismo de ação do belimumabe pode aumentar o risco potencial para o desenvolvimento de neoplasias. Em estudos clínicos não houve diferença na taxa de doenças neoplásicas entre o grupo tratado com belimumabe e
o tratado com placebo. Não se deve administrar vacinas com vírus vivos por 30 dias antes ou concomitantemente à belimumabe porque a segurança clínica não foi estabelecida. Houve mais relatos de óbitos com Benlysta® do que com placebo durante o período controlado dos estudos clínicos. Não houve predominância
isolada de causa das mortes. As etiologias incluíram infecção, doença cardiovascular e suicídio. Em estudos clínicos, as taxas de resposta do desfecho primário foram inferiores nos indivíduos negros do grupo Benlysta® em relação aos do grupo placebo. Benlysta® deve ser utilizado com cuidado em pacientes da raça
negra. Os pacientes que recebem Benlysta® devem ser instruídos a entrar em contato com seu profissional de saúde caso tenham casos novos ou agravados de depressão, pensamentos suicidas ou outras alterações de humor. Casos de Leucoencefalopatia Multifocal Progressiva (LMP), inclusive fatais, e que resultaram
em déficits neurológicos têm sido relatados em pacientes com LES que receberam farmacoterapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Caso a LMP seja confirmada, deve-se considerar a interrupção da terapia imunossupressora, incluindo belimumabe. Uso em gravidez e lactação: Só se deve usar belimumabe
durante a gravidez se o possível benefício para a mãe justificar o risco potencial para o feto. Se a prevenção da gravidez for mandatória, mulheres férteis devem adotar os métodos anticoncepcionais adequados ao longo de toda a terapia com belimumabe e durante pelo menos quatro meses após a conclusão do
último tratamento com esse agente. Não se estabeleceu a segurança de belimumabe durante a lactação. Recomenda-se que a decisão a respeito do tratamento com belimumabe em lactantes seja tomada levando-se em consideração a importância da amamentação materna para o lactente, da medicação para a mãe,
e qualquer potencial efeito adverso tanto de belimumabe quanto da condição materna subjacente para o lactente. Categoria B de risco na gravidez. Reações adversas: Muito comuns (>1/10): infecções (não oportunistas), infecções bacterianas (por exemplo, bronquite, cistite), diarreia, náuseas. Comuns (>1/100
e <1/10): gastroenterite viral, faringite, nasofaringite, leucopenia, reação de hipersensibilidade, depressão, insônia, enxaqueca, dor nas extremidades, pirexia e reação sistêmica relacionada à infusão. Incomuns (>1/1.000 e <1/100): reação anafilática, angioedema, exantema, urticária. Raras (>1/10.000 a <1/1.000):
reações do tipo tardias, reações de hipersensibilidade não agudas. Interações medicamentosas: Não se realizaram estudos sobre interações medicamentosas de belimumabe. Em estudos clínicos sobre pacientes com LES, a administração concomitante de micofenolato mofetil, azatioprina, hidroxicloroquina,
metotrexato, anti-inflamatórios não esteroides, aspirina e inibidores da HMG-CoA redutase não teve efeito expressivo sobre as exposições ao belimumabe. Posologia: O esquema posológico recomendável para adultos é de 10 mg/kg nos dias 0, 14 e 28 e, depois disso, em intervalos de 4 semanas sendo administrado
por infusão intravenosa e devendo ser reconstituído e diluído antes da administração. Deve ser administrado por um profissional de saúde preparado para tratar reações de hipersensibilidade incluindo anafilaxia. A infusão deve ser feita durante o período de 1 hora. Não se deve administrar Benlysta® em infusão rápida
ou bólus. É possível desacelerar a taxa de infusão ou interrompê-la caso o paciente apresente reação infusional. Deve-se suspender imediatamente a infusão se o paciente tiver reação adversa com risco de vida. Os pacientes devem ser monitorados durante e por um período de tempo apropriado após a administração
de Benlysta®. Deve ser considerada a descontinuação do tratamento com Benlysta® quando não houver melhora no controle da doença após 6 meses de tratamento. Superdosagem: Existe uma experiência clínica limitada sobre superdosagem de belimumabe. Para dados completos sobre a segurança do medicamento,
a bula na íntegra deverá ser consultada e poderá ser solicitada à empresa através do Departamento de Informação Médica da GSK (SAC 08007012233 e/ou medinfo@gsk.com). USO ADULTO (a partir de 18 anos). VENDA SOB PRESCRIÇÃO MÉDICA. Reg. MS: 1.0107.0295 mBL_Benlysta_inj_GDS13_ L0752.
Material de divulgação exclusiva para profissionais de saúde habilitados a prescrever ou dispensar medicamentos. Recomenda-se a leitura da bula e da monografia do produto antes da prescrição de qualquer medicamento. Mais informações à disposição, sob
solicitação ao Departamento de Informações Médicas (DDG 0800 701 2233 ou medinfo@gsk.com). Para notificar eventos adversos ocorridos durante o uso de medicamentos da GlaxoSmithKline/Stiefel, entre em contato diretamente com o Departamento
de Farmacovigilância pelo e-mail: farmacovigilancia@gsk.com ou através do Representante do Grupo de Empresas GSK. As marcas registradas pertencem ou são licenciadas ao grupo de empresas GSK.
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Artigo
1. Biomédica. Pós-doutoranda no Laboratório de Autoimunidade da Como citar este artigo: Postal M, Appenzeller S. Biomarcadores no lúpus
Universidade Estadual de Campinas. eritematoso sistêmico. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):26-9.
2. Professora associada livre-docente na disciplina de Reumatologia As autoras não contaram com apoio financeiro.
da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de As autoras declaram não ter interesses associativos, comerciais,
Campinas. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
E-mail para contato: appenzellersimone@yahoo.com. nos produtos e empresas descritos neste artigo.
tor importante na incorporação na prática clínica até o presente Neutrophil gelatinase-associated lipocalin (NGAL) é expressa
momento12. em diversas células, incluindo os túbulos renais. Vários estudos
A identificação do aumento de níveis séricos de INF-α em pa- transversais têm investigado NGAL como biomarcador na nefrite
cientes com LES e a identificação de polimorfismos relacionados lúpica de adultos e crianças com sensibilidade elevada e especi-
com os genes induzidos pelo INF-α, levaram à hipótese de que ficidade variável29-31. Em estudos longitudinais, níveis urinários
INF-α poderia ser um biomarcador para o diagnóstico do LES. de NGAL estão correlacionados com atividade renal e seus níveis
Porém, alterações similares foram observadas em outras doenças se elevam 3-6 meses antes de um flare renal29-31. Contudo, NGAL
autoimunes e infecções13. A utilização de um painel diagnóstico e MCP-1 também não são específicas no LES e precisam ser ava-
com 3 genes induzidos pelo INF-α apresentou sensibilidade e espe- liadas no contexto individual de cada paciente. Ainda existem
cificidade de 70-80% para o diagnóstico de LES. várias outras moléculas em estudo, porém, faltam estudos longi-
tudinais para validação.
Biomarcadores e atividade de doença Dentre os marcadores para nefrite lúpica, os anticorpos anti-
nucleossomo e anticorpos anti-C1q foram extensivamente estuda-
A atividade de doença é avaliada por índices compostos como SLE
dos e demonstraram ser promissores biomarcadores para envol-
Disease Activity Index (Sledai)14, Systemic Lupus Activity Measure
vimento renal7. Os anticorpos antinucleossomo estão presentes
(Slam)15, European Consensus Lupus Activity Measure (Eclam)16 e
em 70-100% dos pacientes com LES e têm uma especificidade ele-
British Isles Lupus Assessment Group Index (Bilag)17, que envolvem
vada (até 97%) para o LES. Esses anticorpos são mais frequentes
uma combinação de sinais e sintomas clínicos e parâmetros labo-
em pacientes com nefrite. Além disso, alguns estudos relataram
ratoriais. Na prática clínica, nem sempre são utilizados de forma
que o antinucleossomo pode ser encontrado em pacientes que
rotineira, mas podem auxiliar na padronização da atividade de
anti-dsDNA consistentemente negativo32,33.
doença. Porém, não auxiliam em diferenciar atividade de doença
Os anticorpos anti-C1q foram encontrados em 30% a 60% dos
de infecção, por exemplo.
pacientes com LES e uma forte correlação entre a presença de an-
Muitos biomarcadores são utilizados em estudos transversais
ticorpos anti-C1q e envolvimento renal foi relatada7. Estudos tam-
e sua associação não se confirma em estudos longitudinais. Por
bém observaram que os níveis de anticorpos anti-C1q diminuíram
exemplo, a aumento da expressão de genes regulados pelo INF tipo
após o tratamento da nefrite lúpica. A ausência de anticorpos
1 tem sido associada à atividade do LES em estudos transversais,
anti-C1q foi relatada para exclusão de um diagnóstico de nefrite
porém, não foram sensíveis a mudanças em estudos longitudinais.
lúpica, bem como um aumento nesses anticorpos sugere apareci-
Mais estudos são necessários para avaliar se podem ser utilizados
mento de flare renal34,35.
para uma manifestação em específico18-21.
O comprometimento do SNC no LES é outro desafio na prá-
Outros biomarcadores estudados e que se correlacionaram
tica clínica36. A ressonância magnética estrutural é considerada
com Sledai foram plasmócitos CD 127 high (valor preditivo de
padrão ouro, mas muitas vezes encontra-se normal ou apresenta
78,9%)22,23, C4d ligado a reticulócitos, citocinas e níveis plasmáti-
alterações inespecíficas37. Técnicas funcionais têm sido utilizadas
cos de estimuladores de linfócitos B (BLyS), porém, até o presente
em pesquisa para identificar alterações na conectividade neuro-
momento, não estão disponíveis na prática clínica. Além da identi-
nal. A grande variabilidade das manifestações do SNC, porém, é
ficação da atividade de doença como um todo, vários estudos têm
um desafio na aplicabilidade dos achados na prática clínica.
procurado identificar biomarcadores para atividade renal ou sis-
Estudos têm demonstrado a existência de uma interação entre
tema nervoso central (SNC).
o sistema imunológico periférico e o SNC no LES. Alguns marca-
dores podem ser detectados tanto no líquido cefalorraquidiano
Atividade órgão-específica (LCR) quanto na circulação sanguínea periférica7. Os anticorpos
Atividade renal está associada a uma maior morbimortalidade no antineuronais foram os primeiros anticorpos a serem investi-
LES. A fisiopatologia da nefrite ainda não é totalmente conhecida gados no LES neuropsiquiátrico (NP), especificamente IgG, que
e não temos marcadores adequados para identificar atividade re- se liga a linhas celulares de neuroblastoma. Esses anticorpos
nal, resposta ao tratamento e o prognóstico renal. A identificação têm sido associados a outras doenças neurodegenerativas, mais
de biomarcadores pode auxiliar no tratamento mais personali- notavelmente as síndromes paraneoplásicas38. Seu papel como
zado da nefrite lúpica, principalmente porque a biópsia, padrão biomarcador ainda é controverso na literatura; alguns estudos
ouro para o diagnóstico da nefrite lúpica, nem sempre é disponível mostraram uma forte associação entre esses anticorpos e formas
ou conclusiva. difusas de LES NP39,40; no entanto, outros estudos demonstraram
Na prática utilizamos complemento e anti-DNA, porém eles que os antineuronais não são sensíveis nem específicos no LES
também podem estar alterados em atividade extrarrenal, não NP. Além disso, os anticorpos antineuronais reagem com uma
sendo, portanto, considerados bons biomarcadores para atividade grande variedade de antígenos neuronais, tornando um fraco
renal exclusiva24. biomarcador para o LES NP.
Monocyte chemoattractant protein-1 (MCP-1) é uma proteína Um dos mais promissores biomarcadores neuronais é o anti-
que atrai leucócitos e está envolvida na inflamação e no dano -N-methyl-D-asparate (anti-NMDA). O componente neuronal é um
renal da nefrite lúpica25-27. Seus níveis estão elevados na nefrite anticorpo anti-DNA de dupla hélice que reage com a subunidade
em atividade e sua especificidade para distinguir nefrite ativa de NR2 de um receptor neuronal de glutamato, o receptor NMDA.
nefrite inativa e atividade extrarrenal é 76% no LES juvenil27. Es- Em geral, os anticorpos anti-NMDA (mensurados por ensaios de
tudos têm sugerido que MCP-1 urinária poderá ser útil para dis- imunoenzimáticos) são detectados na circulação periférica de,
tinguir entre diferentes classes de nefrite, sendo seus níveis mais aproximadamente, 30% dos pacientes com LES. Um notável estu-
elevados na nefrite tipo III e IV28. Porém, estudos prospectivos e do demonstrou uma associação entre anticorpos anti-NMDA e al-
em diferentes populações são necessários antes da utilização des- terações do SNC, como depressão e prejuízo da memória de curto
se biomarcador na prática clínica. prazo. Outro estudo demonstrou uma associação com depressão,
9. Petri M, Orbai AM, Alarcón GS, Gordon C, Merrill JT, Fortin PR, et al. Derivation and va-
porém, não com distúrbio cognitivo. Alguns estudos não encon-
lidation of the Systemic Lupus International Collaborating Clinics classification criteria
traram associações significativas entre anticorpos anti-NMDA e
for systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2012;64:2677-86.
manifestações do SNC em pacientes com LES. Em contrapartida, 10. Manson JJ, Rahman A. Systemic lupus erythematosus. Orphanet J Rare Dis. 2006;1:6.
estudos mais recentes mostraram níveis no LCR aumentados em 11. Manzi S, Navratil JS, Ruffing MJ, Liu CC, Danchenko N, Nilson SE, et al. Measurement
pacientes com manifestações difusas do SNC quando comparados of erythrocyte C4d and complement receptor 1 in the diagnosis of systemic lupus
com pacientes com manifestações focais ou até mesmo indivíduos erythematosus. Arthritis & Rheumatism. 2004;50:3596-604.
saudáveis. Em conjunto, esses resultados sugerem que a determi- 12. Kalunian KC, Chatham WW, Massarotti EM, Reyes-Thomas J, Harris C, Furie RA, et al.
nação de anticorpos anti-NMDA no LCR pode ser mais útil para o Measurement of cell-bound complement activation products enhances diagnostic per-
formance in systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2012;64:4040-7.
diagnóstico de LES NP do que a determinação desses anticorpos
13. Toro-Domínguez D, Carmona-Sáez P, Alarcón-Riquelme ME. Shared signatures betwe-
no soro.
en rheumatoid arthritis, systemic lupus erythematosus and Sjögren’s syndrome unco-
O anticorpo anti-P ribossomal foi descrito, pela primeira vez, vered through gene expression meta-analysis. Arthritis Res Ther. 2014;16:489.
em pacientes com LES, em 198643. Embora a maioria dos estudos 14. Bombardier C, Gladman DD, Urowitz MB, Caron D, Chang CH. Derivation of the SLE-
relate uma prevalência de 10-20% de anti-P ribossomal em pacien- DAI. A disease activity index for lupus patients. The Committee on Prognosis Studies in
tes com LES adulto, sua prevalência no LES juvenil é de 20-42%44-46. SLE. Arthritis Rheum. 1992; 35: 630-40.
Esse anticorpo tem sido associado com psicose em pacientes com 15. Liang MH, Socher SA, Roberts WN, Esdaile JM. Measurement of systemic lupus erythe-
LES47. matosus activity in clinical research. Arthritis Rheum. 1988; 31: 817-25.
16. Bencivelli W, Vitali C, Isenberg DA, Smolen JS, Snaith ML, Sciuto M, et al. Disease acti-
O papel dos processos inflamatórios no LES NP vem sen-
vity in systemic lupus erythematosus: report of the consensus study group of the Euro-
do estudado. Estudos observaram um aumento nos níveis séri-
pean workshop for rheumatology research. III. Development of a computerized clinical
cos e do LCR de citocinas em pacientes com manifestações do chart and its application to the comparison clinical chart and its application to the com-
SNC. Houve, ainda, uma associação com achados de ressonância parison of different indices of disease activity. Clin Exp Rheumatol. 1992;10:549-54.
magnética38. A interleucina (IL)-6 mostrou ter uma associação 17. Isenberg DA, Rahman A, Allen E, Farewell V, Akil M, Bruce IN, et al. BILAG 2004. De-
com psicose nos pacientes LES NP e foi relatado ainda níveis ele- velopment and initial validation of an updated version of the British Isles Lupus Asses-
vados dessa citocina, na ausência de quebra da barreira hema- sment Group’s disease activity index for patients with systemic lupus erythematosus.
Rheumatology. 2005;44:902-6.
toencefálica48. Um estudo demonstrou níveis séricos de TNF-α
18. Rönnblom L, Eloranta M-L. The interferon signature in autoimmune diseases. Curr
aumentados em pacientes com LES com transtornos de humor
Opin Rheumatol. 2013;25:248-53.
e ansiedade49,50. 19. Bennett L, Palucka AK, Arce E, Cantrell V, Borvak J, Banchereau J, et al. Interferon and
É relatado na literatura que a IL-8 pode estar envolvida na granulopoiesis signatures in systemic lupus erythematosus blood. J Exp Med. 2003;
patogênese do LES NP, pois aumenta a permeabilidade à barrei- 197:711-23.
ra hematoencefálica(51. Estudos mostraram que os níveis de IL-8, 20. Landolt-Marticorena C, Bonventi G, Lubovich A, Ferguson C, Unnithan T, Su J, et al.
tanto séricos quanto do LCR, estavam aumentados em pacientes Lack of association between the interferon-alpha signature and longitudinal changes
in disease activity in systemic lupus erythematosus. Ann Rheum Dis. 2009;68:1440-6.
com LES NP quando comparados a pacientes sem manifestações
21. Bauer JW, Petri M, Batliwalla FM, Koeuth T, Wilson J, Slattery C, et al. Interferon-regu-
de SNC e controles sadios51-53.
lated chemokines as biomarkers of systemic lupus erythematosus disease activity: a
Os mecanismos intrínsecos envolvidos no LES têm sido um validation study. Arthritis Rheum. 2009;60:3098-107.
desafio para a comunidade científica e o corpo clínico. Atualmen- 22. Jacobi AM, Odendahl M, Reiter K, Bruns A, Burmester GR, Radbruch A, et al. Correla-
te, os esforços estão dirigidos no sentido de explicar as possíveis tion between circulating CD27high plasma cells and disease activity in patients with
causas envolvidas no aparecimento da doença e no desenvolvi- systemic lupus erythematosus. Arthritis Rheum. 2003;48:1332-42.
mento de determinadas manifestações clínicas. A medicina per- 23. Liu CC, Manzi S, Kao AH, Navratil JS, Ruffing MJ, Ahearn JM. Reticulocytes bearing C4d
sonalizada visa a tratar a saúde do paciente de maneira exclusi- as biomarkers of disease activity for systemic lupus eryhematosus. Arthritis Rheum.
2005;52:3087-99.
va, levando em conta todo o seu histórico e analisando cada caso
24. Cameron JS. Lupus nephritis. Journal of the American Society of Nephrology 1999;10:
individualmente. O uso de biomarcadores pode ser de grande
413-24.
valia na identificação de atividade de doença e na identificação
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1. Neuropsicóloga. Doutoranda do Setor de Neurologia Geral e Ataxias, Agentes Financiadores: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de
Departamento de Neurologia e Neurocirurgia, Universidade Federal São Paulo (Fapesp); Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
de São Paulo. Nível Superior (Capes).
E-mail para contato: lealessi@yahoo.com.br. A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
Como citar este artigo: Alessi H. Depressão, ansiedade e disfunção de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
cognitiva no lúpus eritematoso sistêmico: da fisiopatologia à abordagem nos produtos e empresas descritos neste artigo.
neuropsicológica. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):30-4.
ativação da doença parece aumentar a vulnerabilidade para dis- tar de forma constante e permanente (ansiedade generalizada) ou
túrbios depressivos19, sendo um possível mecanismo inflamatório em crises agudas, que variam de frequência e intensidade (crises
da depressão no LES. de pânico). Os principais sintomas incluem irritação, sensações de
Exames de imagem de indivíduos com manifestações modera- angústia, agitação ou apreensão, aceleração mental, preocupações
das e severas de depressão apresentam alterações funcionais. No excessivas, generalizadas ou específicas, podendo haver também
LES, a ação de autoanticorpos contra estruturas e vasos do sistema reações físicas como taquicardia, aumento da sudorese, cefaleia,
nervoso central (SNC) provoca lesões anatômicas permanentes e mal-estar abdominal, tensão muscular, boca seca e insônia31.
formas de depressão refratárias ao tratamento. Nesses casos, exa- A ansiedade atinge mais de 40% dos pacientes com LES32, e
mes de ressonância magnética (RM) podem apresentar atrofias, pode manifestar-se juntamente com sintomas depressivos. Em
alterações de substância branca sugestivas de microangiopatia pacientes mais jovens, níveis aumentados de ansiedade são fator
ou desmielinização25, além de outras síndromes neurológicas. No de risco para o desenvolvimento de transtornos depressivos32.
entanto, a maior parcela dos pacientes possui flutuações do hu- Dano físico, elevadas doses de corticoides, dor física, fibromial-
mor, sem achados importantes nos exames de neuroimagem. Um gia, fadiga e escores reduzidos em questionários de qualidade de
interessante estudo com tomografia por emissão de fóton único vida foram associados a maiores níveis de ansiedade, assim como
(SPECT) em pacientes com LES e depressão demonstrou redução ativação da doença, independente da presença de depressão15.
do fluxo sanguíneo em regiões corticais frontais e temporais em Um estudo com pacientes sem TDM e sem uso de antidepressivos
relação ao grupo controle e ao grupo de pacientes sem manifesta- mostrou correlações positivas entre os títulos de TNF-α e IL-8 e os
ções psiquiátricas12. níveis de ansiedade, mas não com depressão33, sugerindo que os
Pacientes com LES sofrem impactos sociais, emocionais e de mecanismos fisiopatológicos da ansiedade e da depressão possam
qualidade de vida resultantes dos sintomas, do tratamento e das ser diversos.
restrições a que são submetidos. Alterações ocasionadas pela No período após o diagnóstico do LES, é comum observar o au-
doença, principalmente mudanças físicas, perda de capacidade mento da incidência de sintomas ansiosos, que advêm como rea-
profissional e funcional, alterações no aspecto da pele, ganho de ção adaptativa às mudanças ocasionadas pela doença34. O acesso
peso, alopecia, dor e deficiências físicas estão associados a maior a informações sobre o LES, seu tratamento e prognóstico tem um
impacto psicossocial26. Muitos pacientes relatam a sensação de fal- papel fundamental nesse período inicial, no qual o paciente preci-
ta de controle sobre a doença, seus corpos e seus projetos de vida. sa reformular projetos de vida e expectativas34. É importante que o
Nesse sentido, a presença dos sintomas depressivos pode inclusive profissional estimule o paciente a manifestar suas dúvidas sempre
intensificar a autopercepção e a valoração dos estigmas da doen- que possível, e lhe permita formular sua própria compreensão so-
ça27, induzindo a piora funcional geral. bre sua saúde e tratamento, ao invés de uma abordagem predomi-
Modelos humanos e animais demonstraram associação entre nantemente expositiva e informativa.
inflamação sistêmica e sintomas depressivos, inclusive no aumen- A utilização de questionários autorreferentes, como o inven-
to de tendências suicidas28. Ideações suicidas no LES variam de tário de ansiedade Beck29 (BAI), adaptado para o português, pode
10,5% a 34,4% e são um elemento relevante na investigação clí- ser útil na avaliação e acompanhamento dos sintomas ansiosos.
nica19. Indagar diretamente ao paciente sobre ideações suicidas é Escores superiores a 20 pontos são sugestivos de níveis moderados
uma estratégia eficiente de avaliação de risco. Cerca de 90% dos de ansiedade e indicam necessidade de tratamento psiquiátrico e
suicidas em geral apresentam alguma forma de doença psiquiátri- psicoterapêutico.
ca, incluindo TDM e distúrbios de abuso de substâncias28. Alguns
fatores de predisposição, como impulsividade, comportamento Disfunção cognitiva no LES
agressivo, diagnóstico de transtornos psiquiátricos e eventos ad-
A DC é uma das manifestações neuropsiquiátricas do LES e ocorre
versos na primeira infância também contribuem para o compor-
independente da presença de outras síndromes neurológicas. Seu
tamento suicida e devem ser investigados na anamnese. Eventos
curso é flutuante e atinge aproximadamente 80% dos pacientes
estressantes, como a perda do emprego, de um ente querido ou a
com formas leves a moderadas, enquanto casos de demência são
falta de controle sobre a doença, funcionam como possíveis gati-
raros22. Em alguns estudos, a DC foi associada à presença de anti-
lhos do comportamento suicida28. Tentativas prévias de suicídio
corpos antifosfolipídeo, depressão, uso de esteroides, diabetes e
são um fator preditor de risco, necessitando monitoramento e tra-
baixos níveis educacionais, mas raramente com a atividade sistê-
tamento psiquiátrico28.
mica da doença35.
Questionários de depressão, como o inventário de depressão
A fisiopatologia da DC no LES permanece em discussão e en-
de Beck29 (BDI), adaptado para o português, sugerem o grau da
volve diferentes processos fisiopatológicos, como vasculopatia,
sintomatologia (mínimo, leve, moderado e grave), e podem ser
produção de citocinas inflamatórias e ruptura da barreira hema-
úteis para mediar o diálogo com o paciente, assim como acompa-
toencefálica (BHE)36. Estudos sugerem que células da imunidade
nhar sua evolução. Escores acima de 20 pontos já indicam grau
adaptativa, infiltradas pelo espaço subaracnóideo, são capazes
de sofrimento moderado, e tratamentos psiquiátrico e psicológico
de atuar no funcionamento do SNC saudável e patológico, por
são indicados. O envolvimento da família ou da rede de apoio so-
meio da produção de substâncias pró-inflamatórias sintetizadas
cial também são determinantes para o sucesso do tratamento da
in loco28,37. A ação de autoanticorpos também contribui para a
depressão.
patogênese da DC no LES. Anticoagulante lúpico, anticorpos anti-
cardiolipina, anti-NMDA, inclusive contra o receptor NR2, abun-
Transtornos de ansiedade dante no hipocampo e na amígdala, foram associados com DC em
A ansiedade é uma resposta biológica normal do organismo, ca- paciente com LES1. Um estudo mostrou relação entre os títulos
racterizada por sensações de apreensão e desprazer, geralmente de anti-NR2 no líquido cefalorraquidiano (LCR) e maior atrofia
acompanhadas por sintomas autonômicos30. A exacerbação e per- hipocampal quando comparado a controles10. Atrofia cerebral,
severança da resposta ansiosa prejudicam a vida social e ocupacio- lesões de substância branca e AVC foram associados a piores de-
nal do indivíduo31. Os transtornos de ansiedade podem se manifes- sempenhos cognitivos2.
A DC é definida como um declínio do funcionamento mental confundidos com problemas de memória. São comuns as queixas
prévio documentado por avaliação neuropsicológica, realizada de de baixo rendimento acadêmico ou profissional, falhas na reten-
acordo com dados normativos populacionais38. O número de do- ção de informações e acontecimentos, perda frequente de objetos
mínios cognitivos alterados é um preditor de desemprego, e apro- e dificuldade de concentração em tarefas que exigem maior es-
ximadamente 40% dos pacientes abandonam o trabalho após três forço mental.
anos do diagnóstico5. A avaliação neuropsicológica utiliza testes e O processo de aquisição de novas memórias é hipocampo
tabelas de interpretação de resultados padronizados, a fim de ex- dependente e envolve três aspectos fundamentais: codificação,
plorar o funcionamento cognitivo de maneira objetiva. É um ins- armazenamento e recuperação de informações43. As alterações
trumento capaz de identificar até mesmo disfunções sutis, e pode de memória observadas nos pacientes com LES são variadas, e
ser útil para definir a extensão (focal ou multifocal) e a gravidade manifestam-se como déficits de memória episódica, semântica e
(declínio ou prejuízo) das alterações presentes38. memória de trabalho40. Indivíduos com LES apresentam desempe-
Apesar de a depressão alterar o funcionamento cognitivo, a nhos rebaixados em tarefas de memória operacional e de apren-
DC no LES não é totalmente explicada pelos sintomas depressivos. dizagem, mas costumam apresentar performance dentro dos parâ-
Um interessante estudo comparou o desempenho cognitivo de metros médios em tarefas de recordação com pistas.
indivíduos deprimidos, pacientes com LES sem depressão e com Estudos sobre preditores de DC no LES e em indivíduos idosos
depressão, e verificou falhas ainda maiores neste último grupo39. apontam para a relevância da escolaridade e da manutenção da
Pacientes com DC e RM aparentemente normal podem apresen- atividade mental no decorrer de toda a vida. Pacientes com LES
tar microlesões estruturais e alterações metabólicas de substância apresentam risco de desenvolvimento de demências aproximada-
branca, que sugerem mielopatia imunomediada subjacente, me- mente duas vezes mais elevado com relação à população geral44.
lhor identificada por espectroscopia41,49. A reserva cognitiva individual, moldada a partir de experiências
nas esferas intelectuais e emocionais, permite a alguns organis-
Avaliação dos principais domínios cognitivos no mos resistirem por mais tempo a insultos e danos cerebrais, ou
LES recuperarem-se mais prontamente45 e pode ser estimulada por
meio de ações educacionais e sociais.
O perfil da DC no LES é variado, porém apresenta envolvimento
frontal e subcortical acentuados38. A bateria neuropsicológica su-
gerida pelo ACR tem duração aproximada de uma hora e avalia os Contribuição da abordagem
seguintes domínios: atenção, memória, raciocínio abstrato, veloci- neuropsicológica para o tratamento das
dade de processamento psicomotor e funções executivas. O teste manifestações neuropsiquiátricas no LES
Montreal Cognitive Assessment (MoCA), por seu perfil executivo, é
No contexto do tratamento do paciente com LES, a abordagem
um teste de rastreio útil na identificação de alterações cognitivas
neuropsicológica oferece possibilidades de cuidado emocional,
no LES. Apresenta sensibilidade de 83% e especificidade de 73%
psiquiátrico e cognitivo, de acordo com o projeto terapêutico
na detecção de comprometimento cognitivo leve (CCL) com nota
de corte de 26 pontos42. Dificuldades na execução de atividades individual. Intervenções como a psicoterapia psicodinâmica, a
habituais, necessidade de apoio ou supervisão de terceiros para a terapia cognitivo-comportamental, treinamentos psicoeduca-
sua realização, queixas persistentes de memória e abandono das cionais, técnicas de relaxamento e meditação são práticas base-
atividades acadêmicas ou profissionais são indicativos da neces- adas em evidências para tratamento dos transtornos psiquiátri-
sidade de avaliação neuropsicológica formal, com ênfase nas fun- cos e da DC, e podem ser combinadas a fim de obter os melhores
ções executivas, no processamento de informações, na atenção e resultados.
memória. Uma metanálise com estudos randomizados sobre o efeito da
As funções executivas compreendem um complexo processa- psicoterapia em pacientes com LES mostrou redução nos níveis
mento mental, responsável por guiar a resposta adaptativa ante de ansiedade, depressão e melhora em aspectos de qualidade de
novas situações e desafios. Envolve quatro principais componen- vida, como dor, capacidade física, saúde mental, fadiga, estresse e
tes: controle voluntário; planejamento; ação voltada para um obje- atividade da doença46. As intervenções apresentaram duração mí-
tivo; e automonitoramento para o desempenho efetivo da tarefa43. nima de um mês, e incluíram métodos de terapia psicodinâmica,
Pacientes com disfunção executiva costumam apresentar dificul- terapia cognitivo-comportamental, biofeedback, aconselhamento,
dades na execução de tarefas relacionadas com o cuidado médico, treinamento de habilidades de comunicação, manejo da dor e do
como agendamento de exames e consultas em datas apropriadas, estresse. Quando associada a medicação antidepressiva, a psicote-
organização de documentos para pedidos referentes a medicação rapia promoveu o aumento da adesão e melhor resposta ao trata-
ou atestados médicos, falha na busca por soluções para viabilizar mento47, sugerindo um possível efeito top-down de regulação emo-
os tratamentos indicados, dificuldade de comparecer aos compro- cional, proporcionado pelo autoconhecimento e ressignificação de
missos no horário correto e repertório reduzido para resolução de experiências48.
problemas. Durante as consultas, podem expressar dificuldade na Técnicas de meditação apresentam potencial facilitador da
execução de tarefas que exigem diversas etapas, perda da linha neuroplasticidade e da regulação emocional, e tem sido usadas
do raciocínio durante o diálogo ou realização de uma ação, difi- como auxiliares no tratamento de diversas condições físicas e
culdade na tomada de decisões e desorganização para os aspectos mentais, incluindo transtorno obsessivo-compulsivo, ansiedade49,
práticos do cotidiano. fibromialgia e CCL. Os efeitos benéficos da meditação permane-
As alterações atencionais incidem sobre um ou mais proces- cem após a prática, e estão associados a níveis elevados e duráveis
sos subjacentes, como seleção de estímulos sensoriais relevantes, de bem-estar. Um estudo com programa de redução de estresse
capacidade de iniciação e inibição do comportamento atencional, baseado na técnica mindfulness de meditação, com duração de oito
sustentação da atenção, e ativação cerebral adequada para ma- semanas, observou aumento da densidade da substância cortical
nutenção do estado de vigilância43. Geralmente, distúrbios aten- em regiões envolvidas nos processos de aprendizagem, memória e
cionais manifestam-se como lapsos de informações, e podem ser regulação emocional50.
34. Hawro T, Krupińska-Kun M, Rabe-Jabłońska J, Sysa-Jędrzejowska A, Robak E, Bo- 43. Lezak M. Neuropsychological Assessment. 3. ed. Nova York: Oxford University Press;
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1. Professora titular de Reumatologia na Escola Paulista de Medicina da A autora não contou com apoio financeiro.
Universidade Federal de São Paulo. A autora declara não ter interesses associativos, comerciais,
E-mail para contato: eisato@unifesp.br. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
Como citar este artigo: Sato EI. Causas de mortalidade no LES e nos produtos e empresas descritos neste artigo.
estratégias de prevenção. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):35-7.
2011 (p = 0,001) nesses pacientes. Neste estudo foi observada maior Insuficiência renal e infecções foram as causas mais frequen-
mortalidade entre os homens do que entre as mulheres (2,6% vs. tes de óbitos em coorte de pacientes latino-americanos com LES12.
1,8%) e a raça negra teve 2,8 vezes mais internação por LES do que Em estudo de perfil de mortalidade em pacientes com LES na
a branca, quando comparada com a população de Washington9. França, no período de 2000 a 2009, usando causas múltiplas de
Nível de escolaridade baixo foi associado a maior taxa de morte, foram analisados 1.593 certificados de óbitos relacionados
mortalidade em poucos estudos que avaliaram essa variável10-12. ao LES. A média de idade por ocasião de óbito foi de 63,5±18,4
No estudo de Studenski et al., baixo nível de escolaridade e raça anos. Nos certificados em que o LES foi considerado causa bási-
não caucasiana contribuíram de forma independente para maior ca de morte, as causas não básicas foram: DCV (49,5%), infecção
mortalidade13. (24,5%) e falência renal (23,2%). A mortalidade associada a DCV
e doenças renais foi maior em óbitos com idade menor que 40
Causas de óbito anos, enquanto a mortalidade associada às doenças infecciosas foi
maior em indivíduos com maior idade. A razão O/E foi maior que 1
Estudos da década de 1960 realizados nos EUA referiam que cerca
para doenças infecciosas 2,96 (95% IC 2,41-3,61), DCV 1,58 (95% IC
de 36% dos pacientes evoluíam com insuficiência renal terminal,
1,42-1,76) e doenças renais 3,29 (95% IC 2,21-4,73) quando compa-
sendo a principal causa de óbito. Estudos da última década, reali-
rada aos óbitos da população geral. Óbitos relacionados ao câncer
zados em países desenvolvidos, mostram que atividade da doença
foram menos observados que na população geral [razão O/E = 0,87
é a causa de óbito em cerca de 25% dos pacientes. Infecção, que
(95% IC 0,59-1,23)]15.
era a causa de morte mais importante na era pré-antibiótico, con-
No Brasil, encontramos média de idade por ocasião da mor-
tinua sendo um grave problema mesmo nos dias atuais. O uso de
te muito mais jovem do que a observada na França (35,8 vs. 63,5
imunossupressores mais potentes tende a aumentar o risco de in-
anos). No Brasil, doenças infecciosas e doença renal foram as cau-
fecções e frequentemente infecção e atividade de doença podem
sas mais associadas à morte, enquanto a DCV foi a principal causa
coexistir, contribuindo para o óbito1.
de morte associado ao lúpus na França14,15.
Conquanto a mortalidade por doenças cardiovasculares
Em estudo de 179 pacientes com LES em hospital universitário
(DCV)seja muito frequente em pacientes com LES em países
no Brasil, com seguimento médio de 3,3 anos, ocorreram 13 óbitos,
desenvolvidos, não há muitos estudos em países em desenvol-
sendo 5 por infecção e 5 por insuficiência renal, 1 por atividade
vimento. Estudo multicêntrico mostrou que a mortalidade por
do LES, 1 por causa indefinida e apenas 1 por DCV. As principais
DCV não tem reduzido significativamente em pacientes com LES,
causas de óbito foram infecção e insuficiência renal. Em análise
como o esperado, provavelmente refletindo a complexidade da
de regressão multivariável, o uso de ciclofosfamida, a síndrome
DCV nesses pacientes. Fatores de risco tradicionalmente associa-
antifosfolípide secundária e maiores escores de dano no início do
dos ao risco de DCV, como hipertensão arterial e dislipidemia, e
estudo foram associados ao óbito16.
outros fatores associados ao lúpus como o uso crônico de esteroi-
des, a duração e a gravidade da doença parecem contribuir para
o maior risco de DCV1. Estratégias de prevenção da mortalidade
Estudos da mortalidade analisando causas múltiplas de óbito Considerando que em nosso meio a atividade da doença, princi-
permitem avaliar melhor a influência de todas as causas e fatores palmente a renal e as doenças infecciosas como a septicemia e a
circunstanciais que contribuem para o óbito, sendo importantes pneumonia, são as causas mais frequentemente associadas à mor-
principalmente em doenças crônicas, pois podem fornecer subsí- te em pacientes com LES, as estratégias de prevenção devem ser
dios para medidas que possam prevenir esse desfecho. dirigidas ao melhor controle da atividade da doença e à prevenção
O primeiro estudo avaliando causas múltiplas de morte no LES e o tratamento adequado de infecções. O uso judicioso de imunos-
foi realizado por nosso grupo, analisando os atestados de óbito do supressores e a redução de corticoesteroides para a menor dose,
Estado de São Paulo no período de 1985 a 2007, com 4.815 ates- ou, se possível, a sua retirada, devem ser sempre considerados no
tados em que constava LES como causa básica ou não básica de tratamento a longo prazo.
óbito. A média de idade por ocasião do óbito foi de 35,8±15,1 anos, O diagnóstico e o tratamento da nefrite lúpica deve ser preco-
sem diferença significativa entre os sexos. Foi observado aumento ce, seguindo as orientações da Sociedade Brasileira de Reumato-
significativo da média de idade nos últimos 5 anos do estudo em logia para o manejo da nefrite lúpica. O tratamento de indução é
relação aos primeiros 5 anos, mas, a idade média de óbito conti- feito com solumedrol 1 g intravenoso por 3 dias, associado a um
nua bem menor do que a descrita em países desenvolvidos. Infec- imunossupressor (ciclofosfamida IV ou micofenolato de mofetila
ção e insuficiência renal foram as causas mais relatadas em todos ou sódico) e prednisona por via oral, com redução para a menor
os atestados de óbitos. A insuficiência renal e a septicemia foram dose possível em seis meses. Tem o objetivo de reduzir rapida-
reportados em 5,59 e 4,48 vezes, respectivamente, mais frequente- mente o processo inflamatório renal, com redução da proteinú-
mente nos óbitos de pacientes com LES do que na população geral ria, normalização do sedimento renal e manutenção dos níveis
(O/E). O/E foi menor que 1 para os óbitos por câncer em geral. Em- de creatinina (ou seu retorno à normalidade). A terapia de ma-
bora a tuberculose não tenha sido frequentemente relatada, sua nutenção deve ser feita com imunossupressores (azatioprina ou
ocorrência foi 4,86 vezes mais frequente em óbitos com LES do micofenolato de mofetila) e em mínima dose, ou, se possível, sem
que nos óbitos da população geral14. corticoesteroides. Os imunossupressores devem ser mantidos
Com relação às DCVs, observamos razão O/E menor que 1 por cerca de 3 anos, para se evitar recidiva da nefrite. A falta de
quando analisamos os óbitos em todas as faixas etárias. Entretan- resposta ao tratamento está associada ao pior prognóstico renal
to, quando analisamos os óbitos ocorridos antes dos 50 anos de e à maior chance de evoluir com dano renal, que por sua vez está
idade, encontramos razão O/E de 4,75 (95% IC 4,24-5,31) para DCV, associada à maior chance de óbito17.
sendo 3,35 (IC 95% 2.61-4.23) para doenças cerebrovasculares e de Por outro lado, o uso de imunossupressores mais potentes, so-
2,20 (1.57-3.01) para infarto agudo do miocárdio14. bretudo em nosso meio, onde as condições ambientais são inade-
quadas, com baixo nível socioeconômico e dificuldade de acesso possível, associado a imunossupressores, é a arte que deve exercer o
ao tratamento e acompanhamento médico, aumenta o risco de in- reumatologista que trata de pacientes com LES. Controlar as comor-
fecções. Atender às recomendações de vacinação em imunossupri- bidades também é muito importante e, para isso, o reumatologista
midos e a adequada antibioticoterapia em pacientes com infeção deve ser um bom clínico.
podem melhorar esse cenário tão desfavorável para os pacientes
com LES no Brasil. Referências
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sendo 41,5% atribuído à atividade de doença associado a infecção, 8. ed. Elsevier; 2013. p. 666-75.
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ral, em nosso meio. Tratar adequadamente a atividade da doença,
morbidity in systemic lupus erythematosus patients with hyperlipidemia: A nationwide
sobretudo a nefrite, para reduzir o risco de evolução para insuficiên- population-based cohort study. Atherosclerosis. 2015;243:11-8.
cia renal, ao mesmo tempo em que se deve tratar as infecções in- 21. Soubrier M, Mathieu S, Hermet M, Makarawiez C, Bruckert E. Do all lupus patients
tercorrentes, com judicioso uso de corticoesteroides na menor dose need statin? Joint Bone Spine 2013;80:244-9.
O lúpus eritematoso sistêmico (LES), por ser uma das mais acompanhamento psicológico. Muitas vezes essas alterações,
desafiadoras doenças da clínica médica, faz com que o reumato- mesmo não sendo permanentes, são fontes de depressão. Não
logista necessite sempre estar atualizado com relação aos cons- raro ocorre rompimento de relacionamentos afetivos por fal-
tantes avanços no conhecimento de sua etiopatogenia, diag- ta de informação. Esse fato é muito comum e deve sempre ser
nóstico e tratamento. Poucos especialistas não reumatologistas lembrado.
arriscam-se a seguir o paciente com a doença. Detalhes técnicos Ainda, na linha do acompanhamento multidisciplinar, o
e experiência clínica são fundamentais e levam, cada vez mais, reumatologista não deve retardar o apoio de outras especialida-
a um melhor controle da doença, com consequente melhora da des, quando detalhes no diagnóstico e conduta assim se façam
sobrevida e da qualidade de vida. necessários. Essas trocas de informações são extremamente
O tratamento vai muito além da prescrição de medicamen- úteis no tratamento.
tos, por mais atuais e com boa base em evidências. Uma melhor compreensão de sua etiopatogenia, modernas
No acompanhamento ambulatorial, a relação médico-pa- técnicas de diagnóstico e atualização constante em seu trata-
ciente é fundamental, desde o esclarecimento sobre a doença mento são desafios que devem ser enfrentados.
até as várias opções de tratamento, muitas delas a serem toma- Com relação ao tratamento, embora cada vez mais eficien-
das em decisão compartilhada. Esclarecer o paciente sobre a temente controlamos a doença, ainda estamos longe do ideal.
doença, prestar apoio psicológico adequado e assegurar boas O LES se comporta de modo não uniforme entre os pacientes,
perspectivas em seu controle são fundamentais para a aderên- de acordo com várias condições genotípicas e fenotípicas (sexo,
cia e sucesso no tratamento. raça, idade, órgão acometido, autoanticorpos, tipo de lesão his-
O paciente necessita e tem o direito de encontrar o médico tológica, etc.). A escolha medicamentosa ainda se apoia nas con-
ou a equipe, de modo fácil e rápido. Esse detalhe dá segurança dições fenotípicas. Escolhemos as opções terapêuticas baseados
ao doente, levando a um melhor controle de exacerbações ini- na experiência clínica e nas alterações fenotípicas acima cita-
ciais. Claro que isso é alcançado mais facilmente na medicina das. Estudos de farmacogenética poderão identificar melhor
privada do que no serviço público. Esse ponto favorece um me- qual o perfil genético do paciente que responderá melhor a uma
lhor controle na primeira condição. Centros de excelência em ou outra medicação, enquanto não identificamos os desenca-
assistência e ensino têm a obrigação de igualar essas condições deantes etiológicos e determinantes genéticos precisos.
e, efetivamente, o estão fazendo. Na década de 1980, o Dr. Alfred Steinberg, então importante
O apoio psicológico ao paciente é fundamental. Compar- reumatologista do Instituto Nacional de Saúde Americano, dizia
tilhar esse apoio com a ajuda de profissionais nessa área é que, embora soubesse tratar o LES tão bem quanto qualquer
mandatório. Nas condições comuns de jovens que apresentam, outro especialista, ainda não tinha certeza qual o tratamento
devido à doença ou a seu tratamento, lesões visíveis em áreas ideal. Acho que ainda estamos nessa fase.
como a face e, com o tempo, podem apresentar inúmeras le- No entanto, com certeza, constantemente caminhamos fir-
sões, muitas delas cicatriciais, há a necessidade de constante mes ao encontro desse tratamento ideal.
1. Membro da Comissão de LES da Sociedade Brasileira O autor não contou com apoio financeiro.
de Reumatologia. Reumatologista desde 1982. O autor declara não ter interesses associativos, comerciais,
E-mail para contato: latorrel@terra.com.br. de propriedade ou financeiros que representem conflito de interesse
Como citar este artigo: Latorre LC. Lúpus eritematoso sistêmico, nos produtos e empresas descritos neste artigo.
da bancada ao consultório: opinião do especialista, desafios e
perspectivas. Rev Paul Reumatol. 2017 abr-jun;16(2):38.