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AS VIDAS

IMAGINÁRIAS
nr

MACiAINE

F. LaGard
Smith
r /
vi

A atriz Shirley MacLalne


está influenciando milhões de
leitores com seus livros.
Ela afirma que vivemos muitas vidas, que a
Bíblia ensina a reencamação, que Jesus Cristo
foi um iogue, que os seres humanos,
por eles mesmos, são deuses.

"A despeito de sermos vizinhos, aprendi nos


livros de MacLaine que estamos em mundos
distintos em nossas conclusões acerca da vida
Ela crê em reencamação, carma, comunicações
com espíritos, UFOs e extra-terrestres, enquanto
eu estou mais do que convencido de que o
Cristianismo é a chave para o significado da vida

"Achava que poderia ler os livros de MacLaine e


deixá-los passar como mera meditação, mas
alguma coisa preocupou-me. Pensei nos milhares
de pessoas ao redor do muhdo que têm
comprado seus livros sem jamais suspeitarem de
que estão lendo um manual de doutrina da
Filosofia da Nova Era. É desalentador saber que
Shirley MacLaine faz uso da Bíblia, do
Cristianismo e de Jesus na tentativa de apoiar
suas idéias.”

ISBN 0-8297-1644-0
- Seitas______
AS VIDAS
IMAGINÁRIAS
DE

Shiriey
MacLaine
F. L aG ard
S m ith
T raduzido por
Wanda de Assumpção
ISBN 0-8297-1644-0

Categoria: Seitas

Traduzido do original em inglês:


Out On a Broken Limb

Copyright © 1986 by Harvest House Publishers


Copyright © 1989 by Editora Vida

2.a impressão, 1990

Todos os direitos reservados na língua portuguesa por


Editora Vida, Miami, Florida 33167 — E. U. A.

Impresso nas oficinas da


Editora Betânia S/C
Venda Nova, MG
Este livro é dedicado às minhas irmãs
Maybeth, Beverly, Sandra e Melita,
com quem tenho tido o privilégio de partilhar
minha única vida na Terra.
Com apreciação a
Richardson R. Lynn e Cynthia Novak.
TNDTCE

Prefácio ..................................................................7
1. Vizinhos — Em Pólos O postos....................... 11
2. Lições Tiradas de uma A utópsia.....................21
3. Fascinação e Fantasia.......................................47
4. Providência e Perspectiva ............................... 69
5. Reencamação à Moda Ocidental.....................77
6. Lembrança ou Ficção....................................... 99
7. Textos Fora de Contexto ............................... 117
8. Jesus — Iogue ou Salvador? ......................... 135
9. Um Watergate da Reencamação? ................. 143
10. O Carma Indiferente....................................... 155
11. Então, Qual é a A tração?............................... 171
12. Eu, Eu e Eu ................................................... 195
13. Padrões de um Deus M enor...........................205
14. Uma Vez por Toda a Eternidade...................215
PREFACIO
Este livro é o resultado de uma breve conversa que
tive certa vez com uma jovem estudante de Direito.
Quando a vi em nosso campus, tempos atrás, ela estava
muito entusiasmada com sua nova crença na “reencar-
nação”. Quase insistiu em que eu lesse o livro “Minhas
Vidas”, da atriz Shirley MacLaine. “Se o leu”, excla­
mou ela, “deve saber muito bem de que estou falando.
No livro, ela disse tudo!” Nada me poderia ter surpreen­
dido mais do que saber que aquela jovem americana,
inteligente e culta, havia ficado fascinada pela reencar-
nação. Despertada a curiosidade, fui à livraria local
comprar “o livro da Shirley”.
Achei “Minhas Vidas” cativante e bem escrito, mas
fiquei surpreso ao perceber que as memórias da Srta.
MacLaine eram na realidade uma declaração filosófica
em favor da reencamação, da percepção da Nova Era,
e do egoísmo da geração do “eu primeiro”. Além disso,
fiquei admirado ao ver a tentativa da Srta. MacLaine
em combinar o seu eclético sistema de crenças com a
Bíblia. Fazendo uma pesquisa para um livro que havia
escrito, eu tinha acabado de passar seis anos da minha
vida lendo e estudando a Bíblia o mais detalhadamente
possível. Eu sabia que ela não ensinava a existência da
reencamação, como a Srta. MacLaine e seus mentores
espirituais indicavam, e sabia que estavam colocando
palavras nos lábios de Jesus que ele nem chegou perto
de dizer. Eu sabia que fatos históricos haviam sido
grosseiramente distorcidos num esforço de justificar as
crenças reencamacionistas.
8 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Aquele livro não era apenas a história da vida de


outra celebridade que eu podia deixar na prateleira com
um dar de ombros. Uma coisa era uma estrelíssima
escrever acerca.de sua crença pessoal na reencamação,
mas tentar enquadrá-la dentro do Cristianismo era
afrontoso demais para se deixar passar despercebido!
Quanto às explicações sobre o que nos acontecerá quan­
do morrermos, a reencamação e a Bíblia não poderíam
apresentar posições mais conflitantes. Ou vivemos
muitas vezes aqui na Terra, segundo Shirley MacLaine
acredita, ou vivemos uma única vez, segundo a Bíblia
claramente ensina. A questão não é mera especulação
acerca da vida pós-morte: a verdade acerca do que nos
acontece quando morremos vai ao fundo de nossa exis­
tência presente. Não foi muito depois de ter lido “Mi­
nhas Vidas” que a volumosa quantidade de leitura da
Srta. MacLaine tomou-se a minha volumosa quantida­
de de leitura e as inteiras noites que ela passou escre­
vendo se tomaram as noites inteiras que eu passei
escrevendo.
A necessidade de dar resposta à filosofia por ela
amplarhente divulgada tomou-se mais intensa com a
publicação de seu último livro, “Dançando na Luz”.
Nele, a atriz continua a advogar um sistema de crenças
não apenas altamente especulativo, mas também clara­
mente oposto à verdade. E a cada programa em que ela
aparece para falar acerca dos seus livros, suas idéias
reencamacionistas da “Nova Era” são captadas por
milhões de lares e corações.
Os leitores de “Minhas Vidas” e “Dançando na Luz”
têm para consigo mesmos a obrigação de examinar o
outro lado da questão — o lado que a Srta. MacLaine
não apresentou. Quem não os leu, mas está buscando
por si mesmo o significado da vida, sentir-se-á desafia­
Prefácio 9

do a uma cuidadosa investigação das questões cruciais


que a autora levantou. Este não é apenas um debate
filosófico; não é apenas uma questão de Shirley Mac-
Laine ter a sua verdade e eu a minha. Existe uma
verdade acerca da vida presente e da futura que é
absoluta, intransigente e revelada. A verdade não pode
ser ignorada com impunidade, pois é o mais profundo
significado da vida e o destino pessoal de cada um que
está em jogo.
F. LaGard Smith
CAPrruLOUM

VIZINHOS—
EM PÓLOS OPOSTOS

“Seguramente, se todo o mundo foi feito para o


homem, segue-se que o homem foi feito para mais que
todo o mundo. ”
— Pierre Alexandre Duplessis

Ergui os olhos do livro de Shirley Maclaine e olhei


para fora da janela. As corcovadas montanhas costeiras
do Sul da Califórnia, com seu manto desgrenhado de
cerrada vegetação, despencavam abruptamente para a
lagoa e a praia Malibu, onde as ondas do Pacífico se
arrebentavam numa seqüência incessante de encontro à
praia. De meu privilegiado posto de observação acima
da praia, minha própria sala de estar, não ouvia o ruído
que faziam ao quebrar. Tampouco ouvia os carros pas­
sando na Rodovia Litorânea do Pacífico como se fos­
sem uma fileira de formigas. Era como estar assistindo
a um filme silencioso.
Naquela mesma praia Malibu, a atriz Shirley Mac-
Laine havia-se debatido para descobrir o significado da
vida. O local, tão vividamente narrado por ela em suas
12 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

memórias no livro “Minhas Vidas”, constituiu o pano


de fiando para a odisséia espiritual de Shirley. Eu havia
caminhado pela mesma praia, e participado daqueles
momentos de espiritualidade, quando o poder do ocea­
no e a serenidade de um dia que chegava ao seu ocaso
levaram-me a questionar o significado da vida e do
Universo.
Não obstante, impressionou-me a ironia: Shirley
MacLaine e eu podemos ter caminhado pela mesma
praia, podemos ter sido quase vizinhos e podemos ter
tido o mesmo tipo de questionamento filosófico mas,
pelo que li em seu livro, sabia que estávamos em pólos
opostos quanto às conclusões a que chegamos a respeito
da vida. Shirley MacLaine acredita em reencamação,
carma, comunicação com entidades dos níveis astrais
através de médiuns, OVNIs e seres extraterrenos, ba­
seando-se exclusivamente em experiências subjetivas,
ao passo que eu estou cada vez mais convencido de que
o Cristianismo é a chave para se descobrir o significado
da vida e a única maneira de se compreender a realida­
de. *
Nossas diferenças apresentavam ramificações que
em muito ultrapassavam os limites de nossas reflexões
particulares. Ao olhar para Los Angeles, do outro lado
da baía de Santa Mônica, pensei nos milhares de pes­
soas que lá e em todo o mundo compraram “Minhas
Vidas”, jamais suspeitando de que iriam ler um manual
doutrinário da filosofia da Nova Era. Mais assustadores
ainda foram o uso e a interpretação errôneos da Bíblia,
do Cristianismo e de Jesus que a Srta. MacLaine fez em
defesa de suas idéias!
Fiquei mais atônito ante suas desenfreadas especu­
lações sobre vidas passadas e futuras. Há, por exemplo,
Vizinhos-Em Pólos Opostos 13

a incrível passagem em que ela fala sobre a própria


filha:

“Quando o médico a levou para mim, no leito


do hospital, naquela tarde de 1956, ela já teria
vivido muitas vezes antes, com outras mães? Ela
própria já teria sido mãe? Teria até chegado a ser
minha mãe? Seu rosto de uma hora de idade
alojaria uma alma que talvez tivesse milhões de
anos de idade?”

Após ler e reler esse livro durante os últimos meses,


e investigar as fontes das idéias da autora e do pensa­
mento oriental, cheguei à conclusão de que é difícil
entender como uma mulher com a inteligência e cultura
de Shirley MacLaine pode acreditar em tantas idéias
contraditórias e frívolas. Contudo, ela não é a única.
Milhares de pessoas estão-se voltando para a crença na
reencamação. Encontramo-nos em meio à “aurora” de
uma nova era de “iluminismo” por meio de práticas
orientais de autoconscientização e evolução espiritual.
Por séculos, conquanto duas terças partes da população
do mundo acreditassem em algum tipo de reencar-
nação, essa crença não chegou a tocar de fato a civili­
zação ocidental. As idéias de reencamação dos antigos
gregos e as de grandes religiões tais como o hinduísmo
e o budismo estiveram razoavelmente isoladas dos oci­
dentais. Agora, revestida da terminologia judaico-cristã
e destacada pela atual fascinação que envolve os fenô­
menos paranormais, a crença na reencamaçaão está-se
alastrando por toda a sociedade ocidental.
Por exemplo, em recente suplemento em cores, de
12 páginas, do jornal “The Los Angeles Times”, os Hare
Krishnas declararam que um em cada quatro america­
14 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

nos hoje em dia acredita em vidas passadas e futuras.


“A reencamação está rapidamente se tomando a mais
popular explicação para a vida pós-morte”, dizia a
propaganda. “Recente pesquisa do Gallup, nos Estados
Unidos, mostrou que atualmente mais de 30% das pes­
soas com menos de trinta anos aceitam a reencamação
como explicação para a vida após a morte.”
Contam-se aos milhares os poetas, políticos, médi­
cos, advogados e estudantes universitários que saíram
das igrejas tradicionais e estão-se voltando para versões
ocidentalizadas do pensamento religioso oriental. A
reencamação está-se tomando bem depressa a religião
dos chamados yuppies (jovens bem-sucedidos), muitos
dos quais tiveram seu interesse pela reencamação des­
pertado pelo livro “Minhas Vidas”, da Srta. Shirley
MacLaine.
A rápida expansão da reencamação— hoje a religião
que mais cresce nos Estados Unidos — apanha despre­
venidas as pessoas por ser uma crença, não um sistema
organizado. Não existe nenhum prédio da “Primeira
Igreja da Reencamação” nas esquinas, nem “missioná­
rios da causa” batendo-nos à porta. Os templos foram
substituídos por ãshrams”, salas improvisadas, reu­
niões nas casas e discussões em salas de aula. E os
“evangelistas” prosélitos entram facilmente em nossas
casas e mentes através de vasta coleção de literatura
sobre a reencamação e ampla propaganda através dos
meios de comunicação.
As celebridades do cinema, de televisão, enfim, do
mundo das diversões tornaram populares as crenças
orientais quase sem ninguém o perceber. Por exemplo,
a famosa cantora Tina Tumer acredita firmemente na
reencamação e essa crença se reflete na recente grava­
Vizinhos-Em Pólos Opostos 15

ção “Eu Podería Ter Sido Uma Rainha”, que traz versos
como “Sou um novo par de olhos, uma mente original”.
Shirley MacLaine é provavelmente a mais eficaz e
popular propagadora da causa da reencamação. Consi­
dere-se que “Minhas Vidas” esteve na lista dos livros
mais vendidos do jornal “New York Times” por mais
de 15 semanas, e que a venda de seus exemplares já
ultrapassou a casa dos dois milhões. A Srta. MacLaine
promove sua filosofia diante de milhões de espectado­
res em programas nacionais da televisão tais como
“Donahue” e “The Today Show”. Diz ela que já recebeu
mais de 40.000 cartas de leitores e telespectadores que
desejam maiores informações sobre a sua filosofia de
reencamação. “Minhas Vidas” já foi citado por outros
adeptos da reencamação como “leitura obrigatória”
para qualquer pessoa que esteja buscando respostas
para a vida. Sem dúvida, Shirley MacLaine é o flautista
de Hamelim da música de reencamação nos dias de
hoje.
O mais recente livro da Srta. MacLaine, “Dançando
na Luz”, é uma saga ainda mais chocante de suas
supostas vidas anteriores. Ela assume despreo-
cupadamente que encarnações anteriores afetaram seu
relacionamento com a família e os vários amantes. Em
“Dançando na Luz”, a Srta. MacLaine se arrisca mais
do que no primeiro livro. Sob a influência da acupuntura
psíquica, ela alega ser capaz de conversar com animais,
árvores, e uma entidade à qual dá o nome de “Eu
Superior”. Admira-me muito o fato de milhares de
pessoas acreditarem em Shirley MacLaine quando não
dariam o menor crédito a qualquer outra pessoa que
passasse pela rua dizendo ser capaz de conversar com
as árvores!
16 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

A Srta. MacLaine e eu embarcamos em nossas jor­


nadas espirituais munidos de pressuposições radical­
mente diferentes. Eu fui criado por pais cristãos
dedicados e minhas suposições básicas sempre foram
decididamente cristãs. Freqüência regular aos cultos e
estudo da Bíblia tiveram parte significativa em minha
educação. Meus anos de sério questionamento sobre a
vida — e de testar as alegações bíblicas — simplesmen­
te reforçaram minha crença no Deus Criador da Bíblia,
na morte expiadora e na ressurreição de Jesus Cristo e
na ressurreição final de todos os mortos.
Embora quando criança a senhorita MacLaine tenha
freqüentado uma igreja batista no estado de Virgínia e
tenha achado fascinante a leitura da Bíblia, ela não foi
educada para ser pessoa religiosa. Seus pais a manda­
vam à igreja aos domingos por lhes parecer ser esse o
lugar certo para ela ir. Em “Dançando na Luz”, a
senhorita MacLaine diz: “Minha dita formação batista
(que, na realidade, foi insignificante) nunca me influen­
ciou de verdade. Depois do primeiro piquenique da
igreja a que comparecí, preferi passeios em carroças
cheias de feno nos quais a gente podia namorar agarra-
dinhos.” Com seu pai, lente de psicologia e educação
na faculdade Maryland, Shirley provavelmente apren­
deu tanto sobre Platão quanto sobre Cristo. Talvez esse
fato explique o por quê de a senhorita MacLaine ter
crescido pensando, conforme diz, que Deus e religião
são mitológicos.
Na busca de um substituto espiritual para a religião
organizada, a Srta. MacLaine voltou-se para os seus
próprios pensamentos e para o misticismo oriental. O
que ela descobriu nessa procura de significado e iden­
tidade é uma forma de percepção da Nova Era e de
espiritualismo eclético. Seu espiritualismo se harmoni­
Vizinhos-Em Pólos Opostos 17

za particularmente bem com a sua crença em que as


respostas para a vida não são encontradas em nosso
apego à tecnologia, ao materialismo e às estruturas do
poder político.
Eu e a senhorita MacLaine concordamos em que
existe uma dimensão espiritual da vida e da nossa
existência. O homem é mais do que máquina e o nosso
mundo é mais do que uma experiência secular, não
importa quanto ignoremos ou neguemos esses fatos.
Mas existe grande perigo na forma como ela compre­
ende qual é a realidade do nosso mundo espiritual —
quem Deus é, como nos relacionamos com ele nesta
vida e como é a vida após a morte.
A atriz defende um sistema de crença, e por seu
intermédio, milhares de pessoas o estão aceitando, o
que trará conseqüências profundamente adversas para
quantos a ele se apegam agora, não apenas para esta
vida como também com vistas à que se segue à morte.
Quando, nos programas de televisão, os entrevistadores
questionam a filosofia de reencamação da Srta. Mac­
Laine, ela pergunta com toda a inocência: “O que você
tem a perder?” A resposta é, o que se põe em risco é a
paz com Deus nesta vida e o próprio etemo destino
espiritual!
Uma coisa é Shirley MacLaine decidir o que é ver­
dadeiro para si em sua própria vida—embora minha
preocupação com ela como ser humano me faça desejar
falar-lhe da verdade que encontrei em Jesus Cristo;
outra coisa totalmente diferente é o transmitir sua cren­
ça especulativa para tão vasta audiência, a milhares de
pessoas que estão confiando suas almas ao sistema de
crença que ela descobriu. Conforme ela disse ao entre­
vistador Phil Donahue, outros têm estado a pregar a
reencamação por séculos, mas é ela quem a está “tor­
18 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

nando mais aceitável à percepção popular”. Assim sen­


do, ela não pode com tanta facilidade negar ser respon­
sável pela crença das outras pessoas. E o que ela
promove com tanto zelo é tão espiritualmente letal que
ninguém pode se dar ao luxo de aceitá-lo sem primeiro
fazer um teste.
A Srta. MacLaine tem grande poder de persuasão.
Ao conferir-lhe um Oscar, seus colegas reconheceram
a capacidade superior de Shirley MacLaine como atriz.
Foi sua filha, Sachi, quem observou que representar é
levar alguém a acreditar no que se diz, quer seja verda­
de, quer não. Pode a audiência da Srta. MacLaine esta­
belecer a diferença entre representação no palco e
representação sobre a vida presente e a futura?
Nos programas de entrevistas, Shirley MacLaine
entra correndo no palco com ar de confiança, sorri para
a câmara e embarca num monólogo tipo podcr-do-pen-
samento-positivo. “Precisamos deixar nossa mentalida­
de materialista e atingir nosso potencial espiritual
através da autopercepção e de uma consciência mais
alta”, diz ela. “Precisamos assumir responsabilidade
pessoal por nossa vida. O ceticismo limita e o medo
governa. Precisamos livrar-nos do medo.” Se a sua.
mensagem parasse por aí, poderiamos aceitá-la parcial­
mente. Mas por trás dela existe uma difusa filosofia
mística a qual a Srta. MacLaine apenas insinua no
limitado tempo oferecido por uma breve entrevista na
televisão.
Em “Minhas Vidas”, a Srta. MacLaine tece uma
intricada tapeçaria de idéias e fenômenos aparentemen­
te desconexos — desde a morte até relacionamentos
sexuais íntimos, de médiuns que entram em transes a
curadores psíquicos, do paranormal ao metafísico, da
realidade à ilusão, das Sagradas Escrituras a lendas, e
Vizinhos-Em Pólos Opostos 19

de vidas passadas a futuras reencamações. O sistema


de crença que resulta dessa mistura em muito excede o
simples fato de uma figura pública entusiasta a pedir­
mos que adotemos uma filosofia de amor indiscrimina­
do e energia espiritual positiva.
Está Shirley MacLaine dançando na luz? Ou está
sendo cegada pelo refletor da especulação na qual se
permitiu ficar por tempo demasiadamente longo? Po­
dem as provas que ela apresenta em favor da reencar-
nação resistir a um exame crítico? E a vida apenas uma
ilusão? E a realidade apenas aquilo que cada um de nós
percebe como tal?
O livro da Srta. MacLaine insiste com seus leitores
a que considerem certas idéias bem chocantes em sua
trajetória rumo à Nova Era de iluminismo, ante as quais
cabe indagar: A sensação de déjà vú é prova de vidas
anteriores? As projeções astrais provam a capacidade
da alma de se reencamar? A verdade nos é transmitida
por seres extraterrenos ocupantes de OVNIs? Grande é
o risco de ligarmos nosso destino espiritual a um siste­
ma de fé que se baseia em experiências e especulações
tão incertas quanto o “Acredite-Se-Quiser”, de Ripley.
A busca pessoal da Srta. MacLaine a conduziu a
mentores espirituais que dizem ter acesso direto à ver­
dade e à onisciência. São esses médiuns legítimos “te­
lefones humanos” ligados a conselheiros espirituais na
esfera astral ou são impostores? Merecem eles o mais
alto prêmio por representação improvisada ou nada
mais são do que fantoches num espetáculo demoníaco?
E Shirley “a bruxa do bem”, como ela brincando já se
referiu a si própria, ou terminou por se enredar de
verdade com a bruxaria?
A reencamação é apenas a pontinha atraente do
iceberg filosófico que está sendo rebocado para dentro
20 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

de nossas vidas. O perigo existente abaixo da superfície


do eclético sistema de crença de Shirley MacLaine
precisa ser examinado e exposto, pois não é uma ques­
tão de divertimento e brincadeiras: a vida eterna e a
morte estão na balança.
CAPÍTULO DOIS

LIÇÕES TIRADAS DE
UMA AUTÓPSIA

“O homem é uma alma pequenina a carregar um


cadáver.”
— Epicteto, Fragmentos

A leitura dos livros de Shirley MacLaine não foi a


minha primeira experiência com indagações sobre a
vida e a morte. Muitas foram as ocasiões em minha vida
em que enfrentei essas dúvidas, às vezes com a inocên­
cia e o otimismo da juventude ingênua, às vezes com
luta e questionamento, às vezes com a segurança das
promessas de Deus. Mas a melhor lição que recebi
sobre a morte veio quando, jovem promotor no estado
de Oregon, assisti pela primeira vez a uma autópsia.
O necrotério era frio e esterilizado, o chão e as
paredes recobertos por azulejos desinfetados. Com o
odor de morte a reinar no ambiente, senti-me grato pela
presença, ao meu lado, do sargento grandalhão da Po­
lícia Estadual de Oregon, com um malcheiroso charuto,
embora fosse ainda bem cedo. Temia vomitar ou des­
maiar, e assim ficar desmoralizado.
22 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Não me ocorreu ser possível evitar aquele encontro


com o médico-legista. Como promotor de um municí­
pio rural no leste de Oregon, parte de minha obrigação
consistia em familiarizar-me com as circunstâncias de
cada homicídio. Mas ninguém me havia dito ser obri­
gatório assistir a uma autópsia. Suponho que eu podia
ter apenas lido o relatório do patologista, mas estranha
mistura de curiosidade e empolgada dedicação ao tra­
balho me haviam impelido rumo ao necrotério naquela
manhã.
No meio da sala, em lugar de destaque, encontrava-
-se a mesa de exames, de aço inoxidável. Sobre ela jazia
o corpo enrijecido de um rapaz de uns 25 anos. Eu e ele
tínhamos a mesma idade. Ontem, ele estava vivo, como
eu estava vivo agora. Ele não havia tido o menor pres­
sentimento de que estava vivendo seu último dia neste
mundo. Mas, naquele dia fatídico, havia brigado com a
namorada, jogado umas roupas na mala, e saído intem­
pestivamente de casa. Pouco tinha andado pela estra-
dinha rural quando a namorada veio de carro atrás dele
e, aprumando o veículo com precisão, pegou-o em
cheio pelas costas. O impacto arremessou-o por cima
do capô e da capota do carro e ele foi aterrizar com
força na estrada — retorcido, quebrado, sangrando, e
fatalmente ferido.
Agora ele estava morto. E aqui estávamos os dois,
reunidos não por causa da sua vida, mas por causa da
sua morte. Eu já havia visto cadáveres antes. Quando
criança, tinha ido a muitos enterros — alguns de paren­
tes idosos — e já tinha até cantado hinos em cerimônias
fúnebres. Mas existe grande diferença entre a morte
bem arrumadinha das funerárias e a morte cruamente
brutal que eu enfrentava naquele dia. Dava para ver as
unhas azuladas, o sangue seco, os ferimentos parcial­
Lições Tiradas de Uma Autópsia 23

mente formados, a boca frouxa, a quase imperceptível


barba sombreando o queixo inchado do cadáver. De
certa forma, era mais fácil pensar no “cadáver” do que
no “homem” — um homem demasiadamente seme­
lhante a mim para que eu pudesse sentir-me à vontade
com a sua morte. Eu jamais havia tocado um cadáver.
Fiquei a pensar em qual seria a sensação de fazê-lo.
Enquanto esperavamos que chegasse o patologista,
um ar de expectativa dominava a sala. Falava-se bai­
xinho e mal nos movíamos. Eu estava grudado à parede,
agindo como se fosse minha responsabilidade impedir
que ela caísse, mas sabendo que, na verdade, era a
parede que de fato me impedia de cair. Eu me encon­
trava tão longe quanto possível do cadáver, e não tinha
a menor intenção de chegar mais perto.
De repente, a porta do necrotério abriu-se e o D r .
Scott entrou. Animado e profissional, pegando suas
macabras ferramentas, ele nos cumprimentou com en­
tusiasmo, como se nos estivéssemos reunindo para o
café matinal do Clube dos Otimistas. Parecia que assas­
sinatos e cadáveres nada mais eram para ele do que as
ocorrências normais de qualquer profissional.
O bisturi refletiu o brilho das luzes fortes quando ele
fez a primeira rápida incisão. Um breve corte no for­
mato de um Y logo abaixo do pescoço, uma longa
incisão vertical passando pelo meio do abdômen, e toda
a cavidade peitoral ficou exposta. Aquilo não era ne­
nhuma ilustração do livro de biologia do colegial. Fas­
cinaram -m e a complexidade, a dificuldade, os
músculos, as veias, os órgãos. Fui involuntariamente
atraído para mais perto daquela máquina magistral.
Queria ver de perto os segredos da vida humana. O Dr.
Scott notou o meu interesse e partiu para uma cuidadosa
preleção sobre os aspectos básicos da anatomia. Ele
24 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

gostava de fazer o papel de professor, explicando de­


talhadamente as funções de cada órgão. Chamou-me a
atenção o que ele explicou sobre a localização dos
órgãos. Os mais vitais estavam nas áreas mais bem
protegidas e os outros estavam aninhados juntos em
íntimo companheirismo no abdômen. Lembrei-me das
palavras da Bíblia: “por modo assombrosamente mara­
vilhoso” fomos formados.
A fim de determinar a causa da morte, o patologista
precisa estudar com cuidado cada órgão. Enfiando a
mão na parte de trás da cavidade peitoral, ele a passou
por trás dos tecidos carnudos, tirando os órgãos princi­
pais para fora da abertura e colocando-os com toda a
naturalidade sobre o abdômen ainda intacto. Sem emo-
ção, ele comentou: “E como limpar um veado depois
de uma bela caçada.”
Apesar de tudo, a comparação não me enojou. Na
realidade, pareceu-me apropriada. Na morte, pouca
diferença havia entre um corpo humano e qualquer
outro corpo. Lembrei-me de como tinha sido mais fácil
chamá-lo de “o corpo” em vez de “o homem”. Foi então
que percebi: Este não era um homem, mas uma casca.
O homem já não estava ali.
Ele tinha deixado o corpo tão depressa. Quão frágil
a vida humana parecia agora! Não apenas a pessoa
podia ser separada do seu corpo a quase qualquer mo­
mento, como também esse mesmo corpo vivia num
quase constante estado de traição. Quase antes de ama­
durecer, o corpo começa a se deteriorar. O Dr. Scott
mostrou-me os sinais precoces de arteriosclerose na­
quele corpo de 25 anos, e pus-me a imaginar se o
mesmo insidioso apodrecimento se estava escondendo
em meu próprio corpo. A morte já não estava a 50 anos
de distância; encontrava-se bem à minha frente. Lem­
Lições Tiradas de Uma Autópsia 25

brei-me de outro versículo bíblico que diz ser nosso


corpo o “homem exterior”, e reconhece que esse ho­
mem exterior está em constante decomposição.
Mas a lição mais importante daquela manhã ainda
estava por vir. Eu iria compreender, pela primeira vez,
que a essência de um ser humano não é material, mas
espiritual — que “eu” não era equivalente a “meu
corpo”. Se alguém me tivesse perguntado antes daquele
dia onde minha verdadeira pessoa estava localizada
fisicamente, eu teria identificado a mente ou o cérebro
(que parece abrigar a mente). Afinal de contas, meu
processo de pensamento abriga meus sentimentos mais
íntimos.
Falamos de “questões do coração”, mas ninguém
acredita que o amor, o ódio, a culpa ou a felicidade se
encontrem literalmente no órgão que bombeia o nosso
sangue. É mais uma questão de ter dois diferentes
processos de pensamento — um mais lógico e racional
e o outro mais emocional e intuitivo, mas os dois
inseparavelmente ligados ao pensamento. O cérebro é
a sede do pensamento. E que somos nós sem o pensa­
mento? Os médicos e advogados usam até a terminolo­
gia “morte cerebral” para determinar quando a pessoa
já não está viva.
Antes de toda essa análise filosófica poder filtrar-se
através de minha mente, o patologista fez uma incisão
logo abaixo da linha do cabelo do cadáver e levantou o
couro cabeludo. A parte mais pavorosa da autópsia
estava prestes a ter início. Com uma pequena serra
giratória, o patologista rapidamente serrou uma boa
parte do crânio. Até hoje lembro-me do ruído desagra­
dável que fazia. Com a mesma presteza, ele removeu o
cérebro.
26 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Meu enjôo de estômago converteu-se prontamente


em alerta fascinação enquanto o Dr. Scott examinava o
cérebro, dizendo-nos por fim que não parecia haver
nada errado com aquele órgão. Era um cérebro normal
e saudável. “Um cérebro normal e saudável?” pergun­
tei-me. “Se é de fato um cérebro normal e saudável —
e se a vida está no cérebro -— por que o homem está
morto?”
Fiquei sabendo por experiência, pela primeira vez, o
que eu já conhecia pela fé: A pessoa que sou não está
limitada ao meu corpo. Minha personalidade não é um
produto derivado do meu cérebro, que deve morrer e se
deteriorar como o resto do meu corpo. A pessoa que sou
usa o meu corpo e se expressa por meio dele, mas é
mais do que ele. Meu corpo é apenas parte de mim —
não meu ser essencial. Minhas emoções não são meras
reações a estímulos elétricos, são mais do que isso.
Quando rio, outras coisas estão envolvidas além de
meros impulsos elétricos no cérebro comandando a
garganta e os pulmões a trabalharem juntos para pro­
duzir os sons associados ao riso. Quando choro, as
lágrimas resultam de algo além das ondas cerebrais. A
moda de se falar em funções do lado esquerdo e do lado
direito do cérebro deixa muito a desejar quando usada
para fornecer alguma explicação do que sou. E a parte
do cérebro chamada de espírito que importa.
Cada grama de peso físico que o homem na mesa de
autópsia possuía antes da morte jazia ali à minha frente.
Ele ainda tinha cada um dos órgãos e membros. Mas*
ele mesmo não estava ali. O que estava faltando naquele
corpo não era físico, nem material, nem podia ser
medido em gramas e centímetros. Havia apenas um dia,
aquele corpo tinha sido uma pessoa — com inteli­
gência, sentimentos e emoções — não apenas um orga­
Lições Tiradas de Uma Autópsia 27

nismo vivo, físico. Tampouco tinha essa pessoa sido


apenas outro animal. Os animais também possuem in­
teligência, sentimentos e emoções, mas os seres huma­
nos são mais do que animais. Os seres humanos têm
vontade própria, autopercepção e aspirações não-mate-
riais, sonhos e objetivos. Somente os seres humanos
filosofam. Somente os seres humanos anelam pelo me­
tafísico. Somente os seres humanos têm percepção de
seu Criador e se relacionam com ele. Aquele cadáver à
minha frente era uma casca abandonada, em deteriora­
ção: a pessoa já não estava nela.
Descobri uma grande verdade aquela manhã em
Oregon: embora o corpo humano seja maravilhoso e o
cérebro seja um organismo sofisticado, o espírito do
homem é mais do que o seu corpo e o espírito não fica
preso ao corpo na morte. Pelo contrário, é o espírito que
dá vida ao corpo, não o corpo que dá vida ao espírito.
Não estou dizendo que o corpo humano não tenha
valor — longe disso. Mas tampouco deve-se ficar ob­
cecado com o próprio corpo, ou com o de quem quer
que seja. A pessoa é mais do que o corpo. Nem toda a
maquiagem, cirurgia plástica, ginástica e roupas de
costureiros famosos mudarão a essência da pessoa. O
corpo é parte natural e necessária do meu ser total, mas
não sou definido pelo corpo limitado apenas a ele. A
morte retrata singularmente o fato de o espírito deixar
o corpo quando este morre.
Anos depois da experiência da autópsia, lembrei-me
do que havia sentido no necrotério, e isso influenciou
uma decisão muito pessoal que tive de tomar, quando
meu pai morreu: a de olhar ou não pela última vez o
seu corpo, na funerária. Não o olhei e nunca me arre­
pendí dessa decisão, pois meu pai não estava naquele
caixão. Minha idéia acerca da morte tinha sido radical­
28 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

mente alterada pela experiência da autópsia. Essas no­


vas percepções ajudaram a amainar o choque do passa­
mento de meu pai. “Passamento” descreve bem a morte.
Reflete uma sensação intuitiva da continuidade do es­
pírito após a morte do corpo.
Semanas se passaram e as lições da autópsia colo­
riam meu modo de pensar. Sob outro prisma passei a
ver o mundo ao meu redor. Concentrei-me no signifi­
cado da vida e nas coisas finais. Não fiquei obcecado
com considerações acerca do meu corpo e dos corpos
que me cercavam. Vi a mim mesmo e às outras pessoas
de forma diferente. Descobri-me realizando “autópsias
espirituais” nas pessoas que eu mais amava. O que fazia
com que eu as amasse? O que me atraía a elas? Era o
seu corpo físico? Era sua mente ou sua estrutura emo­
cional? Tentei enxergar como eram por dentro as pes­
soas que eram, em essência, expressas através de seus
corpos, mas não materiais em si mesmas.
Se essa idéia sobre a vida é outra forma de dizer que
não devemos olhar para as pessoas apenas como obje­
tos, sexuais ou quaisquer outros, então eu me havia
associado ao movimento. Somos seres humanos, e isso
é suficientemente maravilhoso. Muito mais significati­
vo — e crucial para se entender o que é a vida — é o
fato de sermos primeiro e acima de tudo seres espiri­
tuais.
Agimos com acerto ao dedicarmos bastante atenção
ao corpo — como o vestimos, alimentamos, exercita­
mos, instruímos, entretemos. Não é de admirar, então,
o fato de nos considerarmos primariamente como seres
físicos possuidores de natureza espiritual secundária
que não podemos quantificar ou explicar. Conforme
observou Aleksandr Solzhenitsyn, ficamos chocados se
alguém dá à própria alma tanta atenção diária quanto
Lições Tiradas de Uma Autópsia 29

ao cuidado do seu corpo. Mas esse conceito está inver­


tido. A verdade é que somos primariamente seres espi­
rituais dentro de corpos físicos bem secundários.
Jesus confirmou que somos espírito quando disse
que devemos amar a Deus de todo o coração, de toda a
alma, de todo o entendimento e força — não apenas
com nossos corpos humanos ou mesmo nossas emoções
ou intelecto, mas com o nosso eu espiritual — nossas
almas. O apóstolo Paulo também apontou para a alma
das pessoas ao perguntar retoricamente: “Por que, qual
dos homens sabe as coisas do homem, senão o seu
próprio espírito que nele está?” Paulo fez clara distinção
entre o espírito do homem e o seu cérebro e corpo.
Neste ponto, eu e Shirley MacLaine concordamos:
A pessoa que somos é mente, corpo e espírito.
Mas a atriz MacLaine errou o alvo. Enquanto muitas
pessoas focalizam o material com exclusão do espiri­
tual, ela às vezes focaliza o espiritual quase a ponto de
excluir o material. Qualquer um desses dois extremos
é desequilibrado e irrealista. O sermos seres espirituais
em um mundo material não quer dizer que o mundo
material não seja real, ou que a realidade seja apenas
aquilo que a percepção de cada um de nós diz ser.
ENCONTRO NA EUROPA
Um encontro que tive na Europa, recentemente, dei-
xou-me ainda mais consciente dos problemas inerentes
à perturbação desse delicado equilíbrio. Eu estava indo
da Alemanha para a Suíça e parei ao cruzar a fronteira
em Basiléia a fim de trocar dinheiro. No estacionamen­
to estava um rapaz alemão de mochila às costas. Achei
que era um estudante de seus 19 anos. Trajava calças
de brim e jaqueta de pano verde-escuro. Perguntou se
eu podia dar-lhe carona até Berna. A cautela que geral­
30 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

mente emprego quando me pedem carona foi superada


pelo ar de urgência em seu rosto, e por isso concordei.
Quando dei a volta para fazer o Volkswagen amarelo
que eu alugara entrar na Autobahn em direção ao sul,
as perguntas normais que os viajantes fazem começa­
ram. “De onde você é?” “Há quanto tempo está na
Europa?” “Daqui, para onde vai?” “Quando chegou
aqui?” “O que veio fazer aqui este verão?” eu disse estar
escrevendo um livro. Ao ouvir isso, os olhos de Karl
brilharam.
— É a respeito da vida presente e da futura —.
(Como explicar às pessoas que se está escrevendo um
livro sobre assuntos tão simples quanto a vida e a
morte?) Karl riu-se, mas era o tipo de riso que revelava
ter eu encontrado eco nele. Que coincidência, disse-me.
Ele estava a caminho de uma “sessão de nascimento”,
um tipo de reunião para pessoas desejosas de “entrar
em contato consigo próprias”. Estariam aprendendo a
respirar corretamente, como que “nascer de novo”.
— Por que isso é necessário? — perguntei.
— Temos de sair para fora do corpo e entrar para
dentro de nossa percepção — replicou Karl.
— Há algo errado com nossos corpos? — contrapus.
— Bem, eles não existem de verdade. Apenas pen­
samos que existem. O ego nos diz que existem e preci­
samos aprender a ignorar isso e focalizar nossa
percepção na verdadeira realidade. Deus é a verdade.
Deus está em toda a parte. Ele está em nós; está nas
árvores, e naquelas pedras lá adiante. Enós estamos em
Deus. Formamos uma só pessoa com Deus.
— Quem criou todas as coisas? — Afinal, pensei,
como pode ele sustentar que Deus é todas as coisas se
Deus é eterno e o mundo que nos cerca não é, mas, sim,
criado?
Lições Tiradas de Uma Autópsia 31

Sua resposta foi imediata: — Deus criou.


— Mas se formamos uma só pessoa com Deus —
testei-o, — nós também criamos todas as coisas?
— Sim.
— Mas como podemos ser tanto Criador quanto
criatura? — Eu realmente não compreendia como ele
conseguia acreditar em idéias tão incoerentes.
A última pergunta pareceu confundir Karl por algum
tempo, e em silêncio serpeamos pelo caminho que nos
levava através de túneis e por sobre os verdes campos
atapetados da singularmente bela zona rural suíça.
— A vida é realmente uma ilusão — começou ele
outra vez. — Somos aquilo que escolhemos acreditar
que somos. É nossa a responsabilidade de tudo o que
nos acontece.
— Você quer dizer que escolhemos viver?
— Sim.
— Também escolhemos morrer?
— Sim. A vida dura tanto quanto escolhermos viver.
Há gente que escolhe não morrer e vive de 300 a 500
anos.
Agora estávamos chegando perto, pensei. Aqui esta­
va algo que podíamos testar. — Verdade? Você já viu
gente assim?
— Não, mas já li sobre elas. Moram na índia.
(“Claro que haveríam de morar na índia”, pensei
comigo mesmo.)
Sinceramente, eu estava gostando de Karl. Não que­
ria parar nossa conversa naquele ponto em que seu
conceito a respeito do mundo estava tão distante da
realidade. Por isso, persisti em nossa despreocupada
troca de idéias. — O que acontece quando um avião
cai? Todo mundo a bordo escolhe morrer?
32 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

— Sim! — disse ele com mais ênfase do que era


necessário, como se a sublinhar sua sinceridade em face
do incrível. — Nada acontece por acidente. Não exis­
tem vítimas.
— Você quer dizer que os etíopes e seus filhos não
são vítimas? Que eles na verdade escolheram fazer
parte daquele sofrimento?
A resposta “claro” do rapaz não tinha a convicção
das afirmações anteriores. — O sofrimento é apenas
sofrimento em nossas mentes. Não é verdadeiro. É
ilusão.
— Mas é apenas ilusão quando alguém mata ou
estupra outra pessoa?
— Sim. Se alguém mata, não é por vontade íntima.
Apenas seu ego. Nossos egos nos dizem que somos
humanos, não divinos. Temos de nos livrar de nossos
egos.
Que estranha deformação! Karl havia sido manipu­
lado por seu conceito do mundo até chegar à mesma
dupla negação que vi nos livros de Shirley MacLaine:
ao negar a realidade de um mundo material, ele era
também forçado a admitir a infidelidade de nossa natu­
reza espiritual, que, como ele diria, erroneamente assu­
me a existência de um mundo material. O tempo passou
depressa e logo a linda cidade de Berna apareceu.
Brincamos um com o outro quanto a ter o nosso encon­
tro “casual” sido cosmicamente ordenado. Karl insistiu
que nada jamais acontece por acidente, e neste caso
concordei. Quando ele desceu no acostamento e deu-
-me largo sorriso de agradecimento, tive a esperança de
que não se satisfizesse com suas idéias não testadas,
mas que continuasse a buscar até conseguir encontrar
um conceito coerente do mundo que abrangesse o ma­
terial ao mesmo tempo que afirmasse o espiritual.
Lições Tiradas de Uma Autópsia 33

Por mim, encontrei esse conceito coerente do mundo


na Bíblia e através de um relacionamento pessoal com
Jesus Cristo. Do ponto de vista intelectual, descobri ser
a Bíblia objetivamente coerente com as leis da natureza,
com a conduta humana, e com meus próprios processos
racionais de pensar. Ela está em perfeito acordo com o
que conheço da história, da ciência e das descobertas
arqueológicas. Do ponto de vista emocional, identifi­
co-me pessoalmente com a altura e a profundidade da
experiência humana apresentada nas páginas da Escri­
tura. Quando Jeremias descreve, de modo comovente,
a destruição de Jerusalém pelas hordas babilônicas,
lembro-me com tristeza de ocasiões em minha própria
vida em que meus ideais e objetivos caíram por terra.
E quando Isaías descreve, de modo majestoso, como
aqueles que esperam no Senhor sobem com asas como
águias, também sinto essa sensação esfuziante. A cada
vitória que Deus me deu, alcei às alturas de euforia.
Espiritualmente, posso ver cada vez mais que Deus
está operando em minha vida; que quase diariamente
estou conseguindo novas percepções sobre a minha
vida aqui e sobre o que me acontecerá depois da morte;
que, com todos os meus defeitos, sou uma pessoa
melhor para o Senhor do que era há um ano, ou há dez
anos. Tenho a paz que vem com a perspectiva espiritual.
E obtenho essa perspectiva mediante meu relacio­
namento pessoal com Jesus Cristo, o Príncipe da Paz,
a fonte da verdadeira paz interior. Ao seguir seus ensi­
namentos e exemplo, tenho melhor orientação sobre
quais devem ser as minhas prioridades, com que proje­
tos devo envolver-me, com quem passar o meu tempo,
como gastar o meu dinheiro.
Enquanto com o passar dos anos descubro cada vez
mais a complexidade do mundo que me cerca, existe
34 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

uma coesão em minha vida que simplifica e satisfaz. O


paradigma cristão é um pacote compreensível no qual
todas as partes se encaixam. Não tenho de sair correndo
por aí agarrando freneticamente primeiro uma idéia,
depois outra — qualquer filosofia eclética que requeira
a reconciliação do irreconciliável. Minha identidade
não está presa à última moda, mania, estilo de vida. Não
preciso envidar frustradores esforços para “encontrar-
-me”. E pena eu não ter podido sentir que Karl tinha as
mesmas garantias em sua vida. Um número demasiado
grande de peças não se encaixavam, ou estavam mesmo
faltando, no pacote filosófico que ele me descreveu.
É A VIDA ILUSÓRIA?
O que Karl tínha estado a me dizer era-me por demais
conhecido. Reconhecí muitos dos mesmos conceitos
em “Minhas Vidas”. A jornada que Shirley MacLaine
empreendeu em busca do significado da vida induziu-a
a procurar diversos mentores espirituais, inclusive Ke-
vin Ryerson, uma espécie de guru espiritual e médium
da cidade de São Francisco, que diz estar em contato
psíquico com várias fontes da verdade cósmica. En­
quanto em transe auto-induzido, Kevin supostamente
faz o papel de intermediário entre seus clientes e várias
entidades espirituais ou personalidades. Diz-se que elas
existem fora deste mundo, naquilo que é chamado de
plano astral. As pessoas fazem perguntas a Kevin, e,
mediante vozes que soam artificiais, Kevin dá as res­
postas dos espíritos, os quais, diz ele, o usam como
“instrumento”. O processo é conhecido como “canali­
zação”.
Uma das entidades que Kevin “canalizou” para a
Srta. MacLaine era chamado John. (A outra entidade é
conhecida como Tom McPherson.) Ao responder às
Lições Tiradas de Uma Autópsia 35

perguntas de Shirley a respeito da vida, John concordou


com a idéia de Karl de que a realidade é distorcida por
nossos egos:
— Se as pessoas insistirem em reter seu sistema
lógico de convicção, estarão a salvo dentro da sua
própria percepção da realidade, e portanto seguras
dentro da posição de poder que ocupam, qualquer
que seja esse poder. Elas não mudarão sua per­
cepção e assim não precisarão mudar a si mesmas
ou desenvolver maior percepção de si mesmas.

— Mas que dizer da segurança do ego da pró­


pria pessoa? — [perguntou Shirley.]

— A maioria das pessoas está sofrendo de egos


alterados. Alterados pela sociedade, pela igreja e
pela educação. Seus verdadeiros egos conhecem
a verdade.

“Egos alterados” e corpos ilusórios são o extremo


oposto de uma concepção excessivamente materialista
da vida. Como pode alguém acreditar que seu corpo só
existe na mente quando a mente em si faz parte do corpo
supostamente inexistente?
Nem todos os místicos orientais concordam em que
o corpo é ilusório. De fato, as práticas da meditação
transcendental e da ioga são baseadas em parte na
correlação entre o corpo e a alma. Para se chegar à
iluminação espiritual, concentra-se a energia psíquica
através de posicionamento correto do corpo e de respi­
ração correta por parte do corpo. Na verdade, todo o
movimento da Nova Era, cujo objetivo é fazer aconte­
cer uma nova era de iluminismo humano mediante a
autopercepção a auto-orientação, é forçado a chegar à
36 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

superpercepção através de dieta, exercício e meditação.


Cresce até mesmo entre os adeptos da Nova Era o
reconhecimento de que a mente, o corpo e o espírito
são um todo unificado e simbiótico.
Não obstante, temos aqui uma contradição. Embora
Shirley MacLaine obviamente aceite a realidade do seu
corpo (talvez com maior percepção que a maioria das
pessoas, devido ‘à carreira de dançarina’, ela ainda
assim acredita firmemente na natureza ilusória de nos­
sas percepções. Ela crê que a verdade e a realidade são
relativas, existindo apenas na mente. Para a Srta. Mac­
Laine, a realidade é aquilo que cada um de nós decide
que é.
Apesar disso, a realidade objetiva se nos apresenta
todos os dias. Vemo-la no primeiro grito de uma crian­
cinha recém-nascida; no amor existente nas famílias;
nas flores; nas chuvas frescas da primavera. Fria reali­
dade existe nos tiranos, nas dores de dentes e nos
impostos. E quando um terremoto mata milhares de
pessoas, tem-se de aceitar a realidade de pessoas reais
soterradas vivas em entulhos reais de concreto, e de
membros reais das famílias que morreram de verdade.
Está certo que aqueles que se descobre estarem “fora
de contato com a realidade” sejam considerados men­
talmente desequilibrados.
Se a Srta. MacLaine estivesse apenas dizendo que
nossa ênfase errada num mundo material nos deixou
espiritualmente desequilibrados, estaria fazendo uma
importante afirmação, algo que precisamos ouvir. Mas
em “Dançando na Luz”, ela quase chega a dizer que a
percepção espiritual é tudo o que existe. Ela se coloca
ao lado daqueles que acreditam ser “o cosmo nada mais
que percepção. Que o Universo e o próprio Deus pode­
ríam não passar de um gigantesco ‘pensamento coleti­
Lições Tiradas de Uma Autópsia 37

vo.'” Ela cita também, com aprovação, a afirmativa de


Flaubert: “A realidade é algo que não existe. Somente
a percepção existe.”
O MAL É ALGO QUE NÃO EXISTE:
Um importante e necessário corolário desse conceito
é igualmente falho: ela conclui que o mal é algo que
não existe. Para ela, o mal é apenas aquilo que se pensa
que é. Seguindo esse raciocínio, ainda posso preferir
pensar que discriminação, maltrato a menores, assassí­
nios e guerra são males. Mas o que me preocupa é a
inferência de que outros podem com a mesma facilida­
de preferir pensar que essas coisas não são más. Esse
tipo de relativismo justifica as bombas dos terroristas e
as atrocidades dos nazistas.
Para ser justo, segundo Kevin, o médium amigo da
Srta. MacLaine, tal idéia socialmente irresponsável re­
fletiría ignorância espiritual por parte dessas pessoas.
Mas é a própria Srta. MacLaine quem insiste em que as
outras pessoas tenham “suas próprias percepções, sua
própria verdade, seu próprio ritmo e sua própria versão
de iluminismo. Não é possível julgar a verdade de
outrem.” Será que isso significa ter sido certo que Hitler
tivesse sua própria verdade? Não houve mal naquilo
que ele fez? É apenas nossa percepção pessoal que diz
ter sido o que ele fez um mal?
Não posso concordar com isso. Parte daquilo que
diferencia os seres humanos de todas as outras formas
de vida é a nossa consciência. Os animais podem ser
violentos, mas são incapazes de praticar um mal moral.
As pessoas, sim. Infelizmente, “julgar” a verdade de
outrem tem-se tomado para muitas pessoas, inclusive
a Srta. MacLaine, o pior dos pecados, o que não deixa
de ser em si mesmo um julgamento! Será que assim
38 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

pensam por não acreditarem na existência de uma ver­


dade absoluta, uma faixa divisória na estrada da vida?
Ou será por desejarem proteger-se contra a possibilida­
de de verem suas crenças errôneas expostas? Se alguém
julga os motivos de outra pessoa, ou se coloca na
posição de ter percepção superior que o resto do mundo
precisa seguir, então essa atitude farisaica é correta­
mente julgada pelos outros como sendo errada. Mas
quem permitiría a uma criança correr em frente de um
carro que vem em sua direção sem fazer um esforço
para avisá-la do perigo? Há julgamentos que destroem
e julgamentos que protegem.
Só por estarem as pessoas inconscientes da existên­
cia de perigo em suas vidas, quer físico, quer espiritual,
não significa que não estejam de fato em perigo. En­
quanto os passageiros a bordo do Titanic dançavam sob
a luz, a morte os espreitava logo à frente, na escuridão.
Advertir as pessoas que seguem uma filosofia do tipo
Titanic não é questão de categoricamente pôr em dúvi­
da a sua sinceridade e direito de escolher. Antes, é
contar-lhes que o que elas percebem como verdadeiro
pode ser uma falsa interpretação da verdade em si,
interpretação essa que lhes ameaça a vida.
O conceito que Shirley tem do mundo não apenas
nega os absolutos do bem e do mal como também nega
necessariamente a existência da tragédia e da dor. Afir­
ma ela: “A tragédia é tragédia porque a percebemos
como tal.” Quer ela dizer que a morte não é trágica?
Que o sofrimento não é trágico? Que relacionamentos
desfeitos não são trágicos? Se tudo o que ela quer dizer
é que aquilo que agora consideramos trágico em última
instância parecerá menos significativo na vida futura,
então eu poderia concordar. Mas a Srta. MacLaine
Lições Tiradas de Uma Autópsia 39

está-se referindo à nossa percepção presente quando


diz que a tragédia existe apenas na mente.
A PREMISSA DA AUTO-ESCOLHA
As notáveis conclusões da Srta. MacLaine estão
baseadas em ainda outra premissa, premissa essa que
eu havia discutido com o jovem Karl na Europa: Esco­
lhemos o que nos acontece, “quer fosse um caso amo­
roso, uma morte, a perda de um emprego, quer uma
enfermidade. Nós escolhemos passar por essas experi­
ências a fim de aprendermos com elas.. . ” Sentimento
semelhante é expresso por um grupo do movimento a
favor do potencial humano, segundo o qual todos esco­
lhem as suas próprias experiências. Isso aparentemente
significa que os bebês no Vietnã escolheram ser quei­
mados pelas bombas incendiárias, que a amiga com
residência logo adiante, na mesma rua em que você
mora, escolheu ser estuprada, e assim por diante. As
vítimas desaparecem, ficando em seu lugar masoquis­
tas macabros! Segundo diz a Srta. MacLaine: “Na ver­
dade, não existem vítimas. A única coisa que existe é a
autopercepção e a auto-realização.”
Por que, então, os passageiros de um avião rabiscam
rapidamente bilhetes para os seus entes queridos como
se não tivessem conhecimento de haverem escolhido
um vôo no qual os motores deixariam de funcionar? A
Srta. MacLaine deu-nos uma pista ao falar de um amigo
íntimo que estava morrendo de câncer: “Ele precisa
aceitar o fato de ter escolhido passar por essa experi­
ência, que não vai ser agradável.” Assim escolhemos,
diz a Srta. MacLaine, muito embora nem sempre este­
jamos cientes de estarmos escolhendo. Na realidade,
conforme sugere a sua declaração, teríamos de escalar
uma barreira incrivelmente alta de descrença para acei­
40 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

tarmos o fato de escolhermos perder o emprego, esco­


lhermos ficar seriamente feridos num acidente automo­
bilístico, escolhermos ter filhos que já nascem aleijados
(ao mesmo tempo que as próprias crianças estão esco­
lhendo nascer deficientes), e assim por diante. Longe
de ser uma filosofia de felicidade e realização, esta é
uma crença irracional que rouba às pessoas a auto-di-
gnidade e reduz o sofrimento humano a caprichos pes­
soais.
Não obstante, a Srta. MacLaine oferece esse concei­
to do mundo como meio de satisfação para aquele que
o adotar! Segundo ela, temos um eu superior e um eu
inferior. Aparentemente, é o eu superior que engana o
incauto eu inferior a fim de levá-lo a embarcar no
malfadado avião. “Tome o vôo 007 da linha aérea
coreana”, diz o eu superior: “será uma boa experiência
para você.” Com isso, o eu inferior obedientemente
arruma as malas, dá um beijo de despedida na esposa e
nos filhos, e sobe a bordo, inconsciente de estar colo­
cando seu destino nas mãos dos pilotos militares sovié­
ticos.
Por incrível que pareça, esse cenário traz muito
conforto a Shirley MacLaine. Para ela, acidente é coisa
que não existe; tudo o que acontece é resultado de
inexorável causa e efeito: destino. “Há sempre um
motivo”, diz ela. “Somos todos participantes de nosso
próprio drama cármico de vida em vida.”
É aqui que entra a filosofia da reencamação da Srta.
MacLaine. Segundo a autora, o eu superior existiu
desde o princípio. Ele escolheu encarnar diversas vezes
em vários corpos físicos no planeta Terra. O propósito
dessas muitas encarnações é o de aprender através da
experiência. Quando uma entidade se encarna, assume
um eu inferior capaz tanto de iluminação quanto de
Lições Tiradas de Uma Autópsia 41

ignorância. Quando o eu inferior se toma mais ilumi­


nado, evolui espiritualmente para um nível mais alto de
percepção. Quando o eu inferior manifesta ignorância,
requer mais instrução.
De acordo com a lei de causa e efeito, a pessoa recebe
a oportunidade de reencamar a fim de conseguir níveis
superiores de percepção. Essa ascensão por vezes re­
quer que o eu inferior experimente aquilo que é perce­
bido como trauma e tragédia, embora no processo de
evolução espiritual essas temidas ocorrências sejam
nada mais que aprendizado experimental. Se deixadas
por conta do eu inferior, essas lições poderiam nunca
chegar a ser aprendidas. Por isso, o eu superior escolhe
no lugar do eu inferior aquilo que este deverá experi­
mentar na esfera terrestre.
A realidade, portanto, não existe da forma como é
percebida pelo eu inferior. O mal não existe porque
mesmo as más experiências são boas para ensinar ex­
perimentalmente. Não existem vítimas — apenas deu­
ses em formação. E não existem acidentes, porque o eu
superior está escolhendo o caminho que conduz ao
esclarecimento. Tal jornada espiritual pode ser celebra­
da, diz a Srta. MacLaine, ao gozarmos uma nova era de
pensamento e percepção, a fim de podermos entender
a existência de uma realidade superior àquela que per­
cebemos. Precisamos chegar a uma percepção mais
alta, mais larga, uma percepção espiritual.
PENSAR COM COERÊNCIA
Maior percepção espiritual? Sim, precisamos dela
com urgência. Perspectiva mais larga no tocante à vida?
Sim, todos nós precisamos de ajuda nessa área, a ênfase
espiritual da Srta. MacLaine acerta bem o alvo num
mundo tão materialista. Mais clara compreensão de que
42 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

esta vida não é o nosso destino final? Certamente!


Segundo Shirley, estamos num mundo espiritual quer
admitamos, quer não. Mas é aí que eu e a Srta. MacLai­
ne nos separamos. Qualquer pessoa que enxergue a
importância de ter um conceito coerente e uniforme do
mundo com capacidade de entender a vida objetiva­
mente precisa repudiar as premissas do pensamento
oriental da Srta. MacLaine.
A vida não é uma ilusão. A verdade não é relativa. A
realidade não é apenas aquilo que eu percebo como tal,
mas sim é a realidade de um Criador inteligente e
intencional. O meu Deus, o Deus da Bíblia, é um Deus
amoroso. Ele não me provoca com uma ilusão. Não
esconde a verdade por trás das portas da relatividade.
Não ignora o mal como se este não existisse. Tampouco
me sentencia a sofrimento não mitigado. Não me aban­
dona a fim de que por conta própria consiga unir-me a
ele mediante esforços fúteis para obter auto-esclare-
cimento. Ele não me acha em falta e repetidamente me
devolve à esfera terrestre até eu conseguir fazer as
coisas da “maneira certa”. Ele não me sentencia a ficar
apalpando no meio da escuridão até encontrar a luz. Ele
é “a verdadeira luz que, vinda ao mundo, ilumina a todo
homem.”
Não, a vida humana não é ilusória. E real e é boa.
Foi feita para que a gozemos enquanto nos preparamos
espiritualmente para a que há de vir. Ninguém sabia
isso melhor do que Jesus. Embora ensinasse que deve­
mos buscar primeiro o reino espiritual, não ensinou que
devemos negar a realidade de nossa existência presente.
Ele mergulhou na realidade da vida, tanto no sofrimento
quanto no gozo que ela oferece.
Jesus, conquanto fosse Deus, foi Deus “encarnado”,
não apenas um ser espiritual a vagar pela esfera terres­
Lições Tiradas de Uma Autópsia 43

tre. Quando Tomé duvidou de que o Jesus crucificado


tivesse de fato ressuscitado dentre os mortos, Jesus
provou sua ressurreição apontando para os ferimentos
em suas mãos produzidos pelos pregos que o tinham
cravado na cruz. Não é uma ilusão, Jesus estava dizen­
do: Veja a evidência em meu corpo físico!
A alma, ou espírito, é real e o corpo é real. Corpo e
alma são intrínseca e essencialmente um. Não apenas
temos um espírito dentro de um invólucro; somos espí­
rito. Não apenas temos um corpo que contém um espí­
rito; somos corpo. E os dois — corpo e espírito — são
um. Separar o espírito do corpo antes da morte (que os
separa) é negar a sabedoria criadora de Deus ao fazer­
mos corpo e espírito, um todo unificado. Dizer que o
corpo e a alma são um não é dizer que são a mesma
coisa. A distinção é algo que facilmente reconheço
dentro de mim mesmo. Meu corpo e minha alma estão
em freqüente conflito. Quero fazer o que é certo, mas
nem sempre consigo. Muitas são as vezes em que faço
o que sei que não deveria fazer, e não faço o que sei
que deveria.
Mas a luta entre meu corpo e minha alma não é o
mesmo que o eu superior e o inferior de Shirley Mac-
Laine. Segundo ela, o eu inferior não está naturalmente
consciente daquilo que o eu superior está percebendo
ou escolhendo fazer. No conceito da Srta. MacLaine
quanto à personalidade humana, é como se existissem
dois eus, agindo separadamente, não um conflito inter­
no dentro de um único eu. Contudo, tenho o tempo todo
plena consciência do conflito em meus pensamentos,
desejos e ações. Tenho consciência de que uma parte
de mim quer voltar-se para o espiritual. Ao mesmo
tempo, tenho consciência de que outra parte de mim
deseja seguir diferente rumo. Existe importante dife­
44 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

rença entre a minha alma e o eu superior de Shirley. A


qualquer momento, sei o que a minha alma consciente
me está dizendo, ao passo que Shirley tem de aproxi­
mar-se de seu eu superior, quase como de uma pessoa
separada, através de meditação, ioga, sonhos ou acu­
puntura psíquica.
Jesus acertadamente observou o que muitos de nós
temos dito brincando: “O espírito, na verdade, está
pronto, mas a carne é fraca.” O corpo, nesse caso,
representa nossa natureza mortal, decaída. E atraído
pela parte do mundo material que reluz como ouro mas
que acaba sendo nada mais que um embuste. A alma,
por outro lado, representa aquela parte de nosso ser que
responde ao chamado de Deus, comunga com o subli­
me, e é atraída pelo espiritual, pelo eterno. Somos as
duas coisas: intelectuais e intuitivos, físicos e espiri­
tuais, bons e maus, mortais e imortais.
Maravilhosa complexidade subsiste nos seres huma­
nos. Nenhum aspecto isolado da personalidade humana
pode ser considerado adequadamente se não conside­
rarmos todas as outras partes. O físico não pode ser
enfatizado sem que seja mencionado o espiritual. O
espiritual não pode ser visto em um vácuo independente
do físico. Não existe nesta vida um abismo essencial e
insondável entre a nossa existência física e a espiritual.
Pelo contrário, a união entre os aspectos físicos e espi­
rituais é uma dinâmica criativa planejada e alimentada
pelo Deus supremo que nos criou. Se tirarmos da per­
sonalidade humana a realidade da mente ou do corpo
ou do espírito, estaremos jogando fora uma das chaves
que revela os mistérios de nossa existência.
Lições Tiradas de Uma Autópsia 45

POR QUE TROPEÇAR NO ESCURO?


À medida que o mundo material exerce influência
cada vez maior sobre nossas vidas, voltamo-nos quase
que instintivamente para o místico e o misterioso. Ao
buscarmos nossa identidade, dispomo-nos a uma longa
jornada para encontrar uma explicação, mesmo que
nossa busca nos leve ao bizarro. E muitas vezes não
temos o cuidado de peneirar e testar a chuva de crenças
conflitantes e competitivas para consumo imediato com
que somos bombardeados. Tomamo-nos presas fáceis
da exploração paranormal, e é aí que Shirley MacLaine
nos conduz — a uma região crepuscular da curiosidade,
povoada por místicos, médiuns, canais em transes, déjà
vu, percepção extra-sensorial e OVNIs.
Antes de nos lançarmos a um mundo de especulação
sobre os diferentes fenômenos estranhos que suposta­
mente sustentam a noção da reencarnação, devemos
considerar o seguinte: é divertido falar sobre OVNIs
até eles serem usados em defesa de uma filosofia difusa
de vida. Estaremos dispostos a arriscar o destino de
nossa vida eterna acreditando na existência de discos
voadores? Déjà vu é interessante e percepção extra-sen­
sorial é fascinante, mas dão-nos eles alguma garantia
de termos mais de uma vida para viver? Os médiuns
podem estar na moda e os psíquicos podem ser a última
mania, mas aonde nos estão levando? A uma vida
presente e futura significativa, ou ao desastre espiri­
tual?
CAPITULO TOES

FASCINAÇÃO E
FANTASIA

“Nunca é para qualquer um de nós uma questão de


ter fé ou deixar de ter; a questão é sempre esta: ‘em
que ou em quem depositamos fé? ”’
— Anônimo

O pacote de conceitos oferecido pelos feiticeiros


metafísicos não seria muito atraente em si mesmo, por
isso eles adoçam a oferta respondendo ao questiona­
mento natural das pessoas relativo aos mistérios que as
cercam na vida. Seres extraterrenos parecem coisa de
filmes infantis até termos uma vivida experiência com
um objeto no céu que não sabemos como explicar. A
percepção extra-sensorial parece prestidigitação men­
tal até termos uma chocante comunicação mental que
não podemos explicar. A reencamação parece um cati­
vante jogo mental para entediados estudantes de filo­
sofia até ponderarmos o difícil problema do sofrimento
dos “inocentes”. Muito do nosso mundo é misterioso.
Simplesmente não sabemos o bastante para satisfazer
à nossa curiosidade. Mas aqueles que adotam o pensa­
mento oriental tomam o caminho errado ao achar que
48 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

qualquer explicação é melhor do que nenhuma, que


qualquer tentativa de resolver os quebra-cabeças da
vida é tão válida e verdadeira quanto qualquer outra.
Como catedrático de Direito, insisto em que meus alu­
nos rejeitem explicações fáceis mas superficiais, visto
que a verdade, mesmo que seja difícil, é o que realmente
importa.
Não estou querendo dizer que necessariamente re­
jeite a validade de experiências ou percepções estra­
nhas; creio gue coisas misteriosas às vezes realmente
acontecem. A semelhança de muitas outras pessoas que
conheço, já tive experiências que não consigo explicar.
Por exemplo, certa vez quando eu estava trabalhando
até tarde, escrevendo um livro didático de Direito Cri­
minal, recebi o telefonema de uma de minhas irmãs que,
muito ansiosa, perguntou se eu estava bem. Ela havia
acabado de acordar de um apavorante pesadelo no qual
tinha visto eu me matar. Embora jamais me passasse
pela mente suicidar-me, a ironia é que, no exato mo­
mento em que ela estava sonhando, eu estava escreven­
do a parte do livro que tratava de suicídio! Numa
ocasião anterior, agindo estritamente por impulso, eu
havia telefonado a essa mesma irmã, que se encontrava
do outro lado do mundo, na hora em que ela estava
desesperada para conversar com alguém. Foram essas
duas ocorrências uma forma de telepatia mental, ou
nada mais que coincidência? Por que tem havido outras
vezes em que um de nós passou por situações mais
difíceis do que essas sem que o outro tivesse a mínima
idéia do que estava acontecendo?
Não há dúvida de que temos a tendência de ignorar
a dimensão espiritual de cada pessoa. Se isso permite
certo tipo de telepatia mental não posso ter certeza, mas
o que sei é que através da oração posso comunicar-me
Fascinação e Fantasia 49

com o Deus Criador do Universo, e que o Espírito Santo


toma possível essa comunicação. A telepatia espiritual
é uma das melhores dádivas de Deus para mim. Quando
algo em minha vida carece do seu toque especial, tenho
confiança em que ele usa a meu favor seu supremo
poder espiritual no mundo físico. Deus prometeu isso
na Bíblia, já vi acontecer na vida de outras pessoas e já
vi acontecer na minha própria vida.
A Bíblia está cheia de exemplos da dimensão espiri­
tual. Jesus conhecia os pensamentos de seus adversá­
rios mesmo antes de eles falarem. Curas físicas eram
com freqüência ligadas à condição espiritual ou fé pes­
soal do enfermo. Os dons espirituais de profecia e
interpretação permitiram aos profetas escolhidos por
Deus predizer acontecimentos futuros e proporcionar a
explicação para visões e sonhos mandados por Deus.
Alguns dos porta-vozes de Deus foram arrebatados a
uma esfera espiritual em que lhes foram mostradas
cenas de outro mundo. Mortos retomaram à vida. On­
das furiosas foram acalmadas pela voz do Mestre.
Página após página da Escritura revela exemplos do
sobrenatural. Temos acesso hoje a todas essas avenidas
espirituais? Nem sempre sabemos com clareza. Mas é
importante perceber que essas avenidas realmente exis­
tem. O universo físico no qual nos encontramos está
cercado e é permeado por um universo espiritual ainda
maior. Podemos nem sempre saber como ele funciona,
mas não podemos negar a sua presença.
Nestes últimos anos, adquiri nova apreciação pelas
admiráveis possibilidades associadas ao meu ser espi­
ritual. Apesar disso, não entendo por que a Srta. Mac-
Laine e outros oferecem as experiências paranormais
como prova da reencamação. Mesmo que duas pessoas
pudessem comunicar-se através da telepatia, que prova
50 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

seria isso de vidas anteriores ou futuras? Reconhecer a


existência de uma dimensão espiritual nesta vida nada
diz a respeito de vidas passadas. Estarmos conscientes
de poder operar numa esfera espiritual nesta vida nada
diz a respeito da possibilidade de vidas Juturas. Basear
nosso destino espiritual no especulativo e no desconhe­
cido não é viajar pela estrada que leva ao iluminismo;
é apenas apalpar no escuro.
ATRAÍDOS PELA ESTRANHEZA
As pessoas que acreditam na reencamação geral­
mente encontram apoio para sua crença no oculto, no
paranormal, na superstição e nas lendas. “Minhas Vi­
das” está repleto de referências a déjà vu, OVNIs,
projeções astrais e visões de pessoas que chegaram
perto da morte.
Naturalmente, em toda essa estranheza, alguma coi­
sa soará familiar a cada um de nós. Todos nós já
experimentamos déjà vu — a sensação de que já esti­
vemos anteriormente em dadas circunstâncias ou am­
bientes, e que estamos representando de novo uma cena
que já representamos numa ocasião anterior. Parece que
todos nós temos uma espécie de “sexto sentido” no
tocante a certas coisas ou certas pessoas — uma intui­
ção que vai além de nossos sentidos físicos normais. A
maioria de nós passou pela experiência de, ao ser apre­
sentado a certas pessoas, ter a sensação de já as conhe­
cer.
A Srta. MacLaine e seus mentores espirituais usam
o déjà vu como “exemplo de existência anterior”, em­
bora nem todos concordem a respeito de como esse
fenômeno funciona. Alguns acreditam ser ele o resul­
tado de memória celular, ou memória ancestral, na qual
herdamos as experiências anteriores de nossos antepas­
Fascinação e Fantasia 5 1

sados. Outros acreditam que a alma projeta uma época


futura e, então, quando essa época chega, ela nos faz
lembrar a antiga projeção. Os reencamacionistas re­
nhidos acreditam estar revivendo experiências de vidas
anteriores.
Minhas próprias experiências com déjà vu estão li­
mitadas a pessoas que conheci nesta vida e prédios,
carros e outros ambientes físicos que são claramente
parte da minha vida presente. Nunca vejo nada de outra
época ou lugar. Minha própria experiência não me
forneceu nenhuma prova de memória ancestral ou lem­
brança de uma vida anterior.
Alguns psicólogos oferecem a teoria de que déjà vu
é a lembrança retorcida que a mente tem de semelhante
ocorrência no passado, baseada ou numa única expe­
riência ou talvez num conjunto de experiências. Até
mesmo a Srta. MacLaine dá por encerrada a sua defesa
de maior autopercepção usando a premissa de que a
mente humana é capaz de armazenar incrível quantida­
de de informação que normalmente não consultamos.
Talvez déjà vu seja essa rara instância na qual a mente
consulta o banco da memória, como que perplexa com
a semelhança existente entre a experiência presente e a
passada.
Outros há que oferecem a teoria de ser o déjà vu um
curto-circuito elétrico no cérebro. E quase como um
acontecimento semelhante na televisão, quando ocorre
uma quebra na transmissão. A tela mostra uma série de
quadros fixos de ação imobilizada, com lacunas entre
si. Durante essas lacunas, a mente invariavelmente
tenta preencher os quadros que faltam. Isso é, afinal de
contas, o meio pelo qual os filmes conseguem funcio­
nar: a mente preenche as lacunas existentes entre os
muitos quadros fixos individuais.
52 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

O cérebro é eletrônico por natureza, recebendo e


enviando impulsos de forma muito semelhante a um
computador ou um televisor. O cérebro pode também
passar por um problema eletrônico temporário. Se isso
acontecer, não será surpreendente experimentarmos um
déjà vu logo após a lacuna na transmissão. Se pensar­
mos que já vimos anteriormente o que agora temos
diante dos olhos, é porque já vimos mesmo — frações
de segundos antes.
Nenhuma dessas explicações é inédita, e minhas
idéias não porão fim ao debate sobre déjà vu. Entretan­
to, o ponto em questão é o de que pode haver numerosas
razões além do pretenso fato da reencarnação. Não há
simplesmente nenhuma ligação lógica entre déjà vu e
reencarnação. De fato, por motivos que logo adiante
serão discutidos, a reencarnação encontra-se entre as
menos prováveis de todas as explicações.
OVNIs E ETs
Ao falarmos a respeito do estranho e do inacre­
ditável, é impossível falar sobre “Minhas Vidas” sem
mencionar que Shirley MacLaine acredita em objetos
voadores não identificados (OVNIs) e seres extraterre-
nos. Quando “John”, a suposta entidade da esfera astral,
estava sendo canalizado através de Kevin, o médium
da Srta. MacLaine, ela lhe perguntou sobre esse tipo de
fenômeno:
— E as possíveis referências extraterrenas na
Bíblia foram verdadeiras? Estou falando de Eze-
quiel e tudo aquilo.
Fascinação e Fantasia 53

— É verdade. Eles apareceram na sua Terra


naquela ocasião a fim de trazer maior conheci­
mento de Deus e do amor espiritual.
Shirley então perguntou ao próprio Kevin, seu men­
tor espiritual, o que ele achava. Acreditava ele em ETs?
— Claro — disse ele, — por que não? Não apenas são
eles mencionados por toda a Bíblia, como também
aparecem de uma forma ou de outra em quase todas as
culturas da Terra.
David, amigo de Shirley, concordou que “eles estão
por todo o Antigo Testamento. Encontramos ali toda a
espécie de descrição que, para mim e para muitas outras
pessoas, é claro, parece ser de naves espaciais.”
A Srta. MacLaine leu o que queria na Bíblia. Foi
assim que ela entendeu o acontecimento da abertura do
mar Vermelho:
No livro de Êxodo, um veículo que se movia e
guiava os hebreus para fora do Egito até o mar
Vermelho é descrito como “uma coluna de nuvem
de dia e uma coluna de fogo à noite”. A coluna
pairou sobre as águas e as dividiu, permitindo aos
israelitas escaparem para o deserto.
Mas vejamos por nós mesmos o que está escrito ali.
Então o Anjo de Deus, que ia adiante do exér­
cito de Israel, se retirou, e passou para trás deles;
também a coluna de nuvem se retirou de diante
deles, e se pôs atrás deles, e ia entre o campo dos
egípcios e o campo de Israel; a nuvem era escuri-
dade para aqueles, e para este esclarecia a noite;
de maneira que em toda a noite este e aqueles não
puderam aproximar-se.
54 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Então Moisés estendeu a mão sobre o mar, e o


Senhor, por um forte vento oriental que soprou
toda aquela noite, fez retirar-se o mar, que se
tomou terra seca, e as águas foram divididas. Os
filhos de Israel entraram pelo meio do mar em
seco: e as águas lhes foram qual muro à sua direita
e à sua esquerda (Êxodo 14:19-22).

Não encontramos aqui base para a referência a quais­


quer “veículos” que possam ter causado a divisão das
águas ao “pairar” sobre o mar. ASrta. MacLaine e seus
amigos interpretaram a passagem bíblica de maneira a
confirmar apenas aquilo que desejavam encontrar, ig­
norando totalmentc o sentido natural e o contexto da
passagem.
A interpretação que a Srta. MacLaine faz das famo­
sas visões que Ezequiel teve das rodas é igualmente
fantasiosa e não encontra nenhuma justificação na pas­
sagem. Diz ela:
No livro de Ezequiel no Antigo Testamento,
Ezequiel descreveu como era a terra vista de gran­
de altura. Ele falou sobre a sensação que teve ao
ser elevado a uma nave voadora quase como que
atraído por um ímã. Descreveu o movimento de
ida e volta do veículo como algo tão veloz quanto
um relâmpago. Referiu-se ele ao comandante da
nave como “O Senhor”.

Uma cuidadosa leitura contextual das narrativas das


visões de Ezequiel, conforme registradas nos capítulos
1 e 10 do livro de Ezequiel, mostra claramente que
Ezequiel nunca foi “erguido” para dentro de quaisquer
uma das rodas que viu — nem por algo como um ímã
Fascinação e Fantasia 55

nem por qualquer outra coisa — e que a descrição tipo


era espacial da Srta. MacLaine é apenas fantástica
invenção.
“ PROVA” FORA DO CORPO?
A Srta. MacLaine refere-se ffeqüentemente às assim
chamadas experiências de sair do corpo, que muitas
pessoas alegam ter tido, como “prova” da reencamação.
Mas essas experiências, embora fascinantes, não apre­
sentam nenhum motivo que nos obrigue a aceitar a
interpretação dada pelos reencamacionistas a esses fe­
nômenos. Não é necessário questionar a validade das
experiências pessoais dos outros a fim de se justificar
um exame cuidadoso das explicações e inferências que
possam ser oferecidas como resultado dessas experi­
ências. Honestidade naquilo que se experimenta não
significa necessariamente correção das conclusões a
que se chega.
Em primeiro lugar, nem todos os que dizem ter tido
a experiência de sair fora do corpo concordam com a
mecânica da sensação em si ou com aquilo que essa
sensação poderia estar dizendo acerca de nossas capa­
cidades físicas ou espirituais. Ainda que uma parte do
eu espiritual pudesse pairar por instantes fora do eu
corporal, a pessoa não poderia assumir que esse mesmo
espírito tivesse estado encarnado em muitos outros
seres corporais antes desta vida. O “aqui e agora” nada
prova acerca do “lá e passado”. Não importa o que mais
possam fazer, as projeções astrais não sugerem uma
existência anterior, como tampouco o faria a vcntrilo-
quia.
A “prova” da reencamação fornecida pelos relatos
de muitas pessoas que estiveram próximas da morte
também precisa ser testada. Mesmo que aceitemos es­
56 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

sas experiências como sendo inteiramente exatas, o que


é pelo menos questionável, o máximo que elas indicam
é haver uma vida após a morte. Nada há nessas experi­
ências que pelo menos sugira, muito menos prove, a
existência de uma vida antes do nascimento. E o próprio
fato de serem experiências vividas próximas da hora da
morte toma a sua contribuição para a pesquisa ainda
menos útil. Se tivessem chegado ao ponto de serem
experiências reais após a morte (experiências ocorridas
depois que o espírito deixa o corpo mortal permanen­
temente), jamais poderiamos saber o que a pessoa teria
visto de fato, já que, mesmo em nossa era de maravilhas
da medicina, os mortos não falam.
Entretanto, existe uma experiência de sair do corpo
que me dá maior percepção: a morte, o scpultamento e
a ressurreição de Jesus Cristo. Isso não é mera especu­
lação, mas sim uma questão de fato histórico. Não foi
apenas um pairar momentâneo ou um imaginar mcntal-
mente, mas uma completa separação entre o corpo e a
alma. E uma experiência de sair fora do corpo com a
qual nenhum dos casos daqueles que estiveram perto
da morte podem competir. Nenhum deles pode estabe­
lecer como fato histórico ter estado morto por três dias,
sepultado, e então ser trazido de volta ao corpo!
A experiência de sair fora do corpo que Jesus Cristo
teve, juntamente com sua ressurreição, o sobrenatural
retomo ao corpo induzido por Deus, garante a minha
própria ressurreição que se dará uma única vez por toda
a eternidade. Por ter sido Deus capaz de erguer a Jesus
dentre os mortos, confio em que ele pode erguer-me
dentre os mortos para nunca mais enfrentar a morte.
Meu futuro não está condenado a uma corrente infinda
de nascimentos e mortes num mundo material; em vez
disso, Jesus Cristo deixa bem claro que a vida após a
Fascinação e Fantasia 51

morte está inexoravelmente ligada ao relacionamento


que tivermos tido com Deus nesta única vida. Jesus
promete que aqueles que se reconciliarem com Deus
nesta vida herdarão e experimentarão a vida eterna.
DEMÔNIOS OPERANDO?
Gostaria de sugerir uma séria fonte para a manipu­
lação de experiências feita pelos adeptos da reencar-
nação, e essa fonte é a influência demoníaca. Impres­
siona-me o número de encontros que Jesus teve com
pessoas possuídas por demônios. Quem quer que fos­
sem ou o que quer que fossem, deparamo-nos com eles
por todos os registros dos evangelhos. Mas existiram
realmente os demônios, e existem hoje?
Ao examinar as muitas passagens referentes a demô­
nios, somos primeiro tentados a achar que as pessoas
nos dias de Jesus simplesmente usavam o termo “De­
mônio” para designar qualquer enfermidade, particu­
larmente as enfermidades mentais ou emocionais. Uma
inspeção mais cuidadosa, entretanto, revela que Jesus
muitas vezes curou pessoas enfermas sem nenhuma
referência a demônios. Ele via uma diferença entre
mera enfermidade e poder demoníaco, mesmo que esse
poder muitas vezes se manifestasse em perturbações
físicas. Ao curar as pessoas de surdez, mudez ou epi­
lepsia, Jesus quase sempre repreendia um demônio que
estava dentro da pessoa e literalmente ordenava-lhe a
saída. Para Jesus, os demônios não eram recurso de
linguagem figurativa para descrever condições físicas
desconhecidas: eram vivos e reais.
Na maioria dos casos, o demônio repreendido jogava
ao chão o corpo que tinha possuído e saía aos berros!
Os demônios eram claramente personalidades indivi­
duais, independentes das deficiências físicas que em
58 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

geral causavam aos possessos. Eram espíritos maus que


tinham capacidade de pensar e falar e invariavelmente
reconheciam o que Jesus era — o Filho de Deus.
Diversos demônios muitas vezes se reuniam com o
intuito de possuir alguém. Por exemplo, Jesus expeliu
sete espíritos de Maria Madalena. Em pelo menos uma
ocasião, diversos demônios expulsos por Jesus de um
homem entraram em porcos, enlouquecendo os animais
a ponto de fazê-los atirar-se num lago e morrer afoga­
dos.
Não é fácil compreender a natureza dos demônios,
mas parece que Jesus fez uma ligação entre eles e
Satanás. Certa vez, quando lhe perguntaram acerca do
poder que seus discípulos tinham sobre os demônios,
Jesus falou sobre ter visto Satanás cair do céu como um
/

raio. E como se estivesse dizendo que os demônios, à


semelhança de Satanás, eram seres angélicos rebeldes
que tinham vindo ao mundo para fazer a obra de Sata­
nás.
Teriam os demônios existido apenas durante a época
de Jesus a fim de desafiar sua autoridade espiritual
sobre a terra? Ou ainda operam no século vinte? Cer­
tamente eram ativos durante o primeiro século, mesmo
depois da morte de Jesus. Paulo, por exemplo, expulsou
um espírito mau de certa jovem cujo poder de predizer
o futuro estava sendo usado por alguns homens com
fins lucrativos.
Mesmo hoje em dia existem videntes, exatamente
como aqueles que a Bíblia identifica como colegas dos
demônios, e não são apenas ciganos em espetáculos
ambulantes. Hoje os chamamos de médiuns e são bem
aceitos — quase que vêm a ser a última moda. Eles se
especializam em servir como “canais em transe”. Em
outras eras, teriam sido conhecidos como bruxos, os
Fascinação e Fantasia 59

que faziam sessões para invocar os mortos. Hoje em


dia, no Sul da Califórnia, e em Estocolmo, na Suécia
(segundo a Srta. MacLaine relatou em “Minhas Vi­
das”), os médiuns agem como intermediários daqueles
que desejam entrar em contato com guias espirituais do
outro mundo (embora nada seja apresentado como pro­
va de que esses médiuns cumpram o que prometem).
A Srta. MacLaine descreveu o que observou de uma
entidade do outro mundo conhecida como Ambres,
supostamente canalizada através de um homem chama­
do Sture, em Estocolmo. A seguir, devido à insistência
dos amigos, a Srta. MacLaine entrou cm contato com
Kevin Rycrson. Foi Kevin quem apresentou a Srta.
MacLaine a diversos dos chamados guias espirituais da
esfera astral durante um transe na casa desta em Malibu.
As conversas da Srta. MacLaine tanto com Kevin quan­
to com as entidades que ele canalizava iam desde teo­
logia, igreja, história, fenômenos paranormais e seres
extraterrestres até reencarnação e supostas vidas ante­
riores da Srta. MacLaine. Nunca a palavra do espírito
foi posta em dúvida ou desafiada. E como se qualquer
coisa que viesse da dimensão espiritual fosse, por força,
boa e onisciente.
Os médiuns modernos não afirmam entrar em con­
tato direto com os espíritos dos mortos. Eles preferem
amistosos espíritos-guias — entidades que suposta­
mente são espíritos desencarnados da esfera astral.
Pretende-se que essas entidades já tenham vivido na
esfera terrestre numerosas vidas, em diversos corpos, e
que estejam em vários estágios de sua evolução espiri­
tual. Quase sempre, naturalmente, são seres espirituais
em alto grau de evolução, estando portanto em posição
de ensinar os menos evoluídos e atualmente encarnados
na esfera terrestre — você, eu e a Srta. MacLaine.
60 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Na tentativa de conhecer melhor o mentor de Mac­


Laine, Kevin Ryerson, li com interesse a carta de apre­
sentação que ele envia a clientes em perspectiva. Nessa
carta, Ryerson descreve seu trabalho como um segui­
mento da tradição de Edgar Cayce, cujos milhares de
escritos psíquicos na primeira metade deste século for­
neceram uma abundância sem paralelo de informação
para os reencamacionistas ocidentais. Ao contrário de
Kevin, entretanto, Cayce nunca usou entidades canaliz­
adas, mas reivindicou apenas seu próprio poder psíqui­
co. A abrangência da capacidade psíquica de Kevin
Ryerson é delineada mais minuciosamente na carta:

Canalização em transe é primariamente uma


fonte de informação. A fonte desta é um vasto
reservatório de informação chamado Mente Uni­
versal ou Registros Akáshicos. A Mente universal
é comparável à teoria do inconsciente coletivo de
C.G. Jung. Nessa teoria, o Sr. Jung declara que
todos os sistemas superiores evoluídos de pensa­
mento da humanidade (por exemplo, Arte, Filo­
sofias, Tecnologia, etc.) sobrevivem através do
tempo e do espaço. Em estado de percepção alte­
rada, Kevin consegue ligar-se ao vasto reservató­
rio da Mente Universal. Assuntos tão diver­
sificados quanto terapias naturalistas, leis físicas,
orientação profissional, até assuntos mais esoté­
ricos como a Atlântida e a reencamação são co­
mentados pelos níveis de inteligência que fluem
através de Kevin enquanto ele está servindo de
canal.

Realmente, precisamos ficar um pouco céticos quan­


to a ter acesso à “Mente Universal” através de alguém
Fascinação e Fantasia 61

que está meio dormindo em nossa sala de estar! Até


Shirley MacLaine teve dúvidas quando ouviu falar
nisso pela primeira vez. No Ashram em Calabasas (que
fica a pequena distância de Malibu por dentro do des­
filadeiro), Cat, amigo da Srta. MacLaine, explicou-lhe
sobre os médiuns que entram em transe.
— O que você acha que aconteceria? — [per­
guntou Shirley.]

— Oh — disse Cat, — geralmente, diversas


entidades se manifestam e é como se estivessem
ali na sala com você.

— E o que faço então? — [quis saber Shirley].

— Pergunte o que quiser. Eles podem contar-


-lhe a respeito de suas vidas anteriores, ou ajudar
com diagnóstico físico e com alguma dor, ou com
dietas que forem boas para as suas vibrações —
qualquer coisa que queira...

A Srta. MacLaine lembrou-se de que Ambres havia


respondido a perguntas sobre o princípio da criação.
“Ele descreveu o despertar do pensamento de Deus e a
criação da matéria. Descreveu o nascimento dos mun­
dos, e dos mundos dentro dos mundos; e universos e
universos dentro de universos.”
Tanto a recomendação que Cat fez à Srta. MacLaine
quanto a carta de apresentação de Kevin parecem dizer
que se pode ter a onisciência ao alcance das mãos.
Parece bom demais para ser verdade, não parece? Os
médiuns podem me dizer onde meu pai está neste
momento? Podem me dizer quando e como vou morrer?
Podem contar-me cada detalhe da minha vida — todas
62 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

as lembranças da infância que já estão esquecidas e que


eu gostaria muito de relembrar?
Se as vibrações dos médiuns chegam até antes da
criação, eles deveríam ser capazes de me dizer tudo o
mais. Deveríam ser capazes de me contar coisas das
quais apenas eu tenho conhecimento. Os profetas da
Bíblia, através de quem Deus falou, não apenas inter­
pretavam sonhos relacionados consigo mesmos como
também podiam descrever em detalhes um sonho mes­
mo antes de a pessoa que tinha sonhado contar-lhes a
respeito!
Quando fui a um dos Seminários de Intuição de
Kevin Ryerson recentemente, ele “entrou em transe”,
tendo convidado os presentes a lhe perguntarem o sig­
nificado de qualquer sonho que tivéssemos tido. Uma
senhora teve grande dificuldade em explicar seu sonho,
e Kevin (ou “Tom McPherson”, a entidade com quem
o diálogo estava supostamente sendo travado) teve de
repetidas vezes pedir mais detalhes. Mais tarde, pergun­
tei a “Tom” como ele conseguia acesso à Mente Uni­
versal a fim de poder explicar o significado de nossos
sonhos mas não era capaz de nos contar o sonho em si.
Sua conveniente explicação foi pouco convincente:

Duas coisas acontecem se eu tentar extrapolar


o sonho todo. Primeiro, se eu fizer isso, privo a
pessoa de muito do que ela sente; e, segundo,
remove a pessoa... se ela não passar pela sensa­
ção da descrição verbal, pode não se ligar na
análise.. . porque a análise precisa se coordenar
aos sentimentos da pessoa. E assim, o “instrumen­
to” (isto é, Kevin) fica fatigado se extrapolar toda
a informação. E algumas informações é melhor a
Fascinação e Fantasia 63

gente não divulgar... pode levar a um desequilí­


brio emocional.
A verdade é que nenhum psíquico é capaz de nos
contar os sonhos que possamos ter tido. E se tudo o que
nos podem dizer é a interpretação desses sonhos, então
essa interpretação pode tão facilmente ser inventada
quanto espiritualmente derivada. Isso explicaria de al­
guma forma o por quê de eu ter recebido uma inter­
pretação de um sonho (um sonho de verdade) que
revelei a Kevin no Seminário de Intuição, e, de numa
sessão pessoal de canalização com Kevin quatro meses
mais tarde, ele me ter dado uma interpretação diferente
do mesmíssimo sonho!
Mas às vezes os médiuns não revelam coisas surpre­
endentes acerca das pessoas, coisas que ninguém mais
podería saber? A própria Srta. MacLainc foi surpreen­
dida diversas vezes pelo fato de as entidades de Kevin
parecerem saber informação pessoal, secreta, a seu
respeito. O que podería explicar esse fenômeno?
/

E possível que jamais venhamos a saber com certeza.


Apego-me fortemente à teoria de pronunciamentos-va-
gos-e-coincidcncia, que explica a correção esporádica
dos horóscopos e de outros tipos de adivinhação. Con­
tudo, outra possibilidade bem real é a de que as pessoas
que acreditam cm canalização por meio de transe este­
jam sendo espiritualmente tapeadas. Pode ser que espí­
ritos malignos estejam envolvidos de fato.

PROVANDO OS ESPÍRITOS

Ao lidar com a esfera metafísica dos espíritos, pre­


cisamos admitir a possibilidade de existirem espíritos
do bem e espíritos do mal. Os médiuns freqüentemente
citam a Bíblia, mas existe uma passagem que jamais os
64 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

ouvi citar. Em sua primeira carta, o apóstolo João


adverte: “Amados, não deis crédito a qualquer espírito:
antes, provai os espíritos se procedem de Deus, porque
muitos falsos profetas têm saído pelo mundo afora.”
Essa passagem não é notícia de primeira página entre
os médiuns populares de hoje, talvez por nos convocar
a fazer julgamentos espirituais, o tipo de julgamento
que a Srta. MacLaine diz que não devemos fazer.
A seguir, o apóstolo João apresentou um teste que
pode ser usado para diferenciar os bons espíritos dos
maus: “Nisto reconhecereis o Espírito de Deus: todo
espírito que confessa que Jesus Cristo veio em carne é
de Deus; e todo espírito que não confessa a Jesus não
procede de Deus.”
Os mentores e os guias espirituais da Srta. MacLaine
reconhecem que Jesus viveu na carne como personali­
dade histórica humana, mas não reconhecem sua sin­
gular divindade como Cristo — isto é, o Messias,
Salvador, e Filho unigênito de Deus. O resultado de
aplicarmos o teste nesse caso para ver se os espíritos
são legítimos é bem claro.
O apóstolo Paulo também cria no mundo dos espíri­
tos malignos. De fato, Paulo via dois mundos em uma
batalha cósmica pela supremacia. Ele instou com os
cristãos da cidade de Éfeso a serem “fortalecidos no
Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a
armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as
ciladas do diabo; porque a nossa luta não é contra o
sangue e a carne, e, sim, contra os principados e potes-
tades, contra os dominadores deste mundo tenebroso,
contra as forças espirituais do mal, nas regiões celes­
tes.”
Os espíritos podem estar tentando lograr-nos, fazen­
do-nos pensar que, se colocarmos um médium em nossa
Fascinação e Fantasia 65

bolsa ou bolso, teremos pronto acesso a uma tal Mente


Universal, como se fosse um banco de 24 horas. Os
espíritos malignos podem ter acesso a suficiente conhe­
cimento cósmico para nos atormentar com o paranor­
mal e com lendas, superstições, e maravilhosas
partículas de informação acerca de vasta quantidade de
questões insignificantes de nossas vidas — e, contudo,
fornecer respostas enganosas e espiritualmente letais às
nossas necessidades espirituais.
Kevin admitiu para a Srta. MacLaine que a Bíblia
proíbe a consulta a médiuns, mas jogou despreo-
cupadamente as proibições bíblicas pela janela, afir­
mando serem apenas uma parte que interessa aos
cristãos usar contra a reencamação. Na realidade, até
as Escrituras do Antigo Testamento colocam os mé­
diuns em má companhia.

Não se achará entre ti quem faça passar pelo


fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador,
nemprognosticador, nem agoureiro, nem feiticei­
ro; nem encantador, nem necromante, nem mági­
co, nem quem consulte os mortos (Deuteronômio
18:10,11).

A conexão entre as várias práticas acima parece


forçada, mas não é. O que todas têm em comum é o
esforço de obter perfeição espiritual através de outros
meios que não o Deus único e verdadeiro que revelou
a si mesmo — e à verdade — unicamente em Jesus
Cristo e nos ensinamentos da Bíblia. Se a verdade é
revelada exclusivamente em Jesus Cristo, então dirigir-
-se a qualquer outra fonte espiritual pode tão-somente
ser sabotagem espiritual auto-induzida, resultando em
uma vida de insatisfação e separação eterna de Deus.
66 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

A Bíblia proíbe a consulta a médiuns não por não


existirem espíritos capazes de invadir a esfera terrestre,
mas porque realmente existem espíritos mais do que
dispostos a invadir a esfera terrestre a fim de ludibriar-
-nos acerca de nossa origem, propósito e destino. Não
são os espíritos de nossos queridos que já partiram. São
espíritos em franca rebelião contra Deus. Quando tra­
tamos com médiuns, antigos ou modernos, estamos
buscando sabedoria na fonte errada. Quando tratamos
com médiuns, não temos garantia de obtermos a fórmu­
la espiritual correta para a nossa felicidade, crescimento
e destino final. Deus deseja que busquemos a ele e à
sua Palavra revelada para estarmos seguros de conhecer
a verdade que nos liberta.
Os médiuns modernos provavelmente ririam da su­
gestão de que estão envolvidos com bruxaria. Os sofis­
ticados sul-califomianos discordariam de que seja
bruxaria consultar seus videntes, astrólogos, curandei­
ros, conselheiros metafísicos e médiuns com suas amis­
tosas “entidades”. E, às vezes, acredito parcialmente
neles. As vezes pergunto-me se os americanos que
vivem na ociosidade não estão simplesmente atirando-
-se a jogos mentais para os mortalmente entediados. O
folheto de propaganda da psíquica Ruth Maybruck cita
a atriz Cloris Leechman [sic] como tendo escrito: “Ruth
— sua leitura astuta foi absoluta e surpreendentemente
correta. Além disso, você é divertida! Passar duas horas
com você é um prazer.” E “Sandy” escreveu: “O pes­
soal que vem às minhas festas mal pode esperar por
suas próximas leituras. Estão sempre a me perguntar
‘Quando será a próxima?”’
Divertimento? Festas? É disso que se trata esse ne­
gócio de psíquicos? Se nada mais fosse que divertimen­
to e brincadeira, ninguém se importaria com o que as
Fascinação e Fantasia 67

pessoas fazem com seu tempo e dinheiro. Mas existe


um sério risco nessa brincadeira. Para aqueles que
levam os psíquicos e os médiuns a sério — e há muita
gente que o faz — não é uma questão de teologia
opcional ou simples escolha de estilo de vida. Essas
pessoas estão participando de um mundo maligno e
terminarão envolvidas em toda a esfera que está sob a
jurisdiçãos de Satanás.
Ninguém pode afirmar categoricamente que todos os
médiuns sejam instrumento de Satanás, nem que todas
as entidades que eles alegam canalizar sejam sempre
demoníacas. (As “entidades” de Kevin Ryerson me
fizeram querer rir mais do que estremecer.) Muitos
médiuns são apenas peritos em imaginação e criativi­
dade, procurando alcançar os ingênuos a fim de rechear
a carteira ou satisfazer ao ego. Mas quer seja essa a sua
intenção, quer não, os médiuns estão fazendo a obra do
diabo.
CAPÍTULO QUATRO

PROVIDÊNCIA E
PERSPECTIVA

“Quanto mais eu vivo, mais fé na Providência, e


menos fé tenho em minha interpretação da Providên­
cia."
— Jeremiah Day

Li com grande interesse o relato da crescente con­


vicção que a Srta. MacLaine foi sentindo de que escre­
vería “Minhas Vidas”. A sensação veio devagarinho
mas inegavelmente. Houve uma hora em que Shirley
sentiu-se como que “um novelo de vibrante confusão”,
questionando-se a seu próprio respeito se “talvez o
propósito daquela coleção particular de átomos contor­
cendo-se ali na cama seria o de transmitir a men­
sagem. . . ”
A Srta. MacLaine relata por todo o seu livro as muitas
trocas de idéia que teve com seu amigo David, que se
tomou um de seus mentores espirituais. Eles compar­
tilharam livros, aulas de ioga, caminhadas pela praia e
pêssegos suculentos enquanto David aos poucos levou
a Srta. MacLaine a crer na reencamação, em OVNIs e
seres extraterrenos. David convidou Shirley para ir aos
70 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Andes peruanos, onde empreenderam longas caminha­


das pelas montanhas, tomaram borbulhantes banhos
quentes, e abandonaram-se às asas da imaginação. Foi
nesses dias que David fez Shirley enxergar qual era a
sua missão, se ela resolvesse aceitá-la. Mas teria ela
escolha?
— Em resumo, Shirley, sua missão é ensinar.
Como eu. Mas numa escala muito mais ampla.

— Uma escala mais ampla?

— Sim.

— O que quer dizer? Não sei ensinar. Não


tenho paciência. Gosto de aprender.

— Sim, mas você gosta de escrever, não gosta?

— Oh, meu Deus — pensei. — Espera-se que


eu escreva um livro sobre tudo isto? Será que
inconscientemente planejei escrever? Era por isso
que eu levava o gravador comigo por toda a parte
e tomava notas ao fim de cada dia?

Está Shirley MacLaine a nos dizer que ela estava de


algum modo destinada ou separada por algo ou por
alguém da esfera astral para escrever “Minhas Vidas”?
David disse que sua amiga Mayan, uma mulher extra­
terrestre vinda de um grupo de estrelas conhecidas
como Plêiades, achava que, devido à “aptidão mental
particular” de Shirley, a Srta. MacLaine “podería es­
crever uma narrativa muito interessante e informativa
de [sua] excursão pessoal por esses assuntos e talvez
ao mesmo tempo ensinar as pessoas.”
Providência e Perspectiva 71

A MINHA MISSÃO
Acho que conheço a sensação de ter sido incumbido
de uma missão. Há alguns anos, comecei a tarefa de
organizar cronologicamente a Bíblia. Estou certo de
que nunca teria iniciado ou completado esse trabalho
sem o impulso de uma força maior do que eu. E, da
mesma forma que a Srta. MacLaine, sei que eu não era
o candidato mais indicado para essa tarefa. Mas, quan­
do olho para trás, posso ver as peças do quebra-cabeças
se encaixando umas nas outras.
Quando eu era adolescente, meu pai, que era pastor,
plantou uma semente que não deu fruto até 25 anos mais
tarde. Enquanto atravessávamos o estacionamento de­
pois de um culto dominical, ele disse apenas: “Alguém
deveria colocar a Bíblia na seqüência certa.” Isso é tudo
o de que me recordo daquela conversa, e não me lembro
de jamais termos tocado no assunto novamente.
O que Papai queria dizer certamente não repre­
sentava nenhum mistério para mim. Eu conhecia a
dificuldade que a maioria das pessoas encontra ao ler a
Bíblia. A menos que se tenha bons conhecimentos de
história, cultura e da ordem cronológica da antigüidade,
a Bíblia pode parecer um tanto confusa.
Muitos anos mais tarde, uma amiga íntima resolveu
ler a Bíblia de capa a capa. Ela tinha pouco conheci­
mento bíblico anterior e a leitura tomou-se difícil. Du­
rante o seu paciente esforço para compreender o que
lia, a idéia de meu pai voltou-me à mente: “Alguém
deveria colocar a Bíblia na seqüência certa.” Papai tinha
razão — alguém deveria fazer isso. Para falar a verdade,
eu mesmo gostaria de ter uma Bíblia assim!
Após seis anos e centenas de horas de trabalho,
chegou enfim a hora de eu ir a Grand Rapids, no estado
72 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

de Michigan, para ver o primeiro lote de A Bíblia


Narrada sair da impressora.
Trabalhar nesse projeto foi uma grandiosa experi­
ência de aprendizado para mim à medida em que eu me
aprofundava na Bíblia. Antes de mais nada, descobri
com certeza que não existem contradições bíblicas, ao
contrário das alegações que se ouvem com tanta fre­
quência. O que descobri foi uma incrível harmonia no
relato da forma como Deus se tem relacionado com a
raça humana desde o princípio dos tempos. A maneira
pela qual Deus operou através de nações e indivíduos
a fim de realizar a sua vontade para o mundo impres­
sionou-me. Fiquei convencido de que Deus não havia
parado no primeiro século, mas ainda estava operando
a sua vontade até hoje. Defrontei-me com o Deus dinâ­
mico que amava seu povo, cuidava dele e até interagia
com ele.
Com o decorrer do tempo, o projeto deu umas voltas
interessantes. Quando cheguei às leis de Moisés, cedi
ao irresistível impulso do professor de Direito: tomei
as várias leis e as reuni em um código legal unificado
de acordo com o assunto. Arranjei também os salmos
em diversos agrupamentos temáticos e apresentei os
cerca de seiscentos provérbios por tópicos. Para a his­
tória dos reis, consolidei as passagens paralelas e depois
inseri os profetas nesse registro histórico no momento
exato em que eles profetizaram.
No Novo Testamento, reuni as narrativas dos quatro
Evangelhos em um único relato em ordem cronológica.
E inseri as cartas de Paulo nos eventos registrados no
livro de Atos. Vendo a necessidade de harmonizar o
texto bíblico que agora tínhamos, coloquei uma breve
narração explicativa no início de cada secção. Essa
narração foi o que acabou dando ao livro o nome.
Providência e Perspectiva 73

Estava Deus operando na produção de A Bíblia Na­


rrada'? Sei que, se tivesse ficado exclusivamente por
minha conta, o livro não teria sido escrito. Em muitos
aspectos, não tinha sentido para mim, já que existem
tantos estudiosos da Bíblia que teriam sido uma escolha
mais provável para essa tarefa.
Entretanto, escrever o livro foi como ajuntar as pro­
vas para um caso, o que eu tantas vezes fizera quando
no cargo de promotor. Como professor, o que mais faço
por meus alunos é organizar, sintetizar, e simplificar.
Era isso o que o projeto requeria.
Há alguns anos, minha atual editora de texto, Eileen,
havia sido admitida à faculdade de Direito onde lecio­
no. Pouco antes do início das aulas, ela foi convidada
a fazer parte da equipe da publicadora Harvest House.
Acontece que, em vez de tomar-se uma de minhas
alunas, ela tornou-se uma colega indispensável na pro­
dução do livro. Estava Deus operando por trás dos
bastidores na vida de Eileen a fim de envolvê-la no
projeto?
Dois outros fatores existentes em minha vida tiveram
influência direta no fato de ter sido eu o autor de A Bíblia
Narrada. O primeiro relaciona-se com uma moça com
quem certa vez pensei cm me casar. Por meio de incrível
série de circunstâncias, ela conheceu outro homem com
quem se casou. Acontece que jamais me casei. E em
retrospecto posso ver as muitas maneiras pelas quais
Deus tem usado o meu celibato em sua obra, inclusive
a liberdade que tive para trabalhar em A Bíblia Narrada.
O segundo acontecimento que creio possa ter sido
parte da providencia divina em minha vida foi a morte
de meu pai. Não é incomum um homem morrer de
ataque cardíaco aos 63 anos de idade. Mas tenho a
certeza de que seu livro jamais teria sido escrito se ele
74 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

não tivesse morrido. Creio que uma fase do ministério


de meu pai provavelmente teve de encerrar-se a fim de
que a próxima começasse.
ABERTO À VERDADE
Podemos ser usados de maneiras que jamais tería-
mos esperado pelos bons ou maus espíritos — por Deus
ou por Satanás. Precisamos estar abertos à possibilidade
de Deus nos usar para realizar o bem final, da mesma
forma que precisamos estar abertos à realidade de que
Satanás está realmcnte trabalhando para obter controle
sobre este mundo. Contudo, Deus já tem esse controle
e está trabalhando mais ainda para nos mostrar a ver­
dade a respeito de quem somos e para que existimos.
Deus não criou o mundo apenas para deixar-se ficar
como observador passivo, olhando enquanto geração
após geração de seres humanos vêm a este mundo e dele
se vão. Segundo o registro do Antigo Testamento, Deus
usou homens santos e profetas para mostrar o caminho.
Ele deu leis que guiam a pessoa com segurança durante
a vida. Ele demonstrou ao mundo o seu poder e o seu
amor. Quando nações inteiras desobedeceram à sua
vontade, ele as disciplinou a fim de fazer com que
voltassem. Quando as desajeitadas tentativas da huma­
nidade para chegar à virtude moral fracassaram, ele
mostrou misericórdia e graça.
Como se isso não bastasse, o Novo Testamento nos
diz que Deus enviou seu único Filho ao mundo a fim
de viver uma vida exemplar (como padrão para encon­
trarmos satisfação em nosso próprio viver) e para mo­
rrer uma morte sacrificial a fim de expiar os nossos
pecados. O tipo de expiação de que falam Shirley
MacLaine e seus amigos, o “fazer parte da mente de
Deus”, é mero concordar em propósito e perspectiva
Providência e Perspectiva 75
s

com aquilo que pensam ser o que Deus afirma. E uma


imitação bem pobre da expiação eficaz realizada pela
morte de Jesus na cruz, a qual expressa a grande ver­
dade de que Deus nos ama, paga a dívida dos nossos
pecados, e prepara o caminho para a nossa eterna sal­
vação quando escolhemos participar de sua morte, se-
pultamento e ressurreição mediante uma entrega
pessoal a Cristo.
Até hoje, Deus ainda está operando no mundo e na
minha vida e na sua. Ele não é apenas um Deus encon­
trado em livros empoeirados da literatura antiga — ele
está vivo c ativo. Ele se revela no milagre de cada novo
nascimento. Seu nome está nos lábios suplicantes da­
queles que sofrem e nos corações agradecidos daqueles
que apreciam a calma reveladora beleza de um novo
dia. Em minha vida, Deus está comigo no carro quando
tento classificar as muitas pressões do meu trabalho ou
relacionamentos pessoais que ficam deformados e con­
fusos. Ele está comigo de manhã quando planejo as
muitas ocupações do dia que se inicia. Converso com
Deus como o faria com meu melhor amigo. Na realida­
de, isso é exatamente o que ele é — meu melhor Amigo.
E o que ele me diz por meio de sua Palavra escrita e o
exemplo pessoal de Jesus Cristo é o tipo de informação
que não posso obter em livros de texto acadêmicos,
enciclopédias, relatórios da bolsa de valores, gurus,
mantras ou meditação. E verdadeiramente percepção
divina.
Ao pensar em como Deus pode estar operando em
nossas vidas, quer diretamente, quer mais indiretamen­
te através da revelação, é importante lembrar que a
instrução de Deus não é uma filosofia secreta à qual
somente os iniciados tem acesso — uma “sabedoria
oculta”, como o misticismo oriental é chamado por seus
76 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

proponentes. Por inspiração, Deus preservou um regis­


tro escrito de sua divina verdade. Ao contrário dos
Registros Akáshicos, que se diz conterem a Mente
Universal (mas que somente uns poucos místicos e
médiuns têm o privilégio de perceber), o registro bíbli­
co está em todas as livrarias e em incontáveis quartos
de hotel para conhecimento de todos.
Ao voltarmo-nos para o ceme da filosofia de Shirley
MacLaine — a reencarnação — precisamos nos deter
a fim de considerar as questões preliminares acerca de
sua missão. Estava Shirley MacLaine fadada a escrever
seus livros, como ela sugere? Se for assim, quem a
enviou nessa missão, e quem está determinando o con­
teúdo de sua mensagem? Está alguém realmente me­
xendo os pauzinhos cósmicos para fazer com que a Srta.
MacLaine se possa tornar nossa mestra espiritual? Se
tal é verdade, quem está fazendo, e qual seria o seu
propósito ao tentar convencer-nos a adotar um sistema
de crença tão perigoso?
CAPITULO CINCO

REENCARNAÇÃO À
MODA OCIDENTAL

“O cristianismo não é uma teoria ou especulação,


mas, sim, uma vida; não uma filosofia de vida, mas,
sim, uma presença viva. ”
— Samuel Taylor Coleridge

Por onde se começa para classificar a idéia da reen-


camação? O problema é: qual versão? Até mesmo o
conceito de reencamação de Shirley MacLaine é uma
versão um tanto eclética. A reencamação é apresentada
de muitas formas diferentes, mas o ensinamento mais
básico é o de que cada alma é imortal, tendo sempre
existido desde o princípio, não importa qual venha a ser
o conceito de “princípio” da pessoa. Os cristãos tam­
bém creem que suas almas são imortais, mas apenas
num sentido futurista. Para os cristãos, a alma não existe
antes de o corpo físico passar a existir.
Entre os reencarnacionistas, alguns acreditam em
uma criação original de todas as almas por um Deus-
-Força que existe desde a eternidade. Outros acreditam
na preexistência eterna da própria alma, sem um mo­
mento no tempo em que tenha havido algo que possa
78 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

ser chamado de “princípio”. A maioria dos reencar-


nacionistas concorda em que a alma é de alguma forma
participante da essência de Deus espalhada por toda a
parte. Em outras palavras, a alma é parte de Deus.
Não importa qual tenha sido a origem da alma ou
quando tenha isso ocorrido; os reencamacionistas acre­
ditam que a alma evolui de um estado espiritual inferior
para outro superior. Não é claro o motivo de a alma
começar em tão baixo estado de desenvolvimento es­
piritual, nem se sabe onde o conceito de “desenvolvi­
mento” se originou.
No processo dessa evolução ascendente, a alma en­
tra, ou se encarna, numa serie de corpos diferentes.
Alguns — de acordo com a tradição hindu — dizem
que cada novo corpo é realmente a mesma “essência de
grude” (uma tradução um tanto livre do skandhas em
sânscrito), de que tanto a alma em si quanto todos os
corpos anteriores são compostos. Embora não esteja
muito claro em nenhum dos seus livros, parece que a
Srta. MacLaine se inclina para o conceito budista. Sem
referir-se à composição dos corpos, em “Minhas Vidas”
ela diz que as almas são entidades invisíveis em har­
monia com a natureza e que “nenhuma delas chega a
morrer; apenas mudam de forma”.
Os primeiros reencamacionistas, e ainda a maioria
de todos os reencamacionistas de nossos dias, acredi­
tam que a alma também se encarna em formas não
humanas, como pedras, árvores ou sapos. Não obstante,
quase todos os reencamacionistas ocidentalizados, in­
clusive Shirley MacLaine, rejeitam a transmigração das
almas de uma forma de vida para outra. Em harmonia
com a teoria da evolução biológica, os reencar-
nacionistas ocidentais dizem ter a alma humana progre­
dido além do estágio dessas encarnações em formas
Reencarnação à Moda Ocidental 79

inferiores de vida. Para eles, portanto, a reencarnação


está limitada a corpos humanos.
A CONEXÃO DO CARMA
A reencarnação precisa ser compreendida como ne­
cessário complemento à doutrina do carma. Não fosse
por essa doutrina, a idéia da reencarnação não teria
fundamento sobre o qual se apoiar.
A doutrina do carma ensina que cada alma está em
processo de aperfeiçoamento, superando as imper­
feições das vidas anteriores. Baseando-se na observa­
ção obviamente correta de que ninguém nesta presente
vida é perfeito, assume-se com acerto que a pessoa não
pode, por si mesma, alcançar a perfeição numa única
vida. Tira-se então a conclusão enganosa de que são
necessárias diversas vidas para a alma poder conquistar
esse alvo.
A reencarnação é para o carma o que bilhões de anos
são para a teoria da evolução. Toma possível uma teoria
(perfeição no decorrer de muitas vidas) que, se não
fosse pelo tempo adicional, seria uma impossibilidade
(perfeição moral a que se chegou por si mesmo durante
o decorrer de uma única vida).
O carma assume também que a perfeição é o alvo
desejado e a conquista necessária da alma humana.
Implícita nesse conceito está uma crença (não muito
bem explicada) de que a alma é decaída e que precisa
esforçar-se para sair da condição em que se encontra a
fim de voltar à união original que tinha com seu Criador
ou com a Alma Universal do cosmo.
O carma também é conhecido como a lei de causa e
efeito, à qual a Srta. MacLaine tantas vezes se refere.
Ela assume que as leis físicas de causa e efeito são
igualmente aplicáveis ao comportamento humano e à
80 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

justificação moral. Essa premissa, reunida ao fato ob­


servável de que ninguém é perfeito, resulta na conclu­
são de que vivemos a “nos encontrar”. Esse termo
cármico significa que precisamos enfrentar as conse-
qüências do carma desfavorável de nossas vidas ante­
riores. Visto que cada um de nós é menos que perfeito,
existe sempre uma substancial quantidade de carma
desfavorável pelo qual somos responsáveis. Embora a
Srta. MacLaine insista em que o processo causa-e-efei-
to não é punitivo, a premissa de existir sempre uma
dívida cármica que precisa ser paga na vida atual é
inerente às idéias do carma e da reencamação. O carma
bom que a pessoa traz de vidas anteriores pode acumu­
lar créditos a fim de pagar o débito cármico, mas poucas
pessoas, se é que existe alguma, já atingiram esse nível
de perfeição cármica.
Isso nos traz de volta ao ponto de partida da doutrina
da reencamação. Já que é tão difícil equilibrar o bom
carma e o carma desfavorável, e já que não temos
possibilidade de pagar nossa dívida cármica no decorrer
de uma vida, precisamos passar por diversas vidas —
talvez trinta, cinqüenta, cem, ou mesmo milhares — a
fim de “conseguir acertar”.
A condição final da pessoa que chegar a “conseguir
acertar” também é questão controvertida entre os reen-
camacionistas. A própria Srta. MacLaine não esclarece
muito bem o destino final daquele que venha a ficar
totalmente iluminado. Alguns crêem que a alma termina
em união cósmica, uma espécie de sopa divina, toda-
-abrangente. Alguns usam a palavra “nirvana” para
descrever esse estado de existência eterna. Para eles, a
coisa mais desejável que possa existir é a absorção pelo
éter cósmico, quando já não será necessário suportar a
roda de sofrimento do carma. Por outro lado, muitos
Reencarnação à Moda Ocidental 81

vêem o nirvana como a extinção eterna, não apenas a


absorção da personalidade individual de alguém.
A versão moderna, ocidentalizada, da reencarnação,
talvez a melhor declaração do ponto de vista de Shirley
MacLaine, parece focalizar a pessoa aperfeiçoada que
finalmente se toma uma com o Universo. Contudo, a
importância dessa conquista é questionável porque os
reencamacionistas com freqüência insistem em que éra­
mos um com todas as coisas no princípio, e que mesmo
agora somos um!
REGRESSO
Um dos menos divulgados aspectos do hinduísmo é
a possibilidade de se regressar — isto é como que
evoluir para trás. Assim como se “pode evoluir rumo a
um estado superior de existência espiritual”, os hindus
acreditam ser possível também a mudança para um
estado inferior, chegando até a tomar-se preciso reen-
camar como uma planta ou um animal. Isso se daria,
por exemplo, se a pessoa fosse muito irresponsável
nesta vida. Em outras palavras, um indivíduo verdadei­
ramente desprezível poderia aparecer algum dia no
quintal de seu netinho como uma aranha viúva-negra.
Esse aspecto não se casa bem com a mentalidade oci­
dental e é sempre eliminado pelos ocidentais como uma
questão cultural.
Existe um derivado da doutrina hindu que é comple­
tamente varrido para debaixo do tapete quando os aci­
dentais são convidados a partilhar a hospitalidade
religiosa do oriente. O sistema de castas, embora tor­
nado ilegal pelo estado, ainda é uma característica
permanente da índia. Quando se trata de opressão hu­
mana, esse sistema de rígidas classes sociais hierárqui­
cas, com seu inerente preconceito e patente injustiça, é
82 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

abertamente parcial para com as pessoas baseando-se


apenas em seu nascimento.
O sistema de castas é uma inferência natural da lei
do carma. O estágio de evolução do espírito da pessoa
é determinado verificando-se a posição de sua família
quando ela nasceu. Visto que a evolução da pessoa
depende da quantidade de dívida cármica, quando esta
nasce dentro de uma casta menos favorecida, merece
sofrer nessa classe como resultado direto de sua posição
cármica. Se os ocidentais tivessem a mínima idéia de
/

como seria reencarnar como um “intocável” na índia,


jamais ouviriamos de novo uma palavra que fosse em
favor da reencamação. Se realmente houver um círculo
de reencamações assim, a humanidade não estará em
melhor situação do que bichinhos irracionais a correr
numa esteira giratória. Se a roda da reencamação existir
de fato o futuro não é luminoso, otimista e excitante. E
sombrio, pessimista e deprimente.
Por que, então, tantos ocidentais se voltam com tanta
facilidade para um ensinamento sobre a vida que du­
rante séculos demonstrou ser uma armadilha de deses­
pero para metade da população do mundo? Enquanto
os ocidentais mergulham de cabeça na crença de que a
reencamação trará uma nova era de iluminismo à raça
humana, aqueles que se enxergam como vítimas do
círculo vicioso da reencamação dizem: “Não precisam
nos agradecer. Podem ficar com ela!”
Pergunto-me se a solução desse mistério não estaria
no próprio fato da afluência ocidental. Se o carma e a
reencamação são uma tentativa de explicar o sofri­
mento, baseiam-se eles numa condição com a qual nem
podemos nos relacionar. Não temos a menor idéia do
que é sofrer de verdade. Em vez disso, congratulamo-
-nos, apontando para nosso luxo e riqueza material
Reencarmção à Moda Ocidental 83

como prova de favor divino, aplauso cármico, e supe­


rioridade espiritual. Nossa perspectiva é a do brâmane
hindu. Somos membros da mais alta casta do mundo, e
por isso, assim como para eles, é-nos fácil enxergar a
“roda do sofrimento” como se fosse uma “roda da
fortuna”. Da mesma forma que os brâmanes, podemos
literalmente dar-nos ao luxo de acreditar na reencar-
nação como uma teoria idealista.
Para aqueles que vivem em uma cultura dominada
pela crença no carma e na reencamação, a perspectiva
é radicalmente diferente da nossa. Vista através de seus
olhos desesperançados, a reencamação não é uma pas­
sagem rumo à liberdade, mas, sim, uma crise global na
qual todos são reféns.
OS TRÁGICOS RESULTADOS
A maior fonte de constrangimento para os reencar-
nacionistas é a índia, onde se originou a crença na
reencamação há cerca de 3.000 anos. A literatura pró-
-reencamação naturalmcnte coloca-se na defensiva a
qualquer menção das condições desumanas que lá im­
peram há séculos. Ela aponta como causa o clima
intolerável, o crescimento incontrolável da população,
e assim por diante. Mas grande parte do sofrimento da
índia relaciona-se diretamente ao sistema de crença
hindu, e mais particularmente aos efeitos da crença no
carma e na reencamação.
Tive a oportunidade de ver esses efeitos por mim
mesmo. Lembro-me de quando desci do avião em Bom­
baim. Mesmo às 3 horas da madrugada, o calor sufo­
cante fez murchar tanto meu corpo quanto meu espírito.
As centenas de pessoas que cumprimentavam os pas­
sageiros que desembarcavam constituíam um grupo de
aspecto verdadeiramente deplorável. Quando entrei no
84 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

apinhado terminal do aeroporto, mal conseguia respirar


devido ao mau cheiro exalado por toda aquela humani­
dade. O odor de maconha pairava nas salas de espera
como a umidade no ar.
A escuridão da madrugada escondia apenas em parte
as mas poeirentas e os sujos barracos a que me acostu­
maria a ver durante o dia. Pelo menos, esse choque me
foi poupado até eu poder descansar um pouco. Tudo
isso já foi descrito, mas não se pode verdadeiramente
avaliar o fato em sua plenitude sem ter-se estado lá
pessoalmente. Filmes de viagens mostrados pela tele­
visão concentram-se nos aspectos mais românticos;
raramente mostram a extensão da miséria. Na maioria
dos lugares, as mas da índia causam espanto. Embora
existam porções muito belas no território em si, a con­
dição humana confere tal tonalidade visual e odorífera
ao quadro que, ao lembrar-se dele, a gente só deseja um
“véu de esquecimento” cármico.
Ainda não consegui esquecer-me dos mendigos, dos
imundos “homens santos”, as máscaras de gaze a reco­
brir as bocas e narizes dos jains a fim de impedi-los de
inspirar insetos que poderíam ser suas avós, os barracos
de papelão montados nas calçadas imundas, as vacas
sagradas passeando por toda a parte, os milhares de
deuses e gurus, os fogos sempre acesos nos lugares
onde os mortos são cremados, as pessoas banhando-se
nas águas poluídas do rio Ganges, e as crianças —
muitas delas sujas, nuas e sem esperança.
A índia não é a única sociedade sofredora— é apenas
uma das piores. E as desculpas oferecidas para explicar
essas condições falham. Uma visita à China basta para
convencer-nos de que o fato de se ter milhões de pes­
soas amontoadas não significa que sujeira, mendicância
e letargia a nível nacional sejam inevitáveis.
Reencamação à Moda Ocidental 85

A cultura hindu, baseada em grande parte nos ensi­


namentos do carma e da reencamação, não é uma
cultura a ser invejada ou admirada. Seus ensinamentos
religiosos não levam a uma Nova Era de iluminismo;
levam, antes, à opressão, ao sofrimento, e à morte
espiritual bem como à física.
Qualquer pessoa que esteja seriamente buscando
respostas precisa perguntar, nas palavras da lei do car­
ma: “Não existe causa e efeito naquilo que se vê na
índia?” As idéias também trazem conseqüências. Mes­
mo que a difusa crença na reencamação não seja a única
causa das abomináveis condições da vida da índia, não
existe prova alguma de que a reencamação tenha feito
o que quer que seja a fim de aliviar o sofrimento.
A questão da índia é crucial por ser ela o país cujos
habitantes reivindicam séculos de acesso à “sabedoria
oculta” da evolução da humanidade até o iluminismo.
Se tivessem eles sido os depositários da verdadeira
percepção cósmica, por que não houve até agora uma
influência positiva em sua sociedade? Por que a índia
está atrasada em relação às outras culturas ao invés de
estar à frente delas?
A resposta é óbvia: Eles não estão de posse da
verdade cósmica afinal de contas.
NASCIDOS DE NOVO.. . E DE NOVO?
A reencamação, na forma em que foi alterada pelo
pensamento ocidental, tomou-se um labirinto comple­
xo e intrincado, ao qual todo novo “guru” das vidas
passadas acrescentou algo. Um dos mais influentes
desses gurus foi um homem de visões, o finado Edgar
Cayce, que passou mais de 15 anos numa famosa praia
do estado da Virgínia, sondando psiquicamente a reen­
camação. Hoje, Virgínia Beach é a sede da Associação
86 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

para Pesquisa e Iluminação, que continua a promulgar


os ensinamentos de reencamação baseando-se nos mi­
lhares de “leituras da vida” feitas por esse homem.
Foi importante para seus proponentes atualizar a
reencamação clássica para os moldes da reencamação
à moda americana (que não é encontrada em parte
alguma dos escritos sagrados hindus, os Vedas, ao qual
a Srta. MacLaine se refere com freqüência). A reencar-
nação da Nova Era é distintamente ocidentalizada, e
grande esforço se faz a fim de que ela se pareça com­
patível com o Cristianismo.
Um dos melhores exemplos da reencamação à la
Cayce em voga nos Estados Unidos hoje é apresentado
por John Van Auken, um palestrante da organização
Cayce, em seu livro recente NASCIDO DE NOVO. ..
e de Novo.
A explicação de Van Auken para o significado da
vida é fantasiosa. Uma combinação de sua imaginativa
história da reencamação dá boa idéia do conceito revi­
sado que os reencamacionistas têm da criação, da queda
do homem, e de sua salvação final. Ele se harmoniza
com o conceito que Shirley MacLaine está promovendo
(tirado das leituras de Cayce, nas quais a Srta. MacLai­
ne e seu médium Kevin Ryerson depositam tanta con­
fiança).
Antes do princípio, segundo Van Auken, a consci­
ência do Criador despertou a fim de expressar pensa­
mentos, imagens, luz e som. Luz, estrelas e galáxias
apareceram então, mas apenas como uma idéia, não em
forma física. Segundo os Ensinamentos Secretos, que
se manifestam nas leituras de Cayce, o Criador desejava
compartilhar essa nova expressão de vida. Assim sendo,
ele concebeu a idéia de pontos individuais de consci­
ência semelhantes a si mesmo, companheiros capazes
Reencarnação à Moda Ocidental 87

de perceber, conceber, expressar a si mesmos e lem­


brar-se.
O plano tinha um problema: se os companheiros
fossem semelhantes ao Criador, deveríam ter a liberda­
de de escolher ser assim. E essa liberdade permitiría a
possibilidade de rebelião. A fim de cuidar dessa possi­
bilidade, uma Lei Universal foi estabelecida: para cada
ação de livre vontade de um companheiro adviria uma
reação ou conseqüência semelhante sobre esse mesmo
companheiro. Portanto, cada companheiro seria res­
ponsável pelo uso que fizesse da consciência e do livre
arbítrio. (Em outras palavras, o Criador estabeleceu a
lei do carma, ou da causa e efeito.)
A criação dos companheiros ocorreu depois disso, e
eles passaram a percorrer todo o Universo. Em suas
viagens cósmicas, alguns dos companheiros desceram
até as influências tridimensionais do planeta Terra.
(Van Auken não menciona como a Terra veio a existir,
nem por que é tridimensional.)
Essas entidades começaram a pensar que eram físi­
cas, e logo depois acharam que já nem mesmo eram
seres celestiais, mas apenas terrestres. Como resultado,
tomaram-se sujeitas às leis da natureza. (Aqui, nova­
mente, ele não oferece uma explicação sobre a origem
das leis da natureza.)
As entidades da esfera terrestre tomaram-se também
sujeitas à morte. Se achavam que eram somente corpos
físicos (em vez de almas espirituais), quando seus cor­
pos morriam, assumiam que elas também morriam.
Para elas, a vida se havia tomado apenas biológica e
física. Quanto mais agiam na terra, mais dívidas terres­
tres (carma desfavorável) tinham de pagar através de
dor, enfermidade, solidão e morte.
88 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Com o passar do tempo, as criaturas terrestres po­


diam outra vez tomar-se cientes da diferença entre a
vida terrestre e a celestial, e perceber que eram co-cria-
doras com o Criador do Universo, com quem haviam
estado no princípio. (Van Auken não explica como algo
criado pode tomar-se seu próprio criador. Outros ten­
tam explicar dizendo terem as almas sempre sido parte
do consciente etemo do Criador, conquanto seus seres
individuais tenham sido criados a partir da substância
do Criador.)
Com a finalidade de ajudá-los a readquirir uma per­
cepção apropriada de sua essência celestial, algumas
das almas que jamais haviam entrado na esfera terrestre
vieram salvá-las. Precisamos usar as palavras do pró­
prio Van Auken neste ponto:
“A fim de evitar a completa perda da verdade,
as almas salvadoras entreteceram a verdade acer­
ca dos companheiros e sua situação difícil na
tapeçaria da vida física, em suas lendas e mitos,
sua arte e seus símbolos. Então, se alguma alma
buscasse além daquilo que encontrava na vida
física, a verdade real estaria ali diante dela. Três
famosos exemplos desses contos de significado
secreto são a Bela Adormecida, a Branca de Neve
e Pinóquio... Outro exemplo é o Mágico de Oz”.
As próximas idéias de Van Auken são ainda mais
incríveis. Ele diz que, como não havia formas humanas
disponíveis na Terra quando as primeiras entidades
vieram ao planeta, elas tiveram de manifestar-se nos
animais que já aqui se encontravam:
As estranhas criaturas que até hoje permane­
cem em nossas lendas foram resultado dessa en­
Reencarmção à Moda Ocidental 89

trada forçosa nos primórdios da Terra: sátiros


(seres que eram meio bodes, meio homens), cen­
tauros (meio cavalos, meio homens), dríades (mu­
lheres que viviam nas árvores, e geralmente em
toda uma floresta “encantada” delas), esfinges
(meio homem e meio leão, carneiro ou águia;
também um leão alado com cabeça e seios de
mulher), e as sereias e os tritões.
É preciso não esquecer que este conto é tirado dos
oniscientes Registros Akáshicos (bancos de dados psí­
quicos da história cósmica) conforme lido pelo famoso
psíquico Edgar Cayce, com cujo ensinamento a Srta.
MacLaine está tão impressionada. Contudo, ela prefe­
riu não dar a conhecer aos seus leitores esses excertos
particulares de Cayce.
As leituras de Cayce indicam que foi nesse momento
que o Criador interveio e usou seu singular poder a fim
de que seus companheiros pudessem tomar-se huma­
nos. (O conflito óbvio que surge quando o Criador tenta
ajudar seus companheiros a superar a ilusão que têm de
um mundo físico dando-lhes corpos físicos não é trata­
do por Van Auken.)
Entretanto, devido à rebeldia dos companheiros ao
entrarem na esfera terrestre, foi necessário haver um
meio de salvação. E aqui que a reencamação toma-se
estranhamente cristianizada nas leituras de Cayce, con­
forme Van Auken demonstra ao referir-se a Cristo:

Segundo os ensinamentos secretos, a primeira


alma a se oferecer para passar por toda provação,
superar toda tentação, dispersar toda ilusão, ven­
cer todo desafio e alcançar a perfeição foi a alma
a quem chamamos Jesus de Nazaré.
90 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

A história, tomada como um todo, é inteligente mis­


tura de verdade e ficção, e por isso tantas pessoas
acreditam na premissa básica. Podem achar que centau­
ros e sereias são um pouco demais, e o significado
cósmico da Branca de Neve pode escapar à sua com­
preensão, mas o restante parece suficientemente razoá­
vel. Como disse David, o amigo da Srta. MacLaine, a
respeito dos OVNIs: “Por que não? Sinto-me confortá­
vel com essa idéia.”
Com o decorrer dos séculos, a reencamação tem
oferecido forte atrativo mesmo sem apresentações tão
fantasiosas. Platão, por exemplo, acreditava na imorta­
lidade da alma. E, conforme repetidas vezes nos relem­
bra a Srta. MacLaine em “Minhas Vidas”, a lista de
personagens históricos que criam na reencamação pa­
rece a relação de Quem é Quem entre os filósofos,
cientistas, teólogos, políticos e poetas. Sem dúvida, a
reencamação é uma idéia cativante. Afinal de contas, o
prospecto de muitas vidas é sedutor para aqueles que
temem a exdnção pela morte, ou que tremem à idéia do
juízo eterno e do fogo do inferno. A reencamação
encontra um mercado receptivo em todos aqueles que
desejam explicar algo que às vezes é inexplicável.
Fornece um conceito do mundo àqueles que rejeitaram
os paradigmas tradicionais ou religiosos. E a especu­
lação acerca de vidas passadas pode até ser divertida.
Precisamos estar lembrados, é claro, de que a sim­
ples quantidade de adeptos — mesmo que grandes
pensadores estejam incluídos em suas fileiras — não
prova a validade de uma crença. Por exemplo, nos
primeiros séculos da era cristã, praticamente toda a
população do mundo acreditava que o mundo era plano,
embora a Bíblia dissesse estar Deus “assentado sobre a
redondeza da Terra”.
Reencarnação à Moda Ocidental 91

REALIDADE X FANTASIA
Eu estava em Davos, na Suíça, o meu lugar favorito
quando tenho de escrever, quando li a fantasiosa histó­
ria de Van Auken sobre a natureza ilusória da vida. Ao
terminar o relato inspirado em Cayce feito por ele
acerca do princípio do mundo, pausei, deixando que
suas idéias me percorressem a mente enquanto eu olha­
va ao redor.
A tarde de meados de junho no Dischmatal, um vale
que se estende rumo ao leste de onde eu estava morando
na periferia de Davos, estava ensolarada, em lugar da
nublada escuridão do dia anterior. Naquela tarde indo­
lente, os campos achavam-se escondidos debaixo de
flores de todos os matizes, as quais serviam de pasto
para as vacas. Brancas, amarelas, roxas, lilases com
delicados tons de azul — havia flores por toda a parte.
O riacho Dischmal corria ligeiro e ondulado por
sobre as grandes pedras que forravam seu leito, ao
serpear entre os graciosos chalés alpinos com suas
jardineiras salpicadas de gerânios vermelhos. Mães
com crianças de faces rosadas, juntamente com casais
mais velhos cujos rostos traziam as marcas de invernos
alpinos, saudavam-me com a amável expressão local:
“Gruezi”.
Os Alpes, constante e silencioso pano de fundo da
vida em Davos, na ponta dos pés, procuravam tocar o
magnífico céu azul com seus picos cobertos de neve.
Quando a fresca aragem soprou de suas encostas e
tocou-me de leve o rosto, senti-me como se fosse um
com as montanhas, um com as flores, como riacho, com
as vacas, com as crianças, e com a natureza. Também
senti-me como se fosse um com Deus, e louvei-o pela
gloriosa sensação de estar vivo e naquele lugar!
92 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Ao caminhar ao longo do Dischmal, refleti sobre as


coisas de que Van Auken e os outros estavam falando
— que quem eu sou e aquilo que minha percepção diz
que o meu mundo é são apenas ilusão. Ao abaixar-me
para apanhar algumas das flores do prado, não estava
convencido de ser eu ou de serem elas uma ilusão. E
quando pensei a respeito da unicidade acerca da qual
estava sempre a ler na literatura reencamacionista —
todos nós somos um com o cosmo — tive a certeza de
que algo estava errado. Eu sabia o que significava
sentir-se como se fosse “um com a natureza”. Estava
sentindo isso naquele exato momento. Não tinha dúvida
de que eu e a natureza havíamos sido criados pelo
mesmo Criador, de que a beleza que eu via ao redor não
era resultado de um acidente cósmico. Antes, tinha sido
planejada para o gozo dos seres humanos por uma
Personalidade com sensibilidade artística, que parti­
lhava seu amor pela estética com sua mais alta criação.
Contudo, eu sabia que não era disso que os reencar-
nacionistas estavam falando. Eles estavam dizendo que
somos um com Deus— que nós próprios somos deuses
(ou pelo menos deuses em perspectiva) e co-criadores
do Universo!
Ao erguer os olhos para os Alpes que se elevavam
altaneiros ao meu redor, eu sabia que essa afirmação
simplesmente não era verdadeira. Sabia que nem mes­
mo podia escalar até o topo de alguns desses picos,
quanto menos fazer um deles.
E ao olhar para as flores em minhas mãos, soube
outra vez que os escritores estavam enganados. Pode­
mos construir computadores que imitam a mente hu­
mana, mas não podemos fazer um capinzinho que seja!
Se não consigo ser o criador de meu Universo neste
corpo físico, não há motivo para crer que jamais podería
Reencarmção à Moda Ocidental 93

ter sido o seu criador. Segundo os reencamacionistas,


sou a mesma entidade que sempre fui desde o princípio
dos tempos.
Naquela gloriosa tarde nos altos dos Alpes suíços,
eu sabia o que era verdadeiro para mim. Somos os
senhores da terra, mas não o seu Criador. Não criamos
o nosso mundo; podemos apenas destruí-lo. E, enquan­
to lá em cima estridentes jatos da Força Aérea Suíça
cruzavam os céus, perturbando a calma do tranqüilo
vale, recordei-me da apavorante facilidade e regulari­
dade com que destruímos a nossa Terra.
Será a vida uma ilusão? Teremos evoluído de dríades
e sereias? Deverá a nossa orientação espiritual ser en­
contrada nos contos de fadas infantis? É a nossa exis­
tência nada mais que uma futil tentativa de “acertar” no
decorrer de muitas vidas? É nisso que estamos nos
arriscando a acreditar?
Ironicamente, em “Minhas Vidas”, Shirley MacLai-
ne repetidas vezes nos relembra quanto à necessidade
de basearmos nossas crenças em provas, não em cega
aceitação. Nesse espírito, há muitas perguntas difíceis
que devem ser feitas a respeito da reencamação!

NÃO ACREDITE NAQUILO QUE NÃO


FUNCIONA

Se o princípio de causa-e-efeito for aplicado cons­


tantemente de modo que a ignorância espiritual ou a
conduta pessoal obscurecida requeiram a experiência
de aprendizado em diversas vidas de tribulações e so­
frimento, como pode alguém menos que perfeito ini­
cialmente jamais ter a esperança de ascender na escala
da evolução? Em geral, tribulações e sofrimento dei­
xam uma herança de amargura, ressentimento, culpa e
94 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

hostilidade — as exatas características que presumivel­


mente se está tentando superar. Não seria semelhante
ao avião que se encontra num mergulho, cujo piloto é
incapaz de nivelar o aparelho por ter sido seu próprio
peso lançado contra o manche? Nessa espiral de causa
e efeito, os espiritualmente ricos ficarão mais ricos
espiritualmente, mas os espiritualmente pobres ficarão
espiritualmente mais pobres. Não é essa uma areia
movediça cármica?
Outro problema com a reencamação ocidentalizada
oculta-se na idéia de que escolhemos nossas supostas
várias vidas sobre a Terra. Se isso fosse verdade, como
explicar a clara falta de escolha que temos a respeito de
continuar vivendo? Mesmo sem considerar a teoria do
eu superior da Srta. MacLaine, a menos que se resolva
encurtar a vida por meio do suicídio, ninguém tem
escolha sobre quando e como morrerá. Se escolhésse­
mos de verdade quando e sob quais circunstâncias
nasceriamos, por que somos tão impotentes com rela­
ção ao tempo e circunstância de nossa morte? E se
nosso destino é determinado por nosso carma, como
podemos escolher nós mesmos a nossa próxima vida?
Ainda outro problema é a falta de prova. O que, na
experiência humana, existe a indicar que alguém já
chegou perto de conseguir o equilíbrio cármico, ilumi­
nação, ou perfeição espiritual? Não basta dizer: aqueles
que conseguiram atingir a unicidade obviamente já não
estão re-invadindo a esfera terrestre. Em toda a história
humana de que se tem registro, quem jamais deslocou-
-se numa esfera espiritual radicalmente superior?
Respondendo a essa questão, os reencamacionistas
às vezes apontam para Buda, ou Krishna, ou até mesmo
Jesus. Mas a Bíblia nos diz explicitamente que Jesus
Cristo veio de uma dimensão superior e depois voltou
Reencarnação à Moda Ocidental 95

a essa dimensão superior a que chamamos de céu. Jesus


Cristo é Deus por natureza e tomou-se carne a fim de
habitar entre os homens. Não existe nenhuma docu­
mentação histórica de que Buda ou Krishna tenham
viajado para qualquer outra dimensão, quanto menos
uma superior. E não existe motivo para crermos que
qualquer outra pessoa jamais tenha evoluído a alguma
dimensão espiritual dramaticamente superior. E uma
questão de paleontologia cósmica: que prova existe de
um elo perdido? Que prova há do progresso evolucio-
nário da alma?
Mesmo os detalhes práticos envolvidos na reencar­
nação levam-nos a questionar. Por exemplo, fico a
pensar em como será o jogo da casca cósmica. Quando
cada alma tem apenas um corpo físico, e cada corpo
tem apenas uma alma espiritual, não existe lugar para
confusão ou erro ao ajuntá-los. Em contraste, o proble­
ma prático de logística com que se defrontam os reen-
carnacionistas é imenso. Imagine bilhões de almas a
brincarem de cadeira musical com os corpos disponí­
veis!
Não importa quão bem uma teoria soe, ainda precisa
funcionar. E esse continua sendo o maior problema para
os reencamacionistas: simplesmente não existe prova
de que sua teoria funcione — ou de que jamais funcio­
nou, ou de que jamais poderia funcionar. Onde está a
prova? Que elemento podem os reencamacionistas
apresentar como prova?
O FATO COMPROVÁVEL DA RESSURREIÇÃO
Ao contrário da reencarnação teórica e especulativa,
a ressurreição bíblica é um fato histórico, comprovável.
Centenas de pessoas testemunharam a morte, sepulta-
mento e ressurreição de Jesus de Nazaré. A ressurreição
96 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

de Jesus é um fato histórico, da mesma forma que o são


a invasão das praias da Normandia no Dia D, a vitória
das colônias na Guerra da Secessão americana, a derro­
ta de Napoleão em Waterloo, e os antigos triunfos de
Alexandre, o Grande. A ressurreição de Cristo realmen­
te ocorreu, e foi tão dramática naquela época quanto
seria hoje se um parente do leitor que tivesse morrido
aparecesse em sua casa com um corpo ressurreto três
dias depois de ter sido baixado ao túmulo num esquife
lacrado.
Se Jesus Cristo nunca tivesse ressurgido dentre os
mortos, seus ensinamentos, conquanto maravilhosos,
teriam provavelmente sido enterrados junto com ele. E
no poder de sua ressurreição que Jesus Cristo se toma
a nossa esperança e segurança. Ele é a prova que Deus
deu ao mundo da ressurreição que há de vir e da vida
eterna para aqueles que submetem as suas vidas ao seu
senhorio.
Acerca desse evento, as testemunhas disseram: “Nós
somos testemunhas de tudo o que ele fez na terra dos
judeus e em Jerusalém; ao qual também tiraram a vida,
pendurando-o no madeiro. A este ressuscitou Deus no
terceiro dia, e concedeu que fosse manifesto” (Atos
10:39,40). A ressurreição de Jesus é o fato histórico
final. Nenhum outro evento na história teve, ou jamais
terá, significado espiritual tão poderoso. “Ora, não le­
vou Deus em conta os tempos da ignorância; agora,
porém, notifica aos homens que todos em toda parte se
arrependam; porquanto estabeleceu um dia em que há
de julgar o mundo com justiça por meio de um varão
que destinou e acreditou diante de todos, ressuscitan­
do-o dentre os mortos” (Atos 17:30, 31).
Se prova é o que a Srta. MacLaine procura, a ressur­
reição de Jesus Cristo é o comprovante autenticado com
Reencarnação à Moda Ocidental 97

o qual Deus dá por encerrada a sua argumentação.


Comparada à especulativa teoria da reencarnação, a
ressurreição de Jesus é prova que exige um veredicto.
E para aqueles que estejam dispostos a submeter suas
vidas ao senhorio de Cristo, a inferência desse grandio­
so fato histórico é da maior importância pessoal. “Deus
ressuscitou ao Senhor e também nos ressuscitará a nós
pelo seu poder” (1 Coríntios 6:14).
CAPÍTULO SEIS

LEMBRANÇA OU
FICÇÃO?

“Com que facilidade cremos naquilo que deseja­


mos!"
— John Dryden, Tudo pelo Amor

Os reencamacionistas devem ter ouvido o seguinte


desafio à sua crença um número de vezes suficiente
para fazer com que sua paciência lhes tenha granjeado
montanhas de carma bom, mas é preciso repetir: Por
que ninguém se lembra de suas supostas vidas anteri­
ores? Dentre as diversas respostas apresentadas por
diferentes reencamacionistas, nenhuma é adequada pa­
ra tratar racional e convincentemente do assunto. Al­
guns nos dizem haver um “véu de esquecimento” a
separar uma vida da outra. Essa explicação é conve­
niente, mas inteiramente teórica e inaveriguável.
Outros há que não vêem como problemática a nossa
incapacidade de relembrar, à luz do fato de não poder­
mos nos lembrar do que comemos ao jantar na noite de
terça-feira três semanas atrás, quanto menos o que
vestíamos em certo dia quando tínhamos dois meses de
idade. Embora concordemos em que muita coisa existe
100 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

em nossa vida atual que pouca relevância tem e, por­


tanto, é facilmente esquecida, muitos eventos ficam
gravados na memória durante décadas. Por exemplo,
lembro-me de estar saindo do ensaio do coral da facul­
dade quando soube que o presidente Kennedy havia
sido assassinado. E com os olhos da mente, posso ver
ainda o aparelho no qual eu assistia à televisão quando
nossos astronautas desceram na lua. Casamentos e en­
terros na família ainda estão nítidos em minha mente,
bem como a minha formatura e a cerimônia de jura­
mento para eu ser admitido à Ordem dos Advogados.
Os eventos importantes de minha vida estão claramente
em foco.
Quando se trata de lembrar-nos de vidas anteriores,
não estamos falando da cor de nossas roupas infantis,
mas de questões realmente importantes — tais como
quantas vezes já vivemos, quem fomos, e especialmen­
te qual é o nosso carma desfavorável, a fim de podermos
começar a trabalhar nele. Por que não nos lembraríamos
desses fatos importantes? Presume-se que é por sermos
uma personalidade completamente diferente em cada
vida — o que levanta uma questão ainda mais impor­
tante.
Se não conseguimos nos lembrar de nossas vidas
passadas, qual o benefício para esta vidal Como vamos
trabalhar em nosso carma desfavorável se nem mesmo
sabemos qual é? Esse problema foi levantado em uma
passagem do romance “Neve da Primavera”, do famoso
autor japonês Yukio Mishima, cuja vida foi recente­
mente retratada num filme.

A conversa [entre Kiyoaki e Honda] transfor­


mou-se então numa discussão da própria reencar-
Lembrança ou Ficção? 101

naçao e da questão sobre se ela era ou não crível


como doutrina.

—Se existir algo assim como a reencamação


— começou Honda, traindo certa animação, — eu
seria muito a favor dela, se fosse do tipo que
aparece em sua história, na qual o próprio homem
tem ciência de sua existência anterior. Mas se for
o caso de a personalidade humana chegar ao fim
e sua autopercepção ficar perdida de forma que
não haja absolutamente nenhum traço dela na vida
seguinte, e se uma personalidade completamente
nova e uma totalmente diferente autopercepção
passarem a existir, bem, nesse caso acho que
várias reencamações estendendo-se durante certo
tempo não estão mais significativamente ligadas
umas às outras do que as vidas de todos os indi­
víduos que estejam vivos no mesmo dado momen­
to.

Através dos personagens fictícios da história, Mi-


shima chega ao cerne do problema apresentado pela
idéia de reencamação — aquilo que se relaciona a
trabalhar-se no próprio carma. Na vida real, Mishima
acreditava que o desafio final era a própria morte. Com
um tão baixo conceito de nossa presente existência,
provavelmente não é de admirar que a vida de Mishima
tenha terminado em seppuku (suicídio ritual) aos 45
anos de idade.
Se de fato nos beneficiamos com as experiências de
vidas passadas embora não nos recordemos delas, por
que em cada nova vida temos de começar como crian­
ças outra vez e reaprender tudo? As crianças-prodígio
são muitas vezes citadas como exemplo de que nem
102 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

todo mundo precisa reaprender o modo de fazer as


coisas básicas. Dizem que seus dons especiais são
“talento acumulado” em vidas anteriores. Mas pode­
mos contar as crianças-prodígio nos dedos de uma mão
se as compararmos a todas as crianças que acharam que
pintar dentro dos contornos dos desenhos em um livri-
nho de colorir era um desafio frustrador. E até mesmo
crianças-prodígio precisam aprender a amarrar os cor­
dões dos sapatos!
LEMBRANÇAS IMAGINADAS
Os reencarnacionistas concordam em que não há
lembrança das vidas anteriores — pelo menos sem
algum tipo de ajuda. Mas médiuns psíquicos, hipnoti­
zadores e videntes assumem a tarefa de nos fazer revi­
ver vidas passadas. Pouco importa o fato de eles
precisarem de alguma forma penetrar no aparentemente
impenetrável “véu do esquecimento”, que esconde o
passado das pessoas comuns. E coitados dos milhões
de pessoas que, ao contrário de Shirley MacLaine,
viveram e morreram sem jamais ter tido a oportunidade
de consultar detetives particulares cósmicos como Ke-
vin Ryerson e Edgar Cayce.
As últimas tentativas de Shirley MacLaine a fim de
descobrir suas vidas passadas levaram-na a experi­
mentar a acupuntura psíquica. Em “Dançando na Luz”,
Shirley conta de suas viagens através de sua própria
percepção em busca de vidas passadas enquanto seu
amigo Chris lhe espetava o corpo com finas agulhas de
ouro e prata. A Srta. MacLaine diz que a acupuntura
tira barreiras de sua mente e lhe permite comunicar-se
com o passado por meio de um tipo de memória celular.
A Srta. MacLaine acredita ter visto e conversado
com o seu eu superior, sua alma eterna ilimitada — a
Lembrança ou Ficção? 103

alma que é seu verdadeiro “ser”. Ela acredita que seu


eu superior é o repositório de sua memória de vida para
vida, que ele conhece todas as suas vidas e experiências
anteriores e, por conseguinte, pode guiá-la em sua
busca de iluminação.
Mas como pode a Srta. MacLaine ter certeza de que,
quando fala consigo mesma, não é apenas o seu eu
inferior dizendo que ela tem um eu superior? Quando
seu eu superior lhe diz lembrar-se de experiências de
vidas anteriores, como pode a Srta. MacLaine ter cer­
teza de não ser apenas o seu eu inferior dizendo-lhe
aquilo que ela deseja ouvir?
E mesmo que o eu superior da Srta. MacLaine fosse
a totalidade da memória de sua alma, que benefício isso
traz ao seu eu inferior, que fica sem saber por que está
sendo guiado à certa direção pelo eu superior? Tentar
instilar memória cósmica em alguém inventando um eu
superior separado não resolve o problema. Por exem­
plo, se o eu inferior soubesse que o eu superior o estava
levando a um avião destinado a cair, é bem provável
que o eu inferior mandasse o eu superior tomar banho.
A própria Shirley MacLaine já provou esse ponto.
No show “Larry King ao Vivo”, a Srta. MacLaine disse
a King que se as condições quando está num avião
forem turbulentas, ela imagina uma bolha de luz à volta
do avião. Ela visualiza o avião como que estando per-
feitamente equilibrado de forma que nada de mal lhe
aconteça. Está ela a dizer que seu “equilíbrio visualiza­
do” teria impedido os russos de atirarem naquele jato
das Linhas Aéreas Coreanas? Podería sua “bolha de
luz” ter impedido o ônibus espacial Challenger de ex­
plodir? Mas, mais importante ainda, não estaria ela
tentando frustrar o que podería ser uma escolha cósmica
maior feita por seu eu superior? Ao imaginar sua bolha
104 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

de proteção, não está seu eu inferior dizendo ao supe­


rior: “ Você pode ter o plano do jogo cósmico, mas sou
eu quem vai ter de cair mais de 10.000 metros!”
Além disso, se o eu superior já conhece o bastante
para guiar o eu inferior à iluminação, então que neces­
sidade há de existir o eu inferior, para começo de
história? Se o eu superior é “parte de Deus” e “total­
mente consciente”, conforme diz a Srta. MacLaine, que
necessidade existe de memória? Por que a charada de
múltiplas encarnações para se chegar à autopercepção?
POR QUE AS SEMELHANÇAS?
O que se nota ao voltar cada página das detalhadas
vidas anteriores de Shirley MacLaine descritas em
“Dançando na Luz” é quanta semelhança existe entre
as supostas personalidades e circunstâncias e os rela­
cionamentos que a Srta. MacLaine já analisou em sua
vida atual. Por exemplo, ao passar pela experiência de
acupuntura, a Srta. MacLaine ve a si mesma em uma
vida anterior na qual ela viveu com uma manada de
elefantes, e depois pergunta-se se isso teve algo a ver
com a fascinação que ela sente por elefantes nesta vida.
Por que não lhe ocorre que ela pode ter imaginado uma
vida passada com elefantes por gostar de elefantes nesta
vida? Outra suposta vida anterior ocorre no deserto, e
a Srta. MacLaine conjetura ser essa a razão pela qual
ela sempre sentiu uma atração mística pelo deserto.
Naturalmente, ela nunca admite a possibilidade de ter
a vida anterior no deserto sido invocada em harmonia
com sua presente atração pelo deserto.
A questão óbvia é: quais vieram primeiro, as expe­
riências da vida passada ou as da vida atual? Sente-se
a Srta. MacLaine atraída pelo deserto nesta vida por ter
tido uma experiência memorável ali em uma vida ante­
Lembrança ou Ficção? 105

rior, ou é a fascinação que sente desde a infância pelo


deserto que leva sua mente a construir uma aventura
naquele cenário? Ela admite que um dos livros favoritos
de seu tempo de criança era “As Areias de Karakorum”,
uma história de aventura no deserto. É possível que, sob
a influência da acupuntura, seu livro de histórias da
infância tenha tido uma interpretação cósmica?
Quando a percepção da Srta. MacLaine a enxergou
na Rússia, servindo na corte real, houve um paralelismo
excepcional entre aquela experiência e a que ela teve
nesta vida com Vassy, seu volátil amante russo. A Srta.
MacLaine interpretou a visão como sendo uma confir­
mação de certas conclusões a que ela havia previamente
chegado acerca do relacionamento. Contudo, não é
igualmente possível que sua mente estivesse apenas
confirmando aquilo que ela desejava ouvir?
Não sonhamos com freqüência a respeito de situa­
ções que nos estão pesando bastante na mente? E os
personagens em nossos sonhos não parecem muitas
vezes terrivelmente reais, mesmo que estejam num
cenário histórico diferente do presente? É fácil a mente
produzir filmes de segunda categoria a respeito de
coisas nas quais já estamos pensando.
A Srta. MacLaine admite a possibilidade de poder
estar inventando os cenários de suas vidas passadas,
mas sugere ser a imaginação apenas uma forma de
memória. Eu sugiro que é exatamente o oposto: para
aqueles que a estão procurando, a “memória” é apenas
o resultado da imaginação.
RESULTADOS TENDENCIOSOS
Uma das formas pelas quais as pessoas supostamente
tomam conhecimento de suas vidas anteriores é a re­
gressão hipnótica. Dados acumulados durante essas
106 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

regressões são anunciados como prova substancial da


reencamação. Em primeiro lugar, entre aqueles que
advogam tal prova da “vida antes da vida”, encontra-se
Helen Wambach, autora de um livro com esse nome
além de outro intitulado “Revivendo Vidas Passadas”.
A respeito desse último, lembra-se a Srta. MacLaine:
“Esse livro, talvez mais do que qualquer outro, deu-me
a certeza de que verdadeiramente já tivemos vidas
anteriores.” É interessante notar a atenção que tem sido
dispensada aos livros de Wambach à vista do método
científico altamente questionável por ela usado.
Suas descobertas baseiam-se em várias sessões nas
quais hipnotizou grupos de pacientes — 50 ou mais
pessoas de cada vez — e as levou naquilo que chama
de “viagem do nascimento”. Enquanto olhava para os
corpos relaxados no chão à sua frente, Wambach fazia
uma série de perguntas sobre as quais os pacientes
deveríam refletir enquanto hipnotizados. Depois da ses­
são, cada participante preenchia um questionário, indi­
cando o que “viu” ao ouvir as perguntas:

“Quero que vá agora ao momento logo antes de


você nascer em sua vida presente. Você está es­
colhendo nascer?”

“Você escolheu seu sexo para a vida que vai


iniciar? Se escolheu, por que escolheu o enfoque
de homem ou de mulher para esta vida?”

“Agora, quero dirigir sua atenção para a que vai


ser sua mãe [e depois o que vai ser seu pai]. Você
já a [o] conheceu numa vida anterior? Se conhe­
ceu. . .qual foi o seu relacionamento?”
Lembrança ou Ficção ? 107

“Você está consciente agora, antes de nascer,


de outras pessoas a quem conhecerá na vida que
se vai iniciar? Conheceu-os em vidas anteriores?
Sabe que papel terão na vida que vai iniciar? Você
os conhecerá como amantes ou cônjuges? Conhe-
cê-los-á como filhos ou outros parentes? Conhe­
cê-los-á como amigos?”

Conforme evidencia essa amostragem das pergun­


tas, Wambach começou seu estudo assumindo que as
pessoas a quem estudava tinham experimentado vidas
anteriores, e estas, na grande maioria, eram da mesma
opinião. Muitas das pessoas que participaram do estudo
haviam feito o treinamento em percepção extra-senso-
rial de Wemer Erhard ou já haviam passado pelo pro­
cesso de nascim ento em oficinas de trabalho
psicológicas voltadas para terapia. Muitos haviam sido
treinados no Método Silva para Controle da Mente, e
uma grande parte praticava a ioga. Não se pode dizer
que esses adeptos do movimento da Nova Era consti­
tuíssem uma amostragem representativa do público
americano. Não sabemos que resultados teriam sido
obtidos em grandes grupos de pacientes que não acre­
ditassem na reencamação.
A predisposição do grupo de teste é revelada em uma
das respostas ao questionário que finalizou a sessão:
“Minha irmã gêmea queria entrar para a vida nessa
ocasião e me convenceu a acompanhá-la. Parece que
ela tinha mais carma para resolver do que eu, ou pelo
menos ela estava mais ansiosa do que eu para ir.” É
difícil acreditar que uma resposta cármica como essa
teria sido dada espontaneamente, ou mesmo sob hipno­
108 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

se, por alguém que não acreditasse, ou alguém que


jamais tivesse ouvido falar em carma.
Wambach não faz segredo acerca das predisposições
de seus clientes. “A maioria”, diz ela, “claramente já
vinha com idéias acerca das pessoas com quem se
tinham relacionado nas vidas anteriores.” E suas re­
ações indicaram de modo geral que o que viram sob
hipnose foram profecias que se cumpriram a si mesmas.
Ao referir-se à dificuldade que muitos dos pacientes
encontravam em “ver” o que lhes acontecia durante o
processo do nascimento em si, Wambach observa: “Em
certo sentido, foram os veteranos do movimento de
percepção os mais propensos a obter as respostas nas
viagens de nascimento.” Deveriamos ficar admirados?
Apertar os estudos antes do exame sempre ajuda!
Qualquer teoria sobre a vida que se baseie, mesmo
que parcialmente, em uma pesquisa tão falha quanto
essa é, no mínimo, muito suspeita, e certamente não
deveria ser aceita como o fundamento de nosso destino
etemo!
O FRAUDULENTO EDGAR CAYCE
As conclusões da Srta. Wambach não se fundamen­
tam em método científico mas sobre sua crença pessoal
na reencamação e no carma. Nesse ponto, ela segue
diretamente a tradição do “pai” do reencamacionismo
americano, Edgar Cayce, que, à semelhança de Kevin
Ryerson e outros psíquicos, alegou ser capaz de nos
contar acerca de nossas vidas passadas mesmo quando
não nos lembramos delas. Quando as pessoas procuram
prova da reencamação, inevitavelmente voltam-se para
Cayce.
Quem foi esse inconteste sumo sacerdote das vidas
passadas, Edgar Cayce, a quem a Srta. MacLaine tem
Lembrança ou Ficção? 109

na mais alta estima? Existem diversas e notáveis curio­


sidades no trabalho de Edgar Cayce. Em primeiro lugar,
é interessante — mesmo suspeito — que tantas vidas
anteriores em suas milhares de leituras de vidas acabas­
sem sendo relacionadas a vidas supostamente passadas
do próprio Cayce. A conveniência dessas associações
é demasiadamente interesseira, sugerindo que as leitu­
ras de sua vida foram simples produto de sua imagina­
ção fértil e não o resultado de quaisquer fontes
sobrenaturais neutras.
E também motivo para dúvida razoável o fato de
tantas leituras revelarem que os amigos e associados de
Cayce haviam sido anteriormente personagens famosos
da história. Por exemplo, o “adorado sobrinho” da
secretária de Cayce supostamente havia sido tanto Ale­
xandre, o Grande, quanto Thomas Jefferson. Poucos
dentre aqueles cujas “vidas passadas” foram lidas ti­
nham sido pessoas comuns. A propensão de Cayce para
o sensacionalismo é certamente suspeita.
Cruciais para a avaliação da validade das leituras
feitas por Cayce das vidas anteriores de outras pessoas
são as muitas leituras que supostamente revelaram in­
formação a respeito de vidas passadas do próprio Cay­
ce. O número delas é demasiadamente grande para
permitir-nos repassar cada uma, mas há algumas que
projetam interessante facho de luz sobre esse “rei do
carma”. Uma aparição, por exemplo, ocorreu mil anos
depois de Adão. Cayce encamou-se como o sumo sa­
cerdote egípcio Ra Ta. Durante essa encarnação, ele
ajudou a construir a Grande Pirâmide [juntamente com
Hermes, que será visto mais tarde como entidade de
especial significado]. Uma narrativa desse período é a
de que —
110 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Os egípcios, cujo progresso cultural prevalecia


contra as tribos mais pastorais e simples de Arart,
já vinham há muito valendo-se de viagens aéreas
em balões movidos a gás introduzidos em sua
cultura em eras passadas pelos atlantes. . .Ra Ta
viu uma oportunidade de visitar outras áreas do
mundo onde os filhos dos homens estavam reuni­
dos. Assim, foi à índia, à terra de Gobi, a Ogue, e
àquilo que é hoje o Peru, bem como à Carpátia...

Se a “leitura” de Cayce a seu próprio respeito for


verdadeira, os livros de história terão de ser reescritos.
Com relação à existência da lendária Atlântida, Gina
Cerminara, intérprete de Cayce, diz: “Se aceitarmos as
leituras de Cayce, a Atlântida definitivamente existiu.”
E claro que isso também significa que, se a Atlântida
não tiver existido, as leituras de Cayce não deverão ser
aceitas.
Como soldado de Tróia, Cayce ajudou a defender o
portão principal da fortaleza sitiada. Quando a cidade
foi vencida, ele ficou tão humilhado que se suicidou —
um momento verdadeiramente baixo na evolução cár-
mica de Cayce. Talvez seja esse fator o responsável
pelo erro nas datas que Cayce obviamente cometeu na
leitura. Sua leitura (e não um erro subseqüente de
registro) indica ter ele vivido como o soldado troiano
de 1158 a 1012 A.C., um período de 146 anos.
Em parte alguma são as leituras de Cayce mais
escandalosamente engenhosas do que quando se voltam
para as supostas encarnações de Jesus, antes de ele ser
Jesus. Segundo Cayce, Jesus encamou-se como o Adão
da Bíblia, por volta de 12.000 a.C. A insinuação de que
Lembrança ou Ficção ? 111

Jesus foi, portanto, aquele que cometeu o pecado de


Adão não passou despercebida a Cayce:
“P-3 Quando Jesus ficou sabendo que deveria
ser o Salvador do mundo?”

“Quando ele caiu no Éden (2067-7)”.


Jesus, o nosso Salvador, diz Cayce, cometeu o carma
desfavorável original!
Aproxima informação de Cayce, tirada da “Memória
da Natureza”, conforme ele se referia aos já citados
oniscientes Registros Akáshicos, é um erro obviamente
crasso. As leituras de Cayce disseram que Jesus encar­
nou-se também como Enoque, o homem que não mo­
rreu mas foi levado por Deus ao céu. Aqui, Cayce
depara-se com um problema importante, ou talvez seja
um lapso histórico por parte dos Registros Akáshicos.
Jesus supostamente encamou-se tanto como Adão
quanto como Enoque — os dois estiveram vivos ao
mesmo tempo! Embora Enoque tivesse nascido muitos
anos depois de Adão, esse ainda vivia na época do
nascimento de Enoque, o que faz com que fossem
contemporâneos.
Foi dito também que Jesus se manifestou como Her­
mes, o arquiteto da Grande Pirâmide, de quem Ra Ta
(Cayce) foi colega, e como Zenda (pai de Zoroastro),
cujo pai foi Uhjltd (Cayce, de novo). Interessante a
conclusão a que tudo isso leva. Jesus, o unigênito Filho
gerado por Cayce? Talvez tenha sido toda essa intimi­
dade cósmica que deu a Cayce a percepção para saber
algo que jamais foi dito a nós outros: quando Jesus
finalmente encamou-se como Jesus e foi condenado à
morte, ele “foi contando piadas ao dirigir-se ao Calvá­
rio, enquanto carregava a própria cruz.”
112 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Depois de certo tempo, temos de parar e perguntar


se alguém pode acreditar nas leituras das vidas feitas
por Cayce. As leituras acerca de suas supostas vidas
anteriores são grotescas e cheias de erro. E se isso é o
que acontece com as leituras para a sua própria “enti­
dade”, que fé podemos depositar na existência de algu­
ma verdade nas leituras de outras entidades?
KEVIN, O PSÍQUICO DE SHIRLEY
Como parte do processo de investigação dos mé­
diuns psíquicos, arranjei uma “sessão de canalização”
com o psíquico pessoal da Srta. MacLaine, Kevin Ryer-
son. Kevin teve papel predominante em “Minhas Vi­
das” e aparece também no programa especial de
televisão de Shirley MacLaine, adaptado do livro. Sem
revelar que estava escrevendo este livro (um fato que
se podería achar que um psíquico genuíno percebesse
imediatamente), tentei parecer alguém que estivesse
sinceramente procurando saber a respeito do seu pas­
sado. O que observei foi que Kevin não pode ser com­
parado a qualquer quiromante local ou místico com
bola de cristal num espetáculo psíquico barato.
Kevin é inteligente, eloquente, sério, e, por tudo o
que pude perceber, sincero. E muito culto, versado em
assuntos como religiões do mundo, psicologia, ciência,
história e filosofia. Tendo sido criado dentro de tuna
mistura de batista com presbiteriano, ele se descreve
confortavelmente como “cristão reencamacionista”.
Naturalmente, eu não poderia divergir mais dele com
respeito à reencamação, e, de modo especial, sua crença
da compatibilidade da reencamação com o cristianis­
mo. Contudo, se há alguém com quem eu gostaria de
passar uma tarde falando a respeito de assuntos tão
esotéricos quanto esses, Kevin seria essa pessoa.
Lembrança ou Ficção? 113

O que mais me perturbou a respeito de Kevin foi a


“canalização” que supostamente ele fazia. Tentando ser
tão objetivo quanto possível nessas circunstâncias, não
fiquei convencido de que entidades da esfera astral
estivessem usando Kevin como “instrumento”. As duas
vozes, de “John” e de “Tom McPherson”, pareceram-
-me ser meras simulações da voz do próprio Kevin. Já
passei muito tempo na Inglaterra e na Irlanda, mas
jamais ouvi um sotaque irlandês igual ao da suposta voz
da entidade “Tom”, que se diz irlandês. Tampouco
pareceu-me que Kevin jamais tivesse entrado no que se
podería com justiça chamar de transe.
Curiosamente, somente se conseguia receber respos­
tas das entidades depois de repetidas perguntas por
parte delas com relação a detalhes sobre a questão. Tal
questionamento seria desnecessário, parece-me, se as
entidades realmente estivessem em sintonia com a
“Mente Universal”. E, se não fosse por causa de certos
lapsos — às vezes pausas bem longas — quando uma
vida anterior estava sendo descrita para o ouvinte, o
desempenho teria sido magnífico. As pausas hesitantes
não diferiam muito daquelas que se poderíam observar
por parte de pessoas que estão levando tempo para
estruturar suas respostas — diferindo totalmente da
tranqüila segurança que se esperaria de entidades su­
postamente oniscientes! Em certa ocasião, para testar a
correção dos fatos, dei a entender propositadamente
que minha mãe já não vivia. A resposta à pergunta que
tinha feito erroneamente assumiu como verdadeiro
aquele engano. Não teriam de saber os Registros Aká-
shicos se minha mãe ainda estava ou não na esfera
terrestre?
O que fiquei sabendo através de “Tom” acerca das
minhas vidas passadas foi que eu nasci em tomo do ano
114 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

200 a.C. na índia, em uma casta brâmane alta. Fui um


estudioso, de uma família extensamente envolvida com
o comércio ao longo do Ganges. Muito bem versado
nas tradições vedas, eu pratiquei o chamado ioga raja.
Ao completar 28 anos, converti-me ao budismo e fui
para o Nepal. Impressionado com a condição de supers­
tição e ignorância das várias escolas de mistério ali,
cnsinci-lhcs a respeito de Buda e partilhei com elas a
iluminação das tradições brâmanes. Deixei aquela en­
carnação aos 97 anos de idade enquanto me encontrava
em estado de profunda meditação.
Em outra vida, estive no Egito como filho de uma
família de mercadores à qual os faraós haviam conce­
dido monopólio para suprir os templos com óleo, in­
censo, ervas e material para os rolos. De sangue misto
— ariano, semítico e núbio — eu agi como diplomata
para ajudar a manter a unidade entre os reinos superior
c inferior do Egito. Deixei a forma física após 83 anos
bem vividos, e nessa ocasião meu corpo foi embalsa-
mado.
Uma coisa é ouvir dizer que vivi interessantes vidas
anteriores, mas — surpresa das surpresas — Shirley
MacLaine pode agora me acrescentar à sua sempre
crescente lista de relacionamentos das vidas anteriores!
Segundo o “Espírito”, como são chamadas as entidades,
eu e a Srta. MacLaine trabalhamos juntos como cola­
boradores na China no século onze. A Srta. MacLaine
trabalhou com marionetes e eu fui um estudioso taoísta.
Combinamos nossos esforços com a finalidade de co­
municar o taoísmo ao povo, usando meu conhecimento
acadêmico e a capacidade de comunicação da Srta.
MacLaine através de seus fantoches.
Devo confessar que minha suposta associação com
a Srta. MacLaine numa vida passada apareceu ali por
Lembrança ou Ficção ? 115

minha própria sugestão. Surgiu de um sonho que pedi


que fosse interpretado. No sonho, eu e a Srta. MacLaine
estávamos juntos em Malibu. Quando contei o sonho
ao “Espírito”, perguntei especificamente se uma vida
anterior com a Srta. MacLaine poderia ser uma possível
interpretação. E foi, sem dúvida! Mas tenho a impres­
são de que poderia ter perdido a oportunidade de um
encontro cósmico com Shirley MacLaine se não tivesse
insinuado essa possibilidade!
Apesar de todo o seu inocente fascínio e personali­
dade genuinamente simpática, Kevin não tem maior
acesso à percepção universal do que você e eu. A melhor
forma de descrever suas supostas fontes espirituais de
informação cósmica é dizendo que são especulativas e
imaginárias. O desempenho de Kevin é simplesmente
um dos melhores espetáculos ambulantes nos Estados
Unidos. Embora seja consumado palestrante, professor
e conselheiro pessoal, é trágico ver que ele está enga­
nando pessoas crédulas com relação à verdadeira fonte
de conhecimento espiritual e à explicação correta de
nosso destino espiritual.
Precisamos nos lembrar sempre de que não existe
averiguação independente disponível que comprove o
fato de alguém realmente ter passado pela experiência
de vidas anteriores segundo alegam psíquicos como
Edgar Cayce e Kevin Ryerson. A falta de corroboração
independente os espreita o tempo todo. Mas a outra face
dessa lacuna comprobatória é o que mantém ativos os
chamados psíquicos. Eles podem fingir ver todas as
vidas passadas que quiserem, sem a ameaça de contra­
dição.
Shirley MacLaine prendeu-se a uma base de apoio
filosófico e comprobatório que desafia tanto a razão
quanto a experiência. Quer seja sob hipnose ou acupun­
116 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

tura, quer seja com o arrimo e conforto de médiuns


psíquicos, não se precisa necessariamente ser científico
para “provar” a existência de vidas anteriores. Se al­
guém quiser acreditar já ter vivido antes, é fácil imagi­
nar!
CAPÍTULO SETE

TEXTOS FORA DE
CONTEXTO

“A Bíblia tem sido muitas vezes tratada como se


fosse um nariz de cera que pode ser retorcido à vontade
do intérprete.”
— Clarence Tucker Craig
Os Primórdios do Cristianismo

Os reencamacionistas não apenas rejeitaram a pro­


messa bíblica da ressurreição, ao aceitarem a esperança
falsa de vidas repetidas, como também rejeitaram uma
apreensão razoável e coerente da Bíblia em favor do
uso caprichoso de passagens bíblicas para apoiar suas
teorias. Explico o que quero dizer.
Quando eu era jovem, meu pai contou uma experi­
ência bizarra certa noite ao chegar a casa. Durante
diversas semanas, ele havia estudado a Bíblia com um
senhor de nossa cidade que tinha mostrado interesse em
conhecer melhor o Cristianismo. Com paciência, papai
havia repassado cuidadosamente uma variedade de
crenças doutrinárias e mostrado ao homem as passa­
gens bíblicas das quais essas crenças tinham sido tira­
das.
118 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Na semana anterior, o homem, com raiva, havia


negado que uma das doutrinas que meu pai estava
explicando pudesse ser da vontade de Deus. Ele jamais
tinha visto esse ensinamento específico na Bíblia e não
estava disposto a aceitá-lo. Papai referiu-se outra vez
às passagens que ele achava boas para fundamentar a
doutrina, e disse que talvez o homem quisesse pensar
mais acerca desses versículos antes de seu próximo
encontro.
Papai voltou a visitar aquele senhor, sem saber ao
certo como seria recebido. O homem foi surpreenden­
temente amável, mas disse já não haver necessidade de
discutir a mesma doutrina que haviam discutido na
semana anterior. Papai perguntou se o homem compre­
endia agora que o ensinamento era bíblico, mas ele
respondeu: “Não, essas passagens não se encontram em
minha Bíblia.” Curioso, meu pai perguntou se ele que­
ria dizer que estavam lá, mas que ele simplesmente as
entendia de maneira diferente. Mais uma vez, o homem
replicou: “Não, elas não estão em minha Bíblia.”
Talvez o homem não conseguisse localizar a passa­
gem certa, pensou Papai. Apanhou então a Bíblia da­
quele senhor para abri-la na passagem apropriada. O
que meu pai viu, para surpresa sua, foi que a passagem
de fato não se encontrava lá. O homem havia tomado
uma tesoura e literalmente cortado a passagem da sua
Bíblia!
DISTORÇÃO DOS FATOS
Se qualquer outra pessoa que não meu pai me tivesse
contado essa história, eu jamais teria acreditado. Mas
encontramos aqui uma analogia: os reencamacionistas
ocidentais, inclusive os mentores espirituais de Shirley
MacLaine, tratam a Bíblia da mesma maneira. De for­
Textos Fora de Contexto 119

ma contínua, eles ou “removem” passagens da Bíblia


ou com tanta liberalidade enxergam nelas seus próprios
ensinamentos que a Bíblia toma-se um gigantesco mo­
saico recortado e colado.
Certamente teria mais sentido e seria mais fácil para
os reencamacionistas ocidentais ignorar a Bíblia, ou
então relegá-la (como freqüentemente o fazem os hin­
dus) a apenas um “inspirado mas falho” aspecto da
revelação de Deus. Mas é difícil eliminar antigas tradi­
ções, especialmente para os ocidentais, criados na cul­
tura (se não na instrução) da Bíblia. É mais confortável
aceitar a reencamação se alguém nos puder convencer
de que ela é ensinada na Bíblia.
Entretanto, não se pode acomodar a verdade a fim
de que esta permita uma abordagem seletiva das Escri­
turas. Por definição, a verdade é realidade transcenden­
te: é coerente, confiável e universalmente aplicável.
Não estamos propensos a ser muito flexíveis com res­
peito à verdade quando, por exemplo, alguém depõe
contra nós num tribunal, ou quando o governo nos
manda um cheque de restituição do imposto de renda
menor do que esperávamos!
Pode ser que existam verdades acerca das quais
nenhum de nós tenha uma visão muito clara — como
os seis cegos do Industão que descreveram cada qual
uma parte do elefante. Cada um, baseado em sua expe­
riência pessoal, adquiriu parte da verdade, mas nenhum
tinha a verdade toda. A verdade é que um elefante não
é um leão, ou um pássaro, ou uma bola de basquete; e
o fato de que poderiamos ter um conceito pessoal
singular acerca dele ou resolver dar-lhe outro nome não
muda a verdade acerca daquilo que ele é de fato.
Existem também verdades acerca de coisas intangí­
veis, do espírito — tais como Deus, existência anterior,
120 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

vida futura e vida atual. E essa verdade é conhecível. É


encontrada não apenas em nossas próprias experiências
subjetivas no mundo de nosso Criador, como também
através da objetivamente conhecível revelação da Bí­
blia.
A verdade espiritual é, por natureza, coerente e har­
moniosa: não se contradiz. Não pode acomodar tanto
uma crença que diz que vivemos muitas vezes sobre a
Terra e outra que diz que vivemos uma só vez. A
verdade não pode abranger tanto outra de que podemos
“agir por nós mesmos” até “conseguirmos acertar” e
uma crença de que devemos fazer a vontade de nosso
Criador e confiar em seu reto juízo.
A FONTE DE TODA A VERDADE
A Bíblia reivindica exclusividade — que existe um
único caminho. Essa reivindicação é estranha às reli­
giões orientais e malquista entre os ocidentais, que são
tradicionalmente democratas, independentes e pluralis­
tas. Muitos têm sido os sonhadores fantasiosos que
tentaram enfeitar a verdade. Os sonhadores têm ator­
mentado a imaginação humana com contos, lendas e
maravilhosas histórias do mundo espiritual. E a busca
de alternativas à verdade tantas vezes dolorosa leva
muita gente a apegar-se com força a mitos.
Entretanto, o Cristianismo traz uma visão clara para
o meio dessa confusão espiritual — não apenas devido
a um sistema ou teoria teológica superior, mas também
devido à pessoa de Jesus, o Filho de Deus, que é o
Salvador do mundo, e cuja verdade buscamos. As ou­
tras religiões são fundadas sobre homens — meros
homens — que não têm o poder advindo do fato de
também serem Deus, ou sobre idéias ou teorias abstra­
tas que nada conhecem da realidade humana. Jesus
Textos Fora de Contexto 121

Cristo, embora sendo Deus, foi homem encarnado.


Jesus Cristo, embora sendo homem, foi e é o Deus vivo
da criação.
Em seu comentário acerca da epístola aos Hebreus,
o autor cristão John MacArthur Jr. aponta a supe­
rioridade do Cristianismo. Em todas as outras religiões,
o objetivo é o homem encontrar um caminho para
chegar a Deus, seja “escapando, escalando, pensando,
seja trabalhando” para podermos chegar a ele. No Cris­
tianismo, Deus veio até o homem.

Essa é a diferença entre o Cristianismo e todas


as outras religiões do mundo. Por isso é grande
tolice as pessoas dizerem: “Não faz diferença
aquilo em que você acredita ou que religião se­
gue.” Faz toda a diferença. As religiões nada mais
são do que a tentativa do homem para descobrir a
Deus. O Cristianismo é Deus explodindo dentro
do mundo dos homens e mostrando e contando
aos homens como ele é . .. Ele fez isso em forma
humana, e o nome daquela forma humana é Jesus
Cristo.

Jesus não é simplesmente um entre muitos guias


espirituais. Contrário à tentativa de Shirley MacLaine
de colocá-los num mesmo plano, Buda não está no
mesmo nível espiritual de Jesus Cristo. Nem mesmo
chega perto, pois não foi Deus, como Jesus. Se consi­
derarmos com cuidado o ensinamento de Jesus, nós o
ouviremos dizer:

“Entrai pela porta estreita (larga é a porta e


espaçoso o caminho que conduz para a perdição
e são muitos os que entram por ela), porque es­
122 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

treita é a porta e apertado o caminho que conduz


para a vida, e são poucos os que acertam com ela.
Eu sou o caminho, e a verdade, e a vida; nin­
guém vem ao Pai senão por mim.

Então disseram todos: Logo tu és o Filho de


Deus? E ele lhes respondeu: Vós dizeis que eu
sou.

Vós sois cá de baixo, eu sou lá de cima; vós sois


deste mundo, eu deste mundo não sou. Por isso eu
vos disse que morrereis nos vossos pecados; por­
que se não crerdes que eu sou morrereis nos
vossos pecados.
Não temais os que matam o corpo e não podem
matar a alma; temei antes aquele que pode fazer
perecer no inferno tanto a alma como o corpo.”
Estas não são palavras de um mestre religioso ífaco-
te, a tratar de coisas sem importância, como Jesus é
geralmente retratado. Essas não são palavras a que se
possa aceitar ou rejeitar sem punição. Ou ele realmente
é quem diz ser — o Filho de Deus e fonte de toda a
verdade — ou então é um egocêntrico, blasfemo luná­
tico. O professor da Universidade de Cambridge e
ex-agnóstico, C. S. Lewis, disse-o muito bem:
Estou aqui tentando evitar que alguém fale a
coisa verdadeiramente idiota que as pessoas mui­
tas vezes dizem acerca dele: “Estou pronto a acei­
tar Jesus como um grande mestre moral, mas não
aceito sua reivindicação de ser Deus.” Essa é a
única coisa que não devemos dizer. Um homem
que fosse mero homem e afirmasse o tipo de
Textos Fora de Contexto 123

coisas que Jesus disse não seria um grande mestre


moral. Seria um lunático — a nível do homem que
diz ser um ovo escaldado — ou então o Diabo do
inferno. E necessário escolher. Ou esse homem
era, e é, o Filho de Deus, ou então é um lunático
ou algo pior. Podemos calá-lo como sendo um
tolo, podemos cuspir nele e matá-lo como sendo
um demônio; ou podemos cair-lhe aos pés e cha­
má-lo Senhor e Deus. Mas que nenhum de nós
venha com essa asneira condescendente acerca de
ser ele um grande mestre humano. Ele não nos
deixou essa opção. Não quis que assim fosse.
Não é de admirar que o reencamacionista tenha de
haver-se com Jesus. O espetáculo não pode continuar
até ouvirmos o que Jesus tem a dizer acerca do assunto.
O que declarou o Filho de Deus, a fonte de vida espiri­
tual, acerca da reencamação? Vejamos primeiro o que
os reencarnacionistas freqüentemente alegam ter ele
dito e sido.
O QUE JESUS DISSE E O QUE ELE NÃO
DISSE
Quando Shirley MacLaine escutava a Kevin, este lhe
afirmou: “Cristo ensinou que o comportamento da pes­
soa determinaria os acontecimentos futuros — ou car-
ma, segundo os hindus. Aquilo que alguém semear,
ceifará.” Quando a Srta. MacLaine conversou com
John, da livraria Bodhi Tree, ele disse que Moisés e
Cristo “nem sempre usaram as palavras carma ou reen-
carnação, mas o significado era o mesmo.” Quando
ouviu o que dizia seu amigo David, ele falou haver dito
que Jesus havia dito que “precisávamos compreender
que a alma e o espírito do homem têm vida eterna e que
124 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

a alma buscava elevar-se cada vez mais alto rumo à


perfeição humana até ficarmos livres.” Ele continuou:
“Isso é o que Cristo estava tentando dizer-nos. Tudo o
que fazemos ou dizemos em nossas vidas todos os dias
tem uma conseqüência, e o lugar onde nos encontramos
hoje é o resultado daquilo que fizemos antes.” Concluiu
David: “Estou convencido de que Cristo estava pregan­
do a teoria da reencamação.”
Revisar as passagens apresentadas pelos reencar-
nacionistas como prova de que Jesus ensinou a reen-
carnação nos esclarecerá a respeito do assunto. Certa
vez, Jesus foi procurado em segredo por Nicodemos,
membro do conselho que governava os judeus. Ocorreu
a seguinte conversa:

“Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte


de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais
que tu fazes, se Deus não estiver com ele. A isto
respondeu Jesus: Em verdade, em verdade te digo
que se alguém não nascer de novo não pode ver o
reino de Deus. Perguntou-lhe Nicodemos: Como
pode um homem nascer, sendo velho? Pode, por­
ventura, voltar ao ventre materno e nascer segun­
da vez? Respondeu Jesus: Em verdade, em
verdade te digo: Quem não nascer da água e do
Espírito, não pode entrar no reino de D eus... Não
te admires de eu te dizer: Importa-vos nascer de
novo” (João 3:2-7).

Está Jesus realmente ensinando a reencamação aqui?


Na verdade, ele menciona apenas um novo nascimento,
não vários! E é óbvio que ele rejeitou a sugestão de
Nicodemos de que o novo nascimento se daria através
do ventre. De fato, Jesus afirma claramente que o novo
Textos Fora de Contexto 125

nascimento seria da água e do espírito. Paulo se refere


a esse novo nascimento da água e do espírito em sua
carta aos cristãos de Roma:

“Ou, porventura, ignorais que todos os que


fomos batizados em Cristo Jesus, fomos batizados
na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele na
morte pelo batismo; para que, como Cristo foi
ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai,
assim também nós andemos em novidade de vi­
da.”

Era a um novo nascimento espiritual através da fé e


da água do batismo que Jesus se referia! E isso que traz
à pessoa nova vida em Cristo. Nada tem que ver com
múltiplas vidas terrestres; seu foco é a regeneração
espiritual. E o princípio de um novo relacionamento de
confiança e entrega. Aquele que pela primeira vez ex­
perimentou entregar-se a Cristo, literalmente se sente
como uma nova pessoa — no mesmo corpo. E óbvio
que ao ensinar a respeito da necessidade de um renas­
cimento espiritual, Jesus não estava ensinando o con­
ceito de reencamação.
Em outra ocasião, Jesus foi questionado por alguns
de seus discípulos acerca de um cego:
“Caminhando Jesus, viu um homem cego de
nascença. E os seus discípulos perguntaram: Mes­
tre, quem pecou, este ou seus pais, para que nas­
cesse cego?” (João 9: 1,2).

Nos dias de Jesus, os judeus não acreditavam na


reencamação, mas muitos deles acreditavam que se
herdava o pecado dos pais, os quais o herdavam de seus
pais, e assim por diante. Devido a uma interpretação
126 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

errônea da ênfase que o Antigo Testamento dava à


perfeição como reflexo da glória de Deus, eles também
geralmente associavam imperfeições físicas ao pecado
(herdado ou não).
A resposta de Jesus a essa especulação foi, com
efeito: Vocês estão enganados a respeito desse assunto.
“Nem ele pecou, nem seus pais”, disse Jesus, “mas foi
para que se manifestem nele as obras de Deus.” Jesus
curou imediatamente o homem, demonstrando sua di­
vindade e sua autoridade sobre a criação.
Admira-me muito que os reencamacionistas che­
guem a apresentar essa passagem para ser considerada,
quanto menos oferecê-la como prova. Longe de ensinar
a rcencamação, ela demonstra que Jesus especifica-
mente renunciou à idéia de que a condição da pessoa
nesta vida dependa de algo na vida de outra pessoa ou
em outra vida que ela própria possa ter tido. Mesmo
que a pessoa não conheça as crenças doutrinárias dos
judeus do tempo de Jesus, o que ele ensinou está claro
em si mesmo. “De quem foi o pecado que causou a
cegueira deste homem?” perguntaram eles. Jesus res­
pondeu: “A cegueira não é causada pelo pecado de
ninguém. A crença de vocês num relacionamento de
causa e efeito aqui está simplesmente errada.”
As duas próximas passagens oferecidas como prova
de que Jesus ensinou a reencamação apenas teriam
mérito se fossem tomadas com rígida literalidade. Sen­
do a Palavra infalível de Deus, a Bíblia é uma bela obra
literária que apresenta todos os dispositivos literários
legítimos, inclusive a linguagem figurativa. Ao concluir
comentários altamente elogiosos acerca de João Batis­
ta, Jesus fez esta observação:
Textos Fora de Contexto 127

“Porque todos os profetas e a lei profetizaram


até João. E, se o quereis reconhecer, ele mesmo é
Elias, que estava para vir” (Mateus 11:13,14).

Elias foi novamente o assunto da conversa quando


três dos discípulos de Jesus voltavam com ele da trans­
figuração. Jesus havia subido com os discípulos a um
monte, e subitamente eles viram Jesus conversando
com Moisés e Elias. Foi mais do que uma visão. Pedro
ficou tão impressionado com a experiência que quis
erguer abrigos para cada um deles. (Moisés e Elias
foram na verdade chamados do mundo dos espíritos, o
que tanto confirma a vida após a morte quanto contradiz
a teoria da reencamação.)
Ao descerem do monte, depois dessa experiência, os
discípulos perguntaram a Jesus acerca das profecias de
que Elias deveria vir antes do Messias.

“Então Jesus respondeu: De fato Elias virá e


restaurará todas as coisas. Eu, porém, vos declaro
que Elias já veio, e não o reconheceram, antes
fizeram com ele tudo quanto quiseram. Assim
também o Filho do homem há de padecer nas
mãos deles. Então os discípulos entenderam que
lhes falara a respeito de João Batista” (Mateus
17:11-13).

Havia o antigo profeta Elias reencamado como João


Batista? Certamente que não. Visto que a missão de
João era semelhante à de Elias, João estava sendo
apontado simbolicamente como “o Elias” da profecia.
Quando o nascimento de João foi anunciado primeiro
a seu pai por intermédio de um anjo do Senhor, disse o
anjo:
128 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

“Isabel, tua mulher, te dará à luz um filho a


quem darás o nome de João... E irá adiante dele
[Senhor] no espírito e poder de Elias, para con­
verter os corações dos pais aos filhos, converter
os desobedientes à prudência dos justos e habilitar
para o Senhor um povo preparado” (Lucas
1:13,17).

A referência a Elias feita por Jesus é uma figura de


linguagem. Quando um excepcional jogador jovem
aparece em cena no futebol brasileiro, os comentaristas
esportivos podem dizer: “Ele é outro Pelé ou Rivelino”.
Da mesma maneira, o ministério de João fazia lembrar
o de Elias. Os discípulos presentes à transfiguração
entenderam a referência de Jesus como linguagem fi­
gurativa porque tinham acabado de ver Elias — não
João, seu contemporâneo.
Deus forneceu uma resposta clara à conjetura dos
rcencamacionistas. Em uma passagem que nunca vi ser
mencionada em nenhuma literatura da reencamação, o
próprio João nega ser a “entidade” Elias reencamada:

“Este foi o testemunho de João, quando os


judeus lhe enviaram de Jerusalém sacerdotes e
levitas para lhe perguntarem: Quem és tu? Ele
confessou e não negou; confessou: Eu não sou o
Cristo. Então lhe perguntaram: Quem és, pois? És
tu Elias? Ele disse: Não sou" (João 1: 19-21).

Simplesmente não há como se possa com honestida­


de colocar palavras de reencamação na boca de Jesus.
Longe de ensinar a idéia da reencamação, Jesus ensinou
que ele pode enriquecer nossas vidas tanto agora quanto
na única vida celestial por vir. As promessas feitas por
Textos Fora de Contexto 129

ele não são cármicas. São garantias nas quais podemos


confiantemente depositar a nossa fé:
“Pedi, e dar-se-vos-á; buscai, e achareis; batei,
e abrir-se-vos-á.
“Se alguém tem sede, venha a mim e beba.
Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu
interior fluirão rios de água viva.
“Vinde a mim todos os que estais cansados e
sobrecarregados, e eu vos aliviarei. Tomai sobre
vós o meu jugo, e aprendei de mim, porque sou
manso e humilde de coração; e achareis descanso
para as vossas almas. Porque o meu jugo é suave
e o meu fardo é leve.
“Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em
mim, ainda que morra, viverá; e todo o que vive
e crê em mim, não morrerá, etemamente.”

QUE DIZER DO CARMA?


Vimos claramente que nem a Bíblia nem Jesus Cristo
ensinam a reencarnação. Mas que dizer do carma, o
fundamento da crença na reencarnação? A Bíblia apóia
a idéia do carma?
No livro “Minhas Vidas”, de Shirley MacLaine, e
em praticamente todos os outros livros sobre reencar­
nação da atualidade, a seguinte frase é usada em cone­
xão com o suposto ensino que C risto faz da
reencarnação: “Aquilo que alguém semear, ceifará.”
Todos os autores explicam que Jesus está-se referindo
à lei do carma — que aquilo que a pessoa semeou em
uma vida anterior virá ao seu encontro numa vida
futura. Se o próprio Jesus disse que a pessoa colhe
130 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

aquilo que semeou, então, segundo os reencar-


nacionistas, essa deveria ser a melhor prova da reencar-
nação. E claro que, no caso de Jesus ter afirmado isso,
e ter querido dizer o que os reencamacionistas dizem
significar, eles estariam certos. Essa realmente seria a
melhor autoridade possível para tal crença.
Na única vida que vivemos agora, geralmente colhe­
mos mesmo aquilo que semeamos. De fato, vemos
casos em que ocorrem causa e efeito. Todo mundo sabe,
por exemplo, que fumar pode causar câncer, e que beber
em excesso pode levar ao alcoolismo. Deixar de estudar
é um convite aberto a notas baixas, e deixar de pagar
os impostos meterá você em sérios apuros. Déficits
comerciais resultam em aumento na dívida nacional, e
abuso de liberdades pessoais acabam levando a revolu­
ção. Nas ocorrências normais desta vida, geralmente
colhemos o que semeamos.
Com essa observação Jesus concordava plenamente.
Por exemplo, ele se referiu ao homem prudente cuja
casa permaneceu firme sobre o alicerce construído na
rocha quando veio a inundação, ao passo que o insen­
sato, que construiu sua casa sobre a areia, viu-a desabar.
O ponto da analogia era que, da mesma forma que as
ações físicas trazem conseqüências físicas, as ações
morais trazem conseqüências morais.
Ademais, Jesus ensinou claramente que não apenas
somos responsáveis por nossas ações como também
respondemos por elas. Ele advertiu-nos repetidas vezes
de que a maneira como vivemos esta vida terá conse­
qüências eternas irrevogáveis. Jesus nos ensina que o
dia do juízo será um dia de séria colheita.
Mas Jesus jamais ensinou que viveremos diversas
vezes aqui nesta terra em corpos diferentes a fim de
pagar por nossas ações. Ele jamais ensinou que o que
Textos Fora de Con texto 131

semeamos em uma vida determinará o que ceifaremos


em outra aqui na terra. Ele jamais ensinou que semear
e ceifar está de alguma forma relacionado com uma lei
cósmica de carma. Na realidade, o aspecto mais sur­
preendente do uso que os reencamacionistas fazem da
suposta declaração de Jesus com relação a semear e
ceifar é que eles nem mesmo estão citando a fonte certa.
Jesus nunca disse: “Você colhe o que semeia!” Não é
apenas a diferença sobre o que Jesus podería ter querido
dizer, mas sobre algo que ele nem mesmo disse.
No contexto de explicar as bênçãos que a pessoa
recebe ao contribuir para o bem-estar financeiro de seus
mestres espirituais, foi o apóstolo Paulo quem disse:

“Não vos enganeis: de Deus não se zomba; pois


aquilo que o homem semear, isso também ceifará.
Porque o que semeia para a sua própria carne, da
carne colherá corrupção; mas o que semeia para
o Espírito, do Espírito colherá vida eterna: E não
nos cansemos de fazer o bem, porque a seu tempo
ceifaremos, se não desfalecermos. Por isso, en­
quanto tivermos oportunidade, façamos o bem a
todos, mas principalmente aos da família da fé”
(Gálatas 6:7-10).

A passagem não apenas nada tem que ver com reen-


camação ou carma, como também foi dita por Paulo,
não por Jesus. Quando os mentores espirituais da Srta.
MacLaine responderam-lhe às perguntas acerca dos
ensinamentos de Jesus, eles simplesmente a engana­
ram.
Infelizmente, a informação errada que deram não foi
apenas a confusão quanto ao que Jesus e Paulo tinham
para dizer. David, o amigo de Shirley, por exemplo,
132 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

cometeu um erro mais sério ainda ao afirmar “Conhe­


cer a si mesmo é o conhecimento mais profundo de
todos. Cristo disse: ‘Conhece-te a ti mesmo.’E depois,
sê fiel a esse conhecimento.”
Cristo nunca disse isso! Tampouco o disse Paulo ou
qualquer outro escritor cristão. Um egoísmo desses,
típico da geração do eu-primeiro, não podería ser mais
contrário ao ensinamento de Cristo. “Conhece-te a ti
mesmo” é uma famosa admoestação dos antigos gre­
gos, inscrita sobre o oráculo délfico e às vezes atribuída
a Pitágoras. E quer-me parecer que o último comentário
de David é uma paráfrase de Shakespeare, em Hamlet
“Sê fiel a ti mesmo.”
Como nos é possível depositar confiança em alguém
que reivindica acesso ao conhecimento divino mas nem
mesmo pode atribuir citações famosas ao autor certo?
Os juizes dão aos jurados esta instrução: “A testemunha
que houver sido intencionalmente falsa em parte de seu
depoimento deve ser desacreditada nas outras partes.”
Entre os reencamacionistas, encontramos pelo menos
um grosseiro descaso com relação a fatos facilmente
conhecíveis e também uma falta de revelação plena.
SEMEADURA E CEIFA VERDADEIRAS
A despeito de citarem profusamente a Bíblia, é evi­
dente que os reencamacionistas não a estudaram com
cuidado, nem talvez a tenham lido toda. É irônico que
foi durante uma discussão em relação à vida após a
morte que Jesus disse aos saduceus: “Errais, não conhe­
cendo as Escrituras.” Pergunto-me se, em tudo que
andou lendo, Shirley MacLaine algum dia sentou-se e
leu por si mesma a Bíblia, de capa a capa — cuidado­
samente e em espírito de oração. Parece que ela leu
algumas partes que lhe foram recomendadas, inclusive
Textos Fora de Contexto 133

algumas passagens altamente figurativas e facilmente


mal entendidas por meio de subjetiva interpretação
pessoal. Mas não parece que a Srta. MacLaine possua
uma compreensão geral da Bíblia. Se possuísse, sem
dúvida teria notado os erros textuais que lhe foram
apresentados.
Jesus ensinou a respeito da questão de semear e
ceifar. Certa ocasião, ele usou a palavra “ceifar” para
dizer que, na grande providência de Deus, não precisa­
mos ficar ansiosos quanto à prosperidade do tipo cau-
sa-e-efeito.

“Por isso vos digo: Não andeis ansiosos pela


vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou
beber; nem pelo vosso corpo quanto ao que haveis
de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e
o corpo mais do que as vestes? Observai as aves
do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam
em celeiros; contudo vosso Pai celeste as sustenta.
Porventura, não valeis vós muito mais do que as
aves? Quem de vós, por ansioso que esteja, pode
acrescentar um côvado ao curso da sua vida?”

O que Jesus ensinou a respeito de semear e ceifar


não foi a causa e efeito cármicos. Em Cristo, colhemos
os benefícios espirituais daquilo que outros antes de nós
semearam a nosso favor. Em Cristo, colhemos muito
mais em bênçãos espirituais do que nós mesmos semea­
mos. E se já submetemos nossa vida ao senhorio de
Jesus Cristo, temos a promessa de que Deus proverá
para nós, mesmo que nossa semeadura tenha sido ina­
dequada. Segundo Jesus, não recebemos carmicamente
o que merecemos. Recebemos algo muito melhor do
que merecemos!
CAPITULO OITO

JESUS—
IOGUE OU SALVADOR?

“Melhor seria não ter nenhuma opinião sobre Deus


a ter uma que seja indigna dele; pois a primeira é
apenas descrença — a segunda é desrespeito. ”
— Plutarco

O caso apresentado em favor da reencamação oci­


dentalizada, cristianizada da Nova Era assemelha-se
bastante a certo homicídio no qual fui o promotor. O
advogado de defesa apresentou ao júri duas teorias
discrepantes: ou o acusado havia acidentalmente atira­
do na namorada, ou então havia agido em defesa própria
— à escolha do freguês! Não importava a teoria que o
júri preferisse contanto que os advogados conseguis­
sem um veredicto de Inocente, mesmo que para tanto
tivessem de empregar duas teorias contraditórias.
No caso que nos é apresentado pelos reencar-
nacionistas, existe também um bocado de arrazoado
altemaúvo que não é logicamente coerente, nem tam­
pouco honesto. Dizem-nos primeiro que o próprio Jesus
Cristo ensinou a reencamação. Quando a patente fragi­
lidade do argumento transparece sob a mira de cuida­
136 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

doso exame, dizem-nos existir uma segunda teoria, que


descobrimos ser discrepante da primeira.
Nessa segunda teoria, dizem-nos que realmente não
faz a menor diferença o que Jesus disse porque afinal
ele não era de fato o Filho de Deus. Foi um bom homem,
e talvez uma das pessoas mais moralmente perfeitas que
jamais viveu. Mas certamente não foi Deus revelado na
carne. E de forma alguma foi ele a fonte absoluta e
exclusiva da verdade espiritual. Foi mais como o Jesus
em quem Shirley MacLaine acreditou durante a infân­
cia e juventude:

“Jesus Cristo parecia ter sido um homem inte­


ligente, sábio e certamente bom, mas eu via aquilo
que tinha aprendido acerca dele na Bíblia como
filosófico, mitológico e algo remoto. O que ele
pregou e fez realmente não me afetava, por isso
eu não cria nem descria. Ele simplesmente existiu.
.. como todos nós... e fez algumas coisas boas
há muito tempo. Eu não acreditava muito nessa
história de ele ser o Filho de Deus, e, de fato,
quando fui chegando perto dos vinte anos, eu já
havia concluído serem Deus e religião definitiva­
mente mitológicos e que se as pessoas sentissem
necessidade de acreditar neles eu não tinha obje-
ções, mas eu não o conseguia.”

A Srta. MacLaine sintetizou bem aquilo em que


vasto segmento de nossa sociedade veio a crer acerca
de Jesus. Em seu livro “Muitas Mansões”, Gina Cermi-
nara, a cronista das leituras de Edgar Cayce, sente-se
perfeitamente à vontade ao colocar outras pessoas no
mesmo nível espiritual que Jesus:
Jesus—Jogue ou Salvador? 137

“A percepção cristológica não é, contudo, um


atributo exclusivamente cristão. Cristo, é preciso
lembrar, não é o nome do homem Jesus, mas, sim,
um termo cujo significado literal é “o ungido”, e
cujo significado místico, ou antes, psicológico, é
o de uma percepção liberada ou espiritual. Pode­
mos crer que Krishna e Buda foram igualmente
possuidores de percepção cristológica..

“Até mesmo nós", continua ela, podemos obter a


percepção cristológica — sem querer dizer que pode­
mos ‘apropriar-nos da mente de Cristo’, como diz a
Bíblia, mas que podemos literalmente tomar-nos nosso
próprio Salvadorl” Também Shirley MacLaine inva­
riavelmente coloca Cristo e Buda no mesmo plano,
como se fossem pares espirituais — como se Buda
também tivesse nascido de uma virgem, como se Buda
também pudesse mandar que ondas tempestuosas se
acalmassem ou fazer reviver os mortos, e como se Buda
também tivesse ressurgido três dias após ter morrido!

OS MITOS MÍSTICOS

Não basta que o caso apresentado contra Jesus tente


mostrá-lo como algo menos que Deus. Outra faceta
dessa segunda teoria apresentada no julgamento que os
reencamacionistas fazem de Jesus é a alegação de que
ele foi produto do misticismo oriental. Lembram-se dos
18 anos da vida de Jesus durante os quais a Bíblia não
registra nenhum acontecimento específico — os anos
entre a época em que Jesus tinha 12 anos e a época em
quem ele começou seu ministério público aos 30 anos
de idade? Algumas pessoas acham que sabem o que
Jesus esteve fazendo durante esse tempo. Alegam que
138 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Jesus não foi o carpinteiro a respeito de quem lemos na


Bíblia. Dependendo da pessoa com quem se falar, Jesus
foi educado pelos essênios ou tomou-se um guru, um
avatar, ou um iogue — ou tudo isso junto!
Foi isso o que Kevin disse à Srta. MacLaine, e David
ecoou esses pensamentos:

.. muita gente pensa que esses dezoito anos


que faltam foram passados em viagens pela índia,
Tibete, Pérsia e Oriente Próximo. Existe todo tipo
de lendas e histórias acerca de um homem que
muito se assemelha a Cristo... Dizem que ele se
tomou um iogue perfeito e conseguiu total con­
trole sobre seu corpo e sobre o mundo físico que
o rodeava. Evidentemente, ele andou fazendo to­
dos aqueles milagres que foram mais tarde regis­
trados na Bíblia e tentou ensinar às pessoas que
elas também poderiam fazer o mesmo se entras­
sem mais em contato com sua natureza espiritual
e seu potencial de poder.”

A Srta. MacLaine já tinha ouvido falar dessa teoria,


por ter ficado conhecendo Janet e Richard Bock no
“ashram”. Os Bocks empregaram considerável tempo
e esforço atrás das várias lendas que dizem ter Jesus
viajado para a índia e para o Tibete.
No livro de Janet Bock, “O Mistério de Jesus”, fica
óbvio que diversos místicos orientais desejam reivindi­
car Jesus para si. O mestre religioso Prajnananda disse
aos Bocks que “Cristo foi um iogue indiano”. De fato,
Prajnananda disse que Cristo “percebeu a Deus não
apenas como cristão, mas também como hinduísta, jain,
budista e o Deus de todas as crenças.” Sua Santidade
Muni Shshil Kumarji, um monge e líder jain, disse aos
Jesus—Iogue ou Salvador? 139

Bocks que Jesus também havia passado tempo com o


seu povo!”
Como explicação do extraordinário poder de Jesus
sobre as forças da natureza, foi a sua experiência ao
tomar-se iogue, diz Bock, que permitiu a Jesus a capa­
cidade de fazer milagres.
Mas existe alguma prova de que um mero iogue
pudesse acalmar as ondas de um mar tempestuoso ou
alimentar 5.000 pessoas com alguns pães e uns poucos
peixes? Teria algum iogue da atualidade coragem de
tentar executar tal façanha?
OS DEZOITO ANOS
No tocante aos ditos 18 anos, se Jesus tivesse estado
na índia por tanto tempo, não seria esse fato pelo menos
mencionado pela família dele? Seus irmãos, que não
aceitaram a Jesus como sendo o Cristo até depois de
sua crucificação e ressurreição, caçoavam dele com
relação ao seu ministério, mas nem uma vez atribuíram
o que ele estava fazendo a viagens ao Tibete ou à índia.
O mesmo pode ser dito dos vizinhos de Jesus e das
pessoas de Nazaré onde ele foi criado. Embora muitos
deles rejeitassem a Jesus como o Messias, jamais rela­
cionaram essa rejeição ao fato de Jesus ser um iogue
ou um avatar. Não houve ninguém que dissesse: “Ora,
o que se pode esperar de alguém que tenha passado seu
tempo nos ‘ashrams’da índia?”
Quando Jesus foi publicamente acusado de blasfê­
mia pelos líderes judeus, não foi por estar envolvido
com o misticismo oriental, mas, sim, por reivindicar ser
o Messias prometido. De fato, um dos argumentos
oferecidos para comprovar a acusação de falsa perso­
nificação foi o de que Jesus havia estado entre o pessoal
daquela localidade todo o tempo! “Mas sabemos de
140 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

onde esse homem procede”, insistiram, “quando o Cris­


to vier, ninguém saberá de onde ele vem.”
“Não é este o carpinteiro?” perguntaram as pessoas
daquela localidade. E como se estivessem dizendo:
“Sabemos que Jesus não poderia ser o Messias porque
ele viveu aqui na nossa vizinhança todos estes anos,
trabalhando como carpinteiro. Agora, de repente, ele
diz ser o Messias. Quem acreditaria que isso fosse
possível?”
Como foi que as lendas místicas a respeito de Jesus
surgiram? E muito provável que notícias do homem
santo da Palestina tivessem de fato sido levadas por
caravanas mercantes a terras longínquas, inclusive à
índia. Na realidade, seria bastante surpreendente se as
notícias a respeito de Jesus não se tivessem espalhado
até lá. Uma vez que a história de Jesus começou a
circular, particularmente dentro de diferentes grupos
religiosos, foi sem dúvida modificada a fim de se har­
monizar melhor com as crenças locais. O melhor exem­
plo de como esse fenômeno funciona é a maneira pela
qual a teoria oriental da reencamação foi cristianizada
para os ouvidos ocidentais.
Pelo menos isto precisa ser dito: aquele que desejar
descartar a Jesus como sendo personagem meramente
mitológico terá de pensar duas vezes. Até mesmo a
evidência falsificada acerca de Jesus reforça o fato
histórico de sua vida e ministério!
ESCOLHA RÍGIDA
Da forma como o atual julgamento de Jesus nos é
apresentado, as táticas dos reencarnacionistas ficam
óbvias. Primeiro, tentaram usar Jesus em sua própria
defesa, na esperança de que aquilo que ele ensinou
pudesse ser interpretado de forma tal que salvasse sua
Jesus—togue ou Salvador? 141

teoria da ameaça que pesa sobre ela. Mas se percebemos


o que está por trás dessa defesa, eles nos pedem que
enxerguemos o engano existente acerca de Jesus: ele
não foi verdadeiramente o Filho de Deus o qual reivin­
dicou ser, mas apenas um homem muito bom e um
esplêndido professor — talvez até iogue, avatar ou
alguém no mesmo nível de Buda.
A essência do caso é se acreditamos no que a Bíblia
reivindica com relação a Jesus. Escrevendo aos cristãos
de Colossos, o apóstolo Paulo colocou a questão clara­
mente em foco:

“Ele é a imagem do Deus invisível, o primogê­


nito de toda a criação; pois nele foram criadas
todas as coisas, nos céus e sobre a terra, as visíveis
e as invisíveis, sejam tronos, sejam soberanias,
quer principados, quer potestades. Tudo foi criado
por meio dele e para ele. Ele é antes de todas as
coisas. Nele tudo subsiste. Ele é a cabeça do
corpo, da igreja. Ele é o princípio, o primogênito
de entre os mortos, para em todas as coisas ter a
primazia, porque aprouve a Deus que nele residis­
se toda a plenitude, e que, havendo feito a paz pelo
sangue da sua cruz, por meio dele reconciliasse
consigo mesmo todas as coisas, quer sobre a terra,
quer nos céus.”

Ao contrário do júri num caso de homicídio, não nos


é permitido o luxo de um meio-termo no nosso vere­
dicto. As afirmações bíblicas com relação a Jesus exi­
gem que o aceitemos como nosso único Salvador e
Senhor, ou então o rejeitemos totalmente.
Foi Jesus apenas um iogue contemplativo, um kri-
shna dançante, ou um sorridente guru? Ou foi ele o
142 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Senhor de toda a criação, a fonte de toda a verdade, o


Salvador do mundo e o próprio Filho de Deus, diante
de quem, no dia do juízo, todos os joelhos se dobrarão
— os de Buda, os de Krishna, os de Janet Bock, os de
Shirley MacLaine, os seus e os meus!
CAPÍTULO NO VE

UM WATERGATE DA
REENCARNAÇÃO?

“Nas mãos da descrença, as meias-verdades são


empregadas para fazer a tarefa das completas falsida­
des."
— Enoch Fitch Burr

Já examinamos o mau uso e a má interpretação da


Bíblia feitos pelos reencamacionistas em sua tentativa
de angariar apoio para seus pontos de vista. Mas há
outra maneira pela qual eles sempre argumentam que
suas idéias são compatíveis como cristianismo. Em vez
de partir da premissa de que a Bíblia é a infalível
Palavra de Deus, eles geralmente argumentam que ela
é incompleta em sua revelação, que importantes verda­
des se perderam ou foram deliberadamente omitidas ou
mesmo que ela foi tirada da literatura reencamacionista
oriental.
Por exemplo, após explicar à Srta. MacLaine a im­
portância dos Registros Akáshicos, “John” (um perso­
nagem composto representando dono e empregado da
livraria metafísica predileta da Srta. MacLaine) havia
levantado a questão acerca da inspiração da Bíblia,
144 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

insinuando que os Registros Akáshicos tinham de certa


forma estado envolvidos na revelação dada aos escri­
tores bíblicos:
“Por exemplo, como acha que Moisés escseveu
a respeito da criação do mundo se não tivesse
psiquicamente sintonizado? E o mesmo se deu
com Cristo. O que estou dizendo é que essas
pessoas possuíam um alto desenvolvimento espi­
ritual e achavam que sua missão na vida era trans­
mitir seu conhecimento.”
John chegou a admitir que Jesus jamais realmente
usou a palavra “reencamação”, mas que o significado
era o mesmo. Afinal, ele falou sobre leis de moralidade
e de uma alma etema!
— Bem — [perguntou Shirley,] — o que dis­
seram eles em relação ao fato de não se lembrarem
de suas vidas anteriores?
[Replicou John:] — Eles falam sobre um tipo
de “véu de esquecimento” que existe em nosso
consciente a fim de não ficarmos continuamente
traumatizados pelo que poderia ter ocorrido antes.
Todos eles dizem que a vida atual é a mais im­
portante, apenas entremeada por aquelas sensa­
ções de “déjà vu” que se tem, de haver passado
por uma experiência antes ou de conhecer alguém
a quem se sabe jamais ter encontrado consci­
entemente nesta vida.
A alusão de John de que a Bíblia se refere a qualquer
coisa semelhante a déjà vu ou “véu de esquecimento”
é pura invenção. Pode-se rebuscar a Bíblia de capa a
capa e jamais se encontrará qualquer um desses concei­
Um Watergate da Reencarnação? 145

tos mencionados — nem mesmo uma única vez, nem


tampouco de modo vago.
CHAMEM O CARCEREIRO
Tramóias assim tão artificiais me fazem lembrar de
uma história conhecida nos tribunais que fala da mano­
bra desesperada de certo advogado de defesa num caso
em que não havia absolutamente nenhuma prova em
favor de seu cliente. Na argumentação final, ele per­
guntou ao júri por que a promotoria não havia trazido
o carcereiro para depor. “Por que o carcereiro não foi
trazido para depor neste caso?” bradou. “O que eles
estão tentando esconder?”
O carcereiro, naturalmente, não tinha informação
alguma acerca do caso, de uma forma ou de outra, mas
o júri não sabia disso. E o advogado de defesa estava
jogando com o fato de ninguém no júri perceber que
ele mesmo poderia ter intimado o carcereiro a depor.
Quando o advogado de defesa terminou sua grandiosa
encenação a respeito do carcereiro, o júri ficou conven­
cido de que importante prova lhes estava sendo delibe-
radamente negada.
O que faz o promotor em uma situação dessas? Sem
dúvida, ele se levantará em sua argumentação final e
negará: “O carcereiro nada sabe a respeito do caso.”
Claro, pensam os agora céticos jurados!
É uma manobra eficaz. Brade alguma coisa em voz
suficientemente alta e uma porção de gente acreditará
em você, ainda que esteja dizendo algo que não tenha
nenhuma base concreta. Infelizmente, a Srta. MacLaine
foi o recipiente de carradas de informação assim inven­
tada. Tanto Kevin quando David usaram dessa mano­
bra, quer intencionalmente, quer não. Nunca fica isso
tão patente quanto nas referências que fazem a preten­
146 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

sas supressões secretas de importantes ensinos da Bí­


blia:

“Existe uma frase na Bíblia [afirma Kevin] que


diz que nunca se deve receber outras entidades
espirituais além de Deus. A maioria dos cristãos
segue esse ensinamento. Mas a Bíblia também
não diz nada acerca da reencamação. . . e é um
fato bem conhecido que o Concilio de Nicéia
tomou a resolução de suprimir da Bíblia o ensina­
mento sobre a reencamação.”

Presume-se que Kevin esteja dizendo que houve uma


época em que a Bíblia continha ensinamento sobre a
reencamação, mas que a igreja do século quatro orde­
nou que essas porções das Escrituras fossem rasgadas,
cortadas, queimadas ou de alguma forma destruídas.
Felizmente, existem volumes e mais volumes de regis­
tros da história da igreja que relatam com detalhes o
conteúdo, as ações, e as resoluções do Concilio de
Nicéia e a história da igreja primitiva. Nenhum histo­
riador responsável, levando em consideração todos os
registros à nossa disposição, concordará com Kevin em
que a reencamação teve alguma relação com o concilio,
ou com o conteúdo original da Bíblia, ou com a solidez
da doutrina da igreja.
Mesmo a logística de uma conspiração dessas exige
demais da nossa credulidade. Como poderia a igreja ter
tido acesso a todos os exemplares da Escritura que já
haviam sido escritos durante os dois séculos anteriores?
Como poderiamos explicar os manuscritos que possuí­
mos que foram compostos antes dessa época, e que
estão de acordo com os textos que temos hoje, mas que
não mencionam a reencamação? Como poderiamos
Um Waíergate da Reencarnação? 147

explicar o fato de que os lecionários (coleções de leitu­


ras bíblicas usadas nos ofícios divinos) da igreja primi­
tiva, a partir dos quais podemos recriar o texto
praticamente completo do Novo Testamento, ignoram
de todo aquilo que Kevin assume ter sido um ensina­
mento bíblico central? E como poderiamos harmonizar
os dois mutuamente excludentes ensinamentos da res­
surreição versus reencarnação dentro de uma Bíblia
unificada? Como podería o processo de mutilação evi­
tar o aparecimento de perceptíveis lacunas nos registros
bíblicos? Por que nenhum registro das passagens supri­
midas foi feito a partir da memória de alguns pró-reen-
camacionistas que pudessem ter vivido naquela época,
visto que essa seria uma supressão da maior magnitude
histórica e espiritual para eles?
Quando a Srta. MacLaine pressionou Kevin para
dizer como tinha conhecimento dessa pretensa ação do
concilio de Nicéia, ele respondeu: “Ora, a maioria dos
estudantes metafísicos sérios da Bíblia sabe disso. O
Concilio de Nicéia alterou muitas das interpretações
bíblicas.”
A questão levantada diante do concilio foi quanto à
natureza da divindade de Cristo. E esse um assunto que
deveria ser considerado com mais cuidado pelos reen-
camacionistas, visto que eles universalmente negam a
singular divindade de Cristo. Mas o assunto em debate
não era a reencarnação. Era se Cristo, o Filho, havia
etemamente coexistido com Deus Pai, ou se ele foi a
primeira criação espiritual de Deus antes da criação do
mundo. Em simples enunciado, era Cristo inteiramente
igual a Deus? Essa pergunta era importante para resol­
ver o problema da Trindade — isto é, Pai, Filho e
Espírito Santo.
148 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Um segundo e menos importante problema apresen­


tado ao concilio foi se o Jesus histórico era Deus em
corpo humano, ou se Jesus apenas recebeu uma dimen­
são especial de divindade. Ironicamente, a questão sur­
giu porque algumas pessoas haviam começado a alegar
que Jesus tinha sido um bom mestre moral mas não
realmente divino — a mesma mensagem que temos
ouvido da parte daqueles que estão no movimento da
Nova Era!
E fácil ver em que consistia a controvérsia mediante
uma leitura da resolução do Concilio, formulada em um
credo largamente publicado, que tem sido recitado re­
gularmente desde essa época até hoje, no qual há uma
parte que diz:
“Cremos em um Senhor, Jesus Cristo, o unigê-
nito Filho de Deus, etemamente gerado do P a i...
Deus de Deus, Luz de Luz, Deus verdadeiro de
Deus verdadeiro, não feito, um único Ser com o
Pai.”
Como muitas vezes ocorre entre os proponentes da
reencamação, Kevin perdeu de vista a diferença entre
a verdade e a ficção. E fico curioso a esse respeito. É
esse desleixo com os fatos históricos o que se pode
esperar de médiuns supostamente em contato com os
oniscientes Registros Akáshicos? Têm eles permissão
especial para operar na região de lusco-fusco da verda­
de, onde insinuações tão facilmente atraem os crédu­
los?
Um Watergate da Reencamação? 149

DAVID E O CONCÍLIO
Naturalmente, David também contou à Srta. Mac-
Laine a respeito do pretenso “Watergate da Reencar-
nação” da igreja:

A teoria da reencamação está registrada na


Bíblia. Mas as interpretações apropriadas foram
suprimidas durante a reunião do Concilio Ecumê­
nico da Igreja Católica em Constantinopla por
volta do ano 553 da nossa era. Foi o Concilio de
Nicéia. Os membros do concilio votaram pela
supressão desses ensinamentos a fim de consoli­
dar o controle da igreja. De qualquer forma, isso
é o que acredito que Cristo realmente estivesse
fazendo, e quando a igreja destruiu esses ensina­
mentos, bagunçou a raça humana daí por diante.

Tragicamente, David revela patente descaso para


com a verdade. O concilio de Nicéia foi convocado por
Constantino em 325 AD, não em 553. O concilio que
se reuniu no ano 553 da nossa era foi o Quinto Concilio
Ecumênico, conhecido como Constantinopla II. Nesse
último concilio, diversos assuntos foram discutidos,
mas não se tocou na reencamação. É interessante notar
que um dos assuntos que foi discutido fez surgir a
declaração que mais tarde a Srta. MacLaine leu na
Enciclopédia Católica, de que “qualquer pessoa que
afirmasse crer na preexistência das almas” seria anáte-
ma (oficialmente denunciada).
Essa foi a resposta do concilio ao ensinamento que
vinha persistindo desde o terceiro século, ocasião em
que um teólogo chamado Orígenes especulou que a
alma era pré-existente — não que tivesse passado por
150 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLcàne

encarnações anteriores, mas apenas que já existia antes


do nascimento da pessoa.
Em suas primeiras obras, Orígenes havia ensinado
que os seres humanos tinham sido criaturas angélicas,
e, à moda cármica, haviam sido afetadas nesta vida,
dependendo de se tinham sido boas ou más em sua
existência angélica. Entretanto, da mesma forma que
Orígenes rejeitou encarnações anteriores, rejeitou tam­
bém a idéia de que haveria futuras encarnações.
Ao comentar a respeito da já discutida teoria de que
João Batista era o profeta Elias reencamado, Orígenes
escreveu:

“Nesse lugar, não me parece que ao se mencio­


nar Elias se esteja referindo à alma, para que eu
não caia no dogma da transmigração [reencar-
nação], que é estranho à Igreja de Deus e não faz
parte dos ensinos dos Apóstolos, nem é apresen­
tado em parte alguma das Escrituras. Observe-se
que Mateus não disse: na “alma” de Elias, pois
nesse caso a doutrina da transmigração poderia ter
alguma base, mas, sim, “no espírito e poder de
Elias.”

É digno de nota o fato de que, escrevendo pelo menos


70 anos antes do Concilio de Nicéia e uns 300 anos
antes de Constantinopla II, o próprio Orígenes indicou
que não havia nenhum ensinamento de reencarnação na
Bíblia, nem nos ensinamentos dos apóstolos, nem na
igreja.
Quanto à condenação do ensino da preexistência, a
igreja a emitiu não porque ameaçasse a doutrina ecle­
siástica, mas porque essa idéia não é ensinada na Bíblia.
E o que é mais importante, nem uma vez durante o
Um Watergate da Reencarnação? 151

primeiro milênio a igreja chegou mesmo a considerar


a idéia da reencarnação, quanto mais alterar delibe-
radamente a Bíblia com o fim de eliminá-la.
Se, na realidade, a igreja tivesse envidado um esforço
assim, por que ainda existem tantos pretensos textos-
-prova da reencarnação na Bíblia? Por exemplo, se a
afirmação de Paulo de que “aquilo que o homem se­
mear, isso também ceifará” for realmente um ensina­
mento cármico, por que não foi essa passagem tirada?
Por que a declaração de Jesus acerca de Elias e João
Batista não foi eliminada? Podemos dizer o mesmo a
respeito da dezena de outras passagens prediletas que
têm sido reinterpretadas pelos reencamacionistas.
Também existe abundante evidência de que a igreja
jamais acrescentou passagens que diretamente contra­
dizem a idéia da reencarnação. A passagem que diz:
“Aos homens está destinado morrerem uma só vez e,
depois disto, segue-se o juízo" (Hebreus 9:27) encon­
tra-se no original da Bíblia. As cartas de Paulo aos
cristãos de Tessalônica e Corinto estão cheias de ensi­
namento sobre a ressurreição, o qual é completamente
incompatível com o da reencarnação.

TODAS AS PEÇAS SE ENCAIXAM

Depois de certo tempo, a coisa fica ridícula. E, ao


longo do caminho, perde-se de vista algo importante:
quando se lê a Bíblia de capa a capa, especialmente em
ordem cronológica, o que ali se encontra é uma incrível
unidade e harmonia em todos os diversos registros. Na
forma como recebemos essa coleção de Escrituras,
todas as peças se encaixam. Até John da livraria Bodhi
Tree admitiu isso: “A maioria de seus escritos concor­
dam entre si também”, disse ele à Srta. MacLaine.
152 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

A história bíblica se encaixa na história secular; os


grandes temas da lei e dos profetas se encaixam nos
grandes temas do Messias e dos escritos dos apóstolos;
as profecias durante os mais de 2.000 anos antes de
Cristo se encaixam, com detalhes, na vida de Jesus. Se
a Bíblia fosse produto de alterações, traduções infiéis
e interpretações particulares, como se alega, as peças
simplesmente não se encaixariam como o fazem.
Vendo a Bíblia como um todo, encontramos Abraão
e os patriarcas “indo para seus pais” ou sendo “reunidos
ao seu povo” ao morrerem. Ouvimos Davi dizer a
respeito do filho que morreu: “Irei a ele, porém ele a
mim não tomará.”
Em um de seus salmos, os filhos de Coré perguntam
retoricamente: “Os finados se levantarão para te lou­
var?” Em sábias palavras, Agur pergunta: “Quem subiu
ao céu e de lá desceu?... Dize-me, se sabes!” Ao
contemplar a sua morte, o rei Ezequias de Judá se
lamenta: “Já não verei o Senhor na terra dos viventes;
jamais verei homem algum entre os moradores do mun­
do”.
O mais instrutivo escrito em toda a Bíblia sobre a
questão da vida presente e da futura é o livro de Ecle-
siastes, da autoria do rei Salomão, famoso pela sabedo­
ria que lhe foi dada por Deus. Salomão faz a pergunta
essencial: Quem nos pode contar o que acontecerá
depois que a pessoa se for? O homem, assim como os
animais, não pode impedir a sua própria morte. Nossos
corpos — quer animais, quer humanos — deterioram,
morrem e apodrecem.
Não escolhemos a hora da nossa partida, da mesma
forma que não escolhemos a hora da nossa vinda ao
mundo. Portanto, precisamos encontrar o significado
Um Watergate da Reencarnação? 153

da vida no tempo que temos sobre a terra. Depois, será


tarde demais.
Voltarão os mortos a esta terra? Não, diz Salomão:
“Para sempre não têm eles parte em coisa alguma do
que se faz debaixo do sol”. Portanto, aconselha ele:
“Tudo quanto te vier às mãos para fazer, faze-o confor­
me as tuas forças, porque no além para onde tu vais,
não há obra, nem projetos, nem conhecimento, nem
sabedoria alguma.” Segundo Salomão, qualquer idéia
parecida com a reencarnação é mera fantasia.
NOSSO PROPÓSITO EM VIVER
Qual é nosso propósito em viver? Não é nenhuma
das coisas de que fazemos enquanto corremos por aí.
Acho que a Srta. MacLaine gostaria daquilo que Salo­
mão diz aqui. Ele diz que estamos apenas nos enganan­
do ao pensarmos que conquistas, prazeres, mate-
rialismo, política, popularidade e poder são as coisas
que constituem a vida. Afinal de contas, concorda Sa­
lomão, não podemos levar conosco nenhuma dessas
coisas ao partirmos!
Então, de que constitui a vida? De coisas que são
eternas. Deus, diz Salomão, “pôs a eternidade no cora­
ção do homem.” E assim que somos diferentes dos
animais. Cada um de nós tem uma alma que vive além
da morte. E seremos um dia julgados quanto à qualidade
do preparo que demos à nossa alma para a sua vida
futura.
Portanto, conclui Salomão: “Lembra-te do teu Cria­
dor. .. antes que... o pó volte à terra, como o era, e o
espírito volte a Deus, que o deu.”
Não foi um concilio da igreja primitiva que mudou
o que a Bíblia diz a respeito da vida presente e da futura.
São os próprios reencamacionistas que enganam (de
154 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

maneira consciente ou inconsciente) pessoas crédulas,


fazendo com que acreditem que a Bíblia que temos hoje
não é aquilo que foi originalmente dado e preservado
por Deus.
Se o carcereiro fosse intimado a depor, ele estaria
testemunhando honestamente ao dizer que nada sabe a
respeito de algum pretenso Watergate da reencamação.
Mas também poderia dizer-nos de pessoas que acabam
indo parar sob sua custódia por perpetrarem fraude
contra o público. Talvez os reencarnacionistas deves­
sem pensar um pouco a esse respeito. Há um Juiz bem
interessado naquilo que eles andam dizendo às pessoas:
“Porque Deus há de trazer a juízo todas as obras até as
que estão escondidas, quer sejam boas, quer sejam
/ 99
mas.
CAPÍTULO DEZ

UM CARMA
INDIFERENTE

“Não sou mais cristão do que Pilatos foi, ou você é,


amável ouvinte; e, contudo, à semelhança de Pilatos,
prefiro muito mais Jesus de Nazaré a Anás ou Caifás;
e estou pronto a admitir que não vejo outra solução
para a miséria do mundo a não ser o caminho que teria
sido encontrado por sua vontade.”
— George Bem ar d Shaw

Os reencamacionistas não apenas afirmam falsa­


mente que a Bíblia foi alterada para omitir os ensina­
mentos reencamacionistas, como também afirmam
erroneamente que a doutrina do carma é melhor e mais
justa para com a humanidade do que as crenças cristãs.
Apegando-se à falsa segurança da retribuição cósmica,
os reencamacionistas correm o risco de afogar-se espi­
ritualmente ao se recusarem a lançar mão da corda
salvadora do amor e graça dinâmicos de Deus para com
a humanidade imperfeita.
A lei impessoal não pode dispensar a graça visto que
a graça é favor imerecido que requer inteligência e
156 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

compaixão, acompanhados de um relacionamento di­


nâmico entre aquele que dispensa justiça e o que a
recebe. Permitam-me ilustrar o que quero dizer com
algo que me aconteceu quando era promotor.
Telefonou-me um advogado para informar-me de
pormenores quanto a apuros em que se encontrava um
cliente seu. Parece que o tal cliente havia sido apanhado
entre dois computadores e a polícia estadual. Quando
o computador da sua seguradora não emitiu o formulá­
rio certo, mostrando prova de que ele estava segurado,
o computador do Departamento de Veículos Motoriza­
dos emitiu um aviso de suspensão de sua carteira de
motorista, e notificou a polícia estadual. Essa ficou
então obrigada a prender o homem se o visse dirigindo
pelas estradas, o que ele não podia deixar de fazer, se
quisesse manter-se no emprego.
O homem foi preso duas vezes por “dirigir enquanto
suspenso”, e cada vez explicou como já tinha feito todo
o possível para acertar a papelada. Lidar com compu­
tadores pode ser uma experiência enlouquecedora para
qualquer pessoa, mas para piorar o problema neste caso,
o cliente não era particularmente inteligente. Até mes­
mo o policial que lhe havia dado a multa mais recente
confirmou que era uma situação idiota.
Não havia problema, disse eu ao advogado. Eu liga­
ria para o juiz de paz e retiraria a queixa no interesse
da justiça. Retirar queixas é rotina. A maioria dos juizes
já tem casos o bastante para mantê-los ocupados, e parte
do trabalho do promotor é exercer seu critério nos casos
difíceis. Mas, para surpresa minha, o juiz de paz — um
senhor idoso que já havia exercido o cargo de promotor
que hoje era meu, mas que agora estava parcialmente
aposentado — recusou-se a permitir a retirada da quei­
Um Carma Indiferente 157

xa. Nenhuma explicação foi dada. — Ora — disse eu


— simplesmente não comparecerei para o julgamento.
— Então julgarei o caso sem você — respondeu o
juiz bruscamente.
Ao me deparar com essa perspectiva, informei tanto
o advogado do acusado quanto o policial que efetuara
a prisão que teríamos de levar adiante o processo. A
hora marcada, encontramo-nos no pequeno tribunal,
juntamente com seis ocupados fazendeiros que haviam
sido chamados de suas plantações de batatas aquele dia
para servirem como jurados.
Não demorou muito para eu colocar o policial no
banco das testemunhas e respigar os fatos básicos que
provavam o caso prima facie. Dei por encerrada a
argumentação do Estado e ouvi o acusado contar a sua
história, com a ajuda das perguntas do seu advogado.
De novo, sua história parecia crível e plausível.
Quando chegou a minha vez de apresentar os argu­
mentos ao júri, senti que lhes devia desculpas — e
disse-lhes isso — por ter de desperdiçar o seu tempo.
— Encontro-me numa situação totalmente incomum—
disse-lhes eu. — Sem dúvida, existe aqui uma violação
da lei, tecnicamente falando, mas os senhores ouviram
a história do acusado, e ela faz muito sentido para mim.
Quer-me parecer que ele fez tudo o que pôde para
obedecer à lei. Portanto, peço-lhes o veredicto de Ino­
cente.
Rubro de raiva, o juiz bateu com o martelo e ameaçou
processar-me por desacato ao tribunal.
— Senhor promotor — quase berrou ele, — seu
dever é fazer a acusação!
— Sinto muito, Meritíssimo — repliquei — mas
jurei promover a justiça. — Com isso, e diante dos
158 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

olhares surpresos dos jurados, o juiz resmungou irritado


consigo mesmo e acomodou-se na cadeira.
O advogado de defesa levantou-se lentamente e me-
neou a cabeça.
— Que lhes posso dizer, senhores? Neste caso, con­
cordamos inteiramente com a promotoria! — Dentro
de cinco minutos, nós dois obtivemos o veredicto de
Inocente da parte de seis muito aborrecidos cultivado­
res de batatas.

A DIFERENÇA ENTRE
CARMA E DEUS

Se ficasse exclusivamente por conta da lei e mesmo


de um juiz indiferente, o acusado teria sido declarado
culpado. Se causa e efeito tivessem podido prevalecer
no tribunal, o carma teria condenado o pobre homem.
Essa é a diferença entre carma e Deus. Deus jurou fazer
justiça, e quando entregamos nossas vidas a Cristo, ele
não nos declarará culpados — mesmo que realmente
sejamos pecadores. O cerne do ensinamento bíblico
acerca da salvação é que, já que não somos perfeitos,
e, portanto, incapazes de cumprir perfeitamente a lei de
Deus, a salvação somente pode vir se pessoalmente
escolhermos a Cristo como nosso sacrifício pelo pecado
e como nosso defensor (advogado de defesa) diante do
Pai. Não quer isso dizer que possamos alegar ignorân­
cia das leis de Deus, ou agir irresponsavelmente, recu­
sando-nos a obedec er a elas. Antes, quer dizer que,
quando tivermos feito tudo o que pudermos para obe­
decer à sua vontade e mesmo assim não conseguirmos,
podemos escolher a Cristo como nosso Salvador.
Em contraste, não há ninguém para nos defender nos
tribunais do carma. Na verdade, é quase um exagero
Um Carma Indiferente 159

dizer que o carma tem algum tribunal. O carma asse­


melha-se mais a uma agência administrativa do gover­
no cósmico, aberta para servir ao público somente
durante horas estritamente limitadas.
A coisa realmente apavorante a respeito do carma
não é tanto o fato de ele não ser nem compassivo nem
misericordioso — o que não é — mas, sim, de nem
mesmo haver prova de que é inteligente. Quando con­
sideramos um Deus inteligente o bastante para criar o
Universo, podemos pelo menos assumir que ele tem
capacidade para nos tratar com inteligência! Mas com
o carma, não temos esse tipo de garantia. Tudo o que
temos pela frente é um princípio teórico que não pode
adaptar-se a nenhuma situação da vida real.
Não é difícil ver que a lei de causa e efeito tem
significativas limitações na área dos atos e relações
humanos. Nas realidades inesperadas da vida, quem
vence a corrida não é necessariamente o corredor mais
veloz, nem quem vence a guerra é o exército mais forte.
Basta perguntar à corredora Mary Decker Slaney ou aos
veteranos da guerra do Vietnã. Da mesma forma, nem
sempre a abundância sobrevêm aos sábios, nem a ri­
queza aos mais inteligentes.
Deus conhece as desigualdades da vida. Mas que
garantia podemos ter de que a lei impessoal do carma
pode relacionar-se de maneira inteligente com nossa
situação humana da mesma forma? Tratar com a lei do
carma é como tratar com alguém que esteja no nível
mais baixo de uma organização. Todos já ouvimos
freqüentemente a desculpa: “Estou apenas fazendo
aquilo que me mandaram.” É com alguém assim que
queremos tratar, ou com alguém lá de cima que possa
fazer exceções quando for o caso?
160 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Mas não é com o julgamento do carma que me


preocupo. Você já ouviu falar das sentenças por ele
dadas? Já vi algumas sentenças trágicas serem lavradas,
mas que nem podem ser comparadas àquilo que nos
dizem acontecer quando o carma preside ao tribunal.
Por exemplo, segundo as leituras de Cayce, conforme
as apresenta Gina Cerminara, qualquer anormalidade
de nascença “é provavelmente de origem cármica”.
Defeitos de nascença acontecem à criança, aprego­
am os reencamacionistas, devido a transgressões por
ela cometidas no passado. E por ter um filho assim, os
pais geralmente também estão pagando por algum car­
ma da vida passada. Cerminara continua: “Vez após
vez, nas leituras [de Cayce] feitas de crianças portado­
ras de idiotismo mongólico, surdez, água no cérebro e
muitas outras trágicas desgraças, encontramos esta fra­
se: ‘Isto é carma, tanto para os pais quanto para a
criança'”.
O mais desagradável aspecto de tudo isso é o que
Cerminara diz com relação aos pais dos que nascem
defeituosos: “Para esses pais, o princípio da reencar-
nação pode ser fonte de segurança e coragem.” Até
Shirley MacLaine acha que o carma é uma explicação
confortadora para coisas como a morte de bebês.
Você iria querer “confortar” seus amigos cujo bebê
nasceu defeituoso entrando no quarto do hospital onde
está a criança deformada e anunciando com confiança
que eles nada têm com que se preocupar — que mere­
cem o ocorrido, e que isso é apenas a forma encontrada
pelo carma de ajudar tanto a criança quanto os pais a
evoluírem a um mais alto nível de esclarecimento?
Um Carma Indiferente 161

NENHUM DEUS FEROZ LÁ NO CÉU


John Van Auken orgulha-se bastante do fato de que
o carma “não é um deus feroz lá no céu, que anota tudo
o que as pessoas fazem a fim de poder abatê-las quando
elas menos esperam.” Fico contente em dizer que o
Deus da Bíblia não é assim, embora eu não possa dizer
o mesmo do carma, que ataca crianças com deformida­
des por causa de atos reprováveis de vidas anteriores!
Porém, Van Auken diz que precisamos ver os benefí­
cios por trás desse ataque. “A lei é, na verdade, uma
ferramenta magnífica para perfeito aprendizado. É to­
talmente impessoal.. . ”
Em sua perspicaz crítica Reencarnação— Uma Ava­
liação Cristã, Mark Albrecht lança um pouco de luz
sobre essa afirmativa com o seguinte exemplo:
Hitler morreu em 1945; suponhamos que vol­
tasse em 1947 como um bebê aleijado chamado
Edgar Jones, que nasceu em Nova York, não tendo
a menor idéia de ser Adolf Hitler reencamado nem
de estar sofrendo pelos crimes do “Führer” nazis­
ta. E nesse ponto que a justiça se desintegra total­
mente, pois a verdade é que somente Adolf Hitler
pode pagar por seu carma e ser castigado pelo mal
que fez. Mas ele já se foi, visto que sua persona­
lidade na verdade deixou de existir em 1945 e o
pequenino Edgar Jones carrega agora o pesado
fardo da dívida cármica de Hitler. Assim, Hitler
logra o carrasco enquanto Edgar é vitimado.
Quando Edgar morre, outra pessoa nasce com o
carma de Hitler, e assim o processo é repetido
milhões de vezes... a amarga pílula desse sofri­
mento contínuo provavelmente teria um efeito de
162 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

reação em cadeia, levando amargura e má vontade


a se alastrarem, talvez chegando até a produzir
outros Hitlers.
Se há aqueles que acham repelente a idéia de um
Deus de juízo, com certeza devem rejeitar mais ainda
um deus que julga impessoalmente — sem justiça,
inteligência, empatia ou misericórdia. E que ninguém
se engane: se o carma é aquilo que dizem ser, tem todos
os atributos de um deus menor, cujos braços são curtos
demais para nos erguer quando caímos.
Os reencamacionistas da Nova Era orgulhosamente
proclamam que não existe um deus pessoal além de nós
mesmos, mas apenas uma lei impessoal mediante a qual
operamos. Fico curioso em saber quanto eles realmente
gostam de ser apenas um rosto na multidão, receber
cartas endereçadas ao “morador”, ser um número da
previdência num papel impresso no computador ou
falar com uma secretária eletrônica!
Talvez seja necessário ser advogado para se avaliar
bem quanto a lei pode às vezes ser fria e impessoal. Ela
é uma pacificadora inadequada; não traz reconciliação,
nenhuma verdadeira satisfação. Quando a disputa a
respeito da linha divisória das propriedades tiver sido
resolvida no tribunal, os vizinhos ainda terão de viver
bem lado a lado. E nenhuma lei pode fazer isso. A lei
do carma certamente jamais será acusada de ser muito
calorosa ou humana.
Em contraste, Deus conhecia bem as limitações da
lei — qualquer lei. O Deus da Bíblia, que originalmente
deu as Leis de Moisés, deu-nos agora graça e verdade
através da pessoa de Jesus Cristo. Deus nunca preten­
deu que a lei trouxesse reconciliação e salvação. Antes,
Um Carma Indiferente 163

Deus pretendeu que a lei nos mostrasse quão pecadores


somos, o quanto precisamos da sua graça.
O Deus da Bíblia não espera até que paguemos nossa
dívida cármica antes de julgar-nos elegíveis para a
salvação; ele baseia nossa elegibilidade no sacrifício de
seu Filho em nosso lugar:
“Porque Cristo, quando nós ainda éramos fra­
cos, morreu a seu tempo pelos ímpios... Mas
Deus prova o seu próprio amor para conosco, pelo
fato de ter Cristo morrido por nós, sendo nós ainda
pecadores. Logo, muito mais agora, sendo justifi­
cados pelo seu sangue, seremos por ele salvos da
ira” (Romanos 5: 6,8,9).

O PADRÃO DUPLO DO CARMA


É sempre uma frustração lidar com um padrão duplo.
E, no entanto, é o que temos de enfrentar nos sistemas
de autoridade alternativa que nos são oferecidos. Por
um lado, dizem-nos que o carma dita quem e o que
seremos em nossas vidas futuras, tudo baseado impar­
cialmente na lei da causa e efeito. Por outro lado,
Shirley MacLaine nos diz que nós próprios tomamos
essas decisões. Isso já cria bastante confusão, mas a
inferência que traz é pior.
Por que padrão estamos sendo julgados? O do carma
ou o nosso? Outra vez, por um lado dizem-nos que se
não “acertarmos” pelo padrão do carma, enfrentaremos
uma nova e desapontadora missão da próxima vez. Por
outro lado, dizem-nos que devemos agir com base na
verdade que a Srta. MacLaine diz estar dentro de nós,
à medida que passamos a conhecê-la através de nossas
singulares percepção e experiências. Esse óbvio confli­
to é justo? Acharíamos injusto se supostos pais permi­
164 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

tissem ao filho agir livremente, enquanto ausentes, mas,


ao voltar, o repreendessem ao descobrirem que a crian­
ça havia comido cinco pratos de sorvete.
A lei do carma não passaria no mais leve exame
judiciário. Como parte do devido processo, os tribunais
têm insistido em que os estatutos normativos incluam
uma definição clara e uma expedição de aviso adequa­
do. As leis da vadiagem, por exemplo, têm repetidas
vezes sido declaradas inválidas por conterem um pa­
lavreado tão abrangente que toma ilegal todo o tipo de
atividade inofensiva. Se testada da mesma forma, a lei
do carma não apenas seria “anulada por imprecisão”,
como também seria derrubada por não fornecer padrão
de espécie algumal
Acho particularmente espantoso o fato de america­
nos imparciais acreditarem num sistema de julgamento
que não está ligado a nenhuma diretriz conhecível para
a conduta humana. Não existe fonte alguma de regras,
padrões ou princípios para o carma que seja compará­
vel, por exemplo, à Bíblia ou a outros códigos morais
escritos.
O que o carma da Nova Era diz é: “Olhe para o seu
íntimo e resolva o que acha que deveria ser e fazer na
vida; depois, quando morrer, será decidido se você fez
ou não boas escolhas. Caso não haja escolhido bem,
inexiste outra alternativa senão deixar você sofrer as
naturais conseqüências de tais opções.”
Até mesmo a nossa Constituição proíbe a aprovação
de leis das quais resulte responsabilidade criminal ex
post facto — isto é, após o fato. O propósito dessa
restrição é evitar a injustiça de punir alguém por come­
ter ato não previamente tipificado como defeituoso.
Visto que o carma não nos avisa quanto às causas cujos
Um Carma Indiferente 165

efeitos teremos de sofrer em vidas futuras, é um julga­


mento moral ex post facto.
Num minuto, a Srta. MacLaine insiste em que é
errado julgar as crenças ou ações de alguém. No minuto
seguinte, ela diz que tudo é resultado da causa e efeito
cármicos, o julgamento moral final, impessoal, inesca-
pável. Mas, pior ainda, é um julgamento sem um padrão
moral claro que lhe sirva de base.
Pense nisso: Qual é o padrão que devemos seguir se
não os ensinamentos da comprovada Palavra de Deus,
a Bíblia? E a “moralidade universal”? (Todo mundo
está de acordo quanto à moral?) E o “fazer o que der
na telha”? (Mesmo que prejudique outras pessoas?) É
seguir a própria consciência? (Você está preparado para
oferecer essa opção ao chefe da quadrilha mais próxi­
ma?) E o satisfazer às expectativas da sociedade? (Qual
sociedade? A do Aiatolá?) É prestar rigorosa atenção a
dietas, exercício e meditação? (Podemos fazer dieta,
exercício e meditação o suficiente?) São os nossos
sentimentos? (Em que dia?) São as nossas experi­
ências? (Em que ponto de nossas vidas?)
Qualquer desses padrões deixa muito espaço para
conduta questionável, e ética situacional. Sobre que
base poderiamos, como sociedade, fazer necessários
julgamentos sociais com relação à conduta de qualquer
pessoa? Quem poderia tomar-se legislador, juiz ou
executor da lei? O esclarecimento de uma pessoa não
se toma o mau carma da outra? Não incentiva nossa
escolha de que padrão a seguir? Suponhamos que este­
jamos errados no próprio padrão que escolhermos...
FRACASSO EM CHEGAR À PERFEIÇÃO
Mesmo que pudéssemos descobrir o padrão por que
a lei do carma nos iria julgar, nós defrontaríamos então
166 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

com a tarefa de atingir esse padrão— por meio de nosso


próprio esforço. E é inútil tentar alcançar a perfeição
por conta própria: sabemos que nunca o conseguiremos
durante uma única vida, e não há motivo para crer que
poderiamos fazê-lo em mais de um milhão de vidas. O
tempo não resolve problemas inerentes ao sistema.
O ponto mais básico de todo o carma desfavorável,
dizem-nos, é a simples crença na realidade da vida em
si. Portanto, as pessoas que pensam ter nascido neste
mundo, e pensam viver neste mundo material como o
percebemos ser, estão automaticamente destinadas a
voltar a fim de se conscientizarem de que tudo isso nada
mais é que ilusão — o que, em si, é uma estranha
maneira de ajudar alguém a enxergar a realidade! As­
sim, é impossível atingir um padrão perfeito de conduta
(uma incógnita em si mesmo) ou livrar-nos de uma
grande ilusão.
Ao perceber que o Titanic da reencamação colidiu
com esse frio fato e está afundando depressa, os reen-
camacionistas ocidentais perdem toda a vergonha e
pulam nos barcos salva-vidas marcados “Para Uso Ex­
clusivo dos Cristãos”. Lembrem-se de que o capitão do
navio estava acabando de dizer aos passageiros quão
segura é a lei do carma por ser absolutamente impessoal
e estar sempre a administrar causa e efeito para manter
a quilha da vida em perfeita centralização e equilíbrio.
Quando, porém, os barcos salva-vidas caem na água,
ouvimos os reencamacionistas falando acerca de um
novo método salva-vidas do qual ninguém lá no porto
de Calcutá, de onde partimos, jamais ouviu falar. Mais
uma vez, Van Auken é o porta-voz dos reencar-
nacionistas:
Um Carma Indiferente 167

Associado a essas “peculiaridades” da lei [do


carma] encontra-se o mais surpreendente aspecto
da lei, a graça. A graça é como se ficássemos
temporariamente livres da lei a fim de nos estru­
turarmos. Quando a alma se desvia de seus cami­
nhos auto-orientados e começa a procurar
novamente seu propósito original e o seu primeiro
amor, a lei fica temporariamente suspensa. Essa
suspensão dá à alma que busca tempo a fim de
reunir suas forças para a viagem de volta ao lar.
A alma ainda terá de encontrar a si mesma e a seus
pensamentos, ações e palavras pelo caminho, mas
estará à altura da tarefa por causa da graça.

Bem, aí está — a cristianização final do carma! Mas


é também a castração final do carma, porque por sécu­
los nos disseram que a vantagem do carma sobre o
cristianismo é a de que, com o carma, nada fica ao sabor
do acaso, do capricho ou de qualquer idéia tola de
misericórdia ou perdão. Recebe-se de acordo com aqui­
lo que se faz.
Agora nos dizem que o carma pode ser suspenso
temporariamente. Claro que não nos dizem em que
circunstâncias ele será suspenso, nem o que significa
dar “à alma que busca tempo a fim de reunir suas forças
para a viagem de volta ao lar”. Tampouco nos dão a
menor indicação de onde essa lei da graça foi descober­
ta na ordem cósmica, ou como lhe é possível coexistir
com a mutuamente excludente lei do carma. Contudo,
a história da Nova Era diz que onde existe carma
desfavorável em profusão haverá profusão também da
graça cristã. Naturalmente, isso teria tanto sentido
168 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

quanto se os comunistas soviéticos condenassem o


capitalismo para depois introduzirem a livre iniciativa.
O carma é um deus impotente, impessoal e indife­
rente. Vesti-lo com a roupagem estranha da graça pseu-
do-cristã apenas o deixa pouco à vontade e totalmente
bizarro. É verdade, quanto mais se parecer com o real,
mais bem-sucedida será a fraude. Mas debaixo dessa
roupagem, o carma ainda é carma — impotente, impes­
soal e indiferente.
A VERDADEIRA GRAÇA CRISTÃ
A graça cristã é um dom gratuito de Deus a todos os
que a ele entregaram suas vidas pela fé. Nada tem a ver
com o cumprimento de alguma lei. De fato, a graça
cristã faz-se necessária porque ninguém pode cumprir
a lei. Ela não exige que nos tomemos perfeitos no
decorrer de muitas vidas. A graça de Deus remove o
nosso pecado e nos considera como sendo perfeitos
mesmo que não o sejamos. O apóstolo Paulo foi cate­
górico ao afirmar que a salvação não é realizada pelas
obras, quer cristãs, quer cármicas: “Porque pela graça
sois salvos, mediante a fé; e isto não vem de vós, é dom
de Deus; não pelas obras, para que ninguém se glorie.
Pois somos feitura dele, criados em Cristo Jesus para
boas obras, as quais Deus de antemão preparou para
que andássemos nelas.”
Estive recentemente no cômodo onde John Newton
escreveu o maravilhoso hino “Graça Inaudita”. A sere­
nidade do estudo no segundo andar da antiga casa
pastoral em Olney, Buckinghamshire, desmentia a vida
tempestuosa de Newton. Aos 23 anos de idade, ele
quase perdeu a vida, a bordo de um cargueiro selvage-
mente sacudido por mares turbulentos. Quando ele
clamou a Deus acima do vento furioso, espantou-se
Um Carma Indiferente 169

com a misericórdia de Senhor em salvá-lo. Porém não


foi essa a única experiência que inspirou as palavras do
hino mais popular do mundo.
Durante o tempo que passou na marinha mercante,
Newton se envolveu com o comércio de escravos afri­
canos. Oprimido pela culpa, ele mais tarde renunciou a
essa prática. Tomou-se um ministro e uniu-se à luta pela
abolição da escravatura. Se ele estivesse pensando ape­
nas no quase encontro com a morte, o primeiro verso
do hino poderia ter sido: “Graça inaudita, tão doce soa,
que me salvou de mares tempestuosos.” Mas Newton
percebeu que a graça de Deus era muito mais impor­
tante do que salvar uma vida da morte. Ele acreditava
que, pela graça de Deus, havia-se tomado um novo
homem, uma alma perdoada, renascida.
Juntamente com um pequeno grupo de cristãos reu­
nidos na sala de estudos de Newton num dia chuvoso,
eu também conheci o rico significado da graça de Deus
em minha vida. Senti o que Newton deve ter sentido
quando olhou para trás e viu sua vida imperfeita e
percebeu que Deus tinha oferecido perdão gratuito dos
pecados. Enquanto jubilosos cantávamos o hino, com
os olhos embaçados de lágrimas e com a voz embarga­
da, agradecí a Deus.

A graça eterna de Jesus,


Que veio me libertar,
A mim tão grande pecador,
O graça singular!
Perigos e horrores passarei,
Na peregrinação,
Mas pela graça alcançarei
Celestial mansão.
170 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Se estivermos procurando alguém que realmente se


importe conosco e com as lutas que enfrentamos todos
os dias, é para Deus que nos devemos voltar. O carma
não poderia ser mais indiferente.
CAPÍTULO ONZE

ENTÃO, QUAL É A
ATRAÇÃO?

“Apegamo-nos, como que a uma bóia, às idéias que


representam nossa compreensão. ”
— John Kenneth Galbraith
A Sociedade Afluente

Se, na verdade, o carma é perigoso à luz da experi­


ência humana e da verdade bíblica, por que tanta gente
o acha tão bom? Uma chave para a popularidade do
carma é muito simples: ele parece explicar por que
coisas ruins acontecem sem motivo aparente. A Srta.
MacLaine e muitos outros encontram certa satisfação
em acreditar que causa e efeito estão por trás de todas
as adversidades que encontramos. E essa lei também se
relaciona ao que sentimos quando a prosperidade nos
bafeja. É um tipo de relacionamento duplo — congra­
tule-se porque as bênçãos provam o seu valor, e culpe
os pecados em vidas anteriores por qualquer calamida­
de.
Quando está tudo cor-de-rosa e indo bem, algumas
pessoas tomam emprestada uma frase do filme “A
Noviça Rebelde”: “Em alguma parte de minha juven­
172 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

tude ou infância devo ter feito algo bom.” Mas quando


as circunstâncias se tomam adversas, muitas dessas
mesmas pessoas perguntam: “O que fiz para merecer
isto?” Quer estejam as coisas indo bem, quer mal,
procura-se uma relação de causa e efeito.
Quando tudo vai bem, gostamos de pensar que é por
estarmos vivendo da maneira certa. Existe aí certo
envolvimento do ego, como se mediante nossa própria
bondade mereçamos que coisas boas nos aconteçam.
No entanto, se insistimos em atribuir os bons tempos
a nosso próprio viver correto ou esforço moral, natu­
ralmente assumimos ser o oposto também,verdadeiro.
A coerência exige que atribuamos os maus tempos a
erro ou fracasso moral em nosso próprio viver. Somos
propensos a esquecer-nos do fato de que, assim como
o bem pode acontecer a pessoas más, o mal pode
acontecer a pessoas boas sem nada insinuar de adverso
sobre a sua bondade.
Quando chega ao ponto de tragédia, podemos culpar
a Deus, culpar a nós mesmos ou arrumar uma explica­
ção alternativa. Alguns preferem culpar a Deus, e “per­
dem a fé” do dia para a noite. Alguns culpam a Deus
num sentido secundário, como o popular rabino Kus-
hman, segundo quem coisas ruins acontecem a pessoas
boas por Deus não ser poderoso o bastante para impedir
que aconteçam. Para a maior parte das outras pessoas,
existe uma compreensão quase intuitiva de que Deus é
um Deus de amor que não envia sofrimento sobre nós.
Por isso, só nos resta culpar a nós mesmos. Entretanto,
é nesse ponto que nos defrontamos com uma barreira.
Ou não estamos dispostos a admitir nossas faltas ou
então percebemos nossas faltas mas não podemos com­
preender como poderíam ser sérias a ponto de merecer
que uma grande tragédia ocorra em nossas vidas.
Então, Qual é a Atração? 173

TRANSFERINDO A CULPA
O carma oferece uma explicação alternativa. Man­
tém a culpa sobre nós, mas à distância de um passo
gigantesco. Diz que somos responsáveis, mas não nesta
vida. Diz que aquilo pelo qual estamos passando é o
resultado do que fizemos em vidas anteriores. Nossa
tragédia é apenas parte de um sistema cósmico de
educação superior.
Para muitas pessoas, o carma é uma atraente expli­
cação, transfere qualquer culpa imediata para vidas
passadas das quais nem se conseguem lembrar. Somos
responsáveis pelas coisas ruins que nos acontecem, mas
não precisamos sentir-nos culpados por elas. É também
cativante, pois é algo a que nos apegar, mesmo que não
contenha um grama sequer de verdade. Pelo menos, é
uma explicação, o que, para muitas pessoas, é melhor
que nada.
Mas existem dois problemas sérios com a explicação
do carma. A primeira é simplesmente que, como já
vimos, nenhum de nós teve uma vida anterior na qual
acumulamos carma desfavorável. O segundo problema
é que, embora possamos ser a causa de nosso próprio
sofrimento, não é sempre que necessariamente o so­
mos.
Lembra-se o leitor de ter ouvido falar da paciência
de Jó? Ele foi o personagem bíblico conhecido pelo
grande sofrimento por que passou. Tendo sido muito
rico, perdeu tudo o que tinha, inclusive a família e a
própria saúde. Sua história, que se encontra no livro de
Jó, descreve como ele veio a compreender a causa do
seu sofrimento. Há importante mensagem para nós
naquilo que ele aprendeu. Quando Jó passou por grande
sofrimento, seus amigos insistiram repetidas vezes em
174 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

que era resultado de pecado. Quando Jó protestou, eles


lhe garantiram com maior vigor que ele estava sem
dúvida encobrindo algum pecado que tinha causado sua
desgraça. Mas a mensagem que Deus transmitiu a Jó é
a de que não existe necessariamente uma ligação entre
pecado e sofrimento ou justiça e prosperidade. O carma,
diz-nos o livro de Jó, simplesmente não é uma explica­
ção adequada.
Isso é também o que Jesus ensinou. Nem Kevin, nem
David jamais contaram à Srta. MacLaine o que Jesus
realmente disse. Houve uma ocasião em que Jesus
tratou diretamente do assunto quando lhe contaram
acerca dos galileus que haviam sido atacados e mortos
por soldados romanos enquanto estavam ocupados em
oferecer sacrifícios no templo: “Pensais que esses ga­
lileus eram mais pecadores do que todos os outros
galileus, por terem padecido estas coisas?” perguntou
Jesus. “Não eram, eu vo-lo afirmo.”
Depois, a fim de enfatizar o fato de não existir um
relacionamento cármico de causa e efeito entre pecado
e sofrimento, Jesus mencionou ainda outra tragédia
com a qual estavam familiarizados: “Ou cuidais que
aqueles dezoito, sobre os quais desabou a torre de Siloé
e os matou, eram mais culpados do que todos os outros
habitantes de Jerusalém? Não eram, eu vo-lo afirmo.”
Jesus opôs-se vigorosamente às idéias do carma,
algumas das quais podem até interferir na atitude cor­
reta dos relacionamentos pessoais. “Ouvistes o que foi
dito: Olho por olho, dente por dente. Eu, porém, vos
digo: Não resistais ao perverso; mas a qualquer que te
ferir na face direita, volta-lhe também a outra.” O
conceito de olho por olho é como que primo em primei­
ro grau do carma. Jesus disse que precisamos aprender
a superar atitudes desse tipo.
Então, Qual é a Atração? 175

Nosso exemplo vem do próprio Deus. Jesus nos


relembrou: “Ele faz nascer o sol sobre maus e bons,
sobre justos e injustos.” O clima é tamponco cármico.
O fato de o fazendeiro sofrer uma seca não diz que
algum mal exista no tipo de vida que ele leva. Se outro
fazendeiro desfruta de toda a chuva de que precisa, não
tem motivo para achar que tem acesso direto a Deus.
Todos nós conhecemos pessoas que têm resposta
instantânea para todas as coisas, saibam ou não do que
estão falando. Dizemos a seu respeito: “Muitas vezes
erradas, mas nunca em dúvida.” Ao ser oferecido como
explicação de coisas que saem erradas, o carma asse-
melha-se a essas pessoas. Ele pode ser uma explicação
fácil, mas certamente não é a certa.
NÃO HÁ CAUSA-E-EFEITO ORIGINAL
Muita gente sente-se bem com explicações espiri­
tuais de causa-e-efeito devido à idéia largamente aceita
de que, ao nascermos, já estamos de alguma forma
sobrecarregados com o pecado. Por isso, quando a lei
do carma diz que a pessoa começa a vida trazendo certa
quantidade de carma desfavorável com o qual tem de
se haver, a idéia não é radicalmente nova para os
ouvidos ocidentais.
Jesus ensinou importante lição quando disse: “Em
verdade vos digo que, se não vos converterdes e não
vos tomardes como crianças, de modo nenhum entra­
reis no reino dos céus... porque dos tais é o reino de
Deus.” Por que Jesus nos diria que precisamos nos
tomar como crianças se elas se acham condenadas pelo
pecado e pelo carma desfavorável?
Não estamos contendendo com pecado ou carma
desfavorável de ninguém — nem o de nossos pais, nem
certamente o nosso próprio de vidas anteriores. Esta­
176 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

mos, sim, em luta com nossa própria natureza pecami­


nosa nesta vida — aquela parte de nós acerca da qual
nos sentimos moralmente envergonhados; aquela face
mais escura de nós que talvez nem mesmo nossos
amigos mais íntimos conheçam; aquela parte de nossa
natureza espiritual que gostaríamos de poder mudar.
Pela lei do carma, conforme universalmente expli­
cada, estamos sempre condenados, desde o nascimento.
Mas, como cristãos, temos uma forma de escapar dessa
severa lei de causa e efeito, quer seja a fictícia lei do
carma, quer seja a lei do pecado e da morte a que se
refere a Bíblia. Os mentores espirituais da Srta. Mac­
Laine jamais lhe falaram sobre isso, e não se encontra
nada a esse respeito em nenhum dos livros a favor do
carma ou da reencamação. Mas a Bíblia faz a mais
maravilhosa das promessas — a você, a mim, a Shirley
MacLaine, e a qualquer outra pessoa que aceite o ensi­
namento:
“Agora, pois, já nenhuma condenação há para
os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do
Espírito da vida em Cristo Jesus te livrou da lei
do pecado e da morte” (Romanos 8:1,2).
Pode existir algo mas tranqüilizador? É alguma idéia
mais libertadora? Em Cristo, sou liberto da lei do pe­
cado e da morte. Em Cristo, sou liberto da lei da causa
e efeito. Em Cristo, sou liberto de qualquer pretensa lei
do carma. Como cristão, já não estou condenado, e essa
é uma promessa em que vale a pena nos arriscarmos a
crer.
Então, Qual é a Atração? 177

EXPLICAÇÃO PARA O SOFRIMENTO?


Não fosse pelo sofrimento humano, a idéia do carma
jamais teria sido concebida. O sofrimento exigia uma
explicação, e o carma parecia satisfazer a essa exigên­
cia. Mas é uma boa explicação? A Srta. MacLaine ficou
inicialmente intrigada ao pensar que podia ser. “Co­
mo”, perguntou-se, “se concilia a injustiça de nascer-se
na pobreza e privação quando outros nasceram para o
conforto? Seria a vida assim tão cruel? Seria a vida
apenas um acidente?”
Quando David sugeriu que nada acontecia por aci­
dente — que por trás de tudo existia um propósito
superior, a Srta. MacLaine percebeu umas implicações
muito sérias. “Gostaria que me dissesse como se sentem
os seis milhões de judeus a respeito de serem parte de
uma plano consciente cósmico superior”, exigiu ela,
quase enraivecida. E David teve de concordar que nin­
guém tem boas respostas para atrocidades iguais a essa.
E fácil demais oferecer a lei simplista do carma como
resposta à profunda questão do sofrimento humano —
e é um logro malévolo e cruel àqueles que desespera­
damente buscam respostas.
Embora eu não tenha passado pessoalmente por so­
frimento muito intenso, já vi as faces dos que sofrem.
Vi um tio definhar na agonia de um câncer. Em Iquitos,
no Peru, vi a pobreza do pequenino Roberto, de quatro
anos, refletida em seus olhos. Vi a tensão daqueles que
vivem cada dia na Irlanda do Norte, e aqueles que
andam pelas ruas de Londonderry, sem saber se o carro
pelo qual estão passando explodirá em seus rostos.
Andei pelo poeirento mercado de Addis Abba, na Etió­
pia, poucos dias antes do golpe que matou Hailê Selas-
siê, e vi ali o desespero nas faces dos mercadores que
178 Ay Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

não haviam feito nenhum negócio durante semanas e


meses. Em meu trabalho de promotor, fiquei chocado
ao deparar-me com um bebê de seis meses de idade,
maltratado e abandonado, o corpo emaciado recoberto
de queimaduras feitas por pontas de cigarro.
Posso dizer que o dia mais feliz de minha vida de
advogado foi aquele em que consegui tirar uma criança
para sempre da custódia dos pais. Ela tinha nove anos
de idade e era um encanto. Quando a enfermeira da
escola lhe perguntou a respeito dos machucados que
tinha visto, a garotinha naturalmente disse que eram o
resultado de uma queda.
Mais tarde, ficamos sabendo através do pai que ele
a havia surrado — repetidas vezes — com uma pá feita
na aula de trabalhos manuais por um dos irmãos mais
velhos da menina. Os maus tratos físicos eram o menor
dos males. No Natal, as outras crianças ganharam bici­
cletas novas, mas ela nada recebeu. Por quê? O que
havia causado seu sofrimento? “A esposa e eu quería­
mos nossos outros filhos”, o pai admitiu livremente,
“mas nunca quisemos essa aí!”
Não, eu não me relaciono com sofrimento intenso de
forma pessoal, mas sei avaliar quanto ele é real para
outras pessoas. E admito que não tenho todas as respos­
tas quanto ao “por quê” do sofrimento. Mas uma coisa
sei: Deus tem a solução para o sofrimento — seu etemo
propósito em Cristo Jesus.
Em muito do sofrimento do mundo não temos moti­
vo para culpar o carma de vidas passadas, mas apenas
nossa própria irresponsabilidade. Assim, raramente nos
encontramos numa boa posição para levantar as per­
guntas muitas vezes feitas quanto ao motivo pelo qual
Deus permite que o mal exista no mundo. Um número
demasiadamente grande de vezes, somos nós mesmos
Então, Qual é a Atração? 179

que o permitimos! A pessoa que dirige embriagada não


está em posição de perguntar a Deus por que ele per­
mitiu a morte de uma criança nas mãos de um motorista
irresponsável. Aqueles de nós que passamos por favelas
ao nos dirigirmos a um jogo de futebol e jamais paramos
para considerar o que poderiamos fazer para aliviar a
miséria ali existente não estamos em condições de
perguntar por que Deus permite que as pessoas na
Etiópia sofram. Até que tenhamos feito tudo quanto
pudermos para impedir que os governos enviem seus
jovens para morrer em solo estrangeiro, não estamos
em posição de perguntar por que Deus permite outro
sofrimento que não podemos ligar diretamente à nossa
irresponsabilidade e pecado pessoais.
Entretanto, existe um tipo diferente de sofrimento
que não pode ser atribuído a quem quer que seja nesta
vida. Os exemplos para os quais é inevitável que nos
voltemos são os de crianças que nasceram física ou
mentalmente defeituosas. A não ser pelos casos resul­
tantes de conhecidas causas hereditárias ou de negli­
gência médica, escassa explicação parece haver para
essas tragédias, se não levarmos em conta a indiferente
explicação cármica oferecida pela filosofia da reencar-
nação que a Srta. MacLaine advoga.
Quando Shirley MacLaine diz existir um motivo
cármico para tudo o que de mau nos acontece, está
apenas aumentando o sofrimento. Imagine a culpa que
alguém sente quando o convencemos de que não é
simplesmente uma vítima infeliz de maus tratos quando
criança, mas que foi ele próprio o responsável pelo seu
sofrimento. A Srta. MacLaine não está contribuindo
para um conceito salutar e positivo da vida quanto
insiste categoricamente em que todos estão participan­
180 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

do a cada momento de tudo quanto acontece a si mes­


mos.
Devido à nossa própria humanidade, nossa compre­
ensão atual é limitada e incompleta. Contudo, creio
firmemente em que na vida futura compreenderemos o
sofrimento, a dor e o mal. E creio que, vista da pers­
pectiva de Deus, existe uma resposta que todos aceita­
remos sem a menor hesitação.

UMA COISA PODEMOS SABER

Embora não tenhamos todas as respostas que gosta­


ríamos, contudo existe uma coisa que podemos saber:
Existe um Deus pessoal, externo à nossa situação hu­
mana, que se importa com o sofrimento. Digo “externo
à nossa situação” para enfatizar que Deus é distinto e
separado de sua criação e não parte do mal que expe­
rimentamos. Quando os mentores espirituais da Srta.
MacLaine insistem em que tudo é Um — que nós e
Deus e tudo no Universo é Um — só pode significar
que o mal também é Um, e que portanto Deus é mau.
Não importa o que mais possa ser dito, podemos contar
com este fato acima de todos os outros: Deus não é mau.
Deus é amor.
Conquanto não exista indicação alguma sobre a ca­
pacidade do carma de se importar — se é que realmente
se importa com aquilo que nos acontece, o Deus da
Bíblia enviou seu único Filho ao nosso mundo para
passar pelo nosso sofrimento. Jesus foi desprezado e
rejeitado. Foi um “homem de dores e que sabe o que é
padecer”. Em sua morte sacrificial, foi “oprimido e
aflito”. Ao ser pregado na cruz, “ele foi trespassado
pelas nossas transgressões e moído pelas nossas iniqüi-
dades”.
Então, Qual é a Atração? 181

Como companheiro do nosso sofrimento, Jesus sabia


do que estava falando ao prometer: “Bem-aventurados
vós os pobres, porque vosso é o reino de Deus. Bem-
-aventurados vós os que agora tendes fome, porque
sereis fartos. Bem-aventurados vós que agora chorais,
porque haveis de rir.”
Embora o conceito do carma seja impotente para
interferir e evitar o ciclo infindável de sofrimento e
morte sobre o qual supostamente exerce controle, Deus
decretou que esse ciclo chegue ao fim. Ele preparou
uma vida após esta, na qual o presente sofrimento
desaparecerá totalmente. Conforme disse Paulo aos
cristãos de Roma: “Porque para mim tenho por certo
que os sofrimentos do tempo presente não são para
comparar com a glória por vir a ser revelada em nós.”
Que tipo de glória pode o povo de Deus esperar ver
na vida por vir? “Enxugar-lhes-á dos olhos toda lágrima
e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto,
nem dor, porque as primeiras coisas passaram.”
No mundo por vir, para aqueles que acreditam na
reencamação, existe apenas mais enfermidade, mais
destruição e mais morte. No mundo por vir, para os
filhos de Deus, já não haverá sofrimento, e o leão se
deitará em paz com o cordeiro.

QUE TIPO DE MOTIVAÇÃO?


A Srta. MacLaine acha o carma atraente também
devido à motivação que ele oferece.
“. . . é estranho, mas saber que existe uma lei
de causa e efeito operando toma-me muito cons­
ciente de quão precioso cada momento de cada
dia pode ser... Nada — literalmente — nada é
insignificante. Cada pensamento, cada gesto, tudo
182 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

que digo ou faço, tem ligação com uma energia


positiva... Estou consciente de que tudo acontece
por alguma razão. Também, sei que todo bem que
eu puder fazer, todo divertimento que eu puder
trazer às pessoas, toda contribuição que eu puder
fazer, mesmo que seja apenas dar bom dia a
alguém, em algum lugar e de alguma forma, re­
tomará a mim. Não é uma questão de fazer pontos.
Apenas me deixa com uma sensação... muito
melhor.”
Mas a “alta motivação” da Srta. MacLaine não se
traduz bem para a maioria dos reencamacionistas. Para
começo de história, desde quando uma lei é a forma
mais alta de motivação? Geralmente, não tomamos a
lei como um desafio a que encontremos uma maneira
de contomá-la ou como uma desculpa para ignorá-la?
Em segundo lugar, a lei cármica e as encarnações
sucessivas na verdade são mais uma motivação à com­
placência e à irresponsabilidade. Dado o prospecto de
muitas oportunidades, e uma inevitável absorção de
todas as almas por parte da Percepção Divina, não
existiría urgência compulsória para “acertar”. E inevi­
tável que muitas pessoas que aceitam a reencamação
sejam levadas a uma atitude de complacência cósmica.
A reencamação poderia ser definida como um anelo
infundado pela ressurreição da alma, para a qual não se
está preparado. Quase podemos ouvir alguém dizer:
“Quero acreditar que tenho muitas vidas, porque não
estou preparado para enfrentar a alternativa. Se eu
aceitar a mensagem da Bíblia, sei que quando esta vida
chegar ao fim, não terei outra oportunidade. Serei jul­
gado apenas com base naquilo que eu tiver feito acerca
do senhorio de Jesus Cristo. Se eu tiver uma escolha,
Então, Qual é a Atração? 183

prefiro ‘encontrar a mim mesmo quando morrer a en­


contrar o meu Criador’.”
Gerry, amigo da Srta. MacLaine, viu o problema
quando ela mencionou pela primeira vez a fascinação
que sentia pela reencamação. Referindo-se a pessoas
que vivem em culturas nas quais a reencamação é a
crença prevalecente, Gerry observou:

“O que estou dizendo é que eles não tratam de


suas vidas como se pudessem melhorá-las. Isto é,
simplesmente subsistem como se esperassem coi­
sas melhores na outra vez que viverem, como se
esta vez não fosse tão importante assim.”

Um reencamacionista pode responder que, quanto


mais esperamos, mais dívida cármica acumulamos.
Mas mesmo isso não parece importar na escala cósmica
das coisas. Apesar da impossibilidade de alguém pagar
sua dívida cármica, na forma pela qual a reencamação
é apresentada, todo mundo vai acabar acertando de
qualquer forma.
O motivo pelo qual não existe conceito de inferno
na teoria da reencamação é que (pelo menos o ideal é
esse) cada vida sucessiva ocorre num nível mais eleva­
do de evolução espiritual. Claro, na sua próxima vida
você pode nascer com um defeito físico devido ao que
fez de errado nesta, mas é tudo um processo de cresci­
mento e todos acabarão por acertar. Não importa como
você viva hoje, algum dia vai conseguir e tudo dará
certo.
Assim, todos saem ganhando, inclusive o sujeito que
trabalha no escritório e que deu um jeito de abocanhar
a sua promoção, o pai que pode ter abusado sexualmen­
te da filha ou o cônjuge que deixou a esposa por outra
184 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

pessoa. É isso aí, todo mundo sai ganhando— até Átila,


o Huno, Adolf Hitler, Idi Amin, Gaddafi e o Aiatolá
Khomeini. Certo, eles podem estar na última leva, no
finzinho da fila, mas, ao cruzarem a linha de chegada,
todos estarão esperando ali para incentivá-los. Com a
reencarnação, ninguém sai perdendo! Não admira que
essa idéia pareça atraente!

O MITO DA EVOLUÇÃO

O conceito básico da evolução espiritual da reencar­


nação é confortável para uma porção de gente que já
acredita na evolução biológica. A crença largamente
aceita na evolução do homem a partir da ameba predis­
põe a pessoa a se deixar convencer de que poderia haver
também evolução da alma. Contudo, em “Dançando na
Luz”, a Srta. MacLaine levantou importante problema
ao considerar o relacionamento entre a evolução do
corpo e a evolução da alma:

“Deitada ali na banheira, pensando, perguntei-


-me quanto tempo demoraria até os cientistas
encontrarem meios de comprovar a evolução da
alma da mesma maneira que comprovaram a evo­
lução do corpo.”

Mas, comecemos no princípio. Os cientistas real­


mente comprovaram a evolução do corpo? Imagine-se
a minha surpresa ao ver que a descoberta da maior
fraude do mundo surgiu em nada mais, nada menos que
“A Conspiração Aquariana”, o manual do pensamento
da Nova Era! Embora mantendo uma inquestionável
fidelidade para com a idéia da evolução, e insistindo
que estamos às portas de mais um importante salto
Então, Qual é a Atração? 185

evolucionário, a autora Marilyn Ferguson faz notável


concessão quanto à evolução darwiniana:
A teoria de Darwin sobre a evolução por mutação
acidental e sobrevivência do mais apto tem-se mostrado
irremediavelmente inadequada para responder a um
grande número de observações biológicas... Darwin
ignorou problemas em suas próprias provas. É verdade
que parecia haver grandes lacunas, falta de degraus na
escada da evolução, mas ele acreditava serem apenas
imperfeições no registro geológico. As mudanças ape­
nas pareciam abruptas. Mas até hoje a evidência fóssil
não descobriu os necessários elos perdidos [Ênfase
acrescentada].
Citando nada menos que a autoridade do biólogo e
geólogo da Universidade de Harvard, Steven Jay
Gould, Ferguson observa:

Gould deu o nome de “segredo comercial da


paleontologia” à extrema raridade no registro fós­
sil de formas transicionais de vida. Os cientistas
jovens, defrontando-se com a contínua ausência
desses elos perdidos, estão cada vez mais céticos
em relação à antiga teoria. “A antiga explicação
de que o registro fóssil era inadequado é em si
mesma uma explicação inadequada,” disse Niles
Eldredge do Museu Americano de História Natu­
ral.

Nestes últimos vinte anos, distanciamo-nos bastante


da “prova” da evolução que diziam ser “inquestioná­
vel” até chegarmos ao reconhecimento de que, desde o
princípio, a evolução darwiniana nunca foi uma expli­
cação válida. É certo que, embora de outra forma não
consigam explicar como o processo ocorreu e embora
186 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

estejam irremediavelmente divididos com relação àqui­


lo que realmente aconteceu, muitos cientistas ainda
acreditam ter o homem de algum modo resultado de
forças biológicas acidentais. E embora preeminentes
cientistas estejam finalmente vindo a público para ad­
mitir que a evidência que Darwin esperava jamais foi
encontrada, muitos dos que se dizem cristãos ainda
tentam passar por sofisticados, achando que podem
reconciliar o irreconciliável através de algum tipo de
evolução teísta.
A FALHA FATAL
A verdade é que o conceito básico traz em si uma
falha fatal, e o público em geral ficaria espantado se
todas as cartas fossem honestamente colocadas na me­
sa. Mas isso é material que daria outro livro. Neste
contexto, basta dizer que, segundo depoimento até de
cientistas seculares a celebrada teoria da evolução pro­
posta por Darwin foi finalmente exposta como sendo a
Grande Mentira dos séculos dezenove e vinte.
Sendo uma entre os milhões de pessoas que ainda
acreditam na Grande Mentira, a Srta. MacLaine insiste
em dizer que existe evolução do espírito, da mesma
forma que existe evolução do corpo. Mas ao tentar
conciliar sua crença na reencamação com a crença na
evolução, a Srta. MacLaine cria um espinhoso proble­
ma para si mesma. Se a evolução estiver correta, onde
obtemos “espírito”, “alma” ou “entidade cósmica”, pa­
ra começo de história? Antes de alguma coisa poder
evoluir, precisa existir. No conceito naturalista, mate­
rialista, biológico da evolução, não existe lugar para o
conceito metafísico de alma ou espírito. A evolução
nem mesmo tenta explicar, nem podería, a existência
da entidade espiritual que cada um de nós é. Na reali­
Então, Qual é a Atração? 187

dade, no século passado, a idéia de evolução foi um


fator que contribuiu de forma importante para a nossa
falta de dimensão espiritual. A evolução vem-nos di­
zendo por todos os meios imagináveis que somos fenô­
menos apenas biológicos, apenas naturais, apenas
físicos. Somos corpo e mente, sim, mas não espírito.
Não é nesse ponto que Shirley MacLaine e eu entra­
mos? Não é esse o ponto de partida em que nós dois
concordamos? O que estamos tentando mostrar é que
somos espírito também. Primariamente espírito! Con­
tudo, fica claro que o espírito e a evolução têm sido
inimigos desde o dia em que foram “apresentados”.
Assumamos por um momento que tivesse havido
uma criação externa da alma, independente da evolu­
ção. Em que ponto as almas começaram a entrar nos
corpos físicos? E que eram esses pacotes terrestres?
Adão? Quase-Adão? Quase quase-Adão? O último ma­
caco antes de quase-quase-Adão? Incrivelmente, num
esforço para conciliar sua crença na alma humana imor­
tal e a crença na evolução biológica, é exatamente aí
que a Srta. MacLaine nos conduz. Em “Dançando na
Luz”, ela nos diz que as almas foram criadas antes do
princípio do mundo, e depois “as almas... acabaram-se
alojando em primatas evoluídos que mais tarde se tor­
naram Homo sapiens.”
Ora, eis aí: Shirley MacLaine coloca a alma humana
imortal no corpo de um macaco. Será que ela parou para
considerar a que leva essa conclusão? Significa que
muitos de nós (se não todos) já tivemos o corpo de um
macaco ou talvez mesmo de um peixe ou de uma
ameba! Claro, devido à evolução progressiva do corpo
(dizem-nos), não transmigramos de volta a formas in­
feriores de vida nos dias de hoje, mas permanece o fato
de que, se a Srta. MacLaine estiver certa a respeito da
188 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

história cósmica, já fomos almas contidas no corpo de


macacos!
Já é bastante surpreendente o fato de haver gente
disposta a acreditar que seus corpos, de alguma forma,
descendem dos macacos, mas não creio que muitos
tenham parado para pensar que suas próprias almas
estiveram dentro dessas criaturas irracionais! E duvido
que muitos psíquicos estejam incluindo encarnações
prévias em primatas no seu aconselhamento metafísico
tão em voga. Independente de ser uma idéia simples­
mente degradante, a encarnação em primatas teria sé­
rias repercussões em relação ao pretenso carma
humano e aos especulativos relacionamentos cármicos.
Os problemas práticos são infindáveis. O esforço feito
pela Srta. MacLaine a fim de promover maior percep­
ção espiritual ao mesmo tempo em que se apega à
crença na evolução biológica apenas expõe a ataque sua
própria causa.
RETORNO AO VERDADEIRO CRIADOR
Por que insistimos em explicações fantasiosas sobre
a nossa origem as quais sucumbem sob os ossos de cada
teoria científica descartada? O relato da criação feito
em Gênesis não é apenas uma lenda ou uma tacanha
idéia religiosa. “No princípio criou Deus os céus e a
terra” é ainda a mais abrangente e a mais bem docu­
mentada explicação de nossa existência. E é o único
conceito que se harmoniza com o ensinamento cristão.
Cristo não somente foi o Verbo vivo de Deus que
apareceu durante algum tempo em forma humana sobre
a terra. Jesus Cristo, Deus na came, foi ele próprio o
Criador. João (referindo-se a Jesus Cristo como o Ver­
bo) inicia o relato do seu Evangelho com esta grandiosa
afirmação:
Então, Qual é a Atração? 189

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava


com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no
princípio com Deus.

Todas as coisas foram feitas por intermédio


dele, e sem ele nada do que foi feito se fez.”

Se Cristo não foi o nosso Criador, tampouco é nosso


Salvador.
A evolução obscureceu nossa compreensão, erguen­
do uma cortina entre o Universo e nós. A sensação de
mistério e admiração foi substituída por hipótese e
especulação. Ao destronar o Deus da criação, reduzir a
existência humana ao materialismo desespiritualizado,
e nos enganar acerca da própria natureza e propósito de
nossas vidas aqui na terra, a idéia da evolução atrasou
por mais de um século a compreensão espiritual da
humanidade.
Quem há que possa ignorar os divergentes pontos de
vista acerca de nossa natureza espiritual que cada pers­
pectiva apresenta? O sistema em que a Srta. MacLaine
crê diz que o espírito do homem emanou do Deus Fonte,
de algum modo conseguiu chegar até o corpo de um
primata e, através de uma progressão de corpos subu-
manos em lenta evolução, terminou por se manifestar
em forma humana, tendo sido moldado e influenciado
por sua existência subumana anterior. Em contraste,
através da majestosa narrativa do Gênesis, ficamos
sabendo que —

“Então formou o Senhor Deus ao homem do pó


da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego da vida,
e o homem passou a ser alma vivente.”
190 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

ORIGEM, PROPÓSITO, DESTINO


Em toda discussão a respeito do significado da vida,
a fórmula de indagação tem sido sempre: origem, pro­
pósito e destino. Não podemos saber onde nos encon­
tramos e para onde estamos indo a menos que saibamos
de onde viemos. A própria Bíblia começa com os iní­
cios, depois explora o significado da existência terres­
tre, e conclui com o nosso destino eterno. A
reapropiação da parte de Deus da sua criação no final
do livro, o Apocalipse, não faz sentido sem o fato da
criação e a queda espiritual do homem-criatura, con­
forme relatado nas páginas iniciais do Gênesis.
Por toda a Bíblia, o fato de ter Deus criado o homem
— corpo e alma — encontra-se no cerne da questão. O
apóstolo Paulo focalizou com nitidez a explicação e o
propósito de nossa origem ao dirigir-se aos filósofos da
acrópolc em Atenas:
“O Deus que fez o mundo e tudo o que nele
existe, sendo ele Senhor do céu e da terra, não
habita em santuários feitos por mãos humanas.
Nem é servido por mãos humanas, como se de
alguma coisa precisasse; pois ele mesmo é quem
a todos dá vida, respiração e tudo mais; de um só
fez toda raça humana para habitar sobre toda a
face da terra, havendo fixado os tempos previa­
mente estabelecidos e os limites da sua habitação;
para buscarem a Deus se, porventura, tateando o
possam achar, bem que não está longe de cada um
de nós. Pois nele vivemos e nos movemos, e
existimos, como alguns dos vossos poetas têm
dito: Porque dele também somos geração” (Atos
17:24-28).
Então, Qual é a Atração? 191

Com relação à nossa natureza espiritual, não existe


em toda a revelação divina palavras mais sublimes do
que estas:

“Criou Deus, pois, o homem à sua imagem, à


imagem de Deus o criou; homem e mulher os
criou” (Gênesis 1:27).

Nem a existência de nossos corpos, nem a de nossas


almas é produto do acaso ou do empenho evolucionário.
Tendo ordenado uma vida para cada pessoa, Deus nos
colocou neste mundo com dignidade, honra e propósito
divinos. Somos o arremate glorioso de sua criação!
Nossa maior necessidade é a de capturar a visão de ter
a humanidade sido proposital, inteligente e espontanea­
mente trazida à existência pelo Criador do Universo —
à sua própria imagem — e sentir o valor e o potencial
espiritual que cada indivíduo representa.
Idéias têm conseqüências. Se formos da terra, à se­
melhança dos animais irracionais, nos julgaremos irra­
cionais e agiremos de acordo. Se formos do céu, à
semelhança de Deus, nos julgaremos piedosos e agire­
mos da forma como Deus agiria.

O ERRO DO CÍNICO

Por que motivo a reencamação foi tão prontamente


aceita pelas sociedades ocidentais? Tenho a incômoda
sensação de que muitas pessoas estão-se voltando para
a crença da reencamação apenas por omissão. Para
quem não freqüenta uma igreja, ela fornece uma expli­
cação para a existência das pessoas. Todo mundo tem
de crer em alguma coisa. Em algum ponto do caminho,
cada pessoa precisa resolver de onde veio, por que está
aqui, e o que pensa que lhe acontecerá depois de morrer.
192 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Para muitas pessoas, portanto, a reencamação é um


substituto da religião tradicional organizada.
Por toda a literatura reencamacionista ocidentaliza­
da e a da Nova Era encontramos uma bem perceptível
propensão à amargura com relação à “igreja”. “A igre­
ja”, dizem, enganou e desorientou as pessoas, inter­
pretando egoisticamente as Escrituras, erroneamente
firmou seu poder e tomou-se a causa de todos os pro­
blemas do mundo. Por causa da “igreja”, já não temos
as Escrituras em sua forma original. Por causa da “igre­
ja” não sabemos o que aconteceu nos anos que faltam
da vida de Jesus. Por causa da “igreja”, temos sido
impedidos de conhecer a verdade cósmica, o potencial
humano e a auto-iluminação.
“A igreja” a que se referem nem sempre é claramente
definida. A maioria das referências feitas pela Srta.
MacLaine e seus amigos à “igreja”, eram dirigidas à
Igreja Católica Romana, particularmente com relação
às alterações históricas que alegam ter ocorrido nas
mãos de diferentes concílios. Em outras ocasiões, en­
tretanto, eles se referiram com desdém a todas as igrejas
institucionalizadas, dogmatizadas, hierárquicas e tradi­
cionais em geral.
Mesmo sendo cristão, concordo com algumas dessas
críticas. Dentro da “igreja”, vista de modo geral, exis­
tem igrejas ritualistas e mortas que fingem ser o corpo
de Cristo na Terra. Existem os pregadores que gostam
de esmurrar os púlpitos, os pedintes da televisão, os
egocêntricos que somente divertem as pessoas e aque­
les que pregam piedosas banalidades. Pouco admira,
portanto, que algumas pessoas, confusas, corram para
os braços do ateísmo, do agnosticismo, do humanismo
e até da reencamação.
Então, Qual é a Atração? 193

Se alguém tem motivos para ser cínico a respeito da


“igreja” e das muitas divisões que constantemente a
assolam, sou eu. Uma das minhas mais vividas lem­
branças, quando eu tinha 11 anos de idade, é a de uma
cena em casa numa tarde de domingo quando alguns
dos membros de nossa igreja apareceram para consolar
meu pai, que tinha acabado de ser demitido por causa
do que havia pregado do púlpito na manhã daquele dia
(a respeito de um assunto que de forma alguma é central
ao ensinamento cristão). Como resultado de uma reu­
nião convocada às pressas, meu pai nem teve permissão
para falar no culto da noite. Foi a primeira vez que me
lembro de ter visto meu pai chorar. Pode-se imaginar o
impacto que isso causou em um menino de 11 anos,
cujo principal interesse era o de trocar figurinhas de
futebol e jogar no seu time.
Compreendo que as igrejas são imperfeitas, cheias
de gente imperfeita, tanto como observador quanto
como membro. Eu também tenho muito o que aprender
a fim de ser o homem de Deus que eu deveria ser. Tendo
em vista o retrato de Cristo que nós, os cristãos, muitas
vezes pintamos, o desencanto inicial da Srta. MacLaine
com a religião organizada não é totalmente surpreen­
dente.
Mas existe motivo para otimismo em meio a todo
esse desânimo. Vejo um número cada vez maior de
pessoas que estão descobrindo a Pessoa divina de Jesus
Cristo — não simplesmente o símbolo de segurança das
instituições religiosas. Vejo pessoas começando a ler a
Bíblia por si mesmas — não apenas seguindo cegamen­
te as tradições e os credos da igreja. Vejo que as igrejas
que mais rapidamente crescem são comunidades locais
— não presas a organizações hierárquicas, mas autôno­
mas em sua busca do cristianismo do Novo Testamento.
194 A í Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Vejo pessoas levantando-se de bancos confortáveis e


começando a sentir a necessidade de sacrifício e servi­
ço.
Vejo até mesmo cristãos tomando-se mais voltados
para as coisas do espírito. A semelhança de Shirley
MacLaine, estão fartos do cristianismo materialista e
do formalismo vazio. Um número cada vez maior de
pessoas estão descobrindo o gozo da verdadeira dedi­
cação espiritual e de um relacionamento pessoal com
Cristo. Através do apoio mútuo que encontram em suas
comunidades locais, estão vivenciando a verdade bíbli­
ca de que podemos conhecer a Deus e aproximar-nos
dele mediante submissão pessoal ao senhorio de Jesus
Cristo.
É para Cristo que devemos olhar. Focalizar “a igre­
ja”, com todas as suas imperfeições humanas, nos le­
vará muitas vezes ao desapontamento e ao desencanto.
O cinismo com relação à “igreja” é uma barreira falsa
que alguém colocou na estrada durante a noite. Do outro
lado do cinismo tem-se uma visão mais clara dos cris­
tãos que estão a caminho da maturidade espiritual,
andando na luz de Cristo.
CAPITULO DOZE

EU, EU E EU

“A pessoa que diante de nada se inclina, jamais


poderá suportar o fardo de si mesma.”
— Feodor Dostoevski
Um Jovem Inexperiente

Uma estranha forma de incoerência existe na manei­


ra pela qual a Srta. MacLaine adotou o pensamento da
Nova Era. Essa filosofia diz que toda verdade e signi­
ficado são encontrados dentro da própria pessoa. En­
quanto por um lado a filosofia da Srta. MacLaine lhe
diz que toda a verdade está dentro dela mesma, e que a
satisfação será encontrada em seu íntimo, por outro
lado ela dirigiu sua odisséia espiritual principalmente a
fontes externas. Essa é uma incoerência que o cristão
evita ao olhar apenas para Jesus Cristo em busca de
orientação espiritual. Ao buscar verdade e significado,
a Srta. MacLaine voltou-se para a própria fonte de seu
vazio — ela mesma.
“Assim, este livro é sobre uma busca do meu eu”,
diz-nos a Srta. MacLaine no primeiro capítulo de “Mi­
nhas Vidas”. E, à medida que ela viaja e conversa com
as pessoas, o tom de suas conversas “deslocou-se da
196 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

consternação e confusão para a consideração de que as


respostas poderíam estar dentro de nós mesmos”. David
garantiu-lhe que estava certa. “Você é tudo”, ele lhe
disse. “Tudo o que você quer saber está dentro de você.
Você é o Universo.” A medida que a Srta. MacLaine
foi lendo o material de Edgar Cayce, foi-se convencen­
do de que “a moralidade de sua mensagem é inegável.
E um bom conjunto de valores para guiar a nossa vida.
‘Todas as respostas estão dentro de você mesma, di­
ziam. ‘Basta olhar.”’
Confesso estar confuso a respeito do que a Srta.
MacLaine propôs-se fazer após ter chegado a essa
conclusão. Convencida de que as respostas estavam
dentro de si própria, ela passou meses lendo pratica­
mente uma biblioteca de livros, perguntando a amigos
como eles percebiam as coisas, e procurando médiuns
que lhe prometiam colocá-la em contato com a verdade
cósmica encontrada num tipo de revelação canalizada
de fontes supostamente oniscientes. Se a verdade estava
dentro dela mesma o tempo todo, por que era necessária
toda essa orientação espiritual externa?
Dizer que cada um de nós precisa assumir responsa­
bilidade pelo desenvolvimento de sua própria compre­
ensão e pela avaliação daquilo que os outros nos
ensinam, está muito longe da declaração: “Você é tudo.
Tudo o que deseja saber está dentro de você mesma.
Você é o Universo.”
Jesus identificou a fonte da verdade fora da própria
pessoa, na revelação objetiva, conhecível da mente de
Deus: “Se vós permanecerdes na minha palavra, sois
verdadeiramente meus discípulos; e conhecereis a ver­
dade e a verdade vos libertará.”
Eu, Eu e Eu 197

TRANSFORMANDO O EU EM DEUS
O coração e a alma do movimento da Nova Era, que
a Srta. MacLaine adota, juntamente com suas idéias
acerca da reencamação, nada mais são do que auto-en-
deusamento. Gina Cerminara, adepta de Cayce, ridicu­
lariza como sendo “crime psicológico” a idéia de
alguém ser salvo mediante a morte sacrificial de Cristo.
“É um crime psicológico porque coloca a responsabi­
lidade pela redenção sobre algo externo ao eu; toma a
salvação dependente de uma crença na divindade de
outra pessoa em lugar de na autotransformação, através
da crença na divindade intrínseca da própria pessoa.”
Se houvesse qualquer dúvida acerca do que está
sendo dito, “John”, a entidade canalizada através de
Kevin, coloca um ponto final na especulação.
— Então você quer dizer que se eu quiser en­
tender o que esse negócio de Deus é, preciso
conhecer a mim mesma? — perguntou Shirley.
— Correto — disse John; — sua alma é uma
metáfora de Deus.

Até mesmo a Srta. MacLaine sentiu o peso total do


que essa afirmação acarretaria: “Ora, poderia tomar-me
muito arrogante se realmente acreditasse que eu era
uma metáfora de Deus.”
A resposta de John foi nada mais do que continuar
afirmando: “Jamais confunda o caminho que tomar
com a verdade em si.” E havia mais. John disse à Srta.
MacLaine que o eu “conhece a verdade Divina por ser
ele mesmo Divino.” Está próximo o bastante de auto-
-endeusamento? Se não estiver, eis aqui o argumento
definitivo:
198 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

“O conceito que o cético tem do conhecimento


superior do eu é extremamente restritivo. As reli­
giões dogmáticas, por exemplo, são extremamente
restritivas para a humanidade porque exigem incon-
testada reverência pela autoridade — uma autori­
dade exterior. Você é Deus. Você sabe que é divina.”

Aí está, o preto no branco, bem no livro “Minhas


Vidas”. Shirley MacLaine acabou de ser constituída
como a propagadora da auto-adoração da geração vol­
tada para o eu!
Mas isso não deveria realmente surpreender muito.
Tudo o que precisávamos fazer era montar a equação:
Somos Um; Deus é Um; portanto, somos Deus. A
conjugação cósmica é: Eu sou Deus, você é Deus, nós
somos Deus.
Em contraste, a Bíblia diz que somos feitos à imagem
de Deus como seres humanos morais, inteligentes, vol­
tados para a eternidade, aos quais foi dado domínio
sobre a Terra. Quando entregamos nossas vidas a Cris­
to, tomamo-nos filhos de Deus pela fé em Cristo Jesus,
herdeiros segundo a promessa, filhos de Deus e filhos
da luz.
Se havia qualquer sombra de dúvida na mente da
Srta. MacLaine acerca de ser o seu próprio eu uma
metáfora de Deus, no livro “Dançando na Luz” ela
claramente decidiu-se em favor do auto-endeusamento.
Sua tentativa de chegar a um silogismo é não apenas
claramente ilógica como também impudentemente
blasfema:

Sei que existo, portanto EU SOU.


Sei que a fonte Deus existe. Portanto ELA E.
Eu, Eu e Eu 199

Visto que sou parte dessa força, então EU SOU


o que SOU.

Caso o significado dessa última sentença passe des­


percebido a alguém, temos de ressaltar que “EU SOU
o que SOU” é uma referência bíblica que se aplica
exclusivamente ao Deus Criador do Universo, o único
Deus vivo e verdadeiro.
O que o eu superior da Srta. MacLaine (que ela
abrevia e.s.) lhe diz confirma aquilo que ela deseja
acreditar:
— Então, qual é a diferença entre você e Deus?
— perguntou [Shirley] a seu eu superior.
— Nenhuma — disse ele. — Eu sou Deus por­
que toda eneigia está sintonizada em uma mesma
fonte. Todos nós somos aspectos dessa fonte. To­
dos somos partes de Deus. Somos todos reflexos
individualizados do Deus fonte. Deus está em nós
e nós somos Deus.
— E você é eu.
— Exatamente.
Não é simples coincidência o fato de Shirley Mac­
Laine ter aceito sua própria divindade com crescente
firmeza. Afinal de contas, ela leva os primeiro cinco
minutos de cada dia lembrando a si mesma de que é
Deus. Conforme explica em “Dançando na Luz”, suas
afirmativas diárias fazem com que se sinta bem.
“Afirmativas são resoluções faladas que, quan­
do usadas apropriadamente, alinham as energias
físicas, mentais e espirituais. Os antigos vedas
hindus alegavam que falar as palavras Eu Sou, ou
Aum em hindi, estabelecia uma freqtlência vibra-
200 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

com seu eu superior e, portanto, com o Deus fonte.


A palavra Deus em qualquer língua transmite a
mais alta freqüência vibratória de qualquer pala­
vra da língua. Portanto, se a pessoa diz audivel-
mente Eu sou Deus, as vibrações sonoras alinham
literalmente as energias do corpo com uma sinto­
nia superior.

Pode-se usar Eu sou Deus ou Eu Sou o que Sou,


como Cristo freqüentemente fazia, ou pode-se
estender a afirmativa para cobrir suas próprias
necessidades.”

É claro que, se alguém repetidas vezes diz a si


mesmo que é Deus, não demorará muito para realmente
acreditar nisso.

A EXCURSÃO FINAL DO EGO

Dizer a nós mesmos que somos Deus é uma expres­


são de impudente orgulho. Isso nos coloca na compa­
nhia do usurpador original, Satanás, e também do
antigo rei de Tiro, sobre quem escreveu o profeta Eze-
quiel:

“Visto que se eleva o teu coração, e dizes: Eu


sou Deus, sobre a cadeira de Deus me assento no
coração dos mares; e não passas de homem, e não
és Deus, ainda que estimas o teu coração, como
se fora o coração de Deus.”

O teólogo Helmut Thielicke denunciou esse tipo de


presunção da Nova Era como aquilo que realmente é:
“O refinamento final em matéria de blasfêmia, pois
coloca Deus em analogia com o homem.”
Eu, Eu e Eu 201

A Srta. MacLaine aprendeu a mensagem de auto-en-


deusamento em diversas fontes. Em praticamente tudo
o que ela lia, sua atenção era atraída para “o fato de que
tão grande parte da mensagem parecia ser universal —
isto é, entidades canalizadas através de uma variedade
de pessoas em muitos países em línguas diferentes
estavam dizendo basicamente a mesma coisa. Olhe para
dentro de si mesmo, explore a si mesmo, você é o
Universo.. . ”
Na verdade, a mensagem é ainda mais antiga e difusa
do que a Srta. MacLaine possa perceber. Essa mesma
mensagem existe desde o jardim do Éden, quando a
serpente sutilmente a sugeriu pela primeira vez: “Você
também pode ser Deus.”
Se realmente somos Deus, por que não podemos
impedir nossa própria morte? Por que não podemos
mandar a lei do carma plantar batatas? Por que não
podemos eliminar o sofrimento que hoje culpamos a
Deus por permitir? Por que já não estamos em estado
de suprema iluminação?
Existe algo de intoxicante nas realizações humanas
de nossos dias. Afinal, estivemos na lua. Não fizemos a
lua, mas conseguimos fazer-lhe umas breves visitas.
Nossa atitude não difere muito da do menino de dois
anos que começa a descobrir o que consegue fazer —
andar e falar e todo o tipo de maravilhosas coisas novas.
Não é de admirar que, durante os “terríveis dois anos”,
a mais ouvida exclamação é “eu faço!” De muitas
maneiras, os “terríveis dois anos” são uma idade que
jamais conseguimos deixar para trás.
É a sempre presente questão da soberania humana
versus soberania divina. Somos governados pela teo­
cracia, ou somos nós mesmos uma autocracia? O sábio
rei Salomão teve muito a dizer com relação a esse
202 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

referendo pessoal: “Confia no Senhor de todo o teu


coração, e não te estribes no teu próprio entendimen­
to. . . Não sejas sábio aos teus próprios olhos. . . Há
caminho, que parece direito ao homem, mas afinal são
caminhos de morte.”
E interessante notar que a Srta. MacLaine e outros
adeptos da Nova Era apontam um dedo acusador ao
materialismo, e contudo estão dispostos a elevar a si
mesmos à condição de divindade. Idolatria é definida
como a adoração a qualquer coisa neste mundo material
que não seja ao Criador que a tudo deu existência. O
auto-endeusamento, a idolatria final, é portanto arrema­
tado materialismo. A maioria dos adeptos da Nova Era
acharia a idolatria tradicional — de deuses de madeira
ou ouro — muito abaixo de sua dignidade. Mas em seu
novo paradigma, a madeira e o metal foram substituídos
por carne e osso.
Ao mesmo tempo em que se consideram espiri­
tualistas, é óbvio que os adeptos da Nova Era são, mais
corretamente, mentalistas. Em seu livro “A Conspira­
ção Aquariana”, reconhecido como a mais completa
explicação do movimento da Nova Era, Marilyn Fer-
guson afirma que seu alvo final é a capacidade de atingir
a superpercepção através da mente humana, seja pela
meditação, ioga, retroalimentação biológica, música,
cantochão, hipnose, “elevação da consciência”, diários
de sonhos, psicoterapia ou drogas que expandem a
mente. A mente é vista como a porta através da qual o
superaprendizado e a auto-iluminação chegarão.
Se a superpercepção é a meta, não faz mais sentido
focalizar nossa atenção na mente onisciente infinita
daquele que teve tal grau de superpercepção que pôde
criar nossas mentes humanas finitas? Caso contrário,
estamos restringindo nossa própria percepção ao en­
Eu, Eu e Eu 203

trarmos em contato com mentes que apenas podem


questionar como elas mesmas funcionam em vez de
com a Mente criativa que já sabe como elas funcionam.
Ao estabelecer um relacionamento pessoal com o Cria­
dor em si, estamos entrando em contato com a infinita
Mente do Universo.

O SEGREDO DA VERDADEIRA SATISFAÇÃO


O pensamento da Nova Era pode ser a última novida­
de, chique e em voga — algo a respeito de que se falar
nas conversas de coquetéis. Contudo, a ironia é que de
muitas formas, o movimento da Nova Era é apenas um
retomo a tempos idos — tempos de superstição, mágica
e bruxaria. Quando se considera o interesse em astrolo­
gia, tarô, curandeiros psíquicos e médiuns de transe,
pode-se ver a verdade daquilo que Salomão disse: Não
existe nada novo debaixo do sol. Longe de ser progres­
sista, o movimento da Nova Era bem mais se caracteriza
por regressão societária em massa.
Não precisamos de regressão até a bruxaria ou a fan­
tasiosas vidas passadas, mas, sim, de otimismo voltado
para a frente, para um futuro ainda não vivido. Viver no
passado, quer através de misticismo, quer de psicanálise,
é debilitador e um desperdício. O que foi feito, está feito,
e não o podemos mudar, quer seja por nascimento em
condições indesejáveis, juventude desperdiçada, relacio­
namentos desfeitos, quer por presumidos fracassos.
“Conhecer a si mesma”, conforme encorajaram a Srta.
MacLaine a fazer, pode ser uma moeda de duas faces.
Descobri que, se olho no espelho por tempo breve de­
mais, logo me esqueço daquilo que vi e preciso olhar
outra vez. O mesmo sucede com pessoas que passam
pouco ou nenhum tempo avaliando quem são e por que
existem. Viverão e morrerão sem jamais saber.
204 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

Mas se fito o espelho por tempo demasiadamente


longo, vejo novas rugas, menos cabelo no cocuruto e
mais fios brancos na barba. O mesmo se dá com pessoas
que ficam demasiadamente preocupadas consigo mes­
mas. Suas falhas e necessidades são apenas exageradas.
Vivem ansiosamente e morrem de preocupação.
Precisamos de menos percepção de nosso eu e mais
percepção dos outros. Precisamos ter menos autoco-
nhecimento e mais conhecimento das necessidades dos
outros. Felicidade é não ser voltado para si mesmo e
egoísta; felicidade é ser voltado para fora e altruísta. É
estar cheio por dentro de modo que se pode partilhar essa
plenitude com os outros no plano externo. Atingir a
felicidade através de preocupação com os outros deriva
do bem testado princípio cristão de ser mais bem-aven­
turado dar do que receber.
Ao nos mostrar como ficar verdadeiramente satisfei­
tos, Jesus ensinou que precisamos dar nossas vidas pelos
outros — não ser mais auto-afirmadores. A fim de viver­
mos verdadeiramente, precisamos morrer para o nosso
próprio eu. A auto-orientação precisa ser transformada
em autonegação. Para nos encontrarmos, precisamos nos
perder. A verdadeira auto-realização vem através da au-
to-entrega ao senhorio de Cristo. Quando nos dedicamos
a amar e a servir a Cristo e aos outros, não somos
consumidos pelo vazio que nos corrói quando estamos
envolvidos com a nossa própria pessoa.
A busca do eu começa com a premissa de que algo está
faltando nele. E por esse motivo que o auto-endeusamen-
to toma-se a Grande Ilusão. Quando aquilo que está
faltando em nossas vidas toma-se objeto de nossa adora­
ção, nosso deus fica reduzido a uma casca vazia, e nossa
auto-adoração fica exposta como Arrematada Loucura.
CAPITULO TOEZE

PADRÕES DE UM DEUS
MENOR

“Precisamos não nos preocupar tanto com aquilo de


que o homem descende — é aquilo a que ele desce que
envergonha a raça humana. ”
— Anônimo

Se a política produz estranhos parceiros, tanto mais


a reencarnação — particularmente a “reencamação
cristianizada”. Quando a idéia de reencamação é apli­
cada de maneira prática a padrões de moralidade e
conduta humana, os padrões tradicionais e bíblicos se
perdem. Faz o cristianismo parecer uma relíquia pré-
-histórica, cujos ossos carregados de valores são des­
carnados por altamente evoluídas entidades cármicas
até não sobrar nada.
Por exemplo, através da reencamação da Nova Era,
a homossexualidade assumiu respeitabilidade cósmica.
Quando “John” foi canalizado através de Kevin, ele
disse à Srta. MacLaine que ela havia reencamado duas
vezes no sexo masculino e uma vez no feminino. A
curiosidade de Shirley foi despertada quando John disse
206 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

que todo mundo passa pela experiência de viver como


sexos diferentes.

— Seria essa uma explicação metafísica para a


homossexualidade? — [perguntou Shirley.] —
Quero dizer, talvez alguma alma passe por uma
transição difícil de um corpo feminino para um
masculino, por exemplo, ficando um resíduo emo­
cional e uma atração da encarnação anterior?
— Assim é — disse John, afirmativamente.

Edgar Cayce concordou, mas indicou que a homos­


sexualidade pode ser mais cármica ainda. Em uma das
leituras feitas por Cayce, ele disse a um jovem com
tendências homossexuais que este era vítima de um
efeito bumerangue do carma. Parece que, numa vida
anterior, ele havia sido um fofoqueiro na corte francesa
e se havia deliciado de modo especial em expor escân­
dalos homossexuais.
Partindo das leituras de Cayce, Gina Cerminara nos
diz que existem também aspectos cármicos no adulté­
rio:

“Em resumo, esses casos indicariam que a in­


fidelidade de um dos cônjuges ocorre às vezes por
necessidade cármica. Com base nessas ocorrên­
cias, não se pode assumir, é claro, que todos os
casos de infidelidade sejam cármicos. A infideli­
dade de João para com Maria pode ser devida ao
fato de Maria merecer esse tratamento como re­
sultado da infidelidade dela para com Claudius na
Roma antiga, mas, por outro lado, o namoro do
marido pode resultar de Maria ter falhado no
presente; a infidelidade pode ser nada mais que
Padrões de um Deus Menor 207

uma reação temporária a uma instigação contem­


porânea — um caso rápido de carma.”
O adultério pode ser apenas um caso cármico rápido?
Experimente contar essa ao seu cônjuge! Se ele ou ela
não aceitar tão conveniente desculpa cósmica, e resol­
ver pedir o divórcio, então, nesse caso, também está
tudo bem.
O casamento como instituição é, segundo o ponto de
vista dos reencamacionistas, menos sacrossanto do que
muita gente pensa. Se a sociedade desejar fazer com
que o casamento seja indissolúvel, muito bem; se não,
novamente muito bem. A lei cósmica não será frustrada
por qualquer um dos dois sistemas — se o homem
deixar de cumprir uma obrigação em uma existência,
será irrevogavelmente chamado à responsabilidade em
outra. As formas exteriores que o homem estabelece
são quase tão arbitrárias e quase tão sem importância
quanto as regras que ele estabelece para um jogo de
cartas.
Assim, a moralidade é apenas uma questão de diver­
timento. Podemos mudar as regras todas as vezes que
desejarmos. Se desejarmos mudar a moralidade, pode­
remos fazê-lo por iniciativa popular ou legislação ou
normas dos tribunais ou dogma da igreja ou alteração
das atitudes sociais. Afinal de contas, nada nesta vida
importa de verdade. Tudo sairá ao ser cosmicamente
lavado em outra vida.

A LINHA CÁRMICA DE RACIOCÍNIO

Até onde estamos dispostos a levar essa linha de


raciocínio? Se ficarmos com as leituras de Cayce a que
a Srta. MacLaine tanto admira, poderiamos nos defron­
tar com algumas situações bem interessantes. Por
208 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

exemplo, houve o caso da mulher cujo noivo era seu


antigo pai reencamado. Por destino cármico, eles deve-
riam novamente ter o mesmo sobrenome — desta vez
como marido e mulher.
Usando o raciocínio que foi antes aplicado para
justificar a homossexualidade, podemos ver agora a
mesma conclusão com relação ao incesto. Ao reverter­
mos à situação do fato, se o pai praticar sexo com a
filha, talvez seja apenas o remanescente cármico de um
casamento anterior das mesmas entidades.
Dizem-nos que, a despeito de véu do esquecimento,
somos as mesmas entidades que fomos nas vidas ante­
riores. Assim, se pai e filha tivessem sido casados antes,
já haviam tido um relacionamento sexual. Portanto, o
que poderiamos considerar incestuoso é realmente bem
cósmico.
Estou sendo parcial e levando a lógica reencar-
nacionista longe demais? Se considerarmos “Dançando
na Luz”, parece que a Srta. MacLaine não acha que seja
como essas. Quando ela e o amante russo, Vassy, esta­
vam brigando por ter ela percebido que estava agindo
para com ele no relacionamento sexual como se ele
fosse seu filho, ela ficou confusa:

Eu tinha simplesmente querido ter uma fantasia


acerca de ser sua mãe enquanto mantínhamos
relação sexual, e para ele esse era uma espécie de
mal fundamental?... Teria eu despertado alguma
fantasia incestuosa inconsciente que me havia de
fato atraído a ele em primeiro lugar?... Então,
enquanto tentava colocar alguma ordem na con­
fusão em que caíra, tive outra inspiração. Se real­
mente tínhamos tido uma vida passada juntos,
podería ter sido como mãe e filho?
Padrões de um Deus Menor 209

Pode esse bizarro caminho levar à justificação da­


queles que molestam crianças e até mesmo dos estupra-
dores? A lógica reencamacionista não apenas concorda,
como as supostas vidas passadas da Srta. MacLaine
também sugerem possibilidades tão aberrantes assim.
Após descrever como partilhou a cama de um bandido
(que hoje é sua mãe), a Srta. MacLaine conta o que
aconteceu quando um rapaz (seu ex-marido nesta vida)
a estuprou quando se encontrava grávida:
“Contudo, percebi que, por mim mesma, estava
gostando da luta erótica, sendo minha única preo­
cupação o bem-estar do nenê.”

O PENSAMENTO CÁRMICO NA SOCIEDADE


Shirley MacLaine, pessoalmente, não advoga nem
aprova molestamento infantil, incesto ou estupro. Mas
idéias de base filosófica invariavelmente terminam por
penetrar na sociedade, mesmo quando vistas de início
como radicalmente repugnantes. A revolucionária acei­
tação da homossexualidade e do aborto é um bom
exemplo da rapidez com que as atitudes e padrões da
sociedade podem mudar.
A respeito da questão do aborto, Helen Wambach
usa a lógica reencamacionista para concluir que não
pode haver nada moralmente errado com o aborto,
porque a única coisa que está sendo morta é um corpo,
não uma alma:
“Que esclarecimento esse estudo traz à questão
do aborto?... A alma aparentemente pode esco­
lher em que feto entrar. Se um feto for abortado,
parece que é possível escolher outro. Em alguns
casos, a alma que ocupará o feto está em contato
210 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

com a alma da mãe e pode influenciá-la com


relação ao aborto.”
Se formos acreditar no que diz Wambach, a mãe nem
mesmo pode ser inteiramente responsabilizada por sua
decisão. Mais horripilante ainda é a compreensão de
que, por inferência, não deve ser errado matar ninguém
— feto, bebê ou adulto — já que se estaria apenas
“matando um corpo, não uma alma.”
Os comentários sequintes de Wambach levantam
algumas inferências igualmente interessantes:
“Meus dados também indicam que as almas
podem eleger deixar o corpo do feto ou do bebê
e retornar à condição entre vidas. Talvez a síndro-
me da morte súbita de bebês seja o resultado da
decisão de uma alma em não levar avante o plano
de vida.”

Sem comentar a respeito da hipótese das mortes


infantis no berço, observo com grande curiosidade a
inferência que essa possibilidade de se escolher a pró­
pria existência poderia ter com relação ao suicídio. Em
outros contextos, dizem-nos que o suicídio gera carma
desfavorável, e, contudo, o suicídio não parece ser nada
diferente da situação na qual, logo depois do nascimen­
to, a alma resolve voltar ao estado entre vidas. Usando
o raciocínio de Wambach, o suicídio é simplesmente a
resolução de não levar adiante um plano de vida. (Quan­
do perguntei a Kevin Ryerson se essa é uma correta
posição reencamacionista com relação ao suicídio, ele
concordou, sem hesitação ou restrição.)
E talvez, através da eutanásia, possamos fazer um
favor a outra alma, terminando sua miserável existên­
cia, permitindo-lhe partir para uma situação melhor em
Padrões de um Deus Menor 211

outra vida. Até mesmo matar com má intenção acabará


por se resolver, na escala cósmica das coisas, tanto para
o assassino quanto para a vítima. E por que não funcio­
naria globalmente também, se resolvéssemos que ser­
viría a nossos interesses jogar a bomba?
John-Roger, um “líder espiritual” de Los Angeles,
do “Movimento de Percepção Espiritual íntima”, vai
mais longe:
“Examinemos o povo vietnamita nos últimos
3.000 anos de sua existência. Na pluralidade do
grupo, eles podem estar recebendo exatamente o
que criaram para si mesmos e podem ter equili­
brado todo o seu carma. Agora, é ruim para eles
ficar carmicamente livres de tudo isso? E errado?
Talvez essa liberdade em particular não tivesse
vindo de forma realmente popular, em termos
daquilo que poderiamos querer que fosse, mas
veio de uma forma que foi inteiramente perfeita.
Não houve nenhum excesso; não houve nenhuma
falta.
Os americanos que foram lá e se envolveram
com tudo isso fizeram parte do processo vietna­
mita de milhares de anos atrás, e mesmo tendo
nascido nos Estados Unidos nesta vida, também
foram levados de volta para lá a fim de comple­
tarem seu carma. E aqueles que passaram pela
guerra sem se ferir não faziam parte do processo
e voltaram a salvo para casa. Assim, como pode
essa ação ser julgada errada”?
Até que enfim, uma explicação razoável para a guer­
ra do Vietnã! Os soldados que foram mortos lá estavam
indo ao encontro de seu próprio carma, bem como foi
212 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

também cármica a bomba incendiária lançada sobre o


inimigo. Talvez, então, nosso envolvimento na América
Central seja também cosmicamente ordenado.

DESVALORIZAÇÃO DA VIDA HUMANA


Parece não haver fim para a racionalização cármica.
Pode até chegar a proporções genocidas, se W. H.
Church e Edgar Cayce estiverem certos. Em seu livro
“Muitos Retornos Felizes: As Vidas de Edgar Cayce”,
Church diz:

“Evidentemente, os primitivos antepassados


dos índios americanos eram aqueles filhos de
Belial da antigüidade, que escaparam da Atlântida
condenada para o que é agora o continente ame­
ricano. E os colonizadores que para cá vieram, se
interpretamos corretamente as palavras de Cayce,
eram nada menos do que os antigos filhos da Lei
de Um, ‘entrando outra vez nos relacionamentos
e contatos mais íntimos'. Se isso for verdade,
explica muita coisa a respeito dos trágicos e san­
grentos conflitos que ocorreram mais tarde entre
os colonizadores europeus e os índios como resul­
tado dessa reunião cármica de forças opostas.”

Se foi tudo cármico, então por que deveriamos clas­


sificar o extermínio dos índios americanos de “trági­
co’? Parece que aqueles “filhos de Belial” receberam
o que mereciam!
E apenas coincidência ou existe em toda essa con­
versa reencarnacionista uma significativa desvalo­
rização da vida humana — desde o aborto até mortes
infantis no berço, a suicídio, guerra e genocídio? É
também apenas coincidência que, à medida que cai o
Padrões de um Deus Menor 213

mercado do valor humano, o valor dos animais sobe?


O eu superior da Srta. MacLaine lhe disse:

“Nós, humanos, jamais devemos nos esquecer


de nossa capacidade de sintonizar com o espírito
coletivo dos animais. Sua energia é essencial para
o nosso futuro crescimento. Os animais estão
sobre a terra por um motivo e nosso desrespeito
por eles tem-se tornado alarmante.”

E é apenas coincidência que o clamor pelos direitos


dos animais surge numa época em que a vida humana
foi tão barateada carmicamente? Pode-se matar um feto
humano quase que ao sabor do próprio capricho porque
ele supostamente ainda não contém uma alma, mas não
se pode matar animais, nem mesmo para pesquisa mé­
dica, porque, segundo a Srta. MacLaine, “pulsando em
sua percepção coletiva encontram-se lições do passa­
do”.
Se a Srta. MacLaine e outros proponentes da Nova
Era estiverem realmente procurando iluminação e se os
reencamacionistas de hoje estiverem levando a sério
sua evolução espiritual, precisam fazer umas perguntas
difíceis acerca do rumo que estão seguindo. Os padrões
sociais e éticos que estão brotando de sua filosofia
devem seguramente ser desconcertantes. Contudo, da­
das as premissas aceitas, as conclusões seguem-se lo­
gicamente.
Os rebentos morais e sociológicos da idéia da reen-
camação me convencem de que a lei do carma contém
pelo menos este grão de verdade: Existe de fato causa
e efeito entre a premissa básica da vida na qual a pessoa
escolher acreditar e os tipos de padrões pessoais e
sociais que dela resultarão. Eles vivem a nos dizer que,
214 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

se quisermos saber por que existe um dado efeito,


precisamos olhar para a causa. Com isto, pelo menos,
eu concordo: Padrões baixos não vêm de ensinamentos
elevados.
CAPITULO QUATORZE

UMA VEZ POR TODA A


ETERNIDADE

“A morte é a entrada para uma vida mais sutil. Para


a flor, ela libera o perfume; para a crisálida, a borbo­
leta; para o homem, a alma.”
— Juliette Adam

Se posso esperar viver uma só vez neste mundo, o


que posso esperar que aconteça quando eu morrer? Que
tipo de vida após a morte posso antever? O céu é
realmente algo mais do que uma ilusão? E mais do que
um cenário para infindáveis piadas a respeito de São
Pedro? No céu, seremos realmente como os anjos? E
que dizer do inferno? Existe realmente um lugar horrí­
vel para o castigo dos maus? Seu castigo não é apenas
viver num inferno aqui mesmo?
Tantas perguntas se amontoam pedindo respostas
quando se dirige o pensamento para o futuro até a morte
e o que acontecerá no invisível mundo além. Embora o
processo de morrer esteja ligado a certa apreensão —
particularmente em casos associados com dor e sofri­
mento — a morte em si não deveria causar medo. Eu e
a Srta. MacLaine concordamos nesse ponto. Na morte,
216 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

simplesmente descartamos o corpo humano. A alma


continua a viver. Continuaremos a existir. Creio nisso,
não porque tema qualquer finalidade na morte e portan­
to busque a imortalidade, mas porque, mediante Cristo,
tenho a esperança de satisfação pessoal maior ainda na
vida futura.
O céu tem sido tratado com tamanho pouco caso que
poucas pessoas o levam a sério. Talvez seja devido ao
fato de vivermos em uma sociedade tão afluente que
pensamos já ter o céu aqui na terra. Ou talvez seja
devido à dificuldade que temos em conceituar alguma
coisa além de nossa existência presente. As referências
bíblicas a “ruas de ouro” e “portais de pérola”, não
importa o que vierem a ser de fato, dizem-nos que o céu
será glorioso, além de nossa imaginação. Deus usou
linguagem que podemos entender em nossa existência
atual a fim de transmitir os conceitos que nossas mentes
não podem compreender plenamente. O que sabemos
a respeito do céu é o fato de ser algo pelo qual vale a
pena esperar, que é tão maravilhoso que ninguém há de
querer perder.
Através das descrições que nos foram dadas do céu,
temos a promessa de que já não teremos de suportar
dor, sofrimento ou morte com os quais estamos fami­
liarizados nesta vida. Não haverá um carma desfavorá­
vel para pagar, um pecado para vencer. Não
precisaremos nos preocupar com sermos designados
para voltar a este mundo como uma criança deformada,
um intocável hindu ou uma vítima de discriminação.
— Mas o que faremos então? — perguntará alguém.
— Não será cacete demais viver no céu por toda uma
eternidade? — Talvez seja particularmente difícil para
aqueles de nós que vivemos em uma sociedade orien­
tada para a atividade, cheia de horários, que vive de
Uma Vez Por Toda a Eternidade 217

olho no relógio, apreciarmos quanto a eternidade será


diferente. A eternidade não é tanto uma questão de
tempo ou quantidade, mas de qualidade. E a diferença
entre dizer: “Ela viveu apenas 28 anos”, e dizer “Ela
foi uma mulher talentosa, realizada e feliz”. E a dife­
rença entre dizer: “Já estive em 25 países”, e dizer
“Aprendi lições incríveis com as pessoas que conheci
em minhas viagens”. A vida eterna é uma qualidade que
os cristãos adquirem mesmo na vida presente. Jesus
disse: “Quem ouve a minha palavra e crê naquele que
me enviou, tem a vida eterna... passou da morte para
a vida”.
Visto por esse prisma, aquilo que faremos no céu
parece secundário e insignificante. Embora duas pes­
soas que se amem possam gostar de planejar um em­
preendimento excitante, na verdade pouco importa o
que realmente fizerem contanto que estejam juntas. E
ficarem juntas a única coisa que realmente as leva a
esperar ansiosamente o acontecimento. Conforme a
Srta. MacLaine mostrou tão bem em relação àqueles
que gostam de “fazer” e aqueles que gostam de “ser”,
é ser que traz mais satisfação. Os cristãos aguardam
com ansiedade a rica participação na comunhão com
Deus e uns com os outros.
Parte da dificuldade que sentimos em compreender
o céu é o fato de ainda não estarmos preparados para
ele. Deus precisa falar conosco como se fôssemos
crianças porque ainda temos um conceito imaturo a
respeito da vida presente e da futura. Houve uma época
para cada um de nós em que a criatividade e o prazer
de plantar delicadas florzinhas num canteiro do quintal
teriam ultrapassado a nossa compreensão de criança,
contente simplesmente em brincar com terra. O céu,
para aqueles de nós que somos adultos, será qualitati­
218 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

vamente tão superior a esta vida quanto a vida adulta é


à infância. E existe algum modo pelo qual um adulto
possa explicar isso a uma criança?
Não importa a definição que lhe dêem, a maioria das
pessoas quer ir para o céu quando morrer. Em contraste,
não posso dizer que conheço uma única pessoa que
queira ir para o inferno. Na verdade, a maioria das
pessoas deseja descartar de todo essa possibilidade.
Mas Jesus nos adverte de que o inferno existe e que não
é apenas uma palavra qualquer, como hades, para se
referir ao mundo invisível. Não importa o que mais o
inferno possa ser, ele é claramente um lugar de punição
que jamais deve ser atenuado ou ignorado.
A descrição do inferno avisa a quem quer que seja,
com antecedência, de que é um terrível destino. Em
comparação com a vida celestial de imensurável satis­
fação pessoal, o inferno será um castigo de fato severo.
Em sua revelação divina, João nos diz que “se alguém
não foi achado inscrito no livro da vida, esse foi lançado
para dentro do lago do fogo”.
Da mesma forma que com o céu, qualquer tentativa
de compreender o inferno terá de ser inadequada. Mas
acho que tenho uma leve suspeita de como seria estar
no inferno quando deixo de seguir as instruções para
gravar meu trabalho no processador de texto do com­
putador e acabo apagando cinco horas de escrita. Inva­
de-me aquela sensação de impotência, frustração e
desalento quando vejo pulsando na tela as palavras:
“Não foi encontrado.” “Não foi encontrado.”
Infelizmente, alguns de meus antigos alunos passa­
ram por experiência semelhante ao procurarem em vão
seu nome na lista daqueles que haviam passado no
exame da Ordem dos Advogados. Quando, por fim,
voltaram-se para sair em total desapontamento, a única
Uma Vez Por Toda a Eternidade 2 19

coisa em que podiam pensar era o fato de que seu nome


não havia sido encontrado. “Não foi encontrado.” Que
amargo contraste será a rejeição do inferno comparada
à promessa feita àqueles que submeteram a sua vida ao
senhorio de Cristo. Pois Cristo prometeu: “De modo
nenhum apagarei o seu nome do livro da vida; pelo
contrário, confessarei o seu nome diante de meu Pai e
diante dos seus anjos.”
David disse à Srta. MacLaine que “Até mesmo a
religião acredita em causa e efeito — é por isso que,
quando jogaram foram a reencamação, inventaram um
céu e um inferno para dar um jeito em todos os efeitos
não cumpridos”. Pelo menos, eu e David concordamos
em que, de alguma forma, haverá um julgamento de
nossas atitudes e ações nesta vida. Mas não será na base
impessoal da lei de causa e efeito. Se fosse, não haveria
necessidade de céu, porque ninguém estaria habilitado.
Ninguém é perfeito. Felizmente para aqueles que esco­
lheram a Cristo como seu Salvador, quando chegar a
hora de contabilizar os pecados, Deus prometeu aos
seus filhos que se esquecerá de todo o mal que tiverem
praticado!
Mas se houver um inferno para aqueles que veemen­
temente negam o senhorio de Jesus Cristo, que, arro­
gantes, assumem os atributos de divindade como o fez
Satanás antes deles, e que cinicamente descartam a
possibilidade até da idéia de um inferno, então podemos
apenas esperar que, para o seu próprio bem, estejam
errados a respeito da lei de causa e efeito. A última coisa
que qualquer um deles desejaria encontrar no inferno é
essa lei sendo meticulosamente aplicada.
220 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

UM NOVO CORPO ETERNO


Apesar de tudo o que eu disse até aqui, preciso
confessar que acredito na reencamação.
Uma única vez.
Ela acontecerá na hora da ressurreição. Nessa hora,
quando Jesus Cristo vier novamente à Terra para buscar
os seus, os fiéis que já tiverem morrido serão ressusci­
tados. Então, diz Paulo, os fiéis que ainda estiverem
vivos na hora da ressurreição serão arrebatados com
eles ao encontro do Senhor, com quem todos entrarão
no céu (1 Tessalonicenses 4:13-18).
E nessa hora que a nossa única reencamação ocorre­
rá. A alma, que esteve encarnada no corpo terrestre, e
que foi separada do corpo corruptível pela morte, en­
trará num corpo novo, etemo. Paulo explicou aos cris­
tãos de Corinto que o novo corpo não será como aquele
com o qual estamos atualmente familiarizados (1 Co-
ríntios 15:35-57). Ele diz que precisamos tomar cuida­
do com a maneira pela qual o vemos. Ele nos relembra
de que, quando plantamos uma semente, a nova vida
que dela brota é de uma forma muito diferente da
semente em si.
Ele nos relembra também de que existem muitos
tipos diferentes de corpos, cada qual arquitetado per-
feitamente para seu propósito singular. Neste mundo,
os seres humanos têm um tipo de corpo, os animais têm
outro tipo, os pássaros outro e os peixes ainda outro.
Até mesmo os “corpos celestiais” em nosso atual Uni­
verso — a lua, as estrelas e os planetas — todos têm
tamanho, formato e brilho diferentes.
A coisa mais importante que devemos considerar,
diz Paulo, é a de que pode haver corpos físicos corrup­
tíveis, como os que temos agora, e corpos espirituais
Uma Vez Por Toda a Eternidade 221

incorruptíveis, como os que teremos um dia. Como


descendentes de Adão, todos recebemos um corpo físi­
co mortal. Na vida futura, cada herdeiro espiritual de
Cristo receberá um corpo espiritual imortal. Da mesma
forma que nossos corpos atuais foram criados perfeitos
para o ambiente no qual existimos aqui na Terra, os
nossos corpos eternos serão exatamente aquilo de que
precisamos para nossa existência etema. Em nossa
nova forma, seremos tão parecidos com o eterno Cristo
quanto fomos com o Adão mortal.
Nossos novos corpos serão tão diferentes dos que
temos atualmente quanto uma borboleta difere da ver-
miforme lagarta. Sabemos que toda borboleta passa por
quatro fases na vida: ovo, larva (lagarta), crisálida e
adulta. Durante cada uma dessas fases, sua aparência
muda e ela leva um tipo completamente diferente de
vida. O processo de crescimento e desenvolvimento
através de suas diversas formas é chamado de metamor­
fose.
A semelhança do ovo da borboleta em desenvolvi­
mento, passamos os primeiros meses da existência co­
mo embrião no ventre de nossa mãe. Em seguida, à
semelhança da lagarta, crescemos da infância até a
idade adulta em uma existência de percepção, aprendi­
zado e atividade sem fim. Quando morremos, passamos
através do casulo da morte e nos tomamos as mais belas
criaturas que poderiamos imaginar.
Temos muito a ganhar ao chegarmos ao estado eter­
no. Já não seremos as destrutivas larvas humanas que
somos hoje. O corpo que tivermos no céu, qualquer que
seja, impedirá que isso aconteça. E, quanto à questão
de saber o que faremos — pense só na liberdade!
Mas não dá para ouvir algumas lagartas filosofando
entre bocados de alguma folha? “Por que qualquer
222 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

lagarta haveria de querer viver além do casulo?” “E o


que faríamos se vivéssemos?” “Por mim, prefiro voltar
de novo do jeito que sou, e dar mais uma repassada
nesta folha.”
NOVA VIDA AGORA!

E de metamorfose espiritual que se trata. Não de


reencamação. Não de evolução. Não de auto-percepção
dentro de um corpo terrestre em deterioração. Como a
coroa de glória da criação de Deus, temos uma distinta
vantagem sobre as lagartas e borboletas: Nossa meta­
morfose pode começar mesmo nesta vida! Podemos
tomar-nos novas pessoas ainda enquanto estivermos
vivendo neste mesmo corpo! E a isso que se refere o
novo nascimento espiritual. Como cristãos, tomamo-
-nos novas criaturas em Cristo — agora, nesta vida,
antes de morrermos, do lado de cá do céu.
Se nossos corpos forem como que invólucros, segun­
do concorda a Srta. MacLaine, então não precisamos
de outros invólucros. Precisamos é transformar a pes­
soa que atualmente somos dentro desse invólucro. Mais
uma vez Shirley concorda, mas insiste em que precisa­
mos de muitos corpos (mais tempo) para transformar o
que está ali dentro.
Se alguém é fisicamente defeituoso, esperamos por
ele, se necessário, até que faça o que os outros poderíam
fazer mais depressa. Mas dar-lhe mais tempo não eli­
minará o defeito que ele enfrenta. Se fosse de alguma
forma possível eliminar esse defeito de vez, então ele
jamais precisaria novamente de mais tempo. Eliminar
os nossos defeitos é o que a graça de Deus faz quando
nos entregamos a ele em fé obediente.
Não precisamos esperar pelo céu a fim de nos tor­
narmos uma nova pessoa espiritual. Na realidade, se
Uma Vez Por Toda a Eternidade 223

esperarmos, será tarde demais. Ao entregarmos nossas


vidas a Cristo e seguirmos o seu ensinamento, somos
transformados (metamorfoseados) agora mesmo, pela
renovação de nossas mentes e pelo renascimento do
nosso espírito.
Os reencamacionistas muitas vezes empregam mal
a referência de Jesus a “muitas moradas” para retratar
o ciclo de corpos humanos pelos quais a alma tem de
passar na jornada rumo à iluminação espiritual. O qua­
dro mais correto, de uma perspectiva bíblica, é o de uma
morada com mais de um espírito. Para o cristão, existe
mais de um espírito dentro de seu “invólucro”. Ele não
está sozinho em seu corpo: seu corpo 6 também a
habitação do Espírito de Deus, que enche, satisfaz,
transforma e ama.
Por fim, capta-se a mensagem: E melhor viver em
uma casa dilapidada plena de companheirismo e amor
do que apenas em uma sucessão de “moradas” confor­
táveis. Nessa verdade, o cristianismo é muito superior
ao misticismo oriental. Enquanto os místicos, através
de mantra e meditação, ficam sozinhos e falando com
suas próprias pessoas, o cristão, através da oração, fala
com um companheiro constante — o Deus Criador do
Universo.
COMPARE AS CONSEQÜÊNCIAS
Quando todos os jogos mentais tiverem chegado ao
fim, quando toda a lógica legal tiver sido gasta, o que
realmente conta é a forma pela qual as nossas crenças
afetam a nossa vida e a daqueles que nos cercam.
Shirley MacLaine e eu podemos facilmente tomar um
jato até o Peru, ou a índia ou a China — o lugar que
desejarmos — e usar o tempo para obter uma perspec­
tiva espiritual de nós mesmos. E podemos, com a mes­
224 A í Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

ma facilidade, retomar ao nosso confortável estilo de


vida em Malibu e entregar-nos a teorias estapafúrdias,
especulativas. Mas os milhões de pessoas que deixamos
para trás em esqualidez, ignorância, fome e incertezas
cotidianas não se podem dar ao luxo de fazer o mesmo.
As pessoas precisam de um Deus pessoal para sus­
tentá-las, e talvez os ricos e famosos precisem mais
ainda. Voltar-se para a lei impessoal do carma e seu
insensível executor— a reencamação— não deixa nem
o rico nem o pobre com um Deus que pode amar,
confortar, perdoar e satisfazer. O Deus que tudo isso
pode fazer é pessoal e real. Ele deseja muito ter comu­
nhão conosco, e com isso nos confere grande honra.
Tendo-nos feito à sua própria imagem, Deus fica
triste e desapontado quando nos rebelamos contra ele
por intermédio de vidas cheias de pecado. Mesmo as­
sim, Deus não nos abandonou ou, irado, vingou-se de
nós. Pelo contrário, “porque Deus amou ao mundo de
tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo
o que nele crê não pereça, mas tenha a vida etema.
Porquanto Deus enviou o seu Filho ao mundo, não para
que julgasse o mundo, mas para que o mundo fosse
salvo por ele” (João 3:16,17).
Nossa salvação foi alcançada mediante alto preço, a
morte de Jesus sobre a cruz. Sua morte se deu para que
pudéssemos ter vida. Seu sangue foi derramado para
que nossos pecados pudessem ser perdoados. Homens
e mulheres têm morrido de forma cruel por boas causas,
mas Jesus era o inocente Filho de Deus, e ele morreu
Çela maior de todas as causas — nossa etema salvação.
E movidos por seu amor e cabal sacrifício que nos
dedicamos a Jesus Cristo:
Uma Vez Por Toda a Eternidade 225

“Pois ele, subsistindo em forma de Deus não


julgou como usurpação o ser igual a Deus; antes
a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de
servo, tomando-se em semelhança de homens; e,
reconhecido em figura humana, a si mesmo se
humilhou, tomando-se obediente até à morte, e
morte de cruz. Pelo que também Deus o exaltou
sobremaneira e lhe deu o nome que está acima de
todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre
todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra,
e toda língua confesse que Jesus Cristo é Senhor,
para glória de Deus Pai” (Filipenses 2: 6-11).
Em Cristo podemos viver com confiança as nossas
vidas, sabendo que Deus jamais nos abandonará.
“Quem nos separará do amor de Deus? Será
tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome,
ou nudez, ou perigo, ou espada? . . . Em todas
estas coisas, porém, somos mais que vencedores,
por meio daquele que nos amou. Porque eu estou
bem certo de que nem morte, nem vida, nem anjos,
nem principados, nem coisas do presente, nem do
porvir, nem poderes, nem altura, nem profundida­
de, nem qualquer outra criatura poderá separar­
mos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus
nosso Senhor” (Romanos 8: 35-39).
ENCONTRANDO A VERDADEIRA LUZ
Com tal esperança e garantia através de Cristo, por
que deveriamos buscar qualquer outra fonte de segu­
rança e satisfação? Por que deveriamos confiar em
nossos próprios esforços para “acertar”? A eclética
filosofia da Srta. MacLaine de reencamação e egoísmo,
226 As Vidas Imaginárias de Shirley MacLaine

e sua crença em médiuns que promovem transes, OV-


NIs e seres extraterrestres, é fascinação repleta de pe­
rigo. A dotar um sistem a de crença assim tão
especulativo é como dar um mergulho aéreo sem pára-
-quedas.
Paulo dirige palavras de cautela àqueles que já são
cristãos, e as seguintes palavras de etema importância
àqueles que ainda não entregaram suas vidas a Cristo:
“Cuidado que ninguém vos venha a enredar
com sua filosofia e vãs sutilezas, conforme a
tradição dos homens, conforme os rudimentos do
mundo, e não segundo Cristo: porquanto nele
habita corporalmente toda a plenitude da divinda­
de. Também nele estais aperfeiçoados. Ele é o
cabeça de todo principado e potestade.

E a vós outros, que estáveis mortos pelas vossas


transgressões... vos deu vida juntamente com
e le ...

Portanto, se fostes ressuscitados juntamente


com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo
vive, assentado à direita de Deus. Pensai nas coi­
sas lá do alto, não nas que são aqui da terra; porque
morrestes, e a vossa vida está oculta juntamente
com Cristo, em Deus. Quando Cristo, que é a
nossa vida, se manifestar, então vós também se­
reis manifestados com ele, em glória” (Colossen-
ses 2:8 e seguintes).
Pode a crença na lei impessoal do carma possivel­
mente dar significado à existência do leitor nesta vida?
A noção de reencamação traz à tona o que de melhor
existe em você? Pode você encontrar satisfação nas
Uma Vez Por Toda a Eternidade 227

viagens de expansão da mente que o movimento da


Nova Era promove? Você se sente o mais feliz possível
quando está todo voltado para si mesmo?
Seria uma coisa arriscar-se a crer na reencamação e
no egotismo se essa crença não tivesse sérias conse-
qüências. Mas quando coisas tão importantes estão em
jogo, tais como o significado da vida presente e da
futura, e quando a alternativa de vida em Cristo é
oferecida tão clara e gratuitamente, que sentido faz
arriscar seu destino, tanto agora quanto para sempre?
Por que haveria alguém de querer sair dançando no
escuro em cima de um galho quebrado?

Eu sou a luz do mundo;


quem me segue não andará nas trevas,
pelo contrário terá a luz da vida.
— Jesus Cristo

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