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Otomanos – Assim eram chamados os turcos muçulmanos que a partir do século XIII,
sob a liderança do imperador Osman (ou Otman), avançaram sobre os Bálcãs e, em
meados do século XV, acabaram dominando o antigo Império Romano do Oriente (ou
Império Bizantino).
Império Romano do Oriente – Para conter o processo de decadência do mundo
Pode-se dizer que a Europa do início dos tempos modernos ainda conservava
muito da velha paisagem feudal. Mas nela já se respirava outra atmosfera social,
econômica e cultural, com novas ideias, valores e interesses. Tentando traduzir o que
estava acontecendo, o dominicano espanhol Bartolomeu de Las Casas – que ficaria
famoso por seu trabalho junto aos índios americanos – registrou: “estamos no limiar de
um novo tempo... diferente de todos quantos já vimos”.
Trabalho servil – Relação de trabalho pela qual o trabalhador rural (servo) é obrigado
a prestar serviços gratuitos ao senhor da terra e a ceder-lhe uma parte do que produz.
Em troca, o senhor feudal concede a ele um pedaço de terra para cultivar e proteção em
caso de guerra.
Antiguidade Clássica – Expressão que identifica o período de hegemonia política,
1
Capitalismo é o sistema social e econômico hoje dominante na maior parte do mundo.
Ele se caracteriza pela separação entre o trabalho e o capital, entre os trabalhadores que
vendem sua mão de obra em troca de salário e os empresários que aplicam o capital
(dinheiro, máquinas, matérias-primas, meios de transporte, terras, etc.) na produção e
comercialização de mercadorias, visando ao lucro.) Desde o final do século XVIII,
quando se iniciou a industrialização na Europa, o capitalismo passou a ter como base
principal as atividades industriais. Ainda hoje, a produção industrial em grande escala é
responsável pela geração de boa parte dos empregos e dos lucros, apesar da importância
cada vez maior dos setores de serviços. Mas nas suas origens e por um longo período,
do século XII ao século XVIII, o capitalismo baseou-se na atividade comercial. Foi a
aplicação de capitais no comércio de produtos entre mercados regionais, nacionais e
internacionais que possibilitou a obtenção de lucro e, com ele, a acumulação progressiva
de capital que posteriormente permitiria a Revolução Industrial. Essa fase inicial do
sistema é por isso chamada de capitalismo mercantil.
Sua formação correspondeu à ascensão da burguesia urbana e à consolidação dos
Estados nacionais europeus e seus impérios coloniais. Enquanto mercadores e
banqueiros ampliavam seus negócios dentro de seus países, nas colônias e pelo mundo
afora, os governos tratavam de assegurar que o comércio se desenvolvesse cada vez
mais. Para isso criaram regras e impuseram controles – leis, monopólios, moedas, taxas,
impostos, etc. -, interferindo diretamente na vida econômica.
tradicional estrutura política, na medida em que ajudava a enfraquecer o poder local dos
grandes senhores e a reforçar o poder central da monarquia.
Mas tarde, coube aos portugueses retomar a procura, atraídos pelo comércio de
especiarias e pelas fabulosas riquezas que, segundo as lendas, existiriam nos continentes
africano e asiático. Tais lendas povoam o imaginário dos europeus desde a época dos
relatos de viagens de Marco Polo à China, no século XIII. Elas exerciam também uma
poderosa influência entre os espanhóis.
Foi essa ambição de riquezas uma das forças motivadoras da expansão marítima.
Ela mobilizava aventureiros de toda espécie na procura das Índias. Motivava também
homens de Estado. Para estes, havia igualmente uma necessidade urgente de aumentar o
estoque de ouro e prata, de modo a facilitar a circulação de moedas, financiar
empreendimentos e custear as crescentes despesas públicas. Na difícil situação criada
pelo controle turco e árabe do Mediterrâneo após a tomada de Constantinopla, o
atlântico surgia como rota alternativa para uma nova frente de expansão europeia.
Foi durante a dinastia de Avis, que a partir do final do século XIV, definiram-se
prioridades, mobilizaram-se apoios sociais e políticos e reuniram-se recursos para a
expansão atlântica. Coube a um dos filhos de dom João I, dom Henrique o Navegador,
orientar e conduzir esse empreendimento nas suas etapas iniciais.
Tudo isso seria inútil, entretanto, caso não existisse uma atmosfera cultural que
alimentasse o audacioso sonho de enfrentar o desconhecido – o Mar Tenebroso,
povoado de monstros, segundo as lendas – para chegar às Índias. Essa atmosfera existia,
manifestando-se no desenvolvimento do espírito científico e investigativo típico do
Renascimento, no gosto da aventura5 e da descoberta do desconhecido.
5
“Navegar é preciso, viver não é preciso”. (Antigo verso latino que, segundo a tradição,
foi adotado como lema pelos navegadores portugueses do século XV).
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Já desde o início do século XV, os portugueses, sob o comando de dom Henrique,
enfrentaram o reconhecimento metódico e o mapeamento da costa da África. Com isso,
desenvolveram duas ciências: a astronomia e a geografia. Ora, essas duas ciências são
necessariamente baseadas em observações nas quais a visão predomina. Daí, talvez, a
origem do método da visão direta dos fenômenos, seguida pela sua descrição por mapas,
cartas, crônicas ou roteiros de viagem. (...) Mas não foram só as ciências auxiliares da
náutica que se desenvolveram a partir da observação. A colonização das regiões
descobertas, ou conquistas, levou também ao estudo de novas plantas, animais estranhos
e minérios ainda não explorados. Resultou disso o desenvolvimento da História Natural,
não mais baseada em lendas e relatos fantasiosos, mas, sim, no testemunho da visão.
(...) De tudo isso decorre que o Renascimento (científico) teria começado em Portugal,
quiçá em 1433, quando o Infante dom Henrique instruiu um seu escudeiro Gil Eanes, no
comando de uma nau, a transpor o cabo Bojador, na costa da África, ao sul das
Canárias. A ideia dominante (até então) era de que, dali para diante, não seria mais
possível a vida. A terra seria estéril, o mar ferveria e quem lá se aventurasse não mais
tornaria. A instrução de dom Henrique ao capitão, conforme atestado pelo cronista
Zurara, foi de dobrar o cabo e constatar pela visão direta se realmente assim era.
Portulanos – Mapa rudimentar no qual os navegadores da Antiguidade registravam os
Essa etapa transcorreu sob o comando do rei dom João II (1481-1495), outro
soberano da dinastia de Avis fortemente comprometido com as navegações atlânticas. O
momento definidor foi a chegada, em 1487, de Bartolomeu Dias ao cabo das
Tormentas, no extremo sul da África. O navegador conseguiu ultrapassá-lo no início de
1488, voltando em seguida para Lisboa. Mais tarde, o rei rebatizou o promontório de
cabo da Boa Esperança, indicando a confiança dos portugueses na rota africana para o
Oriente.
Enquanto dom João II mandava seus capitães pelo Atlântico Sul, a Espanha
surpreendia com um fato novo e inesperado: em 1492, Cristóvão Colombo, um piloto
genovês contratado pela Coroa espanhola, navegando pelo Atlântico no rumo do
Ocidente com três caravelas, alcançava as atuais Antilhas (na região central da
América), depois de quase dois meses de viagem9.
longo da costa para garantir a posse de territórios conquistados e apoiar suas transações
comerciais.
9
1492, de Ridley Scott, 1994 – Reconstituição histórica da viagem de Cristóvão
Colombo e dos primeiros contatos e conflitos entre espanhóis e ameríndios das
Antilhas.
Mas a novidade do feito e a presença dos espanhóis no Atlântico mudava
bastante o mapa-múndi. Do ponto de vista dos portugueses, era conveniente negociar
logo com os seus rivais a partilha antecipada das terras a serem conquistadas nos dois
lados do oceano. Se não viesse a obter nenhuma outra vantagem concreta, estariam pelo
menos preservando suas posições e rotas na margem africana do Atlântico.
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[...] para o bem da paz e da concórdia e pela conservação da afinidade e amor que o
senhor rei de Portugal tem pelos senhores rei e rainha de Castela e de Aragão, em
virtude dos seus poderes, outorgaram e consentiram que se trace e assinale pelo Mar
Oceano uma raia ou linha direita de pólo a pólo, a treentas e setenta léguas das ilhas de
Cabo Verde em direção à parte do poente. [...] E que tudo o que até aqui tenha achado e
descoberto, pelo rei de Portugal e por seus navios, tanto ilhas como terra firme, dentro
da dita raia, que tudo seja e fique e pertença ao senhor rei de Portugal e aos seus
sucessores para sempre [...]
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“Senhor da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia.”
(Acréscimo mandado fazer por dom Manuel, o Venturoso, a seu título oficial de rei de
Portugal e Algarves.)
Vasco da Gama (1469-1524). Navegador português que, em 1498-1499, completou o
contorno do litoral africano e estabeleceu a rota do Oceano Índico até Calicute, na Índia.
O sucesso dessa expedição possibilitou a Portugal estabelecer entrepostos comerciais na
Índia e em outros pontos da Ásia para comercializar regularmente na Europa as
especiarias orientais. Vasco da Gama voltou outras vezes à Índia, onde acabou
morrendo.
A posse oficial de terras descobertas pelos portugueses era marcada pelos padrões de
pedra, gravados com o brasão real. No caso do Brasil, na falta de um desses padrões, a
posse foi registrada pela cruz de madeira levantada em Porto Seguro.
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Pedro Álvares Cabral (1467 ou 1468-1520 ou 1526) – fidalgo português, escolhido
pelo rei dom Manuel para comandar a primeira grande expedição comercial enviada ao
Oriente, depois que Vasco da Gama descobriu o caminho marítimo para as Índias.
Acabou aportando na costa brasileira em abril de 1500. Apesar do êxito comercial, a
perda de grande número de embarcações provocou o afastamento de Cabral do comando
de outras expedições.
América portuguesa
No percurso até Cabo Verde, a rota foi fielmente seguida. Após o arquipélago, a
frota desviou-se para o ocidente, no rumo sudoeste. No fim da tarde de 22 de abril, os
portugueses avistaram um monte, que chamaram Pascoal, a linha da costa, no sul da
atual Bahia. Cabral e sua frota chegavam às novas terras 44 dias após deixar Lisboa.
Esse desvio, provavelmente deliberado e não casual, faz supor que, além do roteiro
conhecido, a esquadra tivesse a missão não divulgada de comprovar a existência de
terras no Atlântico Sul dentro da área prevista em Tordesilhas13.
Cabral e seus homens batizaram as novas terras de Ilha de Vera Cruz. Para
comunicar o feito ao rei dom Manuel, partiu de volta para Portugal o navio comandado
por Gaspar de Lemos, levando uma carta do escrivão Pero Vaz de Caminha. Este expôs
13
Os precursores de Cabral – Antes de Cabral, as terras que hoje fazem parte do Brasil
já haviam sido visitadas por navegantes europeus. O primeiro a chegar parece ter sido o
espanhol Vicente Pinzón que, a 26 de janeiro de 1500, desembarcou na ponta de
Mucuripe, no litoral do atual estado do Ceará. Alguns dias depois, em fevereiro de
1500, Diego de Lepe, outro navegador espanhol, aportou também nas novas terras –
segundo alguns historiadores, no cabo São Roque, próximo à atual cidade de Natal;
segundo outros, no cabo Santo Agostinho, no atual estado de Pernambuco. Existem
ainda referências a possíveis expedições portuguesas às novas terras anteriores a Cabral
no livro Esmeraldo de situ orbis, escrito pelo navegador Duarte Pacheco Pereira. Nesse
livro afirma-se que o rei dom Manuel, já em 1498, teria enviado frotas para “descobrir a
parte ocidental, passando além do Mar Oceano, onde é achada e navegada uma tão
grande terra firme,” na qual se encontra “muito e fino brasil”.
Entretanto, Duarte Pacheco – que acompanharia Cabral na grande viagem de
1500 – publicou o Esmeraldo em 1505, de modo que as referências que faz àquelas
possíveis expedições de 1498 não têm o valor de fonte histórica irrefutável.
ao rei suas dúvidas quanto à existência de ouro e prata e recomendou-lhe que desse
início imediato à “salvação” dos nativos, isto é, à sua conversão ao cristianismo14.
Mais recentemente, porém, a expressão vem sendo criticada, pois ela revela
apenas a visão portuguesa e europeia – ou visão eurocêntrica – do acontecimento.
Argumenta-se que, na verdade, o continente e suas populações já existiam,
independentemente de serem conhecidos ou não pelos europeus. Essas populações
tinham sua própria cultura, crenças, valores e formas de organização social, anteriores à
conquista europeia. Tudo isso faz também de nossa história.
Os primeiros anos
14
O descobrimento do Brasil, de Humberto Mauro, 1937 – Representação
cinematográfica, com clara intenção didática, do fato histórico da chegada dos
portugueses ao Brasil em 1500; produção esmerada, belas imagens e trilha sonora de
Heitor Villa-Lobos.
Américo Vespúcio (1451-1512) – Navegador e cosmógrafo florentino. Foi o primeiro
A ameaça estrangeira à posse da terra chegou a tal ponto na década de 1520 que
o governo português se viu obrigado a enviar para cá expedições militares, chamadas de
guarda-costas. Mas, ao regressar ao reino, seus próprios capitães reconheciam que
perseguir traficantes por uma infinidade de ilhas, enseadas, estuários e baías era um
esforço inútil. A solução era a defesa permanente da costa, com vilas e povoados que
pudessem impedir a atividade comercial dos estrangeiros, “pois que estes não iriam
querer ir até lá e voltar vazios”, como observou Cristóvão Jacques em 1526.
Na verdade, três décadas após declarar sua posse daquela faixa das terras
americanas, Portugal ainda não tinha uma estratégia definida para aproveitá-la no
contexto de sua política expansionista e mercantilista. Não queria perdê-la, mas não
tinha certeza quanto à melhor forma de explorá-la. O pau-brasil, com seu reconhecido
Em alguns casos, o litoral das novas terras, com sua extensão e seus
ancoradouros naturais, poderia servir como escala para abastecimento de água e
alimentos das frotas que se dirigiam às Índias. Mas até para isso era preciso defendê-lo e
administrá-lo. quando o Estado português, no governo de dom João III (1521-1557), se
convenceu disso e passou a agir nessa direção, começou a formar sua colônia na
América.
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Diálogos: “...mais me temo de Lisboa, que ao cheiro desta canela, o reino nos
despovoa.” (Do poeta Francisco de Sá de Miranda, em torno de 1530, sobre a grande
euforia com os negócios das especiarias orientais em Portugal.)