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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04


Prof. Luiz Gonzaga de Carvalho

Transcrição não revisada ou corrigida pelo professor.

Estamos de volta com mais uma aula de Introdução ao Simbolismo


Astrológico. Se não me engano, na última aula começamos a explicar uma espécie
de círculo dos planetas, em que havia um cenário no círculo e um dos planetas
ocupava o papel do centro (e de acordo com o planeta que estava no centro, seria o
significado de cada um dos planetas em torno); e na sequência, nós íamos fazer isso
com outros planetas no centro.

Mas antes disso, vamos fazer uma pausa no simbolismo para dissipar algumas
confusões comuns de quando a pessoa começa a estudar simbolismo astrológico,
alquimia, ou qualquer uma dessas ciências tradicionais de caráter divinatório – I
Ching, Quiromancia, Feng Shui etc. Quando praticadas dentro dos seus limites
adequados e por representantes competentes, essas artes até que são bastante
eficazes na antecipação de certos eventos futuros e na descrição de cenários que
você desconhece. E se você fala “astrologia” duas vezes numa conversa, na terceira
vez surge a questão do destino e livre arbítrio, não é verdade? É inevitável. Vamos
então, antes de avançarmos no simbolismo astrológico, tentar clarear alguns dos
conceitos fundamentais, para entendermos essas noções de livre arbítrio e destino.

A primeira delas é a própria noção de livre arbítrio. Quando falamos “livre


arbítrio” nossa imaginação representa quase que imediatamente uma capacidade
totalmente aberta e indefinida de agir de qualquer jeito; [sua imaginação] representa
que quando você está dentro do livre arbítrio você pode fazer o que você imaginar e
ninguém pode antecipar o que você faz com o seu livre arbítrio, porque ele é o livre
arbítrio, quer dizer, uma espécie de super-poder que permite que a sua ação não
tenha nenhuma relação com seus estados de existência anteriores à ação: você
imagina que tem uma ação atomística, que você pode realizar ou não, e pode realizá-
la do jeito A, B, C ou D, e ela não está de modo algum ligada ao que você pensou
imediatamente antes de fazer, ou imaginou antes de pensar, ou sentiu antes de
imaginar, ou viveu antes de sentir, ou fez ontem, e anteontem, e assim por diante.

Em primeiro lugar, essa capacidade de liberdade indefinida ou ilimitada


evidentemente não existe. Toda e qualquer ação, ainda que seja absolutamente livre,

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tem algo de si nos estados anteriores do sujeito que age – do agente – porque o
agente é a causa da ação e a ação não pode ser desproporcional ao agente, o efeito
não pode ser desproporcional à causa. O que realmente queremos dizer quando
dizemos que uma ação é livre?

Se vocês lembrarem as aulas de Introdução à Ética, falamos que a primeira


característica pela qual a ação humana se distingue da atividade dos animais é a
capacidade do homem representar a ação para si mesmo de modo abstrato, como um
tipo geral e não como uma ação particular. Por exemplo, você se levanta, tem que
sair para o trabalho, e vai decidir: “Eu vou pegar meu automóvel. Ah, mas o
automóvel está com problema, ele pode quebrar no meio do caminho (eu não sei
como os automóveis funcionam, então imagine uma coisa que você sabe que está
para quebrar e que pode quebrar a qualquer momento). Pego um ônibus? Não sei,
vai chover”. Veja bem, quando você representa para si essas alternativas, você não
representa o você entrar no automóvel e, quando estiver dentro do automóvel, o
sentir um certo cheiro, nem se imagina sentado dentro do automóvel e vendo o que
está diante de você no pára-brisa; nem se imagina sentando no ônibus ou esperando
o ônibus. Você não tenta reproduzir a situação em particularidades sensíveis, você
simplesmente as esquematiza em conceitos. E cada conjunto de conceitos, por
exemplo, a ação de pegar o automóvel, ir com ele, e arriscar quebrar uma peça dele
no meio do caminho não é necessariamente imaginada, ela é simplesmente
representada como “todas as possibilidades sensíveis de o automóvel quebrar essa
peça no meio do caminho”. Você não precisa imaginar “depois que eu andei duas
quadras – e quando eu ando duas quadras eu passo em frente àquele edifício ali que
é cor de laranja – quebrou a peça”. Você não imagina uma circunstância possível,
você pensa conceitos que significam as diversas possibilidades daquela ordem. Você
representa a situação possível para você conceitualmente, não imaginativamente, ou
afetivamente, ou de maneira proto-sensível – quer dizer, você não tem uma visão do
que vai acontecer, você calcula o que vai acontecer a partir de conceitos abstratos.
Esses conceitos não significam uma situação possível, eles significam N situações
possíveis; eles são de caráter geral, não são de caráter particular.

Basta pensar assim: você sabe que tal peça do carro está para quebrar. Você
não precisa imaginá-la, visualizá-la como “uma parte que tem um eixo de metal e
uma borrachinha, e esta borrachinha está rasgando”. Você não faz nada disso, na
verdade você concebe a peça a partir do nome dela, e este nome serve para você
lembrar que aquela peça tem uma função qualquer no automóvel, e esta peça está
para quebrar; não sei se é porque ela vai explodir, ou porque a sua borracha vai
derreter, ou se dissolver. Você não pára e lista para si mesmo todas as imaginações
possíveis; você usa dois, três, quatro, cinco, meia dúzia de conceitos, com esta meia
dúzia de conceitos você representa uma série de cenários análogos, e então imagina
a série contrária: “Se quebrar a peça, as desvantagens são esta, esta e esta; eu vou
chegar atrasado, vou ter que deixar o carro no meio da rua". Isso se ele quebrar. Aí a
lista tem [as desvantagens] A, B, C e D. E se ele não quebrar: "Vai ser bom! Eu vou

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chegar mais rápido, se chover eu não pego chuva etc.”. Ou seja, você lista
conceitualmente algumas vantagens e desvantagens; e depois pega o outro cenário:
“Está bom, deixo o automóvel e pego um ônibus, e amanhã vou mandá-lo para o
conserto”, e aí também faz uma lista geral e abstrata das vantagens e desvantagens.

Você então [observa] “Há esses cenários que são pegar o automóvel e ele
quebrar ou não quebrar, e pegar o ônibus e chover ou não chover”. São quatro
cenários diferentes (normalmente as escolhas humanas são feitas concebendo mais
do que quatro cenários, aqui nós estamos simplificando, não vamos tentar reproduzir
toda uma situação humana real, porque não é necessário). Quando você analisa esses
quatro cenários geralmente você pensa: “Bom, um eu detesto; outro é tolerável; o
outro é melhor etc.”. Diante da multiplicidade dos cenários concebidos – veja bem,
isso não são [todos] os cenários de possibilidades reais; fora os concebidos existem
inúmeros outros cenários que você não concebe, porque eles já parecem
implausíveis, por exemplo: “Devo pegar meu automóvel hoje? Mas e se cair um
asteróide em cima do capô do automóvel e amassá-lo?”. Diante desses quatro
cenários, você tem duas perguntas: “Qual eu prefiro?” e “Qual vai acontecer?”.
Você não sabe se a peça do automóvel vai quebrar ou não, você não sabe se vai
chover ou não, você não sabe se o ônibus vai chegar na hora ou não, e assim por
diante. Então são duas perguntas que você tem que fazer, são dois problemas que
você tem que resolver, e a sua ação – o que você vai fazer – vai ser diretamente
proporcional à sua resposta a essas duas perguntas. Não é assim que você decide as
coisas?

Então, quando você é livre? Suponha que você acha que vai acontecer o
cenário A (se você pegar o carro ele vai quebrar), e você pega o carro e ele não
quebra, ou pega o ônibus e o ônibus quebra. Onde está sua liberdade? Não há
liberdade nenhuma! Porque a sua liberdade depende de você ser capaz de antecipar a
realidade tal como ela vai acontecer. Liberdade é assim: você é especialista em
automóveis e sabe que há 90% de chances de que ele vá quebrar, então você não o
pega; e na próxima vez em que você pega o carro, ele quebra. Veja bem, naquele dia
você não podia pegá-lo, você comprovou que foi livre ao escolher não pegar o
automóvel. Na maior parte das vezes na vida você não vai ter como comprovar se
houve liberdade ou não.

Agora suponha que alguém de fora pudesse responder a essas mesmas duas
perguntas – esta é uma pergunta de caráter objetivo: “Qual desses quatro cenários é
o mais provável de acontecer?”. Quer dizer, desses quatro, o sujeito só precisa saber
duas coisas –, suponha alguém de fora da situação possa lhe dizer se vai chover ou
não, ou se o seu automóvel vai quebrar ou não. Duas perguntas que têm pouquíssima
relação com seu livre arbítrio (algum conhecimento de meteorologia ou de mecânica
poderia dar uma resposta a essas perguntas). Veja bem, o fato de existir um
climatologista ou meteorologista que é capaz de dizer, para aquela circunstância,
“vai chover” ou “não vai chover”, modifica em algo a sua liberdade? No momento

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em que você está tomando aquela decisão, há um cientista da NASA que sabe se vai
chover ou não, e ele está lá na NASA, não está na sua casa. Ao mesmo tempo, nesse
mesmo momento há um engenheiro automobilístico que sabe se o seu automóvel vai
quebrar ou não, mas ele também não está na sua casa. E também nesse exato
momento, fora esses dois especialistas, há provavelmente a sua esposa, que é
especialista em você, e sabe desses cenários qual é o que você prefere. Se você
juntar essas três pessoas e elas concluírem o que você vai fazer nessa circunstância,
isso não mudou a sua liberdade em nada. Agora, se essas três pessoas se juntassem,
antes de você fazer a escolha, e pudessem escolher: “Vamos dizer a ele o que vai
acontecer ou não”, aí elas estariam afetando a sua liberdade. Por quê? Simples:
porque elas poderiam lhe dar um conhecimento melhor da situação, do que o que
você tem sozinho. Você poderia pela sua opinião achar: “Parece que vai chover,
então há uma desvantagem em pegar o ônibus”, mas chega o sujeito da NASA e lhe
fala: “Não, não vai chover, filho, não tem como”. Opa, mudou a situação!

Liberdade é a capacidade de antecipar uma situação e agir de acordo com essa


antecipação. Livre-arbítrio é outra coisa: é a capacidade de antecipar abstratamente a
situação e a possibilidade de agir ou não. Livre-arbítrio é um negócio que não
exercemos em 90% do tempo. É assim, você concluiu: “Posso pegar o automóvel,
porque o engenheiro da Volkswagen me falou que ele não vai quebrar, e o outro me
falou que não vai chover; está tudo explicado”, mas depois você decide: “Mas eu
decidi que não quero ir trabalhar hoje”. Você sempre pode decidir que não quer ir
trabalhar hoje. Acontece que você não vai fazer isso; você pode fazer isso a qualquer
momento – observe-se –, mas você simplesmente não faz. Se você falar “Não vou
trabalhar hoje”, é porque apareceu uma outra circunstância, concebida por você, que
lhe afeta interiormente e lhe dá um motivo para não ir trabalhar. E essa outra
circunstância também pode ser analisada de fora por um outro.

Isso é só para dizer que livre-arbítrio é um negócio que geralmente não é


usado, na prática. Livre-arbítrio significa simplesmente isto: porque você concebeu
abstratamente a sua ação você pode realizá-la ou não. Livre-arbítrio não significa
que em cada vez que você vai realizar a sua ação, você joga uma “moeda interior”
que ninguém sabe onde vai cair – ou seja, você concebeu a situação e: “Então vou
trabalhar ou não?”, e a “moeda interior” cai em “vou” e você vai. Se fosse assim,
você iria trabalhar metade dos dias de sua vida e a outra metade não, e todos os
contratos de trabalho levariam em conta essa imprevisibilidade da natureza humana.
Livre-arbítrio quer dizer que isto é possível, que você pode fazer isto, e que não
existe na situação que você analisa nenhum fator que te impede de não agir de
acordo com o que você planejou. Livre-arbítrio não significa que não existe nenhum
fator interno que te move na direção de agir como você planejou, existem N fatores
internos que te induzem a agir exatamente como você calculou que deveria agir –
tanto que é o que geralmente você faz. Mas não existe na situação externa, tal como
ela é concebida por você (e veja bem, é a situação externa tal como é concebida que
te move a agir; tal como ela chega à sua mente, não como ela existe no mundo

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exterior), nada que chega até você que te tire a possibilidade de falar: “Não vou
fazer nada”. Mas se você agir como se as pessoas sempre fossem agir como elas
acharam que deviam agir, você vai acertar em 99,999% das vezes.

Então, o que essa possibilidade do livre-arbítrio oferece para você na prática?


Na prática, o livre-arbítrio oferece para o sujeito simplesmente a oportunidade de
[pensar]: “Ah, eu posso parar mais um pouco e imaginar ou conceber razões para
agir de outro modo”. O livre-arbítrio normalmente te compra um tempo quando
você precisa dele.

Por que isso é diferente do caso do leão? Lembram quando falamos do leão?
Está certo que o leão não tem que decidir entre o automóvel ou o ônibus para ir
trabalhar, mas ele tem que decidir entre ir nessa direção para caçar a gazela ou ir
naquela direção para caçar o gnu, ou ficar aqui, em paz, descansando. Acontece que
a situação de, por exemplo, ir naquela direção para caçar a gazela não aparece para o
leão como um conjunto de conceitos, mas como uma representação da imaginação
da mesma coisa; o leão, ao contrário de você, imagina “Há um cheiro de gazela ali”,
e começa a imaginar o gosto da gazela na boca dele, e aí ele imagina o trabalho que
deu para ir [caçar]. Seria a mesma coisa que você tomar a sua decisão com base no
seguinte: “Como é a sensação de abrir a porta do carro? E a de sentar? E a de ligar o
carro”, e assim por diante [ou seja, com base em sensações, e não em conceitos]. Às
vezes você faz isso: quando você está em um restaurante e pensa “O que eu vou
comer hoje?”, muitas vezes o seu critério é justamente esse. Mas [o critério] é
voluntariamente esse, isto é, você escolhe esse como o critério do que você vai
comer no restaurante [o critério poderia ter sido conceitual, nutricional, e não
sensível]. Pois você já tinha concluído, por algum motivo, que era vantajoso ir no
restaurante comer alguma coisa, senão você nem tinha ido lá. E uma vez que você já
está lá, você [pensa] “Qual a vantagem em comer isto ou aquilo? Nenhum oferece
qualquer vantagem. Eu não tenho nenhum motivo para fazer isto ou aquilo”, e aí
você usa o critério do leão. Você lê [o cardápio], começa a imaginar o gosto daquela
comida na sua boca, e decide: “Ah, é isso que eu quero”. Pois bem, o leão sempre
decide assim.

Quando você decide assim, é possível que cada um dos cenários imaginativos
te mova numa direção sensível real, na direção de um objeto concreto. O processo
da escolha humana não te move na direção de nenhum objeto concreto, mas na
direção de um esquema geral. Isso significa que para o leão, ou para você no
restaurante, caso o resto da sua humanidade esteja temporariamente desligado – o
que, veja bem, é perfeitamente normal nesse cenário, não tem nada de errado com
isso –, chega uma hora ali no restaurante em que você percebe que não tem escolha
senão comer aquilo. É claro que esse “não tem escolha”, é de “mentirinha” em você,
é um jogo que você está fazendo com você mesmo, porque você escolheu não pensar
na situação abstratamente, você escolheu que a imaginação era o melhor critério.
Mas quando ela é efetivamente o único critério, chega uma hora em que você não

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tem escolha nenhuma, em que o sujeito não pode falar “Não vou comer isto aqui”.
No leão, chega uma hora no seu processo de seleção das possibilidades (que são
representadas imaginativamente) em que ele não tem escolha do que fazer. Deu para
perceber o que significa exatamente o livre-arbítrio?

Aluno: Seria por isso que nós podemos dizer que as paixões escravizam?

Prof: Sim. Na medida mesma em que você tem para com certas paixões o
hábito de usá-las como critério de escolha, é a medida em que você está desligando a
capacidade que te dá liberdade. Cada vez que o sujeito fala “É que eu não
aguentei!”, cada vez que ele faz um negócio porque não aguentou, ele cria na sua
mente um esquema para, naquela situação, apenas imaginá-la.

O que dificulta um pouco para nós as coisas é que quando dizemos que você
“representa a situação para você conceitualmente”, isso não significa que você pensa
na situação. Isto é, esses conceitos não necessariamente estão representados
interiormente por nomes. Pense bem: se cada vez que você tivesse que fazer uma
escolha, você tivesse que produzir interiormente um discurso formal que descreve a
situação e as possibilidades de escolha, você poderia realizar talvez uma ou duas
escolhas por dia. Quer dizer, você teria que fazer uma redação interna explicando a
situação e por que você escolhe uma [opção] e não outra. Não, isso nunca acontece!
Então quando falamos que você representa conceitualmente, não quer dizer que você
pensa a situação dialeticamente; significa que você “pensa” no sentido mais original
da palavra – você pesa conceitos, sem representá-los com sinais verbais ou de
qualquer outro tipo. Isso acontece porque a sua inteligência é muito mais rápida do
que a sua capacidade de pensamento.

Aluno: São quase conceitos visuais, né? Você pesa os...

Prof: Há pessoas que tendem a representá-los com imagens ou visualmente. A


verdade é que normalmente a representação deles é tão sutil, é quase só corpórea. É
assim: ela olha uma coisa, concebe uma coisa – por exemplo, o carro quebrando – e
o seu corpo faz assim [prof. mexe ligeiramente o seu corpo, como que se afastando];
aí ela já concluiu o que ela sente em relação a essa possibilidade. Nem precisa
pensar, falar para si mesmo. Tanto que muitas vezes, se alguém lhe pergunta, logo
depois de você tomar a decisão, por que você fez aquilo, você fica assim: “Hmm...”
Muitas vezes você não tem o discurso. Nunca te pegaram nessa? Logo depois de
você tomar a decisão, fazer a coisa, perguntam: “Por que você fez?” – “Eu sei por
que eu fiz, mas não sei explicar ainda...”. Também é a coisa mais comum do mundo,
depois de ele fazer e alguém perguntar o porquê, o sujeito inventar um discurso que
não tem nada a ver com o real porquê.

Isso é bastante importante para indicar esta primeira coisa: uma arte preditiva
qualquer, ainda que antecipe para você o resultado qualitativo das ações dos outros,

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não diminui a sua liberdade, ela a aumenta. É evidente. A capacidade de antecipar


no que vai dar uma situação não diminui a sua liberdade em relação a situação, mas
aumenta a liberdade.

Deu para entender o que significa o livre-arbítrio? Livre-arbítrio consiste nisso:


se analisarmos o que é a alma humana, a mente humana, a inteligência humana, e
como você toma decisões, você percebe que toma decisões por meio de fórmulas
abstratas, pela representação abstrata das situações e de seus desenvolvimentos
futuros, e não por imaginar ou sentir as coisas. Na verdade, quando você toma uma
decisão sentindo algo, com base no sentimento e não numa representação abstrata,
você geralmente se arrepende. E não é se arrepender vinte anos depois: aquelas que
você pensou e representou, você se arrepende vinte anos depois, porque você então
vê as coisas muito melhor; mas aquelas que você só sentiu, no dia seguinte você se
arrepende.

Veja bem, o simples fato de você ser capaz de representar a situação


abstratamente permite que você faça ou não o que você pensou. Aí você tem que se
observar. Quando você tomou uma decisão, se você se observar naquele mesmo
instante em que tomou a decisão, você vai ver que você pode não fazer o que
decidiu. É claro que se você não fizer o que você decidiu, você é um idiota, é óbvio
– porque se você decidiu é porque você pensou no assunto –, mas você pode não
fazer. Mas isso é uma possibilidade abstrata; não é um esquema de como as coisas
funcionam, não é um esquema operacional da vontade humana, é o seu limite
abstrato.

Veja bem, pegue os tratados de confissão de todos os tempos para ver. O


sujeito nunca te culpava, nas confissões, de pecado mortal, por você não ter
realizado uma ação de virtude heróica – “Você não jejuou quarenta dias a pão e
água, você é um pecador!”. Não é assim. Mas se você dormiu com a vizinha, aí sim.
Não fazer uma coisa sempre é possível; fazer, nem sempre. O seu livre arbítrio não
está aí para funcionar assim: você fala para si mesmo “Jejue quarenta dias a pão e
água”, e o seu livre arbítrio vai lá, com seu poder infinito, e você jejua quarenta dias
a pão e água (experimente fazer isso com o seu livre arbítrio!). Você vai ver que só
há um jeito de você fazer: naqueles quarenta dias, cada vez que você tiver vontade
de comer, e chegar perto da decisão de comer, você vai ter que falar: “Não, eu não
vou comer!”; e você vai ter que fazer isso mais ou menos umas quatrocentas vezes
por dia durante quarenta dias. Ou seja, para você jejuar um dia, você tem que tomar
duzentas decisões, você tem que se valer do seu livre arbítrio duzentas vezes! Para
você não dormir com a vizinha, você tem que fazer a mesma coisa uma vez. Você
tem que admitir que isto é bem mais fácil.

Isso significa que o livre arbítrio é muito útil para te impedir de agir, mas ele
sozinho não te leva a agir. Por quê? Pense bem, você parou e pensou “Se eu jejuar
quarenta dias a pão e água, eu vou ficar doente, meu organismo vai sofrer etc.”, e

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você chegou à conclusão de que é ruim. "Ah, mas com o meu livre arbítrio, eu vou
lá e jejuo!”. Quando você decidiu que é ruim, você não quer – você decidiu não
jejuar. Você representou a situação para você como: “É negativo fazer isso, é
vantajoso comer”. Logo, para levar o plano à prática, você vai ter que contrariar a
sua análise da situação cada vez que você tiver com vontade de comer. É por isso
que mandamentos das religiões são assim: não faça A, B, C e D. E se você observar,
[elas dizem] “Você quer se livrar de A, B, C e D? Faça isso, isso e isso. Reze assim,
jejue assim, dê esmola assim”. Porque o sujeito que faz essas coisas exerce o livre
arbítrio dele tanto, com tão mais freqüência que quando é só a hora de falar “Não
faça isso”, ele tira de letra. Deu para entender como funciona o princípio do livre
arbítrio?

Aluno: É você se exercitar assim.

Prof: Exatamente. O sujeito que se dedica a exercícios positivos, em que ele


tem que fazer certas coisas, a cada vez que ele vai fazer, ele tem que decidir de
novo, e geralmente ele vai chegar à conclusão de que ele não tem que fazer aquilo; e
aí ele vai [falar] “Agora eu vou usar o meu poder de livre arbítrio. E embora a minha
análise seja ‘Eu não preciso rezar o terço todos os dias, eu vou fazê-lo. Por quê?
Porque eu mando aqui’”.

Note bem, essas coisas são ensinadas assim: “Não faça isso". Mas para você
realmente conseguir não fazer isso: "faça isso, isso e isso”. Porque as pessoas que
pensaram essas coisas sabiam como o ser humano funciona, como a vontade
humana opera. E eles sabiam que, em princípio, você pode analisar a situação de um
jeito, chegar a uma conclusão e fazer o contrário [o que te pareceu ruim], mas você
realmente não vai fazer assim; normalmente a pessoa não age assim.

Agora, quando você tem que representar para você conceitualmente uma
situação, para tomar uma decisão, qual o critério que você usa para escolher a lista
de conceitos necessários para representar a situação tal como ela é? Como você
decide quais são os fatores relevantes? Esse é o ponto mais importante desse
negócio de artes divinatórias. É simples: você não tem como decidir quais são os
fatores relevantes. Por quê? Porque normalmente você não é um especialista em
todas as situações possíveis. Se você tem que tomar um decisão acerca de algo que é
a sua especialidade, algo que você se habituou a representar na sua estrutura
permanente, nas suas variáveis, e a lidar com aquilo, então espontaneamente a sua
memória – a imagem de situações anteriores – traz para a sua mente os conceitos
relevantes. Por exemplo, você é um cirurgião e já fez duzentas cirurgias cardíacas, aí
acontece alguma coisa com este paciente e na hora a sua memória traz para você:
“Quando acontece isso, a melhor coisa a fazer é aquilo”. Como a sua vida é feita de
situações acerca das quais você não é especialista, e muitas vezes situações acerca
das quais não existe especialista, não tem como usar este critério, ou seja, não tem
como ter uma memória acostumada a trazer para a sua mente o que é relevante. Isso

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

significa que você vai ter que se basear em uma memória que não é significativa ou
representativa daquela situação. Vamos explicar o que é isso depois do intervalo (...)

[INTERVALO]

Como nós não somos especialistas na maior parte das situações que
enfrentamos, os conceitos com os quais analisamos aquela situação particular vêm
da nossa experiência geral da vida, vêm da memória de situações análogas, ainda
que completamente diferentes. Isso significa que os conceitos são escolhidos a partir
de memória e imaginações. Então quando então surgem os conceitos, você pode
estar sempre consciente de que esses conceitos podem não servir para explicar ou
representar essa situação, porque eu os tirei da minha imaginação e não de um
conhecimento deste tipo de situação, não de uma ciência, ou revelação, ou
iluminação acerca desse tipo de situação. Isso faz com que nesses casos a nossa
situação não seja muito diferente da do leão ou do cachorro. Ainda é diferente,
porque ainda são conceitos que você vai usar, e você pode estar o tempo todo
cônscio, ou medindo a sua avaliação da situação com a consciência de que esses
conceitos podem ser inadequados, podem não explicar a situação.

Veja bem, os conceitos são operações da inteligência, enquanto que a


imaginação, diferentemente da inteligência, tem uma base orgânica definida.
Imaginação é sentido estendido, imaginação é uma operação secundária do sentido.
[INTERRUPÇÃO] (...) Quer dizer, a imaginação é uma operação do sentido estendido.
Então, na maior parte das situações, especialmente nas situações para as quais nós
não estávamos intelectualmente preparados, isto é, situações que você não concebia,
ou não imaginava, você está na situação parecida com a do leão. Não é idêntica,
porque você pode ter a consciência de que não está analisando a situação direito, e o
simples fato de poder conceber a situação, isto é, representá-la conceitualmente, já
lhe dá essa liberdade. É uma vantagem em relação ao animal; pode não significar
uma vantagem prática na maior parte das circunstâncias, mas é uma vantagem
teórica.

Isso significa que o nosso livre arbítrio está nessa situação específica, que é a
da maior parte das suas decisões – por exemplo, nos relacionamentos humanos. A
maior parte das suas decisões no seu trabalho, se você é razoavelmente competente,
são baseadas na análise da inteligência, porque os conceitos são selecionados a partir
de uma experiência repetida e que já foi compreendida. Por exemplo, quando o
mecânico vai analisar o automóvel, a imaginação dele já opera segundo padrões
determinados pela inteligência. Agora, quando você vai decidir em quem confiar ou
não confiar, não é bem assim, porque você não tem o conhecimento dos
temperamentos humanos e dos indivíduos tão vasto e detalhado que lhe permite
fazer uma análise, digamos, garantida do comportamento futuro dos outros.

Reduzimos então o livre arbítrio às proporções humanas reais – “O livre

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

arbítrio existe nessas circunstâncias”. Já sabemos que ele não é a capacidade


ilimitada de fazer as coisas – seja o quê, como, e quando você quiser –, ele consiste
fundamentalmente na capacidade de adiar escolhas para fazer uma análise mais
adequada; ele implica na possibilidade de não fazer uma coisa definitivamente. Mas,
na prática, você não vai usá-lo em toda essa extensão, na prática você só vai usá-lo
muito de vez em quando. Este é um lado da comparação.

O outro lado são os próprios sistemas simbólicos das artes divinatórias. Vamos
pegar um cenário diferente: você não vai escolher se vai pegar o carro ou o ônibus,
em vez disso você está procurando emprego e vai fazer uma entrevista, e você não
sabe se vai conseguir o emprego ou não. Não é por nada, é porque o sujeito que te
avalia e avalia as outras pessoas não tem um critério matemático e exato para
escolher as pessoas, é evidente. Ele não pode [analisar]: “Vamos pegar o currículo,
ler linha por linha, e este aqui é positivo; é negativo; é positivo; é negativo, e pronto
– decidido!”, porque o currículo pode ser simplesmente falso, pode ser exagerado.
Então, a primeira coisa é que só pelo currículo você não sabe [como é a pessoa];
também você não sabe como você tem que se apresentar para esse sujeito: ele quer
uma pessoa mais informal, mais formal? Do que ele gosta, com o que ele simpatiza?
Você também não sabe isso. E você também não sabe quais são os outros
candidatos, ou seja, você não sabe com o que você está se comparando ou sendo
comparado.

Esta é uma situação em que o seu livre-arbítrio e o livre-arbítrio do


entrevistador contam muito pouco. Por quê? Porque o entrevistador não vai chegar à
conclusão de que a melhor pessoa a ser contratada é a pessoa A, e então, só porque
ele pode, escolher a pessoa B; ele vai tentar chegar a uma situação em que ele
praticamente não tem escolha. Ele vai tentar representar a situação de maneira a
antecipar os resultados.

Alguém então pode pensar: “Ah, o que decide esse negócio não é nem o meu
livre-arbítrio, nem o dele, nem o dos anjos; são os astros. Essas pedras gigantescas
flutuando no céu, dependendo da posição em que elas atiram nas nossas cabeças, vai
sair o resultado da entrevista: se eu vou conseguir o emprego ou não”. Normalmente
é assim que as pessoas pensam a astrologia. Há de um lado o livre-arbítrio e do
outro, os astros – “pedras gigantes que estão girando em torno da sua cabeça”. O
problema é que do mesmo jeito que o lado "livre-arbítrio" é mal representado na
imaginação do sujeito que via um conflito entre essas duas coisas, o outro lado, o
fenômeno astrológico, também é mal representado na imaginação do sujeito.

O ponto é que astrologicamente, ou como o astrólogo concebe o astro, o astro


não é uma pedra flutuando no ar. A astrologia é um algo que foi concebido,
inventado, desenvolvido antes de enviarmos naves para fotografar os planetas e
descobrir do que eram feitos. A astrologia foi desenvolvida num tempo em que
provavelmente não ocorria a ninguém a possibilidade de aqueles pontos luminosos

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

serem pedras, astros como a Terra. A verdade é que ela foi desenvolvida num tempo
em que as pessoas em geral, e até os astrólogos, não tinham a menor idéia do que
esses objetos eram fisicamente.

É claro que podemos imaginar: “É simplesmente porque eles ignoravam, mas


hoje nós sabemos que são pedras gigantescas. E se você acredita em astrologia, é
porque você imagina que essas pedras gigantescas soltam algum tipo de raio que
afeta o cérebro do entrevistado e do entrevistador, e é assim, evidentemente, que
aqueles raios afetam a decisão de todo mundo”, ou seja, a astrologia foi concebida
de maneira independente da conceituação dessas pedras e raios, mas ela coincide
com essa explicação; hoje nós sabemos o lado verdadeiro, o lado oculto da
astrologia, que os caras que a inventaram não sabiam. E isso significa que eles
tiveram que pensar em “efeitos” dos planetas, dos signos e das casas, sem saber o
que esses objetos eram. No entanto as coisas não funcionam assim. Quando não
você sabe o que uma coisa é – você não tem a menor idéia, a única coisa que você
viu foi ela de longe –, você não tem a menor idéia do que ela pode causar. Fora o
fato de que alguns objetos astrológicos são realmente insubstanciais do ponto de
vista corpóreo.

Por exemplo, o mapa é assim: [Prof. desenha no quadro] o céu é um círculo –


tem 360º –, e há sete planetas, e o círculo do zodíaco, com os [doze] signos, e a linha
do horizonte [horizontal] e a linha do meridiano [vertical] (...). Mas há um ponto do
zodíaco aqui [Prof. aponta no desenho], em que não há nenhum planeta; o que há é
um ponto do zodíaco e uma direção do espaço em relação ao seu horizonte. Porém,
um ponto do zodíaco não é uma “coisa”, ele é uma determinação geométrica, uma
abstração geométrica a partir do movimento aparente do Sol durante o ano. Quando
Sol não está lá, aquele ponto do zodíaco não existe.

O zodíaco é simplesmente isso: durante o ano, o Sol percorre um caminho


aparente no céu, e se você marcar os pontinhos dia a dia, você vai ver: “Olha o
zodíaco aqui”. Mas a cada momento, o Sol, que traça essa linha imaginária, só está
num ponto do zodíaco, e o resto do zodíaco naquele momento é completamente
insubstancial. E essa direção [no desenho] do espaço em relação ao seu horizonte (e
este não é só uma abstração, de fato existe a linha do horizonte, debaixo da qual está
a Terra e em cima, o céu) é a cúspide da casa VIII [no desenho], que é uma direção
subindo do horizonte oeste a alguns graus. Ela é também só uma direção imaginária,
não há nada ali. Não há um planeta ali soltando raio, nenhum! Nada! É
insubstancial. Aí o astrólogo vai falar “Veja bem, porque a cúspide da sua casa VIII
está aqui no signo tal, que significa isso, vai acontecer isso, isso, e isso com você”.

Deu para perceber que o objeto astrológico não é exatamente um conjunto de


corpos influenciando a sua decisão? Ele é na verdade um esquema de conceitos que
representa o céu. Pegue um astrólogo e pergunta a ele: “A pessoa nasceu em tal dia,
em tantas horas e na cidade tal. Como é o mapa dela?”; aí se faz o mapa dela. Agora

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

peça para ele fazer o mapa de dois minutos depois. Esse é o mapa do quê? Esse é o
mapa de nada. É o mapa do céu. Peça para o astrólogo: “Faça um mapa de um
momento e me diga se nasceu alguém nesse momento e lugar”. Ele vai falar “Como?
Como é que eu farei isso?”. Isto é porque astrologicamente – pelo menos é assim
que você tem que entender esse negócio de astrologia –, os objetos da astrologia, os
elementos do mapa astrológico não são seres substanciais. Não são coisas, não são
entes que causam efeitos. Se eles fossem entes que causam efeitos, dado um mapa,
um astrólogo lhe diria o que objetivamente acontece naquela circunstância; mas
nunca é assim. Dado um mapa, ele vai lhe perguntar “Isso é mapa do quê? O que
aconteceu nesse momento, nessa hora?”. Isso é só um jeito de localizar um momento
no tempo.

Se o mapa é constituído de objetos insubstanciais, como ele funciona? Como


ele tem alguma correspondência com algum fenômeno qualquer? Se ele fosse um
conjunto de agentes substanciais, de seres naturais, eles teriam efeitos de acordo
com a sua natureza. Mas eles não são, eles são só abstrações. Tanto é assim, que
uma das principais escolas de astrologia na Índia não usa os planetas, porque,
segundo eles, os planetas são apenas símbolos das divindades, e as divindades
percorrem o céu em ciclos diferentes dos planetas, embora semelhantes. O sujeito
dessa escola então faz o seu mapa astrológico, e se você olhar o céu naquele
momento não há nenhum planeta naquela direção – ele marca Júpiter num ponto em
que Júpiter não está –, e ele faz todas as previsões de sua vida em relação a esse
mapa. Nesse caso o negócio é totalmente insubstancial! Na astrologia ocidental pelo
menos você pode dizer que os planetas são corpos que estão em alguma direção.

Acontece que as pessoas que conceberam a astrologia e que a usaram durante


milhares de anos tinham algumas concepções sobre a realidade diferentes das
nossas. Nós pensamos: “A vida surgiu na Terra ao longo de milhões de anos, dada
uma seqüência de fatores mais ou menos aleatórios e arbitrários; do mesmo jeito que
ela surgiu na Terra, ela poderia ter surgido, por exemplo, em Vênus ou em Marte. E
os fatores que causaram a existência do sistema solar também são análogos a esses,
um conjunto, a uma série de fatores aleatórios”. Por que dizer que são aleatórios?
Porque as forças naturais que nós concebemos que entraram em ação para constituir
o sistema solar ou para constituir a vida na Terra, essas mesmas forças naturais
poderiam ter constituído um negócio completamente diferente – um sistema solar
com vinte e sete planetas e não sete, ou cinco, e assim por diante, e os seres
humanos poderiam ter quatro pernas e não duas. Este tipo de estudo da realidade nos
permite entender alguma coisa sobre o que está acontecendo, entender algo do
funcionamento do sistema solar e do funcionamento dos seres vivos. No entanto, ele
não nos permite conhecer tudo. Porque ele não nos permite conhecer o seguinte: por
que essa seqüência de fatores aleatórios formou-se e resultou no sistema solar ou nos
seres vivos? Quer dizer, por que o sistema solar é como ele é e os seres vivos são
como eles são? Um cientista vai dizer: “Isso é uma possibilidade entre outras,
aconteceu assim porque existem inúmeros sistemas solares e algum aconteceu de ser

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

parecido com o nosso”.

Um astrólogo medieval ou da antigüidade não pensaria assim. Primeiro, ele


não tinha condições de levantar a hipótese da existência de inúmeros sistemas
solares, ele não tinha nenhuma razão para isso. Só o que ele tinha era [a ideia]:
“Temos esse sistema solar aqui e ele é deste jeito. Por que ele é deste jeito e não de
outro?”. Isso é muito diferente de se perguntar: “Como ele veio a ser deste jeito?”. É
outra pergunta. “Por que há um Sol que tem um ciclo de 365 dias e uma Lua que
tem um ciclo de 30 dias? Por que há 12 meses num ano? Por quê? Poderia ser um
ciclo totalmente diferente?”. Tudo bem, poderia ser um ciclo muito diferente, mas
não é, é este aqui.

A diferença está no seguinte: suponha que você mora numa tribo na África, e
você sai da sua aldeia e aparece um leão na sua frente. Você pode se perguntar:
“Como este leão veio a aparecer aqui na minha frente?”; outra pergunta que você
pode fazer é: “O que esse leão quer comigo? O que eu faço agora?”. Quanto à
pergunta de como ele veio, você verá que há inúmeras causas aleatórias – ou, pelo
menos do seu ponto de vista, uma seqüência de causas aleatórias que não têm como
você esgotar ou como conhecer. E, ao invés do leão, poderia ter aparecido um
coelho, não poderia? Acontece que saber isso, que ao invés de aparecer um leão
poderia aparecer um coelho, é irrelevante para o sujeito que está diante do leão; uma
vez que aparece um leão, os leões quando estão diante de pessoas fazem A, B, C e
D, e as pessoas têm as saídas aqui X, Y e Z.

Isso significa que [no que se refere aos] astrólogos tradicionais quando
olhavam o céu, quando olhavam Júpiter ou Saturno, por incrível que pareça, a
atribuição de poderes aos planetas – a esses “pontos luminosos no céu” – é muito
tardia na história da astrologia. A astrologia mais antiga é assim: os planetas, esses
pontos luminosos, significam divindades. Por que eles pensavam assim? Porque eles
pensavam que, em geral, todas as coisas significavam divindades. Porque para
explicar por que uma coisa é, você acaba tendo que recorrer a uma divindade. É
claro que estamos usando o conceito de divindade num sentido muito amplo: um
princípio universal qualquer é considerado aqui como divindade.

Agora, se você considerar que tudo significa divindades, você começa então a
listar para si mesmo que divindade cada coisa significa. Por exemplo, o Sol significa
o quê? Pense assim: você acredita que só há um Deus, não é? Então, se Deus fosse o
Sol, quais seriam as suas características? Como você analisa isso? Do mesmo jeito
que você analisa a expressão de uma pessoa quando você conversa com ela. “O
sujeito está concordando comigo? Está entendendo? Ele não está entendendo? Ele
gosta? Ele não gosta? Como você analisa isso?”. É simples: uma pessoa que está
entendendo tem uma expressão assim; uma pessoa que está concordando tem uma
expressão assado; uma pessoa que está gostando tem uma expressão assado. De uma
aparência você infere um estado interior. Assim, se você pensar nas coisas naturais

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

como sinais de divindades, a primeira coisa a fazer é isso: [perguntar-se] “O Sol é


que tipo de sinal? O que ele indica sobre a divindade? A Lua, o que indica? A
direção ‘para cima’, e a direção ‘para baixo’, o que significam?”, e assim por diante.
Isso é importante, porque para os antigos, para as pessoas que inventaram a
astrologia, o fundamento da astrologia era o fato de que os objetos da astrologia
falavam de Deus – “Esse negócio funciona porque existem divindades que mandam
em tudo”.

Veja bem, o conflito entre “destino astrológico” e “livre arbítrio” só surge no


contexto entre os gregos e os romanos, no período até um pouco antes do início do
Cristianismo, e depois do surgimento do Cristianismo. Porque as pessoas pensavam
nos astros como objetos físicos (não como pedras, realmente) e pensavam no livre
arbítrio como esse poder mágico. Assim, ou é esse poder mágico para você fazer o
que você quiser, ou é esses astros aqui decidindo o que você quer. Diante dessas
alternativas que não colocavam Deus na jogada, não levavam em conta a existência
de uma divindade, é evidente que as primeiras autoridades cristãs falaram: “Esqueça
esse negócio, que isso é tudo loucura”.

Aluno: Nesses termos?

Prof: Nesses termos. Está certo que mais tarde, depois de banir a Astrologia,
quando se recoloca a Astrologia em termos cristãos, onde os céus representam as
esferas angélicas, e os planetas representam os anjos, que são os agentes de Deus no
mundo natural e determinam coisas, aí ela começou a parecer muito mais razoável.

Isso é importante por causa do seguinte: não são os planetas ou os signos ou as


casas que influenciam alguma coisa, são os seus significados. Assim como quando
você está falando, tentando convencer uma pessoa de algo e ela faz uma careta, não
são os músculos dela que modulam a sua reação; é a interpretação que você faz do
que aquilo significa: “Ih, ela não está gostando”. Não há uma relação causal
mecânica – não é que o movimento muscular do outro causa um efeito em você, e
agora você tem que mudar o seu discurso. Isso nunca acontece. Mas porque você
espontaneamente entende aquilo com um sinal natural de um estado interior, esse
estado interior modifica a sua ação. Então, se você entende os elementos da
Astrologia, da Quiromancia, ou do I Ching, como sinais dos princípios universais
que regem todas as coisas naturais, todas as coisas compostas de forma e matéria,
fica mais razoável entender esse negócio de Astrologia.

É simples: duas coisas não podem existir se a existência de uma contradiz a da


outra – digamos, dois estados contrários na mesma coisa ao mesmo tempo –, é o
princípio de não-contradição. E se é assim, se o princípio de não-contradição é
válido, isso significa que tudo o que existe tem alguma analogia com qualquer outra
coisa que existe. Mesmo que sejam dois fenômenos causados por linhas de
causalidade completamente independentes, essas linhas de causalidade não podem

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

ser completamente incompatíveis. Então, ainda que o sistema solar tenha sido
produzido por uma conjunção de causas aleatórias, uma sequência de eventos
meramente possível, ou seja, em que não existe um agente dirigindo etapa por etapa
do processo – e assim simplesmente as forças naturais cegas formaram o sistema
solar e outras forças naturais cegas formaram você nesse sistema solar –, ainda que
essas duas linhas de causa e efeito sejam completamente independentes eles não
podem ser incompatíveis. A linha causal que produziu você como um ser vivo não
como poderia produzir você tão grande que fosse maior do que a Terra, por
exemplo, ela tem que fazer você compatível com o sistema solar no qual você vive.
Você só pode surgir e existir aqui de modo compatível com o mundo no qual você
existe.

Só que o princípio de não-contradição não é o único princípio universalmente


válido para os seres naturais. Está certo que o princípio da não-contradição é
universalmente válido não somente para os seres naturais, como para o ser em geral,
mas existem inúmeros princípios universais que são válidos sobre todos os entes
naturais. Isso significa que ainda que as causas que determinaram a existência do
sistema solar sejam independentes das causas que causaram a sua existência como
animal na Terra, e essas causas sejam aleatórias, todas elas têm que operar de acordo
com determinados princípios universais que são válidos para todos os seres naturais,
para tudo o que é composto de forma e matéria. Todos esses seres (o sistema solar, o
Sol, você, as plantas, o que você faz, pensa, sente, quer), tudo isso tem que se
conformar a esses princípios, existe em conformação com esses princípios.

Acontece que, nos seres naturais, esses princípios não são conceitos abstratos
ou proposições ou axiomas, eles são o tecido da existência das coisas. Por exemplo,
vamos estudar a teoria da gravidade, aí há um monte de equações, demonstrações,
teoremas etc.; mas na Terra a gravidade não é um conjunto de equações e conceitos,
ela é um aspecto da sua existência, é um modo do seu ser. E o mesmo vale para
esses princípios universais de que estamos falando.

Isso significa que os signos do zodíaco não significam direções do espaço, mas
as direções do espaço percorridas pelo Sol existenciam certos princípios, que você
também existência – elas existenciam como órbita do Sol e você existencia como ser
humano. Do mesmo modo temos aqui a teoria da gravidade, com axiomas e tal, mas
em você gravidade é isto que você está sentindo quando você tenta levantar da
cadeira; isto que você está sentindo é um modo da sua existência, é um modo de
efetivação dessa teoria, desses axiomas e teoremas. O que existe na sua mente como
hipótese científica, existe no seu corpo como uma resistência à ascensão; não há
nada de estranho nisso. E no Sol, não existe como uma resistência à ascensão, mas
como uma força pela qual ele prende os planetas em torno dele. São três entes
diferentes.

A diferença é que essa resistência ao movimento vertical não parece a força

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

pela qual os planetas giram em torno do Sol e não parece essa equação [da
gravidade]. Embora sejam análogos, eles não são análogos do ponto de vista
sensível, quer dizer, você olha a fórmula da gravidade e não tem a sensação de algo
pesado, porque a teoria da gravitação não foi concebida para parecer, para gerar em
você a sensação do que o Sol está fazendo com os planetas e a Terra está fazendo
com o seu organismo. Mas que esses fenômenos são análogos, são.

Já os símbolos da Astrologia ou do I Ching foram selecionados por parecer


com certos princípios universais. Há muitas coisas no céu, muitas direções no céu, e
você escolheu algumas, porque estas são as que parecem com isto aqui, porque são
as que dão alguma indicação de certos princípios que você conhece. É por isso que
os astrólogos antigos falavam, por exemplo, que o Sol significa o coração, e eles não
sabiam que o Sol estava no centro do sistema solar, como sabiam que o coração
estava no centro do corpo. O que eles sabiam é: destes princípios universais que
regem todas as coisas naturais, pois são modos do ser se apresentar, modos das
coisas serem, ora, algo é o “centro” – tudo o que existe tem centro. Quando eles
olharam o céu e se perguntaram: “Quem é o chefe aqui?”, eles olharam aqueles
inúmeros pontos pequeninos, aí viram o Sol e [pensaram]: “Não pode ser aqueles
pontinhos, tem que ser este aqui”. Em nenhum momento eles pensaram que o Sol
causava o seu batimento cardíaco, isto é, que o Sol solta um raio no coração dos
animais, pelo qual o coração funciona, pois isso seria insensato. Mas é a coisa mais
fácil do mundo conceber o Sol como o coração do mundo, porque uma coisa parece
a outra.

Mais ainda: estas duas se parecem com uma terceira, que não é bem uma coisa,
é um princípio das coisas. O que é esse terceira coisa? Veja, tudo o que é composto
de forma e matéria, como você, a mesa, o Sol etc., é algo contingente. Nenhuma
coisa composta de duas outras vem a ser composta de duas outras por si mesma,
tudo o que é feito de duas peças teve que ter essas duas peças juntadas, unidas (é
evidente!), seja por uma força cega aleatória, seja por uma força inteligente, seja
qual for, teve que existir um agente que é distinto das duas peças. Mais ainda: esse
agente teve que realizar algo para juntar essas duas peças – houve alguma operação
pela qual essas duas peças se tornaram uma só. Ele teve que ser de algum modo
eficiente. Para você unir duas peças você tem que fazer alguma força: uma está aqui,
outra está lá, você tem que colocá-las juntas. Enquanto elas permanecerem unidas,
há nesta coisa composta de duas peças ainda um efeito na sua ação de unir, e estas
duas peças se mantêm unidas enquanto esse efeito subsistir. Pois bem, este efeito é o
coração da coisa, é o sinal do produtor no produzido. Que este efeito tem que existir
em qualquer coisa composta de forma e matéria é um fato. É este efeito que é
simbolizado pelo Sol na astrologia. O Sol astrológico é inúmeros efeitos que existem
nos inúmeros seres que são compostos de forma e matéria.

O que queremos dizer em última análise é o seguinte: Gêmeos não existe, Áries
não existe, o que existe são coisas que podem ser adequadamente descritas de

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

maneira geminiana ou ariana. Porque Gêmeos e Áries representam modos da


composição de forma e matéria, são os modos possíveis. Veja bem, como tudo o que
é natural é alguma composição de forma e matéria, é possível esses modos se
realizarem em cada um deles. Isso significa que o Sol não é a causa da existência ou
do funcionamento do seu coração; o seu coração existe porque uma coisa composta
de forma e matéria tem que ter um centro, que é o próprio ato da união da forma e
matéria. É justamente isso, é o vestígio efetivo do agente que uniu as peças da coisa.
Como um efeito também é sempre em algo análogo à causa, o Sol pode significar
não somente este efeito “central” na coisa causada, como também o seu princípio
eficiente anterior a ela.

Dá para ir um pouco além ainda: o efeito da ação do produtor durante um certo


estágio da produção mantém ainda as características do produtor. Por exemplo, você
está fazendo uma mesa: há uma tábua cerrada assim, e o acabamento, e os parafusos,
e enquanto está fazendo a mesa, se você olhar você vê que aquilo se parece mais
com as suas ações, indica as suas ações, cada uma das operações que você está
realizando para fazer a mesa (cerrando, furando, etc.), e menos a natureza de mesa.
Mas a partir de um certo estágio da produção o efeito da sua ação parece mais com a
função essencial de mesa do que com as suas operações. Outro exemplo: quando
você foi concebido no ventre da sua mãe, você começou a crescer, e por um tempo
aquele processo de crescimento se parecia [mais] com o processo pelo qual o óvulo
e o espermatozoide foram gerados; mas a partir de um determinado estágio o seu
crescimento ali começou a parecer como a operação de um outro animal. Quando
esse movimento começou a aparecer como o movimento de outro animal, este
primeiro movimento de outro animal é o Sol da coisa: é a eficiência dos produtores
na forma da coisa produzida.

Existe um estágio a partir do qual é evidente que isto é outra coisa. Em algum
estágio da produção da mesa você percebe que aquilo é uma mesa, e não
simplesmente a ação do marceneiro. Existe um momento em que se torna evidente.
É o primeiro momento em que o movimento (ou o efeito) se torna o efeito dos
produtores na coisa. Isso significa que o efeito foi assimilado pela coisa e ela passou
a ser evidentemente o que ela é. É esta evidência, que define a coisa, que é análoga
ao Sol.

Quando o conjunto de fatores eficientes que produz a coisa toma uma forma na
coisa, e então você sabe: “Isto é outra coisa”. Não é mais uma célula do meu corpo,
ou uma célula do corpo dos pais, agora é evidente que é outra coisa. Ou: “Isto não é
só madeira cerrada, furada, etc.; isto aqui é uma mesa”. Quando olhamos o céu à
noite ele vai para fora, ele se expande indefinidamente, e quando o Sol nasce ele se
vira para você, evidentemente. O Sol é o único astro que você tem certeza de que
nasceu ou não. Do mesmo jeito, um sistema solar é um sistema solar quando um
astro passou a ter este papel central. Deu para perceber como todos esses processos
são análogos?

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

Em qualquer coisa que é produzida – seja produzida intencionalmente, por um


só agente causal inteligente, ou seja produzida por inúmeras causas aleatórias –, se é
produzida, chega uma hora em que percebe-se: “Isto aqui é outra coisa”, e é evidente
que isto se move segundo os seus próprios caminhos, é evidente que isto agora é
capaz de algo que não se reduz à operação dos produtores. Se não fosse assim,
nenhuma produção teria sentido. Você faz um pão porque o pão apresenta certas
capacidades que você, como produtor e a matéria do pão, não apresentam. Esta
característica fundamental da coisa é o Sol dela. Isto significa que o Sol visível, o
Sol físico, é tomado como símbolo deste elemento central que define qualquer coisa
que venha a existir. Não é preciso que o Sol físico cause nada no Sol biológico que é
o seu coração, por exemplo, não precisa ter relação causal nenhuma; o seu coração,
no seu organismo, vai funcionar como o Sol funciona no céu, e acabou. Assim como
a característica que o pão tem e a farinha e o padeiro não têm, é o Sol do pão, é
aquilo que, quando você identifica, você sabe que pão é pão e não é farinha, nem
padeiro, nem uma soma de farinha e padeiro (que seria um negócio bizarro...)

Veja bem, é certo que organicamente ou biologicamente isso acontece em


algum momento – aconteceu com você, por exemplo, no útero da sua mãe. Mas
quando você nasceu, era evidente que você não era um pedaço dela. Enquanto o
sujeito estava lá dentro, é assim [que as pessoas pensam]: “Por todos os sintomas,
parece que a senhora está grávida”; mas quando nasceu, bom, isto não é você [mãe],
é outra coisa. Portanto, esse momento é central ou solar na existência do sujeito.
Porque é o momento em que, para todos, é evidente que ele é um sujeito, que agora
temos que reconhecê-lo como humano. Isso significa que o momento do nascimento
é, para um ser vivo diante dos seus semelhantes, análogo a esta característica, que é
a função essencial de qualquer coisa a partir do momento que ela existe; é análogo à
característica do pão pela qual o pão se distingue das suas causas, é análogo à
característica da mesa pela qual a mesa se distingue das suas causas, e é análogo
àquilo que lhe constitui no Ser, àquilo que faz com que você seja este e não aquele.
É por isso este momento é astrologicamente relevante. Não é que naquele momento
caiu um raio ou aconteceu alguma coisa (pode até ter acontecido, mas isto é, de fato,
irrelevante), não é que agora que você nasceu os astros vão agir sobre você (porque
este é o seu mapa natal), e até então a sua mãe era um escudo impenetrável contra as
energias dos planetas. É o seguinte: quando você nasceu, você tem um estágio de
existência diferente em relação aos outros seres humanos. Até você nascer alguém
poderia falar: “Não, a senhora está engordando...”, isto é, você poderia ser
confundido com gordura corporal; agora que nasceu, não dá mais para confundir. A
diferença entre o não nascido e o nascido é tão grande quanto a diferença entre o Sol
e o resto que está no céu.

Deu para entender como funciona esse negócio de astrologia? Se nasce um


sujeito com Sol em Gêmeos, e aí ele age de maneira geminiana, não é que Gêmeos e
o Sol causaram alguma coisa nele; é que agora existe “Sol em Gêmeos” humano. É
ele quem deu origem a um novo fenômeno, que entra em determinada categoria, um

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

fenômeno que é análogo ao momento do nascimento dele, já que as características


que o diferenciam são análogas a esse momento.

[INTERVALO]

Isso quer dizer que as causas fundamentais em jogo na Astrologia, no I Ching,


tecnicamente não existem; as coisas é que existem, e, ao existir, elas têm que existir
de determinados modos, modos que são comparáveis uns com os outros. É assim: há
o Sol; o momento do seu nascimento; a característica que distingue uma coisa, pela
qual você identifica que ela não é apenas um efeito de outras causas, mas uma coisa;
todas essas coisas são comparáveis. Essas coisas existem: o Sol físico, a diferença
característica de cada coisa, e o momento do seu nascimento – essas coisas existem e
são semelhantes. Por que são semelhantes? É simples: porque tudo o que é composto
de matéria e forma, tem que ter como característica um momento em que o efeito
dos seus produtores é assimilado pela forma da coisa pela coisa. Senão ela não foi
produzida, senão ela não se distingue dos seus produtores.

Aluno: [inaudível]

Prof: Sim. Quer dizer: “O Sol, tudo bem, mas e essas direções do espaço?
[signos e casas] Por que diabos elas significam alguma coisa?”. Vamos chegar lá,
mas isso vai ficar para a próxima aula. O que eu queria hoje era falar não do
simbolismo astrológico especificamente, mas desses princípios em jogo.

O seu livre arbítrio existe assim também. Considerado abstratamente, o livre


arbítrio é um efeito da sua inteligência, que não é algo composto de matéria e forma
– mas você é. Isso significa que o limite teorético do livre arbítrio é realmente o
limite do que é possível para a ação humana; mas você não é “o ser humano”
genérico, você é o Fulano de Tal, que tem um organismo – este organismo –, e cada
operação do livre arbítrio em você não é a operação do livre arbítrio teorético, é o
livre arbítrio do Fulano; e nesta ação existe um elemento material e um elemento
formal. Em cada escolha sua existe um elemento do seu organismo e um elemento
da sua inteligência, e é a combinação destes dois elementos que fará com que esta
escolha seja caracteristicamente sua, e não uma escolha possível do “ser humano em
geral” ou simplesmente uma operação do seu organismo (como a digestão ou a
produção de células). Portanto, cada escolha sua também é análoga ao Sol.

Se, além do Sol ter um significado, a direção do espaço em que ele está
também tiver um significado, basta você juntar todas essas analogias e ver o
seguinte: de certo modo a posição astrológica do Sol indica o tipo das suas escolhas
fundamentais. O tipo aqui quer dizer: do que eu lanço mão interiormente para fazer
uma escolha?Basta você pensar assim, como já falamos: se nós vamos fazer uma
cirurgia e somos especialistas nessa cirurgia, as nossas conclusões podem ser muito
semelhantes – a não ser que o caso não seja abarcado pela nossa ciência, que seja um
caso duvidoso. Mas suponha que não seja um caso duvidoso, é um caso que já foi

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

estudado e está mais que sabido; todos nós então vamos concordar no que teremos
que fazer com esse paciente. Porque, como nós falamos, se o conjunto de conceitos
para analisar a situação pode ser inferido intelectualmente, é fácil chegar a uma
conclusão. Mas numa situação que não conhecemos, em que temos que tomar uma
decisão e ninguém sabe como pensar essa situação, cada um de nós vai pensá-la de
um jeito. E, veja bem, vamos pensá-la de um determinado jeito, a partir daquilo que,
sem ter que pensar, cada um sabe que pode fazer [ou seja: pensaremos a situação a
partir das nossas possibilidades de ação, sem necessidade de parar para refletir
nestas últimas].

As suas escolhas são sempre baseadas na sua própria capacidade e na avaliação


que você faz dessa capacidade. Se a sua capacidade de ação numa determinada
circunstância não pode ser avaliada objetivamente, ela tem que ser avaliada
subjetivamente. É assim: nós temos um problema aqui; se você não explicar o
problema, qual será a solução proposta pelo Mike Tyson? “Vamos dar porrada em
todo mundo!”; qual será a solução proposta pelo São Francisco? “Vamos rezar,
porque só Deus pode resolver isso”. Porque é o seguinte: “Eu não sei se isso pode
resolver a situação, mas eu sei que eu tenho isto para oferecer”.

Ora, isso é evidentemente algo que depende do seu organismo e da sua


inteligência, não só da sua inteligência ou só do seu organismo. Então, se você pegar
dois sujeitos com dois meses [de nascimento] diferentes – por exemplo, um tem Sol
em touro na casa VII e outro tem Sol em escorpião na casa IV –, e os dois ignorarem
como resolver uma situação, você sabe exatamente o que eles vão tentar fazer.
Porque desde a infância eles experimentam diretamente certas capacidades de
operação, mesmo quando eles ignoram a situação; são coisas nas quais você nem
precisou pensar, mas que você sabe que pode fazer.

Quando dizemos que você sabe, significa que isso está lá no fundo – é o
recurso do qual você lança mão quando ignora a situação. É evidente que esse
recurso não funciona para todas as situações. Não há nenhum recurso humano que é
válido para todos os problemas humanos. Enquanto você foi aprendendo que tinha
aquele recurso e que aquele recurso não servia para muitas situações, você também
foi aprendendo a preferir certas situações em relação a outras. Por quê? Porque você
não é idiota. Tanto que se você sentar em casa para fazer uma lista de 50 problemas
humanos diferentes, todos horríveis e graves, e dizer: “eu vou ter que escolher 5”,
você vai notar que há situações que você prefere enfrentar – estas mais do que
aquelas. Às vezes é porque você estudou aquela situação e sabe resolver; às vezes é
só porque você acha: “Eu acho que vou conseguir me dar bem nessa e não naquela”.
Pense assim: você vai ter uma doença que, ou causa muita dor, ou que não causa
muita dor, mas causa imobilidade, e assim por diante. Este é um segundo grau de
efeito astrológico.

Veja bem, este primeiro grau (as capacidades de que você dispõe

20
Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

independentemente do seu conhecimento da situação) é uma coisa; a sua experiência


de quais são as situações em que essas capacidades são aplicáveis é outro grau.
Porque você pode, por exemplo, nunca ter tido que enfrentar situações em que
aquela qualidade é maximamente necessária, e só situações em que outras
qualidades são necessárias. Isso significa que da primeira coisa, isto é, das suas
capacidades operacionais, você tem alguma experiência direta, mas, das situações
em que elas são úteis, você já tem uma experiência relativa. Então, se no primeiro
caso, no primeiro grau, essas capacidades são significadas astrologicamente pelo
Sol, é evidente que o tipo de capacidades que o sujeito oferece na situação é
modulado pelas características do Sol no mapa dele. E as situações que ele prefere?
Não necessariamente: porque o Sol astrológico não determina quais são as situações
que você vai enfrentar e em que você vai descobrir que as suas capacidades são
eficazes. Este é outro problema.

Isso é só para mostrar como é difícil chegar a uma interpretação astrológica.


Para um traço interno do sujeito você tem até um guia relativamente adequado.
Relativamente adequado porque pode haver outros símbolos astrológicos que no seu
mapa correspondem também a um Sol. Por exemplo, um planeta domiciliado, que é
um planeta no seu domínio: uma coisa no seu domínio evidentemente tem mais
controle da sua situação do que outra [coisa não domiciliada]. Isso significa que se
os planetas, signos e casas – todos os elementos do sistema astrológico –, cada um
deles significa de fato um traço característico, na interação entre eles, na sua
combinação eles passam a significar “N” outros traços. Portanto, quando você olha
um mapa, você não tem um mapa, você tem um mapa refletindo inúmeros outros
mapas. Porque [cada coisa] tem um significado direto: Sol em Áries significa isso,
Lua na IV significa aquilo; agora, Sol em Áries na VII em trígono com não sei o
quê: “Caramba! Já começou a complicar!”. Não é que não tenha um significado;
tem, mas achá-lo combinando todos aqueles símbolos dá um trabalho desgraçado!
Daí o tremendo salto entre o conhecimento do simbolismo astrológico e o
aprendizado de uma técnica de interpretação. Os tratados de interpretação
astrológica são coleções de coisas que os astrólogos descobriram que funcionam. É
assim: “Quando o Sol está na casa tal, no signo tal, em trígono com não sei o quê,
acontece isso, se não houver nenhuma indicação em contrário”. Quando você vai
achar um mapa assim? Nunca...

Aluno: Ou já passou.

Prof: Ou já passou, já é passado! Nunca mais aconteceu!

Isso é só para indicar que as possiblidades de interpretação e de, digamos,


“previsão do futuro”, são muito mais limitadas do que pode parecer pelo que
falamos anteriormente. Quer dizer, quanto menos elementos do mapa você pega,
mais genérica é a sua previsão, e quanto mais genérica é uma previsão, menos útil
ela é. Menos previsão ela é. (...)

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Introdução ao Simbolismo Astrológico – Aula 04

Transcrição: Renata Lins, Lucas Oliveira, Caio Marcos, Tamyrys Fernandes, Michael Santos

Revisão: André Rios

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