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O preço deste Iivro só se tornou

possível devido à participação do


INL/MEC que, em regime de co­
edição permitiu o aumento da ti­
OdeANDRAD
ensaio sôbre
ragem e consequente redução do
custo industrial. • .

PREÇO: Cr$ 8,00

a música brasi eira

"Mário de Andrade já se foi. Grande alma e grande escri­


tor, ( ... ) ninguém com mais preocupação de construir algo
de novo e de sólido que Mário de Andrade. Lançou-se em
especial à elaboração e ao emprêgo de uma li11guagem
exclusivamente brasileira que deu aos seus poemas e aos
seus romances um tom nativista muito original, sem nenhu­
ma preocupação nacionalista no sentido clássico do têrmo
(...) a sua morte consagrou-o como a figura mais represen­
tativa do modernismo na sua mais pura essência revolucio­
nária, e uma das maiores figuras das nossas letras de todos
os tempos."

Alceu Amoroso Lima.


DADOS BIOGRÁFICOS DE
MÁRIO DE ANDRADE

Mário Raul de Morais Andrade, pai ígrafo e musicólogo


brasileiro, nasceu em São Paulo em 9 de outubro de 1893.
Fêz seus estudos secundários com os Irmãos Maristas. Diplo­
mou-se em piano no Conservatório ·oramático e Musical da
capital paulist_a e .. ali foi professor de Estética e História da
Música. Estreou em livro, em 1917, com Há uma gôta de
sangue em cada poema, pequena obra enexpressiva, inspirada
na Primeira Guerra Mundial, válida contudo pela intenção
pacifista de que estava imbuída. Em 1922 Mário de Andrade
participou ativamente da Semana de Arte Moderna, realizada
em São Paulo e que teria influência decisiva na renovação da
Literatura e das Artes no Brasil. A partir dêsse momento,
Mário de Andrade se tornou a principal figura do Movimento
Modernista.
Seu primeiro livro de feição moderna, Paulicéia Desvaira•
da, surgiu naquele ano, provocando vívidas polêmicas. A Es·
crava que não é Isaura, ensaio em que o autor defende a nova
estética, veio à luz em 1925. Seguiram-se-lhe Losango Cáqui
poesia, e·Primeiro Andar, contos. em 1926; Clã do Jabuti,
poesia, e Amar, Verbo Intransitivo, romance, em 1927. e
Macunalma, em 1928.
Por essa altura, Mário de Andrade, a par de sua intensa
atividade literária, exerceu com grande autoridade a crítica de
música e artes plásticas na imprensa. Em 1930, ao publicar
Remate de Males, como que inaugurou nova fase em sua
poesia, que ganha em profundidade o que perde em pitoresco
e gratuidade. Nome dos mais respeitados entre os intelEfctuais
da época, dotado de extraordinária capacidade de trabalho,
aceitou sucessiva e, por vêzes, simultâneamente cargos de
grande responsabilidade ligados a problemas culturais. Foi
membro da Comissão incumbida da reforma da'Escola Nacio­
nal de Música e diretor do recém-criado Departamento de
Cultura da Prefeitua Municipal de São Paulo, onde criou os
parques infantis (1935). Deve-se-lhe a .lei que organizou o
Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, ao ser­
viço do qual efetuou, em 1936, o tombamento dos monu­
mentos históricos paulistas. Fundou, em 1937, a Sociedade
de Etnografia e Folclore de São Paulo e foi um dos organiza•
dores do Primeiro Congresso da Língua Nacional Cantada.

'1
Lecionou Estética na Universidade do Distrito Federal (1938)
e trabalhou no projeto da Enciclopédia Brasileira, na qualida•
de de alto funcionário do Instituto Nacional do Livro. Espíri­
to fecundo e infatigável, escreveu ainda Belazarte, contos,
publicado em 1934; O Aleijadinho e Álvares de Azevedo,
ensaio, 1935; Poesias, 1941; O Baile das Quatro Artes e As­
pectos da Literatura Brasileira, ensaios, 1943; O Empalhador
de Passarinho, ensaio; e Contos Novos, no qual firmou prest í­
glo como mestre no gênero. Com Lira Paulis'tana e O Carro da
Miséria, vindos à luz postumamente, e num só volume em
1947, a poesia de Mário de Andrade impregnou-se de preocu•
pação social, enriquecendo-se de uma nova dimensão.
Mário de Andrade faleceu em São Paulo em 25 de feverei­
ro de 1945.

l
-�- .. -- --- ·
EDICÃO COMEMORATIVA
DO 50º ANIVERSÁRIO DA
SEMANA DE ARTE MODERNA

1922 -1972

,,

1972

l...:

ano internacional do livro


l'K]_; OBRAS DE MÁRIO DE ANDRADE
OBRA IMATURA contendo:
1 - Há uma Gôta de Sangue em cada Poema {poesia).
2 - Contos. selecionados do Primeiro Andar.
3 - A Escrava que não é Isaura (poética).
POESIAS COMPLETAS.
1 - Paulicéia Desvairada.
2 - Losango Cáqui.
3 - Oã do Jabuti.
4 - Remate de ·Males.
5 - O Carro da Miséria.
6 - A Costela do Gtã Cão.
7 - Livro Azul.

ensaio sôbre
8 - Lira Paulistana.
9 - O Café.
AMAR, VERBO INTRANSITIVO (Romance).

a música brasileira
MACUNAíMA {rapsódia).
OS CONTOS DE BELAZARTE.
ENSAIO SOBRE A MÚSICA BRASILEIRA.
1 - Ensaio sobre a Música Brasileira.
2 - A Música e a Canção Populares no Brasil.
MÚSICA, DOCE MÚSICA.
1 - Música, doce Música (crítica).
2 - A Expressão Musical nos Estados Unidos.
PEQUENA HISTÓRIA DA MÚSICA.
NAMOROS COM A MEDICINA.
1 - Terapêutica musical.
2 - A Mediei.na dos E'scretos.
ASPECTOS DA LITERATURA BRASILEIRA (ensaios literários).
1 - Aspectos da Literatura Brasileira.
2 - Amor e Medo.
3 - O Movimento Modernista.
4 - Segundo Momento Pernambucano.
ASPECTOS DA MÚSICA BRASILEIRA (ensaios Musicais).
1 - Evolução Social da Música no Brasil.
2 - Os compositores e a Língua Nacional.
3 - A pronuncia cantada e o Problema do Nasal, pelos Discos.
4 - O Samba Rural Paulista.
5 - Cultura Musical.
ASPECTOS DAS ARTES PLÁSTICAS NO BRASIL.
1 - O Aleijaclinho.
2 - Lasar Segall.
3 - Do Desenho.
4 - A Capela de Santo Antônio.
MÚSICA DE FEITIÇARIA NO BRASIL.
O BAILE DAS QUATRO ARTES (ensaios).
1 - O Baile das Quatro Artes.
2 - Arte lnglêsa.
OS FILHOS DA CANDINHA (crônica).
&
PADRE JESUfNO DO MONTE CARMELO.
CONTOS NOVOS. (
. DANÇAS DRAMÁTICAS DO BRASIL (folclore).
MODINHAS IMPERIAIS.
EMPALHADOR DE PASSARINHO (crítica literária) .
ensaio sôbre
a música brasi eira
3.ª edição

Andrade, Mário de, 1893-1945


A568e Ensaio sobre a mú:Sica brasileira. 3.ed.
São Paulo, Martins; Brasília, INL, 1972.
IV, 192 p. ilust.
Bibliografia.
1. MUsica brasileira 2. Música folcló-
rica brasiJ.eira 3. Música popular - Brasil
I. Brasil. Instituto Nacional do Livro, co-ed.
II. Título.

CCF/CBL/SP-72-0034 CDD: 780. 981


781. 781
18. 780.420981
CDU: 78(81) LIVRARIA MARTINS EDITORAS.A.
1ndices para catálogo. sistemático ( CDD): em convênio com o
1. Brasil Música 780. 981 (;'i INSTITUTO NACIONAL DO LIVRO/MEC
2. Brasil Música folclórica 781. 781
1972
i
3. Brasil· Música popular 780 .420981

i
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA

SUMARIO

l<�xpli<'.:ição 7

1 -·- ENSAJO �ôTIRE A M(•SICA BRASILEIRA


Capa Primeira Parte - Ensaio sôbre a Música Brasileiro 11
LUISDíAZ :\1:úsica Brasileira .......................... 13
Músi C'.U popular e Música artística ......... . 20
l?itmo .................................. . 29
Supervisão Gráfica
Melodia · · · · · · · · · · · • " ' ' ' º " ' ' ' " ' ' º ' ' '" " ' ' 39
RODOLPHÓ CERASO
Polifonia ......... ., ....... ·····...... .. . 49
Instrumentação .. . ... . . .... . .............. 54
Forma .. . . ... . .. . . ... . . ... . . . . ... . .... .. 61
Segunda Parte - Exposição de Melodias Populares 75
Notas esclarecedoras da grafia musical . . . . . .. ... 77
Música socializada ... ........... ... ........ . . . . 79
Canto Infantil ..... . . ..................... 81
Cantos de trabnlho .. . . ...... .. .. . . . ... . .... 85
Danças ...... . ..... ..... . . .. . .... ........ 90
Danças Dramí1tic:c1.s ........................ 100
Canto Religioso .......................... . 10:1
Cantigas Militares ......................... 105
Cantigas de Bebida ......... : ............ . 106
C-lieos ..................................... JOB
Direitos para esta edição adquiridos pela LIVRARIA MARTINS
Músi<'a Individual ............................. 121
EDITORA S�A., São Paulo, que se reserva a propriedade artística ·Estribilhos (solistas ou cora.is) ............. . 123
e literária desta obra. 127
'l'oadas ......................... • ... , . • • •
Martelos, Desafios, Chulas ..... ; . . ...... . . 138
Lundús e Modinhas .. . .. . . . . .. . . .. . . . . ........ 112
Pregões .. .. . . . . . . .. . . . .. . .. . .......... .. . Í 4:1
Nota final . .... .... ... . .. .. . . . . . ......... . 151
11 - A MúSJCA E A CANÇÃO POPULARES NO BRASIL 153
J<::xplieação ........... • • • • • • • • • • · · · · · · · · · · · · · · 155
A M úsiea e a Canção Populares no Brasil ...... 163

NKL,�tn; ooitoa
I - Instituições Públicas ................ 167
II - Discografia ....................... 169
III - Bibliografia sôbre a Música dos ame
SEDE - EDIFÍCIO MÁRIO DE ANDRADE ríndios do Brasil ................... 171
RUA ROCHA, 274 - SÃO PAULO
FILIAIS - RIO DE JANEIRO, SALVADOR J V - Bibliografia sôhre a Música Popular
BELO HORIZONTE, LONDRINA Brasileirn
EXPLICAÇÃO

O "Ensaio sôb1·e a Música Brasileira/' aparece


neste vol. VI das Obras Completas de Mario de
A�dra�e, tal co�á na edição de I. ChiC1;ra�o �&
Cia., Sao Paulo,�8.. Um exemplar desta ediçno,
guardado por Mario de Andrade em pasta destina­
da .a.os trabalhos que comporwm o presente volume,
traz na· fôlha-de-rosto a seguinte nota, escrita a tin­
ta vermelha: "Deve haver por a/4 um outro exern­
plar de trabalho., muito wnotado, encadernado em
couro vermelho e com páginas em branco no fim,
para notas. Foi roub(l;{lo da minha biblioteca, em
1941, naturalmente por um =igo. M. A. VII-42".
Essa homenagem, que tem tanto de apaixonada
quanto de desastrosa, impediu pois que Mario de
Andrade reajustasse o "Ensaio" pará inclusão nas
suas Obras Completas e que o editor pudesse agora
tentar atualizar de alguma, forma esta nova edição
do livro. Sabemos apenas que o "Ensaio" contém.
um êrro, várias vêzes mencionado por Mario de
Andrade: ,está complet=ente deturpado o ritmo da
melodia "Prenda Minha", recolhida por Germana.
Bittencourt. Embora sem denunciar a fonte do
êrro, Mario de Andrade deixou escrita uma infor­
mação sôbre o caso, nesta ficha bibliográfica. sôbre
o "Ensaio", encontrada num exemplar de "A
Música e a Canção Populares no Bra..�il", onde a
incluímos em nota: "Estuda algumas das constân­
cias e tendências rítmicas, tonais, harmônicas, me-
MÁRIO DE ANDRADE

lódicas e formais da música popular cantada do


Brasil. Tem um repositório de 122 melodias po­
pulares, de que um numeroso grupo foi o.olhido
diretamente da bôca do.� cantadores. As outras fo-
1·am colhidas de pessoas cultas, mas de garantida
autenticidade e bom conhecimento do canto popu­
lar. Só o documento "Prenda Minhar" é ritmica­
mente falso, e está ritmicaniente certo na harmo­ A DO"N"A ÜLIVfA GUEDES PEN'l'RADO
nização que dessa toada .fêz Ernani Braga (Pren­
da Minha, ed. Ricordi)." HomE>uagem <lo A11tor

Oneyda Alvarenga
L A PARTE

Ensaio sôbre a
Música Brasileira
MÚSICA BRASILEIRA

Até ha pouco a música artistica brasileira


viveu divorciada da nossa entidade racial. Isso
tinha mesmo que suceder. A n _iJ&ão brasileira é
anterior _ á nossa r:i.ç�. A propria--1'.!).ús1ca popülar
eia-Monarquia não apresenta um!i f�satisfato­
ria. Os elementos que a vinham fórmando se lem­
bravam das bandas de alem, muito puros ainda.
Eram portugueses e africanos. Inda não eram
brasileiros não. Si numa ou noutra peça folclo­
rica dos meados do seculo pass(tdo já se delineiam
os caracteres da música brasileira, é mesmo só com
os derradeiros tempos do Imperio que êles princi­
piam abundando. Era fatal: Os artistas duma
raça illdecisa se tornaram indecisos que nem ela.
O que importa é saber si a obra dêsses artistas
deve de ser contada como valor nacional. Acho
incontestavel que sim. Esta verificação até pa­
rece ociosa mas pro me�o moderno brasileiro sei
que não é.
Nós, modernos, manifestamos dois defeitos
grandes : bastante ignorancia e leviandade sistema- -
tisada. Ê comum entre nós a rasteira derrubando
da jangada nacional não só as obras e autores pas­
sados como até os que atualmente empregam a te­
matica brasileira numa - orquestra europeà ou no
quarteto de cordas. Não é brasileiro se fala.
, Ê _ que os modernos, ciosos da curiosidade ex-
-1 · terior de muitos dos documentos populares nossos,
confundem o destino dessa coisa séria que é a
Musica Brasileira com o prazer deles, coisa dile­
tante, individualista e sem importancia nacional
14 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIBA 15

nenhuma. O que deveras êles gostam no brasilei­ Europa completada e organisada num estadio de
rismo que exigem a golpes duma crítica aparente­ civilisação, . campeia el�mentqs._e!lt1.'.1l:!1!t_Qê_P_!:_a S!3_},i­
mente defensora do patrimônio nacional, não é a bertar d�__ §ll._:tgElSi:!1ª· Uomo a gente não tem gran­
expressão natural e necessaria duma nacionalidade deza social nenhuma que nos imponha ao Velho
não, em vez é o exotismo, o jamais escutado em Mundo,
_ nem filosofica que nem a Asia, nem eco­
música artistica, sensações fortes,_ya.tapá,-.;j_a_ciaré, nonuca que nem a America do Norte, o que a Eu­
vitoria-regia. ropa tira da gente são elementos de exposição uni­
Mas uni elemento importante coincide com es­ versal: exotismo divertido. Na música, mesmo o�
sa falsificação da entidade brasileira: opinião de europeus ql!_e__..Yisi:fãm_a_gent_e_J;>erseveram nessa
europeu. ó diletantismo que pede música só nos­ procura do exquisito apimentado. Si escutam um
sa está fortificado. pelo que é bem nosso e consegue õatuque brabo mmto que bem, estão gosando po­
o aplauso estrangeiro. Ora por mais respeitoso rêm si é modinha sem síncopa ou certas ef�sões
que a gente seja da crítica europeia carece verifi­ liricas dos tanguinhos de Marcelo Tupinambá Isso
car duma vez por todas que o sucesso na Europa é musica ·italiana! falam de cara enjoada. 'E os
não tem importancia nenhuma prá Musica Brasi­ que são, sabidos. se metem criticando e aconselhando'
leira. Aliás . a expansão do internaciorialisado o que e pengo vasto. Numa toada num acalanto
Carlos Gomes e a permanencia alem-mar dele pro­ num abôio desentocam a cada passo frases fran­
va que a Europa obedece á genialidade e a cultua. cesas russas escandinavas. Às vêzes especificam
Mas no caso de Vila-Lobos por exemplo é fácil que é R?ssini, que é Boris. UJ Ora o quê que tem
enxergar o coeficiente guassú com que o e�otism.9 a �usica Brasileira com isso ! Si :AIIilk parece com
concorreu pro sucesso atual do_ artista. H. Pru­ Milch, as palavras deixam de ser uma inglesa outra
nieres confessou isso francamente. Ninguem não alemã� . O que a gente pode mas é contastar que
ambas vieram dum tronco só. Ninguem não lem­
imagine que estou diminuindo o valor de Vila-Lo­
bos não. Pelo contrário: quero aumenta-lo. .ª
t,ra de atacar i�alianidade de Rossini porquê tal
Mesmo antes da JJSeudo-música indigena de agora frase dele conrnide com outra da opera-comica
Vila-Lobos era um grande compositor. A gran­ francesa.
deza dele, a não ser pra uns poucos sobretudo Artur Um dos conselhos europeus que tenho escuta-
Rubinstein e Vera Janacopulos, passava desper­ do bem é que a gente si quiser fazer música nacio- p '"' \.-. c1,..._
. cebida. Mas bastou que fizesse uma obra extrava­ nal tem que campear elementos entre os aboríge-
gando bem do continuado pra conseguir o aplauso. nes pois que só mesmo êstes é que são legitimàmente v,' \.,,, e,;­
Ora por causa do sucesso dos Qito Batutas ou �- Isso é uma puerilidade que inclui ''rv-- 1 ;,»,... ..._
do chôro de Romeu Silva, por causa do sucesso ar­ ignor:incia dos p7oblemas sociologicos, etnicos psi- o , "'--1---,";1,-.,
tistico mais individual que nacional de Vila-Lobos, cologicos e esteticos. Uma arte nacional não se h., M, X' )(_
só é brasileira a obra que seguir o passo deles� O (1) Tôdas estas afirmativas já foram escutadas por mim' de estranhos "'-
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fazeudo inventário do que é nosso.
valor normativo de sucessos assim é quasi nulo. A
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16 MÁRIO DE ANDRADE 1-:NRAIO RÔBRE A MÚSIC!A BRASILEIRA lí

faz com escôlha discricionaria e diletante dé ele­ J i::Jalduui, Sclrnmnnnfona são músicas brasileiras.
mentos: uma arte nacional já está feita na incons-J
. . . . pr9s.
4 Toda opinüio em contrário é perfeitamente covar­
ciencia do povo. O artista tem só q1!�_1a:r de, antinacional, anticrítica.
-- elementos já existentes uma fraiisposição . erudita E afirmando _assim não faço mais que seguir
que_façada música popular;músicl! !t"rffstfoa,-isto um criterio universal. As escolas etnicas em mú­
é: imedifameiite-desinteressada. O homem . da na- sica são relativamente recentes. Ninguem não lem­
1-çaoBra�il lioJe, está-mais âfàstado do ameríndio bra de tirar do patrimonio italico Gregorio Magno,
que do japonês e do hungaro. O elemento amerín­ Marchetto, João Gabrieli ou Palestrina. São ale­
dio no populario brasileiro está psicologicamenté mães J. S. Bach, Haendel e Mozart, tres csniritos
assimilado e praticamente já é quasi nulo. Brasil perfeitamente universais corno formação e �té co­
é uma nação com normas sociais, elementos raciais mo caracter de obra os dois ultimos. A França então
e limites geograficos. O ameríndio não participa se apropria de Lulli, Gretry, Meyerbeer, Cesar
dessas coisas e mesmo parando em nossa terra con­ Franck, Honnegger e até Gluck que nem fran­
tinua ameríndio e não brasileiro. O que eviden­ ceses são. �a obra de José Maurício e mais for­
temente não destroi nenhum dos nossos deveres temente na de Carlos Gomes, Levy, Glauco Velas­
pra com êle. Só mesmo depois de termos praticado (1uez, Miguez, a gente percebe um não-sei-quê in­
os deveres globais que temos pra com êle ê que definível, um rúim que não é rúim propriamente,
podemos -exigir dele a prática do dever brasileiro. ? um riíim exrzuisito pra me utilisar duma frase
Si fosse nacional só o que é ameríndio, tam­ ,1e �fanuel Bandeira. Êsse não-sei-quê vago mas
bem os ítalianos não podiam empregar o orgão que geral é uma__J_2rimeira fatalidade de_raça badalan�­
é egípcio, o violino que é arabe, o cantochão que é âo longe. Então na lírica ele Nepomuceno, Fran­
grecoebraico, a polifonia que é nordica, anglosaxo­ éisco Braga, Henrique Osvaldo, Bárroso Neto e
nia flamenga e o diabo. Os franceses não podiam outros, se percebe nm parentesco psicologico bem
usar a ópera que é italiana e muito menos a forma­ forte já. Que isso baste prá gente adquirir agora
-de-sonata que é alemã. E como todos os povos da já o criterio legítimo de música nacional que deve·
Europa são produto de migrações preistoricas se ter uma nacionalidade evolutiva e livre.
conclui que não existe arte europea ... Mas nesse caso um artista brasileiro .escreven­
Com aplausos inventarios e conselhos dêsses do agora em texto alemão sobre assunto chinês, mú­
a gente não tem que se amolar. São fruto de igno­ sica da tal chamada de universal faz música brasi­
racia ou de �- Nem aquela nem leira e é músico brasileiro. Não é não. Por mais
êste não podem servir pra criterio dum julgamen­ sublime que seja, não só a obra não é brasileira
to normativo. como é antinacional. E socialmente o autor dela
Por isso tudo, Musica Brasileira d_exe--de-signi­ deixa de nos interessar. Digo mais: por valiosa
J-.t,,•t?
0f..h 1,
....., \-,,-!h-.
ficar toda música nacional o cria ão uer tenha
quer não tenha caracter triico. O padre Maurício,
que a obra seja, devemos repudia-la que nem faz a
Russia com Strawinsky e Kandi�sky.
VO\, Lrv C·�-, h' h
�) C.-1 �,\�� � e.,.� o ve, !_ ,--\ te ( i' ( ,{ l -\..,

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ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA


MÁRIO DE ANDRADE

Q criterio a&Y-ª.l de Musica Brasileira deve ser


O periodo atual do Brasil, especialmente nas
�ª.<?_!il()sgficº_ . mas social. . DeTe�ser Íun criterio
artes, é o de nacionalisação. Estamos procurando
qe combate. A fôrça nova que voluntariamente
conformar a produção humada do país com a rea­
Cuvc'lvi, se disperdiça por Ulll motivo que só pode ser indeco-
i , �� lidade nacional. E é nessa ordem de ideas que 1;oso (co�odidad_e p�opria, covardia ou pretensão)
justifica-se o conceito de Primitivismo aplicado
J......,.__, �p.,�c\_,- ás orientações de agora. É um engano imaginar e Ullla força antmac10nal e falsificadora.
1
e.'., que o primitivismo brasileiro de hoje é estetico. E arara. Porquê, imaginemos com senso-co­
Ele é social. Um poeminho humoristico do Pau mUlll: Si um artista brasileiro sente em si a fôr­
1\,.' _•.\ r-· ·•_t.J
1\(V'"'.,�! Brasil de Osvaldo de Andrade até é muito menos ça do genio, que nem Beethoven e Dante sentiram
primitivista que um capítulo da Estetica da Vida está claro que deve fazer música nacional. Por�
de Graça Aranha. Porquê êste capítulo está cheio quê como genio saberá fatalmente encotrar os ele­
de pregação interessada, cheio de idealismo ritual mentos essenciais da nacionalidade (Rameau
e deformatorio, cheio de magia e de medo. O li­ We _ber Wagner Mussorgskir Terá pois Ulll valor
rismo de Osvaldo de Andrade é uma brincadeira �omal enorme. Sem perder em nada o valor artís­
desabusada. A deformação empregada pelo pau­ tico porquê não tem genio por mai�-naêlonâ1
lista não ritualisa nada, só destroi pelo ridículo. (Rabel�is G?Yª :V11itman Ocussai) que não seja
Nas ideias que expõe não tem idealismo nenhum. do patrrmomo universal. E si o artista faz parte
Não tem· magia. Não se confunde com a prática. dos 99 por cento dos artistas e reconhece que não
É arte desinteressada; é genio, então é que deve mesmo de fazer arte
Pois toda arte socialmente primitiva que nem nacional. Porquê incorporando-se á escola italia­
a nossa, é arte social, tribal, religiosa, comemora­ na ou francesa será apenas mais Ulll na fornada
tiva. É arte de circunstancia. É interessada. ao passo que na escola iniciante será benemerito
Toda arte exclusivamen�C.ª-il_ 9:esintere,ssa­ e necessario. Cesar Cui seria ignorado si não fos­
da não tem cabimenwnuma :!'@_e_primitiva, fase s� o papel dele na formação da escola russa. Tu­
_
ã e_constr.ução. É intrinsecamente individualistã. rma e de importancia universal mirim. Na es­
É os efeito;-do individualismo artistieo no geral cola espanhola o nome dele é imprescindivel. Todo
são destrutivos. Ora numa fase primitivistie;a, artista brasileiro que. no momento atual fizer arte
o indl.viduo que não siga o ritmo dela é pedregulho brasil�ira é = ser eficiente com valor h=ano. O
.
na botina. Si a gente principia matutando so­ que flze:r ai:te mt�rn�cional ou estrangeira, si não
bre o valor intriseco do pedregulho e o conceito for gemo, e Ulll mutil, Ulll nulo. E é Ullla reve­
filosofico de justiça, a pedr!I fica no sapato e a rendissima bêsta.
gente manqueja. "A pedra tem de ser ;i.Q_gada fora". 1 Assim: estabelecido o criterio transcendente de
É uma injustiça feliz, uma inJustiça justa, fruta Mus!ca Brasileira que faz a gente com a coragem
' \ dos mtegros adotar como nacionais a Missa em Si
de epoca. .._
20 MÁRIO DE ANDRADE E�SAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 21

JJeuwl e Salvador Ilosli, temos que reconhecer que e Paraná sii.o documentos conhecidos pelo menos
êsse criterio é pelo menos ineficaz pra julgar as em todo o centro litoraneo do país. E 1un ou outro
obras dos atuais menores de quarenta anos. Isso documento esparso da zona gaúcha, matogrossense,
é lógico. Porquê se tratava de estabelecer um cri­ goiana, caipira, mostra belezas porêm não basta
tério geral e transcendente si referindo à entidade pra dar conhecimento dessas zonas. Luciano Gal­
envolutiva brasileira. Mas um critério assim é ine­ let está dcmostrando já uma orientação menos re­
ficaz pra julgar qualquer momento historico. Por­ gionalista e bem mais 1nteligente com os cadernos
quê transcende dele. E porquê as tendencias his­ de Melodias Populares Brasileiras ( ed Wehrs e
toricas é que dão a forma que as ideas normativas
Cia. Rio) porêm os trabalhos dele são de ordem
revestem.
positivamente artistica, requerendo do cantor e do
O criterio de música brasileira prá atualidade acompanhador cultura que ultrapassa a meia-fôrça.
deve de -existir em relação á atualidade. A atua­ E requer o mesmo dos ouvintes. Si muitos dêsses
lidade brasileira se aplica aferradamente a nacio­
trabalhos são magníficos e si a obra folclorica de
nalisar a nossa manifestação. 0oisa que pode ser
feita e está sendo sem nenhuma xenofobia nem _im- L. Gallet enriquece a produção artística nacional,
r, , ,c perialismo. O critério histori,·o atual ela J\.lúsic:a é incontestavel que não apresenta possibilidade ck
J 1 p
Brasileira é o da manifgatação-musicaLq.uc____s�:i expansão e suficiencia de documentos pra se tor­
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1
- V "- feita por brasileiro o'u ind.ivid.uo-na<:;ionalisado,re­
_ - ::t'·"""i- flef_f�as_caractg_ristic11s_.mnsicais_claJaça.
nar crítica e prática. Do que estamos carecendo
imediatamente é dum harmonisado!'...5imples_mas

-ti, -�. · :) -- Onde que estas estão� :N"a música popular. crítico também, capaz de se cingir á manifestação
1,;1l�-' popular e representa-la com integridade e efieien­
MüSICA POPULAR E MúSICA ARTISTICA cia. Cãrecemos dum '1'1ersot, dum Franz Korbay,
dum Moller, dum Coleridge Taylor, dum Stan­
Pode-se dizer que o populario musical brasi­
ford, duma Ester Singleton. Harmonisações du­
leiro é desconhecido atcS de nós mesmo,. \'ivemos
ma apresentação crítica e refinada mas facil e
afirmando que é riquissinio e .bonito. Estú certo.
absolutamente adstrita á manifestaçii.o popular.
Só que me parece mais rico e bonito do que a gente
imagina. E sobretudo mais complexo. Um dos pontos que provam a riqueza do nosso
Nós conhecemos algumas zonas. Sobretudo populario Sl'l' maior do que a gente imagina é o
a carioca por causa elo ._maxixe impresso e por cau­ ritmo. · Seja porquê os - compositores de maxixes
sa da predominancia expansiva da Cõrte sobre os e cantigas impressas não sabem grafar o que
Estados. Da Baía tambem e do nordeste inda a executam, sc;ja porquê dão só a síntese essencial dei­
gente conhece alguma roisa. E no geral por in­ xando as subtilezas prá invençii.o do cantador, o
termedio da Côrte. Do resto: praticamente nada. c•.erto é qne uma obra executada difere ás vezes
O que Friedenthal r<'gistrou como de Sta. Catarina '--- totalmente do que está escrito. Do famanado
22 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 23
Pinião pude verificar pelo menos 4 versões rítmi­ PINIÂO (analise prosodrca da versão popular).
cas diferentes, alem de variantes melodicas no J:se. .,

geral leves: 1.ª a embolada nord(lStina q:u.e..._sm::yiu .#ÊiJ�ffiJ h; l"J JA 'W


......-T- �-- __,... �
d�_�pro maxixe vulg11:risado-no--carnay1J,l .fa­ Pi.til . i.o,p1.111.i.o.p1.111. i.o. 01._ pl.atour.reueom medodoga..1'1. io Porino

tjQç-ª_; 2.ª a versão impressa dêste (ed Wehrs e


'Cia.) que é quasi uma chatice; 3.ª a maneira com
que os Turunas de Mauricea o cantam; 4.ª e a niesm0u.b1.&- eui.td_ Ba. tn o..so. �oõ_ Foi cu . mi 1;1eli,0? - _ f'01 cu.m� m�!io!_
variante, próxima dessa última, com que o es­
cutei. muito cantado por pessoas do povo. Se Aliás a terceira grafia que indiquei como
compare estas três grafias, das quais só as duas prosodica pode ser atacada por isso. De fato.
últimas são legítimas porquê ninguem não canta qualquer cantiga está sugeita a um tal ou qual ad
a rµúsica talequal anda impressa. A terceira gra­ libitum rítmico devido ás proprias condiçõeg da
fia é a mais rigorosamente exata. Inda assim si dicção. Porém essas fatalidades da dicção rela­
a gente indicar um senza rigore pro provimento ... tivamente á música europea são de deveras .fatali­
dades, não têm valor especifico prá invenção ucm

Ih ;J Iww1w I n Jj13 íU J Ij I Ll u W7
PINIÃO (verslo impressa ed. C. Wehrs e Cia, Rio).
efeito da peça. Tambem muito documento brn­
j sileiro é assim, principalmente os do cent.ro
P!Jll. io, plnl.lo,pllll .io,01, plntocor.re11 commedodoga.Tti,o· Parlno =•mo nbl. í: e1,11\GJ1
mineiro-paulista e os da zona tapuia. Não falo
l'E
�,,�fl trtttr1t r zr �=Jf1
11 dos sulriograndenses porquê inda não cseutei n<:'­
_ BbLte11aa& e To. ou I foi C10.111ermelõ.o! nhum cantador gaúcho, não sei. JUas o mesmo
Piniüo: pinião, ·phüü.o, não se dá com as danças cariocas e grande número
Oi pinto correu com medo rlo gavião de peças nordestinas. Porq11i'• nc�tns zmia6 os
Por isso mesmo sabiá cantou
:m bateu asa r '\'oou cantadores se aproveitando dos ,·,dores prosodieos
E foi eomer melão! da fala brasileira tiram dela elf'HH•ntos específicos
essenciais e imprescindíveis de 1·i tmo mnsical. E
PINIÂO (slnteae poastveJ da verslo pepular).
de melodia t ambem. Q§_J11a:::iig_�_i111pressns ,Jt,
f�1 1 iil iwu.riJl r IP) .JJJíJ,ru ice r·ru7
1

Plat.&11, p!Jll.io, plnl. io, Oi, pinto correu Mm medodop.,.llo Porh•o •umo ■-..bl .á eut111
Sinhô são no geral banalidades rne!ÕcTicas. ExP­
rjitados, são peças soberbas, �l _1_11�l_f!.<!i_a __�e__tnms­
figurando ao ritmo-novo. E quanto ú peça nor­
;,,�
I'!'' !t.il trd4U
2 �
W1r
lla.1t11 t..u. noa Foi eo,. mhl1111e.lio!
•!I destina ela se ap-;_�ema nrniias feitas com uma
· Pinião, pinião, pi.nião: rítmica tão subtil que se torna q11asi irnpossivel
Oi, pinto eorre11 1•nm uiedri {lo gavião grafar toda a realidade dela. J:>rilwipalmente
Por isso meamo s:ihift c.rmt,111
Bateu aea voou porquê não é apenas proso,li,·a. Os nordestino�
Foi comê ( r) mcJão ! se utilisam uo cauto dum lnisser 11llrr contín110,
24 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 25
de fetitos surpreendentes e muitissimas vezes de um preconceito. Tudo depende da eficaeia do
natureza exclusivamente musical. Nada tem de : ,reconceito.
prosodico. É pura fantasia duma largueza ás ve­ Cabe lembrar mais uma vez aqui do quê é feita
zes malinconica, ás vezes cornica, ás vezes ardente, a música brasileira. Embora chegada no povo a
sem aquela tristurinha paciente que aparece na uma expressão original e etnica, ela provêm de
zona caipira. fontes estranhas: a arnerindia em porcentagem pe­
Porêm afirmando a grandeza do Nordeste quena; ;i. africana em porcentagem bem ma�or;
musical não desconheço o valor das outras zonas. a portuguesa em porcentagem vasta. Alem disso
.Alguns dos cantos tapuios, os fandangos paulistas a influencia espanhola, sobretudo a hispanoameri­
de beiramar, os cantos gaúchos isentos de qualquer cana do Atlantico ( Cuba e Montevideo, habanera
hispanoamericanisnio, expostos na segunda parte e tango) foi muito importante. A influência
dêste livro mostram os acasos de ensinamento e europea tambem, não só e principalmente pelas
honiteza que deve reservar uma exploração deta­ danças (valsa polca mazurca shottsh) como na
lhada do populario. formação da modinha. (Il De primeiro a modinha
de salão foi apenas uma aco:rp.odação mais aguada
Pelo menos duas lições macotas a segunda da melodia da segunda metade do. sec. XVIII
[ parte dêste livro dá prá gente : o caracter nacional europeu. Isso continuou até bem tarde como de­
generalisado e a destruição do preconceito da mostram certas peças populares de Carlos Gomes
síncopa. e principalmente Francisca Gonzaga.
Por mais distintos que sejam os documentos Alem dessas influências já digeridas temos
regionais, êles manifestam aquele imperativo
l
! etnico pelo qual são facilmente reconhecidos por
' 1 nós. Isso me comove bem. Alem de possuírem
que contar as atuais. Principalmente as america­
nas do jazz e ao· tango argentino. Os processos
do jazz estão se infiltrando no maxixe. Em re­
pois a originalidade. que os diferença dos estra- corte infelizmente não sei de que jornal guardo
nhos, possuem a totalidade racial e são todos pà­ um samba macumbeiro, Aruê de Changô de João
tricios. A músfo.a_popula-r-brasi:l:ei;J,�s da Gente que é documento curioso por isso. · E
_qQmpleta,.Jnais__toialmente nacional, mais forte tanto mais curioso que os processos polifonicos e
,,- -- -----�-"---
criação da nossa raça até agm::a. rítmicos de jazz que estão nele não prejudicam
.....
Pois é com a observação inteligente do popu­ em nada o carater da....pJ)Ç_a. É um maxixe legíti­
lario e aproveitamento dele que a música artística mo. De certo os antepassados coincidem ...
se desenvolverá. Mas o artista que se mete num (ll Album de música nns Reise i1n Brasilitm, Spix e Martius; a peça
registrada por Langsdorff na Viagem ao redor do mundo; as peças aôbr e
trabalho dêsses carece alargar as ideas esteticas _
Marllia de Dirceu no Cancioneiro Português de Cesar das Neves e Gualdi­
sinão a obra dele será ineficaz ou até prejudicial. no de Campos (vols. 19, 21, 29, 32, 43, 44, 47 e 50; ed. Cesar Campos e
Cia. Porto); modinhas do padre Maurício e outros no Cancioneiro Fl11-
Nada pior que um preconreito. Nada melhor que 11i.h1,ense de Mello Morais, etc.
26 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 27

Bem mais_ deploravel é a expansão da melodia cho­ E nisto que eu queria chegar: o artista não
rona do tango. E infelizmente não é só em tan­ deve ser nem exclusivista nem unilateral.
gos argentinos ... de brasileiros que ela se mani­
festa. Tem uma influência evidente do tango em Si a gente aceita como um brasileiro só o exces­
certos compositores que prêtendem estar criando sivo ca,8cteristico cai num exotismo que é exotico
até pra nós. O que faz a riqueza das principais
\ a ... Canção Brasileira! Estão nada. Se apro­
( veitam da facilidade melodica pra andarem por escolas europeas é justamente um caracter nacio­
· aí tangaicamente gemendo sexualidades panemas. nal incontestavel mas na maioria dos casos inde­
finível porêm. 'l;odo o caracteL-ex.Qflssivo �
Está claro que o artista deve selecionar a . or ser excessivo é objetivo e exterior em vez de
documentação que -vai-ll1!J. servir de estua:o ou de psicologico, e perigoso. a iga e se torna faci]:
báse. Mas por outro lado nao Ueve cair num mente banal. É uma pobreza. É o caso de Grieg
exclusivismo reacionario que é pelo menos inutil. e do proprio Albeniz que já fatiga regularmente.
A reação contra o que é estrangeiro deve ser feita A obra polifonica de Vittoria é bem espanhola
espertalhonamente pela deformação e adaptação sem ter nada de espanholismo. E felizente prá
dele. Não pela repulsa. Espanha que os trabalhos de Pedrell e autores
Si de fato o que já é Qaracteristicamente bra­ como Joaquim Nin, Halfter, Falla estão alargando
sileiro deve nos interessar mals, si é preconceito as possibilidades do tatatá rítmico espanhol.
útil preferir sempre o que temos de mais caracte­ O exclusivista brasileiro só mostra que é igno­
rístico: é preconceito prejudicial repudiar como rante do fato nacional. O que carece é afeiçoar os
estrangeiro o documento não apresentando um grau elementos estranhos ou vagos que-nem fizeram Levy
objetivamente reconhecivel de brasilidade. A com o ritmo de haban():ra do "Tango Brasileiro"
marchinha central dos admiraveis Chôros n.0 5 de ou Vila-Lobos com a i:nárchinha dos "Chôros n.0
Vila Lobos (Alma Brasileira ed. Vieira Machado, 5" praquê se tornem nacionais dentro da manifes­
Rio) foi criticada por não ser brasileira. Quero tação nacional. Tambem . si a parte central da
só saber porquê. · O artista se utilisou dum ritmo "Berceuse da Saudade" de Lourenço Fernandez
e dum tema comu_ns, desenvolvidos dum elemento (op 55 ed Bevilaqua) constituísse uma obra iso­
anterior <la peça, tema sem caracter imediatamente lada não tinha por onde senti-la brasileiramente.
etnico nenhum, tanto podendo ser brasileiro como Porêm essa parte se torna nec;essariamente brasi­

---
turco ou francês.. Não vai em nada contra a mu­ leira por causa do que a cerca.
sicalidade nacional. Portanto é tambem brasileiro
não só porquê o pode ser como porquê sendo in­ Mas o característico excessivo é defeituoso
ventado por brasileiro dentro de peça de carcter apenas quando virado em norma unica de criação
nacional e não levando a música pra nenhuma ou critica. Ele faz parte dos elementos uteis e
outra raça, é necessariamente brasileiro. até, na fase em que estamos, deve de entrar com

l
28 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRR A MÚSICA BRASll,füHA 29

frequencia. Porqitê é por meio dele que a .r;entc vanês, <lo canto achanti, e outros atrativos delicil)­
poderá com mais firmeza e rapidez determiniir r sos mas passageiros de exposição universal.
normalisar os caracteres etnicos permanentes da O que a gente deve mas é aproveitar todos os
musicalidade brasileira. elementos que concorrem prá formação permanente
Outro perigo tamanho como o exclusivismo é da nossa musicalidade etnica. Os elementos ,i,
unilateralidade. Já escutei de artista nacional que ameríndios servem sim porquê existe no brasileiro
_ a · nossa música tem de ser tirada dos indios. uma porcentagem forte de sangue guarani. E o
Outros embirrando com guaraní afirmam que a documento ameríndio propriedade nossa mancha
verdadeira música nacional é. . . a africana. agradavelmente de estranheza e de encanto soturno
O mais engraçado é que o maior número manifesta a música da gente. Os elementos africanos servem
antipatia por Portugal. Na verdade a música francamente si colhidos no Brasil porquê já estão
portuguesa é ignorada aqui. Conhecemos um ati­ afeiçoados á entidade nacional. Os elementos
lho de pecinhas assim-assim e conhecemos por de- onde a gente percebe uma tal ou qual influência
' mais o fado gelatinento de coimbra. Nada a gen­ portuguesa servem da mesma forma.
L te sabe de Marcos Portugal, pouquíssimo de Rui
Coelho {; nada do populario portuga, no entanto O compositor brasileiro tem de__se basear quer
bem puro e bom. como docl11!1entação quer como -ins�cãoriõ-l'õT-
·-cifore:·--Este, em muitas manifestações caracteris­
Mas por ignorancia ou não, qualquer reação ·ri.qüissimo, demonstra as fontes donde nasceu. O
contra Portugal me· parece perfeitamente boba. compositor por isso não pode ser nem exclusivista
Nós não temos que reagir contra Portugal, temos é nem unilateral. Si exclusivista se arrisca a fazer
de não nos importarmos com êle. Não tem o mini­ da obra dele um fenomeno falso e falsificador. E
mo desrespeito nesta frase minha. É uma verifi­ sobretudo facilmente fatigante. Si unilateral, o
cação de ordem estetica. Si a manifestação bra­ artista vira antinacional: faz música ameríndia,
sileira diverge da portuguesa muito que bem, �i africana, portuga ou europea. Não faz música
coincide, si é influência, a gente deve aceitar a brasileira não.
coincidencia e reconhecer a influência. A qual é ,,
não podia deixar de ser enorme. E reagir contru RITMO
isso endeusando boróro ou bantú é cair num uni­
lateralismo tão antibrasileiro como a lírica de
Glauco Velasquez. E aliás é pela ponte lusitana Um. livro como êste não comporta discussão
( que a nossa musicalidade se tradicionalisa e justi­ de problemas .gerais do ritmo. Basta verificar
\'---- fica na cultura: europea. Isso é um bem vasto. É que estamos numa fase de predominancia rítmica.
Neste capítulo o principal problema pra nós é oâa º
-
o que evita que a música brasileira se resuma á
curiosidade esporadica e exotica do tamelang ja- síncopa.

- 3
:30 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 31
A música brasileira tem na síncopa uma das Já não é possível verificar a mesma coisa do
constancias dela porêm não uma obrigatoriedade. canto africano pelas melodias que jYianuel Quirino
E mesmo a chamada "síncopa" do nosso popula­ registrou na Baía porêm no populario brasileiro
rio é um caso subtil e discutivel. Muitas vezes a dos lundús e_ dos batuques impressiona a frequen­
gente chama de síncopa o que não o é. c'iaUe-:fráses cüinpôsfii.s pela repefagão sist!ili:\afica
O conceito de �/vindo nos dicionarios dum só valor de tempo bem pequeno (semicolcheia).
nas artinhas e nos Ü�ros-:-sobre ritmica, é tradicio­ Os nossõs·-artistasreconlieciainõêm isso e quando
nal e não vejo precisãü" de contraria-lo, está certo. pastichavam o africano, corno é o caso de Gomes
O que a gente carece verificar é que êsse conceito Cardim no "Nossa gente já está livre ... " (Melo­
muitas feitas não corresponde aos movimentos dias Populares Brasileiras, Luciano Gallet, ed.
ritmicos nossos a que chamamos de síncopa. Me cit.), usavam e abJ.i,sav:am..dêssr§__processos orat_orios
----
. -••---a--·-,-___,___ •

parece possível afirmar que se - deu um conflito d.e ritmqi. Inda mais: em certas peças reconheci­
grande entre as nossas tendencia e a ritmica já das· una:nimemente ou tradicionalmente como de
organisada e quadrada que Portugal trouxe da proveniencia negra como na "Ma Malia" dêste li­
mvilisação europea pra ca. Os amerindios e pos- vro essas frases oratorias aparecem e chegam mes­
1\fV-l�·,·v
1
• _.e"_
• sivehnente os africanos tambem se manifestavam mo a <;riar recitativos legítimos (Ver minha nota
,.,-F�' � ,.-: numa ritmica provinda diretamente da prosodia, -=::,,.__ sobre o "Lundú do Escravo" em Revista de An-
à-,'"'-''" ".· .• :J.Õi:ncidind·o pois em muitas manifestaçoes com a ---- tropofagia n.0 5 S. Paulo).
\J 0º"''' .. ritmica di§curs1va de Gregoriano. As frases
0 "' '
musicais dos indigenas de beiram'.ar conserva- Ora êsses processos de rítmica oratoria, des­
das por Lery num tempo em que a ritmica medida provida de valores de tempo musfoãlcõntrastavam
inda não estava arraigada no espirito europeu, sob com a musica portuguesa afeiçoada· ao rnensura­
o ponto-de-vista ritmico são verdadeiras frases de lisrno tradicidional europeu. Se deu pois na mú-
cantochão onde até as distinções aparecem. Muitas sica brasileira um conflito entre a rítmica direta- 1,_:) ._•• t'-
das registrações de Spix e Martins também impli­ mente musical dos portugueses e a prosodica das .... . ., 1 ;

cam essa inexistencia de ritmo exclusivamente mu­ músicas ameríndias, tambem constante nos africa- ",�, ' · "'· '--·
sical entre os ameríndios do centro e do norte bra­ nos aqui. E a gente pode mesmo afirmar que uma /cc,; ,,.,).�,
sileiro. Mesmo nos tempos de agora os livros
scientificos de mais fé musical que nem os de Koch
rítmica mais livre, sem medição isolada musical
era mais da nossa tendencia, como provam tantos
:,._ .�
Grünberg sobre os. indios do extremo-norte, de documentos já perfeitamente brasileiros que expo- :·-' •·") /
Speiser sobre os da bacia amazonica, de Colbac­ nho em seguida a êste Ensaio. Muitos dos cocos, \'·'-""·.,,_·.,,
chini sobre
· · o oeste brasileiro reforçam essa noção desafios, martelos, toadas, embora se sujeitando
duma de canto quasi que exclusivamente á quadratura melodica, funcionam como verdadei- "' .'-,:;
f�logica entre os in 10s. ros recitativos. ·',-.;\ 11' ·
r 1

MÁRIO DE ANDRADE

l
1

:12 ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 33

Ora tt essas influências dispares e a es,;e con­ tente. Êsse é um geito muto comum do nosso can­
flito inda aparente o · brasileiro se _acomodou, tador cantar embora já esteja reconhecido que na
fazendo disso um elemento de expressão musical. nossa prosodia não existam silabas mudas que nem
Não se pode falar diante da multiplicidade e cons­ ;no português ( entre outros H. Parentes Fortes
tancia das subtilezas rítmicas do nosso p.Qpulario em "Do Criterio Atual de Correção Gramatical",
que estas são apenas os desastres dum conflito Baía 1927). Recebi o "Capim da Lagoa" na gra­
não. E muito menos que são exclusivamente pro­ fia mais ou menos legitima:
sodieas porquê muitas feitas elas até contradizem
com veemencia a prosodia nossa. O brasileiro se
' 11O@cap1mda
1# Cla. • go.•
LW'�
acomodando com os eleme:r:itos estranhos e se agei- vi. a.do co.meu

tando dentro das proprias tendencias adquiriu um


geito fantasista de ritmar. E.§z do ritmo uma coi­ É obvio que a obcessão da síncopa levava al­
sa mais variada mais livre e sobretudo um elefüeil­ gum sincopadeiro a grafar:
tQ_de expressão racial.
É possível que a síncopa, mais provavelmente
') I importada de Portugal que da Africa (como de
W'\ 1
· fjl Ed'p
O tr.plm da I& • gouUdo co .ateu

certo hei-de mostrar num livro futuro) tenha aju­ Ora pela grafia anterior mais sincera e pela
dado a f0'maç_ãJ:ulaíantasia-ritm�ca_d_Q_EEt�ileiro. experien.cia que tenho do nosso canto popular sei
Porêm não é possível descobrir a função dela em que trata-se do que a gente podia prosodicamen­
muitas das manifestações de rítmica prosodica ou te grafar assim:
fantasista do brasileiro. E não é possível porqui>
si o som da melodia nasce na chamada parte fraca
do compasso ou do tempo e se prolonga até uma �-#h, 'í1 >lfI "'--> E W 'F· >

acentuação seguinte, êle não haz nenhuma acen­


U c.ipim d• la;. go.11 ,1.a'..du cú. m�u

tuação. "Pelo contrário: o instrumento acompa­ Sendo que os sons não acentuados são verda­
nhante é que acentua conforme a tradição coreo­ deiros nenmas liquescentes. prolongando em silabas
grafica e a teoria. Outras feitas a acentuação novas quasi nulas o som acentuado anterior.
do canto desorienta de fato a acentuação do com­ Si pois conforme o conceito tradicional da sín­
passo mas o som não se prolonga porêm. Outras copa a gente assunta o nosso populario musical
feitas ainda, que nem no lindíssimo <:oco paraiba­ constata qUft.ll)J.ÜJ.QB movimento.s-chamados-de-sin­
no do "Capim da Lagoa" a ocorrem-ia de palavraR !)_QP.ados _não _sã_o si11co.QQ. São polirritrnia ou são
paroxítonas muito acentuadas nas tesis dos tem­ ritmos livres de quem aceita as determinações fi­
pos melodicos obrigam o cantador a tornar a sila­ siologicas clg arsis e -tiifüjí":Pif:i:ênC.i-g:r:iõra - (§u ·1n:
ba atona seguinte, verdadeiramente atona, inexis- :fringe ()J�º�!��e:ri!�
PE )_,1.d_o_ut:d:na_dinàmicã ra:r::
34 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 35

sa do compasso. Eis três exemplos de ritmo livre bem no fandango "Que Moça Bonita" (2.ª parte)
que nada têm de sincopa: aparece outra manifestação dêsse processo, inven­
tando a mudança do · binário pra ternario. Em
vez de dar em semínimas pontuadas os sons das
silabas trêla em estrêla o que fazia a cantiga per­
manecer binaria, a tradicionalisação do processo
encurtou os sons criando a introdução dum ritmo
novo. Ora tem uma diferença enorme entre a
fadiga que leva os recrutas cantando a "Canção
do Voluntário Paulista" a reduzir dois compassos
quaternários em ternários:
:N" otar no terceiro exemplo a diluição caracte­
rística da síncopa em tercina com acentuação cen­
tral, costume frequentíssimo em nosso geito de
�m.g ,.alor Wmoe�ubllme...
114 OI
em, �
J i 1 1UF
o.Jor Comoi, sublime.,,

cantar. Quanto ao processo rítmico de Vila-Lo­


bos, muito comum no artista ("Alma Brasileira", com um efeito que saindo provavelmente da fadiga,
"Saudades das Selvas Brasileiras" n. 0 2, ed. Max até por vezes torna a peça mais fatigante qne nem
Eschig; e-um exemplo magistral na pg. 5 da Seres­ no fandango citado.
ta n.º 4, "Saudades da Minha Vida" ed.. C. Artur E é curioso essas liberdades aparecerem até nas
Napoleão em que a pseudo síncopa ora se dilui em peças dançadas. Porém a habilidade do cantado1·
tercina ora traz acentuação mais forte no lugar no fim da estrofe ou ela parte faz a acentuação do
ritual da tesis), tambem se manifesta no populario compasso acabar coincidindo ele novo com o passo
como demonstra o "Canto de Xangô" na segunda dos dançarinos. Já no "Que Moça Bonita" os 5
parte. compassos terna.rios podem continuar batidos em
Alem dêstes processos em que se dá acentua­ bina.rio porquê acabam coincidindo com a acentua­
ção do som, tem out:r:os em que a acentuação não ção dêste quando volta. O mesmo se dá com o
aparece. Assim na silaba da em varanda do coco admiravel "Tenho um Vestido Xovo'' (2.ª parte)
"Olê Lioné" (2.ª parte). Este caso, muito cor­ em que os dois ternarios de cada estrofe e refrão
rente pode ser considerado como um .... êrro pro­ figuram como tres binarios pro dançador e no fim
dá tudo certo.
vindo da fadiga do cantador que não sustentou o
som da silaba anterior. Mas não é possivel con­ Isto mesmo sueecle com certas cantigas apa­
certar o êrro porquê êle se tornou um processo rentemente sincopadas. Em várias da segunda
da nossa música, um elemento de expressão já per­ parte do livro, especialmente no "Meu Pai Cajuê"
feitamente tradicionalisado e não ocasional. Tam- n g-rnic Yrri1'ir·a <jllr o movimt'nto o qne faz {, se-
. ,
,1\,.; \·1.~-.c...___,_. �. I ...........J
,,,ft,L,,-.(\._ �C..-, �/V I Jl (', \..,,_._,L,..,)
·l "\.../_,,.,v✓'
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"'
;',�e,·{�'- \'·"'"�:'A.�I� •�'i &oR�l�,,;�,,i-,,,,�"l ,l, ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 37
t_.,, �\...("'"rni . '- .,ii"]'A···-�
( . '
Cu
'
guir livremente contanto que dê certo no fim. O
·· \,._'·'-�--: '- � �-: h
.. , ., .
,.:__J,,.., ,..... :.,.
, \ ') Isso é uma riqueza com possibilidades enormes
cantador aceita a medida ritmica justa sob todos de aproveitamento. Si o compositor brasileiro po­
os pontos-de-vista a que a gente chama de Tempo de empregar a síncopa, constancia nossa, pode
mas despreza a medida injusta (puro IJreconceito
teorico as mais das Lezes) chama_dà....9gnz.p_asso. E
,
J.�--- •-�---·> -----�'º" -· =
principalmente empregar movimentos melodicos
aparen_ti,�e s1ncopadOs,· pO,i:�ni..'â.fü;proyid2_��11-e
pela adição de tempos,.!_alequal fi�am os gregos aéento, respeitosos aapfosod� ou musicalmente
-� ..!!�-Elªravilhos:1_ �riação•.ntm,c.si...Cfa!�s, e não po'r riiiitâsistas, Jivresae remeleixo maxixeiro, movi­
subdivfsãõ' que nem fizeram os europeus ocidentais mentos emfim inteiramente pra fora do compasso
com o compasso, o cantador vai seguindo livremen­ ou do ritmo em que a peça vai. Efeitos que alem
te, inventando movimentos essencialmente melodi­ de requintados podem, que nem no populario, se
cos (alguns antiprosodicos até) sem nenhum dos tornar maravilhosamente expressivos e bonitos..
�ementos dinamogenicos da síncopa e só apareu­ Mas isso depende do que o compositor tiver pra
temente sincopados, até que num certo ponto (no nos contar ...
geral fim da estrofe ou refrão) coincide de novo
Tal como é empregada na música popular não
com o metro (no sentido grego da palavra) que \ temos que discutir o valor da sincopa. É inutil c
pra êle não provêm duma teorisação mas é.. d�-es­ discutir uma fo.rALJ!Ção inconsciente. Em todo ca- 'S, '�'-' \'·'
sencia puramente fisiologica. Coreografica até. , n

--
Sãoii'[õ:"vfüieiito:S:]Tvres-defêri:ninados IJela--�-·fadiga.
São movimentos livres desenvolvidos . da fadiga.
··----------
so afirmo que tal como é real{sado na execução e � 1;-n,�L
não como está grafado no populario impresso, o c21 ; •, ,., ... -,.
sincopado brasileiro é rico. ,9. que carece_p_QÍlL<i,,' . 1
'sãÕ-moviiiÍEÍntos ]ivr�s-especiffoos -dã mõlezã'âã
r'prÕsodia
brasileira. São...mov.imenfos.Jiriiê. Il�,9: ª.
que o músico artista assunte b�.!]1 . re_l!füla_d_e }l.a -· ,__ �
·execução pop11Ja.:r.f_ 1J,,l,..e.seJ1,J!_QlY1J.... M ais uma fei-
· âceiífüãdo�,Y> · Sãó movimentos livres acentuados
tã"1embrÕ ·vilà�Lobos. É principalmente na obra
por fantasia musical, virtuosidade pura, ou por
dele que a gente encontra já uma variedade maior·
precisão prosodica. Nada têm com o conceito tra­
de sincopado. E sobretudo o desenvolvimento da
dicional da síncopa e com o efeito contratempado
manifestação popular. Isso me parece importan-
dela. Criam um compromisso subtil entre o �
te. Si de fato agora que é periodo de formação �
tativo e o canto estrofico. São movimentos livres
�oxnaram:s_e es�jJicof,,,,,dâ_músi� devemos empregar com frequencia e abuso o ele- /, 1
L
{l) Nossos eompositores, l�\·ttdos 1wln preconceito da síncopa-a<'-'!11to,
mento direto fornecido pelo folclore, carece que ' '! )'í
têm a mania. de acentua!.J!ld.o_q��l' sincopa. Pois nossa música po­ a gente não esqueça que música artistica não é e+- f,_,
1,"\,,._1 il
pular já atingiu m'lllto rhaior vo.riedadeesübtileza que isso, deixando fenome_l!Q,,.P.QPUlar po_r:êm-aêsenvolvimento_dêsfe. e," \ r '.' '., :
muitas feitas de centuar o som apa.r1•tiJo em parte fraca e prolongando '
uté a tesis seguinte do compasso ou do tempo. Os compositores se tor­ O compositor tem pra empregar não só o sinco- . , /
j

naram por isso muito mais pobres e primários que a arte popular, a qual pado rico que o populario fornece como pode tirar ·'. '9'--s, �
por seu lado se eleva a ponto àl• equiparar com o apogeu da ritmi�
!í ·
.®g.a--quando os artisla1:1 virtiwsístit·n� dl' !:í ri•tirar:un da ritmw:. tl bu· J ilações disso. E nesse caso a síncopa do povo · se- d.e,... ./
1.,•cum tlo 3l'.lrnto. tornará uma fonte de riqueza.
{j -� .r ; ' '-'"-\ ;...,.._A, \.t., C... t.J_,,...,_ N -t. �º \ (,,.(}_:��
_, .... �,_.,.
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1
.· ' '.\,_.,.__,
: 1- 8 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 39

Si a música astistica se confinar ás manifes­ nario gaúcho. E as nossas valsas mazurcas e mo­
tações restritas da sfiicõpa do populario impresso dinhas. É na rítmica destas manifestações prin­
(sincopa central no primeiro tempo do dois-por­ cipahnente que a gente encontra base nacional por
quatro; antecipações sincopadas em finais de fra­ onde variar os metros. Em todo caso isso não me
se; frases com síncopas centrais em todos os tem-· parece problema importante não. A propria in­
pos) teremos uma pobreza abominável. Abominável venção :inais livre do criador individual lhe dará
porquê se estereotipa logo, cai no fácil, no conhecido quando sair do característico popular a variedade
e no excessivo característico. Sincopas assim podem metrica que o populario não fornece. Sem ca­
ser gostosas um tempo, e podem ser necessarias recer pra isso de despencar pro minuete da "So­
pra unanimisar o remeleixo corporal dos dança­ natina" de Casella ...
dores mas, ver os intervalos aumentados arabes,
ver o instrumento regional, ver a harmonisação
de Grieg: se banalisam com facilidade pela propria MELODIA
circunstancia de serem caracteristicas por demais.
B com a banalidade fadiga vem. O problema importante aqui é o da invengão
melodica expressiva. O compositor se vê diante
E será tambem uma pobreza si ,se tornar dum dilema. (Pelo menos êste dilema já me foi
obrigatória. A síncopa é uma das constancias po­ proposto por dois compositores). É êste: O em­
rêm não é constante nem imprescindível não. Pos­ prêgo da melodica popular ou invenção de temas
suímos milietas de documentos folcloricos em que pastichando ela, fazem o autor empobrecer a ex­
não tem nem sombra de sincopado. Mesmo a segun­ pressão. Isso principalmente na música de canto
da parte dêste livro demonstra isso bem. E tem uma em que o compositor devia de respeitar musical­
infinidade de síncopas que não são brasileiras. mente o que as palavras contam. Os grandes ge­
Por bem sincopadas que sejam as "Saudades da nios desde o início da Polifonia vêm pelejando
Cachopa" de Eduardo Souto ( eq_. C. Carlos Gomes, pra tornar a música psicologicamente expressiva.
S. Paulo), o delicioso compositor popular soube Todos os tezouros de expressão musical que nos
com inteligencia tornar indelevelmente portuga deram Lasso, Monteverdi, Carissimi, Gluck, B ee­
êsse maxixe. Na produção paulista abunda:m os
maxixes e cateretês. . . italianos. Em Francisco thoven, Shumann, Wagner, W olff, Mussorgski,
Debussy, Strauss, Pizzetti, Honnegger etc. etc. que
Nazareth não raro a recordação europea deforma
as danças e as atraiçoa. se confinaram mais pro lado da expressão musical
psicologica, têm que ser abandonados pelo artista
Inda cabe notar aqui a monotonia do nosso brasileiro pra que êle possa fazer música nacional.
binario simples. O compositor deverá observar Ou o compositor faz música nacional e falsifica ou
certos binarios compostos, influência portuguesa abandona a fôrça expressiva que possui, ou aceita
que permaneceu na música nordestina. O quater- esta e ahandona a característica nacional.
40 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 41

uma
Vamos a ver os aspetos mais importantes da exatas si forem conclusões...fisiologicas. Está cer­
questão: tÕfalãrquê música é bonita ou feia porquê
certos estados cenestésicos agradam ou desagradam
A música popular é psicologicamente inex­
sem possuirem interesse prático imediato ( fome,
pressiva 1
sêde etc.). O agradavel sem interesse imediato é
Á primeira vista parece. Mas parece justa­ batisado. com o nome de Belo. O desagradavel com
mente porquê é a mais sabiamente expressiva de o nome de Feio.
.todas as músicas. Inda estará certo a gente chamar uma música
O problema da expressão musical é vasto por de molenga, violenta, comoda porquê certas elina-
,demais pra ser discutido aqui. Parece mais acer­ mogenfo.s fisi12,!g_gicas amolecem o organismo, regu-
tado afirmar que a música não possui nenhuma larisam o moviménto dele ou o impulsionam. Es­
fôrça direta pra ser psicologicamente expressiva. tas dinamogenias nos levam pra estados psicologi­
cos equiparaveis a outros que já tivemos na vida.
A gente registra os sentimentos por meio ele Isto nos permite chamar um trecho musical de tris­
palavras. As artes da palavra são pois as psico­ tonho, gracioso, elegante, apaixona.do etc. etc. Já
Iogicas por excelencia. E como os sentimentos se com muito de metafora e bastante de convenção.
refletem no gesto ou determinam os atos as artes Só até aí chegam as verificações de ordem fisiopsi­
elo espaço pelo desenho e pela mimesis coreografi­ quica.
,ca podem tambem expressar a psicologia com certa M�a_l!lúsicA,,JJOSSll!.lUil,,poder dinamogenic,,.
verdade. Tomo expressar no sentido de contar
ª!l .
rµuito intenso e, por.causa_dele,.fortifica.,e_ac.entua..
•qual é a psicologia sem que ela seja sabida ele e_stados-de-alma s0,7Jjf!,gtL.ilr'<�a,nl.e/mJJ,.o.. E como
.antemão. dinamogenias dela não têni significado intelectl!!\I,
Pois a música não pode fazer isso. Não pos­ ·são-místeriosas, o porl<>r sugestivo ,la músiç_a ,;
sui nem o valor intelectual direto da palavra nem -formidaveL -
o valor objetivo direto do gesto. Os valores dela -· -··-ora oquê que a múRica popular faz dêssc va-
são diretamente dinamogenicos e sÕ. Valores que lores e poderes 1 É sempre fortemente dinamogP­
criam dentro do corpo estaâos cenestesicos novos. nica. É de dinamogenia sempre agradavel porqní•
Estas cenestesias sendo provocadas por um ele­ resulta diretamente, s�enhurna erudição falsi­
mento exterior (a música) que é recebido por uma ficadora, sem nenhum individualismo exclusivista,
determinação da vontade (pois a gente quis escu­ denecessidades gerais humanas inconscientes. E
tar a -música) são observadas com acuidade parti­ é sempre expressiva porquê nasce__de necessidade�
cúlar e interesse pela consciencia. E a conscien­ _ iais, por assim dizer i(téi'.ess� do ser e
e§se:11c
cia tira delas uma porção de conclusões intelectuais vai sendo gradativamente des'j:roj-adnctas aresta�
riue as palavras batisarn. Rstas conclusões só serão individualistas dela á medida que se torna de todo,
42 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 43

e anonima. E como o povo é inconsciente, é fata­ ou Max Reger ao passo que uma voz de congo ou
lisado, não pode errar e por isso não confunde de catira é um acaso dentro de nós. m .A fata)i:
umas artes com as outras, a música popular jamais dade de educação_ c_onsiste--no estudo -necessario.. e.
não é a expressão das palavras. Nasc;e sempre de quotiiliano dos grandes geniQ§ .e. _da. cultura eu_roc
Tambení
estados fi��opsi..q:uic.os gerais de q úeapenas pea.--Issôfaz com que. a gênte adquÍra·as _ nÓrnias .
· desta e os �geitos d�q_11e).es.. E a ignorancia esfe­
as palavras nascem. E por isso em vez de ser ex­
pressiva momento por momento, a música popular tica é que faz a gente imaginar num dilema que na
cria ambientes gerais, scientificamente exatos,�re-, realidade não existe, é uma simples manifestação
sultantes fisiologi_cas_d_a gi:a,ça,_ ou. da comodidade, de vaidade individualista.
<!ª_alegria ou da tristura. Mas comonão·-tenho a minima idea de regeitar
os direitos de expressão individual inda quero es­
É isso que o compositor tem de fazer tambem.
clarecer um bocado o emprêgo da melodica popular.
É impossível prá música expressar (contar) (I) O problema da sinceridade em arte eu já discuti uma feita em arti•
o verso: guete de jornal (Diário Nacional, "Ângelo Guida", S. Paulo, 10-XI-1927).
Confesso que o considero perfeitamente desimportante. Mas o artista
"Tanto era bela no seu rosto a morte". afeiçoado pela tradição e cultura ( que não dependeram da escolha dêk
e vêm dos professores e do ramerrãof didático) adquiriu um geito natural
Mas ela pode criar uma cenestesia relativa ao de escrever e de compor. :m-·ae"põfi .não quer mudar êsse geito porquê é
passo do Uruguai. Ambientar musicalmente o sincero. . . Isso é bobagem. A sinceridade em arte já principia por ser
um problema discutibilissimo porém mesmo que· não fôsse, o nosso caso
ouvinte de forma a permitir pela sugestão da dina­ continua desimportante. Além da sinceridade do geito, existe a inteligên­
mogenia uma perceptilidade mais vivida, mais ge­ cia que atinge convicções novas. Além da sinceridade do hábito existe a
sinceridade intelectual. Desde que a gente chega a uma convicção nova,
ral, mais fisiopsiquica do poema. dá um exemplo nobre de sinceridade, contrariando o hábito, o geito já
adquirido pra respeitar a convicção nova. O indivíduo. que está convicto
Pois esta ambientação não implica liberdade de que o Brasil pode e deve ter_ música própria, deve de seguir essa con­
individual nem muito menos ausencia de caracter vieção muito embora ela contrarie aquêle hábito antigo pelo qual O indiví­
duo inventava temas e músicas via Le.oncavallo-Massenet-Reger. E isso
etnico. Não só dentro de regras e fórmulas estrei­ nem é tão difícil como parece. Com poucos anos de trabalho literário de
tas os genios souberám ambientar os poemas que alguns os poetas n�!ES -�parecen_do t_ra_zem_ agoxa _um cu�l;t� t!}F.9.nf_u;ndJ_xeI
de Bras_il na poesiã dêle_s. - -oüt:rõ -dfa Urii músico inda "êStUdânte me falavi'i"
musicavam, como nenhum deles depois que a mú­ llâdlfiCüldãdc-VaSfa (}úêâentia em continuar o estudo da fuga porquê por
ª

sica se particularisou em escolas nacionais, deixou ter escrito um as poucas obras brasileiras já se acostumara tanto que tudo
lhe saía brasilefro da inve nção. Nos paisea em que a cultura aparece de
de ser nacional. O dilema em que se sentem os emprestado que nem os americanos, tanto os indivíduos como a Arte
compositores brasileiros vem duma falha de cul­ nacionalisada, têm de passar por tr&s fases: 1.ª a fase da t�se......naciOJl__Jl,l.�
_2=�-�•-!ª�e do__scntimento__na !'.!i9_nal;_ª.:._1!-__ _g_�.!él- ãã...-inÕonsciência nacional. · f '\e.._, ·
tura, duma fatalidade de educação e duma igno­ 86 -�!l!t� "':última_u.._ Artc .culta e .o.in_divíduo culto sentem a"Sinêên.O.iíd8dô _, ( i '·' ' ") ,
�JI:lõ.i,��-�Et.!L stncetj.dadc-da-eonvieção coincid_erEl_ m. Não_ é riosso '·caso--ahí:d'â. 1
v

rancia estetica. .A falha de cultura consiste na


1

Muitos de n6s já estamos sentindo brasileiramente, não tem dúvida, po• .,, °'·' _,_"' �, ·'- ::_ · z. 1
desproporção de interesse que temos pela coisa rém o nosso coração se dispersa, nossa .cultura nos atraiçoa, nosso geito l,., �- 1
estrangeira e pela coisa nacional. · Essa despro­ nos enfraquece. Mas é nobilissimo, demonstra organisação, demonstra ·-,.- (.·, :.,
caraeter,--.Q_gue põe a vontade como sentinela da_raça e não deixa entrar
porção nos permite sentir na permanencia do nos­ o_gue é prejudícial. E m��l!l!:n,c, .ª gente_ se sacJ·.i(_i_��;c_por _uma_c_ojs--ª-n!&
so ser mediocridades como Leoncavallo, Massenet t�ea,_-y:�d_�lQcn-!�.•-�l_e�n���-�1�nefieiarão �ª que vierem �ep���- i,; , '-' , l �
-
,,
44 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO HÔBRB A MÚSICA BRASILEIRA 45
Si de fato o compositor se serve duma melodia vantes alargam um bocado a obcessão do tonal
ou dum motivo folclorico a obra dele deixa de ser moderno.
individualistamente expressiva como base de inspi-
-. ração. E fica o mesmosio_compositor deliberada­ E a riqueza dos modos não para aí não. De
m_e)'l;tEJ :}lmõlcla :finveriçãoaos _ proeessos populares certas melodias de origem africana achadas no
nacionais� Isso não tem dúvida. Porêm a base de Brasil se colhe uma escala hexacordaL§espr<J:vi,ª�
;---., . .·. ..., ..,.· ,., ,de sensivel cujo efeito é interessantíssimo ( ver nos
rnspiraçao tem valor minimo ou nenhum diante
'. --- '

da obra completa. Basta ver certas harmonisa­ Anais do 5.0 Qongresso Brasileiro de Geografia
ções artísticas de cantos populares. Bela Bartok, I.º vol. as melodias colhidas por Manuel Quirino).
Luciano Gallet, Gruenberg, Percy Grainger per­ Este fenomeno é bem frequente. Eduardo Prado
severam nos seus caracteres individuais, harmoni­ no volume sobre o Brasil na Exposição Interna­
sando coisas alheias. cional de 89 (ed. Delagrave, Paris) registra a
observação dum músico francês sobre melodias
Até em música de canto o compositor pode e nossas desprovidas de sensivel. E mesmo neste
deve se utilisar da melodica popular. E não só
Ensaio vai co:rnoexemplo disso a yersão paraiba­
empregar diretamente a melodia integral que nem
na do "Mulher Rendeira" em que a sensível é evi­
faz frequentemente Luciano Gallet como a modi­ tada sistematicamente.
ficando num ou noutro detalhe (processo comum
em Vila�Lobos), ou ainda e:rµpregando frases po­ A melodica das nossas modinhas principal­
pulares em melodia propria (L. Fernandez na mente, é torturadissima e isso é mna constancia.
"Berceuse da Saudade"). Na cantiga praceana o brasileiro gosta dos saltos
melodicos audaciosos de setima, de oitava (Fran­
Alem disso existem as peculiaridades, as cons­
cisca Gonzaga, "Menina Fareira" ·no album de
tancias melodicas nacionais que o artista pode em­
A. Friedenthal) e até de nona que nem no lundú
pregar a todo momento pra nacionalisar a invenção.
"Yayá, você quer morrer" de Xisto Baía (A Frie­
As fórmulas melodicas são mais dificieis de espe­
denthal, "Stimmen der Volker" vol. 6. 0; "Papel e
cificar que as rítmicas ou harmonicas não tem
Tinta" n. 0 1, S. Paulo). Na 2.ª parte dêste livro é
dúvida. Mas existem porêm e não é possível mais
facil de assuntar isso. e Vila-Lobos na "Modinha"
imaginar um compositor que não seja um erudito
(Seresta n.º 5, ed. C. .Artur Napoleão) mostra tarn­
da arte dele. 4.ficrnar_que.JJJ;nprngªlllos a sí:ncopa
bem um exemplo cheio de espirito.
oU-a-setima_ahaixa.da_é umapuerilidade. O coní­
:p9sitor-deve-conl:recer�quais ·são .as_nossas.Jenâeíi� A inquietação da linha melodica aparece at(>
· éia§__ Jt_constancias...J11elodicas ,..._ Aliás a setima no canto caboclo embora menos frequentemente.
abaixada é uma tendencia brasileira de que carece Está no "Fotorototó" (L. Gallet "6 Melodias Popu­
matutar mais sobre a extensão. Isso nos leva pro lares", ed. cit.) e no "Boiadeiro" (A. Levy,", "Rap­
hipofrigio e as consequencias harmonicas deri- Rodia Brasileira", ed. L. Levy e Irmão).

4
- ---- ---------��--=---
46 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A �n;�ICA Hl\At-lLEll\.-\

Nossa lírica popular demonstra muitas feitas já surgem embrionarios o salto melodico de terça e
caracter fogueto, serelepe que não tem parada. As os sons rebatidos. As variações são incontaveis.
frases corrupiam, no geral em progressões com uma Eis como aparece no "Pierrot" de Marcelo Tupi­
esperteza adoravel. Sem que tenha nenhuma seme­ nambá (ed. Campassi e Camin S. Paulo) :
lhança objetiva, isso nos evoca a alegria das sona­ J
tas ·e tocatas do sec. XVIII italiano. É lembrar a

"Galhofeira" (ed. Bevilaqua, Rio) de A. Nepo­


muceno.
Dessas progressões melodicas e arabescos tor­ do "Reboliço" (E. Nazaret, ed. Casa Artur Napo­
turados possuímos uma coleção vastíssima. Lou­ leão), que é mesmo um reboliço do apá virado.
renço Fernandez no actmiravel "Trio Brasileiro" E quem não reconhece logo um patrício no
(ed. Ricordi, Milão) emprega a simples gradação requebrado:
descendente com sons rebatidos:

Outra observação importante é que a nossa


Essà-fórmula esquematica é frequente na nossa melodica afeiçoa as frases descendentes. No subli­
música popular e se manifesta tambem numa infi­ me "Rasga Coração < ·> (Chôros n. 10 ed. Max
Eschig, Paris) se pode falar que tudo desce. Com
0

nidade de variações. No "Luar do Sertão", na "Ca­ _ _


bocla do Caxangá", no "Apanhei-te Cavaquinho" de excepção de arpejos e melismas rap1dos solistas e
Ernesto Nazaret, nas estrofes de muitas peças reve­ da frase estupenda em notas rebatidas no pistão,
ladas aqui, etc. etc. Nos nossos contrapontos de tudo desce impressionantemente < 1 > . Apropria des­
flautas das orquestrinhas e chôros vem muito dis­ caída escalar (de que um exemplo gostoso está no
so. No "Arrojado" de Ernesto Nazaret (ed. Bevi­ "Ramirinho" de E. Nazaret, ed C. A. Napoleão)
laqua, Rio) a gente percebe logo o caracter flautis­ inda se especialisa nisso que a maioria das feitas
vai parar na mediante (V. o Fandango B de Fort?­
tico pelo requebro relumiante do arabesco.
lel?ia na 2." Parte). Influência de certo da mama
Até nas modas caboclas mais simples aparecem
com frequencia movimentos dêsses. No arabesco
('"") de Villa-Lobos.

tão comum nelas :


(1) Se observe eomo no "Batuque" (A. Nepomuceno, "Série Brasileira"
n.º 4, ed. C. Artur Napoleão) certa frase repetida s_empre pelas cordas,
aprceenta a síncopa obrigatória em todos tempos, vai em progressao w po­

1
rém ascendente. Ê uma frase sem caráter, possuindo a retórica nacional
mas não possuindo nacionalidade. Uma falsificação nacional. Já porém
no Intermédio (n.O 2 da mesma peça), certos arabescos em destacado,
i descendentes, ( comps. 15 a 18- 1 são bem mais característicos apesar <le
não trazerem síncopa.
48 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA . 49

de organizar em terças. Embora não seja possível l Será possivel descobrir ainda outras constan­
generalisar nós temos uma tal ou qual repugnancia cias melodicas porêm isso deixo pros musicos mes­
pela fraqueza crua da tónica. É comum a frase pa­ mo. Os admiraveis Chôros de Vila-Lobos, pra con­
rar nos outros graus da triade tonal. juntos instrumentais de camara (v. Chôros n. 0 2,
As quedas prá mediante atingem ás vezes uma ed. C. Artur Napoleão; Chôros n.º 4, ed. Max
audacia deliciosa que nem por exemplo no refrão Eschig), todos são verdadeiros mosaicos de cons­
instrumental do "Tatú subiu no pau" de Eduardo tancias e elementos melodicos brasileiros.
Sot!to (ed. C. Carlos Gomes, S. Paulo). É até curio­
so de notar que certas frases europeas que nem: POLIFONIA

� ,. : , lf ; J) n I J 11 O problema da Harmonia não existe propria­


mente na música nacional. Simplesmente porquê
os processos de harmonização sempre ultrapassam
em que a gente percebe um modismo bastante por­ as .nacionalidades.
tuga, ficam bem mais brasileirás si a queda termi­ �·
nar na mediante: Na infinita maioria dos casos a harmonisação
acompanhante tem põtrca-ImpoftãnCia na música
....JJ.QJlulã.r. E certo que o emprêgo dos mod0se-das'
escalas deficientes, sistemas gaelicos, chineses, ame­
ríndios, 11> africanos, cria necessariamente uma am­
Quando eu era piazinho tive um primo fazen­ biencia harmonica especial mesmo quando as peças
deiro qúe cantava uma cantiga sorumbatica nada são monodicas. Em certos casos essa ambiencia
feia. Caía sempre na mediante : pode se tornar característica.
Porêm êsse ,:iaracteré_muito pouco nacionali­
Jlªd.o.r.,porque a música artística não pode se restrin­
gir aos processos harmonicos populares, pobres por
demais. Tem que ser um desenvolvimento erudito
deles. Ora êsse desenvolvimento coincidirá fatal­
Essa melodia jamais que pude me esquecer mente com a harmonia europea. A não ser que a
dela. Ficou bem gravada na minha malinconia pa­ gente crie um sistema novo de harmonisar, abando­
ciente. Quadrava bem nos versos, hoje esquecidos, nando por completo os processos já existentes na
Europa. , Carecia abandonar desde as sinfonias
mas que me lembro falavam em quando os meu.�
olhos não se abrirem mais. . . Germano Borba mor­ (l) Entre os índios do extremo norte brasileiro a gente encontra sistemas
pent&tonicos curiosos como fa-mibemol-re-sibemol-la-fa (Koch Grünberg
reu novo. "Von Roroima zum Orinoco" II,0 vol. ed. Strecker e Schrõder, Estugard).
50 MÁRIO DE ANDR ADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA· 51
e diafonias pitagoricas, desde ·o conceito do acorde dade é austríaca! E por causa de Tartini serão
por superposição de terças, e a gerarquia dos graus italianos o maior e o menor modernos 1
tonais, desde os cromatismos, alterações, apogiatu­
ras etc. etc. até as nonas, undecimas, decimastercei­ É absurdo pretender harmonisação brasileirá
ras, a atonalidade e a pluritonalidade dos contempo­ pois que nem a Alemanha nem à Italia nem a
raneos. Ora isso é um contrassenso porquê uma França com seculos de formação nacional, jamais
criação dessas, sem base acustica sem base no po­ não tiveram isso e adotaram as quartas e quintas do
pulario, seria necessariamente falsa e quando mui­ organo talvez latino e as terças e sextas do falso­
to individualista. Jamais nacional. bordão talvez celtico.
E aliás seria possivel uma criação assim que Na infinita maioria dos documentos musicais
deixasse de já ser europea t Creio que não porquê do nosso populario persiste o tonalismo harmonico
iria coincidir com a atonalidade e a pluritonalida­ europeu herdado de Portugal. Nossa harmo:ilisação
de modernas. tem que se sujeitar consequentemente ás leis acusti­
cas gerais e ás normas de harmonisação da escala
Alem disso mesmo os modos ou as escalas exo­ temperada. Os processos de enriquecimento dessa
ticas, quer aqueles por intermedio dos tons-de­ concepção harmonica, pluritonalidade, atonalidade,
igreja, quer · êstes pela rebusca do pitoresco quartos-de-tom, já estão se desenvolvendo e siste­
e do novo, já frequentam a harmonização europea
matisando na Europa. E mesmo que um processo
abundantissimamente desde o Romantismo e lhe
novo apareça por aqui: é invenção individual, pas­
levaram uma liberdade e variedade que ninguem sivel de se generalisar universalmente. Não poderá
não tira dela mais. assumir caracter nacional.
A harmonisação europea é vaga e desraçada. E si de fato numa ou noutra peça em que
Muito menos que raciais, certos processos de har­
monisação são individuais. Todas as sistematisa­ ocorra uma escala deficiente africana ou amerín­
ções de harmonisação que nem o cromatismo de dia, o maior com intervalo de tom da sensivel prá
'Pristão, os acordes alterados franckistas, as nonas tónica que nos leva pro hipofrigio, ou ainda o tri­
e undecimas do Debussismo, principiaram com um tom da tónica prá subdominante que nos leva pro
individuo. Porêm como êste individuo tinha valor hipolidio (ver na 2.' parte o "Pregão do Cego" e o
e se afirmou, o processo dele foi aproveitado por fandango "Não canto por cantá"), si num caso
outros não só do mesmo país como de tôda a parte e dêsses é possivel criar uma ambiencia harmonica
num átimo o processo perdeu o caracter nacional extriivagando do tonalismo europeu ( coisa aliás em
que poderia ter. Haja vista a harmonisação de De­ que os compositores inda não têm pensado) isso
bussy que fez fortuna até no jazz! E por causa será apenas uma ocorrencia episodica. E aliás quer
de Schoemberg a gente pode falar que a atonali- a gente tome essas manifestações como modos, quer
52 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 53

como alterações tudo isso já ocorre na harmonisa­ o desenvolvimento dos processos populares tem de
ção europea tambem ... ' 1 > ser feito sempre com muito criterio porquê sinão
a peça pode perder o caracter nacional, como é o
Onde já os processos de simultaneidade so­ caso do trio "Serrana", aliás esplendido, de Henri­
nora podem assumir maior caracter nacional é -na que Osvaldo ( ed. Ricordi, Milão).
polifonia. Os contracantos e variações tematicas
superpostas empregadas pelos nossos flautistas se­ O problema é bem subtil e merece muito pen­
resteiros, os baixos melodicos do violão nas modi­ samento, muito raciocinio dos nossos artistas. Nada
nhas, a maneira de variar a linha melodica em impede por exemplo que os processos de melodia
certas peças, tudo, isso desenvolvido pode produzir acompanhante que os nossos violeiros empregam
sistemas raciais de conceber a polifonia. E de fato sistematicamente no baixo, passe prás outras vozes
já está sendo como a gente vê das "Melodias Po­ da polifonia. Esse baixo se m:;tnifesta iis vezes como
pulares" harmonisadas por Luciano Gallet, das melodia completa e independente, apenas concor­
Serestas, Chôros e Cirandas de Vila-Lobos. Numa dando harmonicamente com a melodia da vox prin­
Sonatina inda inedita desse moço de futuro Mozart cipalis. É como o conceberam L. Gallet em "Foi
Camargo Guarnieri, o Andante vem contrapontado numa Noite Calmosa" das J\,lelodias Populares Bra­
com eficiencia nacional e magnificamente. sileiras (ed. cit.) e Camargo Guarnieri no Andante
da Sonatina. Ora são simples elementos melodicos
Em Vila-Lobos a maneira de polifonisar já não de tranzição ou simples floreios episodicos de enri­
é mais o emprêgo direto do processo popular mas quecimento. Estes elementos são bem caracteristi­
uma ilação vasta dele. Si por vezes neste compo­ cos. E estão muito bem caracterisados na modinha
sitor o processo se conserva nacionalmente reco­ "1.1:eu Coração" de Lourenço Fernandez (ed. Bevi­
nhecivel (Seresta n.º 11, "Redondilha" seresta n.° 6, laqua). Nas Cirandinhas n.º 7 "Todo Mundo.
"Na Paz do Outono" ed. C. Artur Napoleão), si Passa" (ed. C. Artur Napoleão) o caracter infantil
por vezes a genialidade da invenção torna a obra com que a peça é concebida me parece que não jus­
impossivel da gente discutir ( o baixo-obstinado da tificava os elementos dêsse genero, meramente con­
"Nesta Rua", Ciranda n.° 11) sempre isso contêm vencionais e descaracterisados que aparecem na
o perigo iminente de amolecer, abafar, desvirtuar o primeira parte.
caracter nacional da invenção. E é mesmo o que
sucedeu algumas feitas. A ilação, a generalisação, Quanto aos processos já europeus de polifoni­
(1) Por vêzes no entanto uma ou. outra invenção harmônica se s8rvindo
sação êles são muito perigosos e na maioria das fei­
de pro-cessos já eonsµ.grados consegue fortificar a ambiência nacional do tas descaracterisam a melodia brasileira. Ou pelo
trecho. Se observe por exemplo o passo magnífico do Trio Brasileiro menos a revestem muito mascaradamente. É o que
(L. Fernandez pg. 16) a que o pedal e o organo imprimem um sabor
húmido de :mato quente, extranhamente verde. E se compare essa in• a gente pode observar no "Sapo Jururú" tratado
venção earacterisante com a harmonisação lamentável do mesmo tema, por Vila-Lobos nas Cirandas n/ 4, "O Cravo bri­
absolutamente descaracterisante, feita por Nepomueeno na "Alvorada
na Serra" (comp. U a 20, n.0 1, "Suite Brasileira", ed; cit.). gou com a Rosa" (-ed. C. Artur Napoleão) e mais
54 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 55

fortemente ainda na "Puxa o Melão" de Luciano nhece a sonoridade mais constante da instrumenta­
Gallet (Melodias Populares, ed. cit.) na qual a repe­ ção nacional. Mesmo os agrupamentos praceanos
tição canonica no acompanhamento, da propria me­ se aproximam disso bem. Nas orquestrinhas dos
lodia principal, apesar do brasileirismo incontras­ fandangos praieiros de S. Paulo ocorre com mais
tavel desta, assume o aspecto de mera retorica euro­ frequencia o conjunto: rebeca (violino) viola, pan­
pea. Tambem no 1.° Tempo do "Trio Brasileiro" deiro, adufe, machete. A sanfona que está influin­
de Lourenço Fernandez ( ed. Ricordi), a exposição do bem na melodica da zona mineira, é acompanha­
rlo tema em fa menor segue descaracterisadamente da por triangulo nos fuas de Pernambuco.
na dialogação imitativa de violino e violoncelo, ao
O fato da maioria dêsses instrumentos serem
passo que na exposição do 2.0 tema em la b maior
importados não impede que tenham assumido até
o acompanhamento dq piano, mais característico,
como solistas, caracter nacional. O proprio piano
torna bem mais aceitavel a imitação. Processos
aliás pode ser perfeitamente tratado pelo composi­
dêsses não só não ajuntam caracter prá obra como
tor nacional sem que isso implique desnacionalisa­
podem descaracterisa-la.
ção da peça. O violino se acha nas mesmas condi­
ções e está vulgarisadissimo até nos meios silves­
tres. Numa fàzenda de zona que permaneceu espe­
INSTRUMENTAÇÃO
cificamente caipira, tive ocasião de escutar uma or­
questrinha de instrumentos feitos pelós proprios
Será que possuímos orquestras típicas 1 Pos­
colonos. Dominavam no solo um violino e um vio­
suímos embora elas não sejam tão características
loncelo. . . bem nacionais. Eram instrumentos tos­
li como o jazz, o gamelan, ou os conjuntos havaianos
;li cos não tem dúvida mas possuindo uma· timbração
:11 e mexicanos. Catulo Cearense no "Braz Macacão"
li curiosa meia nasal meia rachada, cujo caracter é
enumera um conjunto caboclo assim:
fisiologicamente brasileiro.
!,
i'l

"Rebeca, frauta, pandêro, Não se trata de desafinação com a qual não


Crarineta, violão, posso contar aqui, está claro. Se trata de caracter
! Um bandão de cavaquinho, de sonoridade, de timbre. Ora o timbre sinfonico
Um ofiscreide, um gaitêro da tal de orquestrinha coincidia bem, com a sono­
Que era um cabra mesmo bão, ridade musical mais frequente dos solistas e dos
Caxambú ... " conjuntos vocais brasileiros. Muitíssimo mais tos­
ca e sem refinamento, era em última análise a mes­
Mais pra diante ajunta o recorreco, o que faz ma sonoridade quente ingenua verde do admiravel
a gente maliciar que a enumeração foi em parte de­ Orfeão Piracicabano. Quem escutar com atenção
terminada pelo acaso do metro. . . Porêm é incon­ nisso um conjunto coral estrangeiro dêsses que nos
testavel que na orquestrinha do poeta a gente reco- visitam, russos, italianos, alemãis e um conjunto
56 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 57

brasileiro põe logo reparo numa diferença ,grande caracter passive! de se aperfeiçoar. No canto nor­
de timbre. E essa timbração anasalada da voz e destino tem um desproposito de elementos, de ma­
do instrumento brasileiro é natural, é climatica de neiras de entoar e de articular, susceptiveis de
certo, é fisiologica. Não se trata do ... efeito teno­ desenvolvimento artístico. Sobretudo o ligado
rista italiano ou da fatalida:de prosodica do francês. peculiar (tambem aparecendo na voz dos violeiros
Talvez tambem em parte pela frequencia da do centro) dum glissando tão preguiça que cheguei
cordeona ( tambem chamada no país de sanfona ou um tempo a imaginar que os nordestinos empre­
de harmonica), das violas, do oficleide, por um fe­ gavam o quarto-de-tom. Pode-se dizer que empre­
nomeno perfeitamente aceitavel de mimetismo a gam sim. Evidentemente não se trata dum quarto­
voz não cultivada do povo se tenha anasalado e de-tom com valor de som isolado e teorico, baseado
adquirido um numero de sons harmonicos que a na divisão do semitom, que nem o posto em jôgo
aproxima das madeiras. Coisa a que propendia na­ faz alguns anos pelàs pesquizas de Alois Haba.
turalmente pelas nossas condições dimatericas e Mas o nordestino possui maneiras expressivas de
pelo sangue amerindio que assimilâmos. O anasa­ entoar que não só graduam seccionadamente o semi-
lado emoliente, o rachado discreto são constantes tom por meio do portamento arrastado da voz, co­
na v'oz brasileira até com certo cultivo. Estão nos mo esta ás vezes se apoia positivamente em emissões
coros maxixeiros dos cariocas. Permanecem muito cujas vibrações não atingem os graus da escala.
acentuados e originalissimos na entoação nordesti­ São maneiras expressivas de entoar, originais,
na. Dei com êles um sabado de Aleluia no cordão características e dum ·encanto extraordinario. São
negro do "Custa mas Vai" em S. João Del Rei. manifestações nacionais que os nossos compositores
Tornei a escuta-lo num Boi-Bumbá em Humaitá, no devem de estudar com carinho e das quais, si a gente
rio Madeira. E numa Ciranda no alto Solimões. possuísse professores de canto com interesse pela
E é perfeitamente ridiculo a gente chamar essa coisa nacional, podia muito bem sair uma escola de
peculiaridade da voz nacional, de falsa, de feia, só canto não digo nova; mas apresentando peculiari­
porquê não concorda com a claridade tradicional dades etnicas de valor incontestável. Nacional e
da timbração europea. Ser diferente não implica artistico.
feiura. Tanto mais que o desenvolvimento artís­ Mas eu estava falando na divulgação silvestre
tico disso pelo cultivo pode fazer maravilhas. Da que ·o violino já tem entre nós. É fato. · Tambem
lira de 4 cordas dos rapsodos primitivos a Grecia na minha viagem fecunda pela Amazonia, tive
fez as 15 cordas da citara. Do santir oriental e do ocasião por duas feitas de examinar violinos cons­
cimbalon hungaro que Lena:u inda cantou, ao piano truidos por tapuios que não conheciam nem Ma­
de agora, que distância através de todas as varian­ naus. E ainda nesses a factura produzia uma tim­
tes de clavicordios ! Da escureza e dos erres arra­ bração estranha que acentuava sem repugnar o ana­
nhentos da fala dele o francês criou uma escola de salado proprio do instrumento. As rebecas de Cana­
cant_o magnifica. Nosso timbre vocal possui um nea tambem são feitas pela gente de lá.
58 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 59
O importante pro sinfonista nacional não me nicarnente. Porquê sí o artista querendo numa
parece que seja se servir pois duma orquestra abso­ obra orquestral dar um ponteio que nem o usado
lutamente tipica. Haja vista o caso do jazz. Si é pelos violeiros e tocadores de violão, puser na par­
certo que a influência dele vale bem ; si sem êle não titura um bandão de cavaquinho, vinte violas e quin­
podemos imaginar a existencia do Octeto, de Stra­ ze violões, está claro que será muito dificil pelo
winsky ou de "J onny spielt auf" da Kreneck: o menos por enquanto encontrar mesmo nas cidades
valor dele como enriquecimento sinfonico me pa­ mais populosas do país, numero de instrumentistas
rece pequeno. Porquê o fato dos instrumentos poli­ capazes de arcar com as dificuldades eruditas da
fonicos de percussão que nem o piano e o xilofone cooparticipação orquestral. Si é possivel e recomen­
fazerem parte quasi obrigada das obras sinfonicas davel que os nossos compositores escrevam peças
de agora, o fato ainda do protagonismo até solista pequenas pra canto e viola, pra violão e flauta, pra
que a bateria adquire certas feitas (por ex. no No­ oficleide caxambú e piano, etc. etc. e mesmo pra
neto, de Vila-Lobos)' si coincidem com manifesta­ conjuntos de camara mais ou menos tipicos, um
ções e te:íidencias do jazz: são mais urna circuns­ número orquestral de instrumentos característicos
tancia de epoca que influência afroamericana. Não dificultava enormemente a execução da peça. Por
é por causa do jazz que a fase atual é de predomi­ isso e tambem pela eficiencia de instrumentos de
nancia ritrnica. É porquê a fase atual é de predo­ maior sonoridade, a transposição de processos é
minancia .ritrnica que o jazz é apreciado tanto. E justa e· bem recomendavel. Aliás é o que está se
com efeito, pra citar um caso só, a �'Sagração da fazendo com os compositores contemporaneos que
Primavera" de Strawinsky é anterior á expansão tomei por mestres neste Ensaio. E já que toquei
do jazz na Europa e é já uma peça predominante­ nisto peço desculpa a outros compositores que tam­
mente ritrnica,, com uma- bateria desenvolvida bem trabalham a coisa nacional por não citar as
que ... profetisava o jazz. obras deles. Não cito porquê inda não se distin­
O sinfonismo contemporaneo, que não é de guem por uma dedicação ao problema, que tenha
nenhuma nacionalidade, é universal, pode perfeita­ eficiencia social.
mente ser brasileiro tambem. O que não quer dizer Pois,, voltando pro assunto: acho que as possi­
que os nossos compositores devam trata-lo que nem bilidades de transposição inda são maiores do que
fizeram Levy, Nepomuceno e infelizmente inda fa­ o já feito. Ou menores. . . Porquê a transposição
ze� alguns novos. Porquê é jiistamente a maneira pode desvirtuar ou desvalorisar o instrumento.
de tratar o instrumento quer solista quer concer­ Como é o caso por exemplo de certas passagens
tante que nacionalisará a manifestação instru­ do violino (especialmente os pizicatos da "Serta­
mental. Nossos sinfonistas devem de por reparo neja") na "Suite pra canto e violino" de Vila-Lobos
na maneira com que o povo trata os instrumentos (ed. Max Eschig). Mas nossos ponteios, nossos
dele e não só aplica-la pros mesmos instrumentos refrães instrumentais, nosso ralhar, nosso toque­
como transporta-la pra outros mais viaveis sinfoni- rasgado da viola, os processos dos flautistas e dos
60 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 61
violonistas seresteiros, o oficleide que tem pra nós gante com que é tratada tantas vezes a orquestra­
o papel que o saxofone tem no jazz, etc. etc. dão base ção moderna facilita a introdução nela de instru­
larga pra transposição e tratamento orque$tral, de mentos típicos. Um instrumentador bom pode nu­
camara ou solista. ma orquestra tirar muito efeito com uma sanfona,
com a marimba, com duas, quatro violas e outros
Eu tenho sempre combatido os processos tec­
. instrumentos polifonicos. E mesmo os instrumentos
mcos e o criterio instrumental que enfraquecem ou
solistas servem. tambem, está claro. E podemos
desnaturam os caracteres do instrumento e o fazem
criar agrupamentos de bateria completamente nos­
sair: pra fora das possibilidades essenciais dele.
sos. Possuímos um diluvio de instrumentos ame­
Porem não me contradigo qui não. Que o violino
rimlios e africanos que merecem estudo mais inte­
banque o violão,
_ que a gente procure fazer do l)iano
ligente da parte dos nossos construtores de instru­
um realeJo de rua, uma caixinha-de-música ou uma
mentos e dos nossos compositores. É ocioso enu­
orque_ �tra são coisas que não me interessam e na merar todos aqui, mesmo porquê não posso garantir
ma10ria das vezes são coisas de fato detestaveis. Não
se tril:ta disso. D�po�s de C esar Franck, de Debussy, que a minha colheita já esteja completa. Mas um
f _
de 1l a-Lobos nao e poss1vel a gente afirmar que
_ .
estmlo do grupo elas tres flautas pareci, (" Ron­
donia" Roquette Pinto) ou das numerosas flautas
os limites tecmcos e esteticos do piano tenham sido
dos Aparai ("ln Düster des brasilianischen Ur­
fixad�s por Chopin. Uma transposição (não falo
walcls", F. Speiser) por exemplo, é absolutamente
propriamente de imitação) da tecnica e dos efeitos
recomendavel. 'l'anto mais que os instrmnentos pa­
dum i��trument? sobre outro pode até alargar as
_ reci não devem ser chamados ele flautas, pois a so­
poss1b1hdades deste e pode caracterisar nacional­
noridade deles por causa elo material e da emboca­
mente a maneira ele o conceber. A influência do
belcanto sobre o violino de Paganini é manifesta dura, na certa que é diferente. E o batacotô o
e a clêste sobre o piano de Liszt. Ernesto Nazaret checherê o ganzá o caiguatazú o curugú e ,jararaca
a inubia o adjá afofiê membí mernbí-clmê membí­
soube nalguns elos tangos, dele transpor pro piano
os 'processos flautisticos e a tecnica do cavaquinho tarará agogô vatapí maracá boré oufuá etc. etc.
sem que perdesse por isso o pianistico excelente da l)Odem servir de condimento ocasional e porventu­
obra dele. Lourenço Fernandez na "Canção do Vio­ ra permanente. A música brasileira o que carece
le ir?" ( ed. Bm:ilaqua) fa1/. m1n transpo,i,;ão pia­ .em principal é do estudo e elo amor dos seus
_ musicos.
mshca bem fehz elo toque-rasgado.
Pois em orquestras comuns mas eoncebidaB
assim, o instrumento tipico viria ajuntar o seu FORMA
valor sonoro novo e a sua eficiencia de caracterisa­
. ção. Nossos compositores inda não imaginaram Me falta tratar o problema da forma. . . Aliás
msso bem. A propria maneira seccionatla, dialo- nos ficou elo passado um cacoete detestavel: o de

5
62 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 63

chamar de brasileiro a peça de caracter nacional. Mas os nossos compositores têm demonstrado
Si um costume dêsses era explicavel nos tempos poder criador bem pequeno a respeito de forma,
de Nepomuceno e Levy, agora já não tem razão de não se aproveitando das que o populario apresenta.
ser não. Norne assim avisa que o compositor faz · Aproveitam-se quando muito de nomes que nem
uma concessão ao exotico ou pro estrangeiro (" Con­ Vila-Lobos. Mas como a tudo quanto faz Vi a­
cêrto Italiano" Bach; "Sinfonia Espanhola" Lalo; -Lobos impri J'eRQS_\ 'tl'.ill\, erestas, Cirandas,
"Suite Brasileira", Respighi). uma feição individualista excessiva, não se utili­
sando propriamente das formas populares nem as
Quanto ao emprêgo de certas formas tradicio­ desenvolvendo. Em todo caso o autor elo gemai
nais não vejo prejuízo nisso embora não recomen­ •<Rasga Co1;ação" emprega com frequencia a peça
de. É uma inutilidade. Hoje essas formas são curta em dois movimentos sem repetição do primei­
simples nomes como João, Arací, não têm valor for­ ro. Essa forma, em que estou longe de propor
malistico mais. Si a gente lê "Sinfonia" no cabe­ uma originalidade brasileira (ver as "Tonadas" de
çalho duma obra moderna sabe que se trata de tra­
balho mais desenvolvido e nada mais. O alegro-de­
-sonata anda bem desmoralisado.
l H. Allencle, chileno, ed. Senart, Paris) é comum
em nosso populario. Ocorre nas rodas infantis �" A
Pombinha Voou", "Padre Francisco", 2.ª parte)
nas toadas ·e frequentemente nos cocos (ver na 2.ª
Mesmo naqueles que inda procuram seguir o parte).
·formulario classico, a desabusada libertação con­
temporanea permite construções que horrorisariam O canto nacional apresenta uma variedade
formal que sem ser originalidade dá base vasta prá
a Stamitz, e ao proprio O. Franck talvez. Se obser­
criação artística de melodia acompanhada. Possui
ve o "Trio Brasileiro" de Lourenço Fernandez.
uma diversidade rica de formas estroficas com ou
Tratando a forma cíclica pela exposição de quasi
sem refrão. Mesmo a melodia infinita encontra
todos os temas no primeiro tempo o artista. fez dêste soluções formais típicas nos cocos. É verdade que
uma verdadeira conclusão antecipada. A Coda do na segunda parte dêste livro dou apenas uma amos­
alegro-de-sonata sobre o tema do "Sapo Jururú" tra do que são os cocos. É que reservei a maioria
assume no Trio o valor de cabeça e não de cocla: dos documentos colecionados pra um livro que sairá
é o tema predominante. Com a constancia dele e o ano que vem. Dentre os desafios muitos se reves­
a circulação contínua dos outros temas sucedeu que tem duma forma estrofica tão vaga (2.ª parte, os
o Trio apesar de formalisticamente tradicional ad­ dois desafios com Mané dos Riachão) que são reci­
quiriu um caracter ele parte unica duma unidade tativos legítimos. Ainda sob o ponto-de-vista da
indissoluvel em que os andamentos diferentes são melodia infinita os fandangos paulistas são de mo­
valores expressivos de estados-de-musicalidade do dêlo bom. E ainda lembro os martelos, certos lun­
artista e não mais as partes dum esquema formal clús muito africanisados ("Ma Malia" na 2.ª parte;
obrigatorio. Tudo feito com uma logica admiravel. "Lundú elo Escravo", Rev. ele Antropofagia cit.
64 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 65
País de povo desleixado onde o conceito de Patria
n. 0 6) as parlendas, os pregões os cantos-de-traba­
é quasi uma quimera a não ser pros que se aprovei­
lho sem forma estrofica, as rezas das macumbas.
Todas essas formas se utilisando de motivos rit­ tam dela; país onde um movimento mais franeo de
mico-melódicos estratificados e circulatórios, nos progresso já desumanisa os seus homens na vaida­
levan do pro rapsodismo da Antiguidade (Egito, de dos separatismos; país de que a nacionalidade a
_ unanimidade psicologica, uniformes e comoventes
Grecia) e nos aproximando dos processos lirico­
diseursivos dos sacerdotes indianos e cantadores independeram até agora dos homens dele que tudo
ambulantes russos, nos dão elementos formalisticos fazem pra disvirtua-las e estraga-las; o compositor
e expressivos prá criação da melodia infinita carac­ que saiba ver um bocado alem dos desejos de cele­
teristicamente nacional. bridade, tem uma função social neste país. O côro
umanimisa os indivíduos. Não acredito que a mú­
Tambem quanto a formas corais possuimos sica adoce os caracteres não. Si nos tempos de Sha­
nos reisados e demais danças dramaticas, e nos cocos kespeare adoçou já não faz isso mais não. Os
muita base de inspiração formal. Nos cocos então circulos musicais que assunto de longe são sacos de
as formas corais variam esplendidadente. gatos. A músiea não adoça os caracteres, porêm o
Ora eu insisto no valor que o coral pode ter côro generalisa os sentimentos. A mesma doçura
entre nós. molenga, a mesma garganta, a mesma malinconia
a mesma ferocia, a mesma sexualidade peguenta, �
Musicalmente isso é obvio. Sobretudo com a mesmo chôro de amor rege a criação da música na­
riqueza moderna em que a voz pode ser concebida cional de norte a sul. Carece que os sergipanos se
instrumentalmente, como puro valor sonoro. O espantem na doçura de topar com um verso deles
Orfeão Piracicabano empregando silabas conven­ numa toada gaúcha. Carece que a espanholada do
cionais adquire efeitos interessantes de pizicato, de
baiano se confraternise com a mesma baianada do
destacado breve ou evanescente. E em boca-fechada
goiano. E si a rapaziada que feriram o· assento no
obtem efeitos duma articulação e fusão harmonica
pastoreio perceberem que na Ronda gaúcha, na
absolutamente admiraveis. Ainda aqui o exemplo
de Vila-Lobos é primordial. Se aproveitando do toada de Mato-Grosso, no abôio do Ceará, na moda
cacofonismo aparente das falas amerindias e afri­ paulista, no desafio do Piaui, no coco norte-riogran­
canas e se inspirando nas emboladas êle trata ins­ dense, uma chula do rio Branco, e até no maxixe
trumentalmente a voz com uma originalidade e efi­ carioca, e até numa dança dramatica do rio Ma­
cacia que não encontra exemplo na música univer­ deira; lugar de mato e rio, lugar que não tem gado,
sal ("Sertaneja", ''Noneto", "Rasga Coração" p ersiste a mesma obcessão nacional pelo boi, per­
_
eds. cits.) siste o rito do gado fazendo do boi o bicho nacional
por excelencia. . . É possivel a gente sonhar que o
Jl,fas os nossos compositores deviam de insistir
canto em comum pelo menos conforte uma verdade
no coral por causa do valor social que êle pode ter.
66 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 67
que nós estamos não enxergando pelo_ prazer amar­ L. Gallet já se aplicou em parte a isso numa serie
goso de nos estragarmos pro mundo ... de peças infantis a quatro mãos, inda ineditas.
Quanto á música purà instrumental possuimos Sambas maxixes cocos chimarritas catiras cu­
numerosas formas embrionarias. A forma da Va­ rurús faxineiras candomblés chibas, baianos, recor­
riação é muito comum no populario. O que carece tadas, mazurcas valsas schotis polcas < 1 > bendenguês
é especificar e desenvolver nossos processos de va­ tucuzís serranas, alem das que possuem uma só
riação. Ela ocorre de maneira curiosa nos maxixes música propria e particularisadas por alguma pe­
e valsas cariocas sobretudo na maneira de tratar culiaridade coreografica e entituladas pelo texto que
a flauta. O "Urubú", sublime quando -executado nem "Quero Mana", < 2> "Caramujo" "Dão-Dão"
pelo flautista Pixinguinha, afinal das contas não "Mangericão" "Benzinho Amor" "Nha Graciana"
passa dum tema com variações. Nos cocos a varia­ "Assú" "Urutagua" "Chico" "Benção de Deus" etc.
ção é comum. Por vezes não são os temas estroficos etc. Alem das dinamogenias militares, dobrados
que variam propriamente porêm se apresentam marchas de carnaval etc. Tudo isso está aí pra ser
acrescentados de parte nova ou com um dos elemen­ i. estudado e pra :ipspirar formas artisticas nacionais.
tos substituidos por outro que nem se verá nos "Fan­ E alem de serem formas isoladas fornecem fun­
dangos da Madrugada" e na versão araraquarense do vasto prá criação das Suites de musica pura. E
do "Sapo Cururú" (2.ª parte). Por vezes as va­ si a metrica das nossas danças obedece no geral á
riantes duma peça muito espalhada assumem o i obcessão brasileira da binaridade, os ritmos, os mo­
aspeto de verdadeiras variações que nem no caso do vimentos são variadissimos e com êles o caracter
"Canto de Usina" e do coco junto dele (2ª parte). tambem. A forma de Suite (serie de danças) não
Quanto a danças temos até demais. Si pela é patrimonio de povo nenhum.· Entre nós ela apa­
expansão grande que teve a forma coreografica do rece bem. No fim dos bailes praceanos, até nos
maxixe, êste, o samba, a embolada, o cateretê, se chás-dançantes é costume tocarem a música "pra
acabar" constituida pela junção de várias danças
confundem na música popular impressa e praceana,
de forma e caracter distintos. E si de fato não
isso não se dá nas danças de tradição oral. Cada
basta -essa brincadeira possivelmente de importação,
uma delas tem a sua coreografia e seu caracter, em­
bora a gente possa reduzir todas a tres ou quatro não sei, pra justificar a forma de suite como hábito
nacional, ela ocorre noutras manifestações tambem.
tipos coreograficos fundamentais, que nem já fez
Nas rodas infantis é comum a piasada ajuntar um
Jorge M. Furt ("Coreografia Gauchesca" ed. Ooni,
canto com outro. Chegam mesmo a fixar suites com ·
Buenos Aires, 1927) com as danças argentinas.
Carece pois que os nossos compositores e fokloris­ (1) As formas de importação que cito já tiveram uma caraeterizaç.ã.o
nacional. Não cito o tango argentino e o fox-trote porquê não adqui­
tas Yiio estudar a fonte popular pra que as danças riram carácter nacional inda aqui: são simples pastichos.
se distingam rnilhor 110 caradcr e 1ia forma. (2) No sul de S. Paulo, "Quero Mana" tambem é sinonimo de Desa­
fio. Então não é dançado.

J
68 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 69
sucessão obrigatoria de peças. Uma das minhas aiu­ empregar motivo afrobrasileiro), (sem movimento
nas me exemplificou isso bem com uma roda grande predeterminado) ;
composta de tres melodias tradicionais reunidas e 6 - Dobrado (ou Samba, ou Maxixe), (bina­
que as crianças da terra dela jamais imaginariam rio rapido ou imponente final).
que não fosse uma roda só. Os cortejos semi-reli­
giosos semi-carnavalescos dos maracutús nordesti­ Suites assim, dentro da preferencia ou inspi­
nos não são mais que uma suite. Nas cheganças e r'.1ção individual, a gente pode criar :numerosis­
reisados a mesma forma é perceptivel. O fandango snnas.
do sul e meio do Brasil si na maioria das feitas é E já que estou imagi,nando em peças grandes,
sinonimo de bailarico, função, assustado ( aliás o é facil de evitar as formas de Sonata, Tocata etc.
proprio baile é uma suite) muitas vezes é uma peça muito desvirtuadas hoje em dia. É seguir o exem­
em forma de suite. plo de C. Franck no "Preludio Coral e Fuga".
A mim me repugnava apenas que suites nossas Dentro de criações dessas, sempre conservando a li­
fossem chamadas de "Suite Brasileira". Porquê berdade individual a gente podia obedecer á obces­
não "Fandango", palavra perfeitamente naciona­ são humana pela construção ternaria e seguir o con­
lisada 1 Porquê não "Maractú" pra outra de con­ selho rasoavel de diversidade nas partes. "Ponteio,
junto mais solene 1 Porquê não "Congado" que Acalanto e Samba"; "Chimarrita, Abôio e Louva­
tantas feitas perde o seu ritual de dança dramatica ção" etc. etc.
pra revestir a forma da música pura coreografica
E. mesmo formas complexas destituidas de
da suite 1 Ou então inventar individualistamente
caracter coreografico, de música pura ou com in­
nomes que nem a "Suite 1922" de Hindemith, ou a
tenção descritiva ou psicologica, que nem as peças
"Alt vVien" de Castelnuovo T!ldesco.
de Schumann ("Kinderszenen", "Carnaval" etc.),
Imagine-se por exemplo uma Suite: de Debussy ("Iberia"), de Malipiero ("Rispetti e
Stramboti") e tantos outros. Ora os nossos reisados,
1 - Ponteio (prelúdio em qualquer metrica
ou movimento) ; bumbas-meu-boi, pastoris, sambas-do-matuto, seres­
tas (serenatas), cirandas se prestam admiravel­
2 - Cateretê (binario rapido); mente pra isso. Si um compositor tiver seu "Bum­
3 - Coco (binario lento), (polifonia coral), ba-meu-Boi" ou o seu "Chôro", isso imped•e que
substitutivo de sarabanda); outro crie o dele tambem 1 E si pode utilisar nessas
formas os proprios temas populares, como êstes
4 - llfoda ou Jl,fodinha (em ternario ou quar­ mudam de lugar pra lugar, de tempo em tempo,
tenario), substitutivo da Aria antiga) ; de ano em ano até, o quê que impede a utilisação
5 - Cururú (pra utilisação de motivo ame­ nessas formas de temas inventados pelo· proprio
rindio), (pode-se imaginar uma dança africana pra compositor 1 Nada.
70 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 71
Não é na procura de formas características que coincidir com uma pesquisa de outro e muito me­
o artista se achará em dificuldade. Pori'rn <luas nos aceitá-la pronto: vira pra nós um imita­
coisas se opem á fixação e generalisação de formas dor frouxo ( 1 ). Isto se dá mesmo entre literatos,
gente que por lidar com letras é supostamente a
nacionais: a dificuldade de estudo do elemento po­
mais culta. A mais bebeda, concordo.
pular e o individualismo bastante ridículo do bra­
Todas •estas constatações dolorosas me fazem
sileiro.
matutar que será difícil ou pelo menos bem lerda
a formação da escola musical brasileira. O lema
Nosso folclore musical não tem sido estudado
do modernismo no Brasil foi Nada de escola! . ..
como merece. Os livros que existem sobre êles são Coisa idiota. Como si o mal estivesse nas escolas
deficientes sob todos os pontos-de-vista. E a pre­ e não nos discípulos ...
guiça e o egoísmo impede que o compositor vá es­
A nossa ignorancia nos regionalisa ao bairro
tudar na fonte as manifestações populares. Quan­
em que vivemos. Nossa preguiça impede a for­
do muito êle se limitará a colher pelo bairro em que ma�ão de espiritos· nacionalmente cultos. Nossa
mora o que êste lhe faz entrar pelo ouvido da janela. paciencia faz a gente aceitar êsses regionalismos e
êsses imliviclualisrno's curtos. Nossa vaidade impe­
Quanto á vaidade pessoal si um músico der de a norrnalisação de processos, formas, orientações.
pra uma forma popular uma solução artística bem E estamos embebed'aclos pela cultura europea, em
justa e característica, os outros evitarão de se apro­ vez de esclarecidos.
veitar da solução alheia. Nós .possuímos um indi­
Os nossos defeitos por enquanto são maiores
vidualismo que não é libertação: é a mais pifia a que as nossas qualidades. Estou convencido que º
mais protuberante e inculta vaidade. Uma falta _ .
brasileiro é uma raça admiravel. Povo de 1rnag1-
de cultura geral filosófica que normalise a nossa nação fertil, inteligencia razoavel; de muita sua­
humanidade e alargue a nossa compreensão. E vidade e perrnanencia no sentimento; povo alegre
uma falta indecorosa de cultura nacional. Inde­ no geral, arnulegado pela malinco11ia tropinil; gen­
corosa. te bóa humana, gente do quarto-de-hó,pedc; gcu-
(1) Um tempo criticaram ridicularisanternente Lourcrn�o Fl'rllmHll'z por­
A falta de cultura nacional nos restringe a um quê plagiara na "Canção Sertaneja" (ed. Bcvilaqua) o acornpanl1:1mento
da. "Viola" (Miniaturas, n.0 2, ed. C. Artur Napolci:ío) (fo Vi\ln-T.nbos.
regionalismo rengo que faz dó. E o que é pior: A entumecência individualista impedia do verem que si os dois rornpnsitores
se aplic::wam a transpor pro piano processos instrumentais pop11larc:-:i, ha­
Essa ignorancia ajudada por urna cultura interna­ viam de coincidir nalgum ponto. E sobretudo ninguém não 1•t> rt•(•lwu que
cional behecla e pela vaidade, nos dá um conceito do mesmo tendo hal'ido aceitação da parte de L. Fernandez, pois que o
processo não era invenção livre do autor da "Viola" mas trnusposir::i�i
plágio e da imitação que é sentimentalidade pura. dum processo popular, havia largueza culta em Lourenço FernanrlPz ace1-
t.ando uma solução alheia e qu<l essa largueza homenageava o outro autor
�inguem não pode concordar, ninguern não pode em vez de diminui-lo.
72 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 73

te acéessivel (Bertoni, ".Anales Científicos Para­ co principalmente aqueles uns que não sacrificados
guayos", Serie III, N. 0 2, 4.0 de Antropologia, ed. ao ramerrão da platea internacional, guardam me­
"Ex Silvis", Puerto Bertoni, 1924: livro que devia moria dos nossos compositores nos programas deles .
de ser cartilha pra brasileiro, e de muita matutação .A unica bereva da nossa música é o ensino, pessi­
quando fala na fusão das raças aqui) ; povo dotado mamente orientado por toda a parte.
duma resistencia prodigiosa que aguenta a terra É possível se concluir que neste Ensaio eu re­
dura, a Sol, o clima detestavl'is que lhe couberam moí lugares-comuns. Faz tempo que não me preo­
na fatalidade. Mas os defeitos de nossa gente, ra­ cupo em ser novo. Todos os meus trabalhos ja­
pazes, alguns facilmente extirpaveis pela cultura e mais não foram vistos com visão exata porquê toda
por uma reação de carater que não pode tardar mais, a gente se esforça em ver em mim um artista. . Não
nossos defeitos impedem que as nossas qualidades sou. .A minha obra desde "Paulicea Desvairada" é
uma obra interessada, uma obra de ação. Certos
se manifestem com eficacia. Por isso que o Bra­
problemas que discuto aqui me foram sugeridos por
sileiro é por enquanto um povo de qualid•ades epi­
artistas que debatiam-se neles. Outros mais faceis
sodicas e de defeitos permanentes. entram pra que meu trabalho possa remediar um
Mas êste Ensaio vai acabar menos amarguento. bocado a invalidez dos que principiam. E si o es­
crito não tiver valor nenhum sempre o livro .,se
O Brasileiro é um povo esplendidamente musical.
valorisa pelos documentos musicais que seguirão
Nosso populario sonoro honra a nacionalidade. .A
agora.
transformação dele em música artística não posso
dizer que vai mal não, vai bem. Figuras fortes e
moças que nem Luciano Gallet, Lourenço Fernan­
dez e Vila-Lobos orgulhavam qualquer país. Den­
tre os nomes das gerações anteriores, varios são
ilustres sem cond'escendencia. Carlos Gomes pode
nos orgulhar alem dos pedidos da epoca e nós temos
que fazer justiça a quem está como ele entre os
milhores melodistas universais do sec. IX. Os
mais novos aparecendo agora se mostram na maio­
ria decididos a seguir a orientação brasileira dos
tres mestres que me serviram de documentação nes-
te livro. Dos nossos virtuoses, alguns notabilissi- '
mos, não honro êstes não: me interessam e glorifi-
2.a PARTE

Exposição de Melodias Populares

1
. tí
' Í.

1 i;
!

r
Notas esclarecedoras da grafia
musical

Os sinais de notas entre parenteses e excedendo do


compasso indicam prolongamentos pequenos de
som feitos pelo cantador.

Nas peças sem segunda voz obrigada as notas du­


plas indicam variantes melodicas.
Nos compas.ô<JS em que a seminima é unidade de
tempo indico apenas o número dos tempos.
O sinal > indica acentuação mais intensa.
O sinal - indica acentuação menos intensa.
O sinal ;l;I; indica apressando pequeninho.
O sinal�indica pequena mutação do andamento
pra mais devagar. Mutação e não ralentado.

6
[ Musica Socializada

1
l
Canto Infantil

.F) m
A,alanto,
.....
1
Higiene
IJ f¾e::F411-+E,H I J m I ....--+"'
--�-
n = a�
M� .u.m.abo . ,u.a,\'1n .d1dà8a . J. 1o,To .au.õ1.1e me . "!.no,Lo..�aJ111.ba . cl.&!

\,_,
I. II.
' Mucama bonita, Bacia de prata
Vinda da Baía, Lavada eom sabão,
Toma êste menino Toma êste menino
Lavai na bacia!

r
Vesti-lhe o roupão!
1
III.
Roupão de veludo,
Touquinha de fil6,
Camisa de renda
Lhe deu a vovó.

82 MÁRIO DE ANDRADE lêl'.SAIO 8ÔBRr: A MÚ>HCA BIL\SU,l•}IRA

Na versão de Franca, alem de variantes nestas Roda A Pombinha voou TAUBATE {S. p4�fo).
tres estrofes, tem mais duas :

IV. V
Menina bonita Vovó é .muito brava,
Não dorme na cama, Não gosta de �anha:
Dorme no regaço · Bate com cip6
Da sua mueama. Na bundinha . de Loló !

Acalanto. Nigue Ninhas PARAÍBA

�11,., ·rr·- -
J º ne,
..J 1• U t'. t'. ( Fff Maria, quando tu fores,
I

Nigli& aigue m.nhu 'Iiobo..nJ.t1.rth.t.1Mit.cam.ba,vl o. la.,De p,i r1e gangu1.n.hao'

#kT L7Tr
Me escreva lá do caminho;

�_J 1·
Si não tiveres papel,
Nas asa.a dum passarinho 1
Eh!.•• ___ lm • � tlllTl.be • l:i Mu. ,..o.p;o • lã Qui • na qu, n�! ..
Refrão A pombinha voou sem d6 l J bts- ..
Nigue nigue ninhas A Maria foi-se embora e me deixou l
Tão bonitinhas
Macamba, viola, II III
De pari e ganguinhaa 1
J!lhl.. Nas usas dum passarinho De boca. faZ um tinteiro,
Imbê tumbelá Eu não posso éscrever; Da Hngua pena dourada,
Mussango-lá � As asas são de penas Dos dentes letra miuda,
Quina quinê ! .• 1 Com penas não escreverei. Dos olhos. carta fechada 1

Refrão RefrãÕ
A pombinha etr,. A pombinha. eto.
O texto vai grafado como . . . senti. Não co­
nheço lingua de africano e a volta foi cruel.
Roda
' Canoinhs nova CAPITAL l'EDXRAL.

�rtffi
•, 9d.

João Csmbuête

w oo 1m n 1� i 1 □ i1
Aca1&111o PERNAlfBUCO, MAmãi fU �ou, MAmii., eu ,·ouhus.�ar A,.._. no. 1.nhn no,,·a.Queca.!u no ma.r!
J,r.4' ...---:,;-
1
, �. a. p 1,) 11,mm I Mumãi eu vou,
I II
Pus o cravo na janela
João,dio Joio! JoãoC&mb11ête,Mtu fi.Jho,TomallL\u.a te.ta,mturLlho, Eh! dio Joio Mamãi ,eu vou buscar, Pra sinh 'Aninha cheirar,
A canoinha nova Sinh 'Aninha de pregui�a
Que ca.iu"no mar!, Deixou o cravo murchar.
João, dão João 1
João Cambuête, III
Meu filho, Menina dos olhos grandes
Toma lá tua teta, Não olhe pra mim chorando,
Meu filho, Que os teus olhos são a causa
Éhl ... dão João 1 De eu andar assim penando.

84 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 85

Rod11. Sodade Sambalelê

�wJ □ i o u J , n 15•• F .n I n , m 1
MINAS. Roda
"
J:M. LARANJAL (Slo i'a�to!.
J,,oo r r
Ca.lu 1<11'1 en.•l'O do céu, So • d.o..de! De ti.o ai.to dti.fo.lllt,u: So • da.de! Queniqul.
�l\t,, nJDJ IJ J 1 •E1JJI)I;
• J ljJJOJIJJ
r r F Q_j J J QatJ J J f"J J o -1
•Samb11.. le.lê 'si& do • en. te, 'St& com a cabeça que. br11.. d.i., •Blmba.. !e.lê preei ca. • n
�i
d ca.aá
1
cu. mi.go,Al,Sn. da. de!
'1
v,.; pe • diaqqemma cri.ô. Ai, s,
1
d11. de!
t
,�1 l:l 1 J
É d�.ma&bo.u l&m.
7J IJ J ba..da.6
IA • J IJ I J JJ21J-J43±.E
·PI.H, pi. H, pt.sa. mu.la.. ta, Pi.u n&ba.r.ra. da

Caiu um cravo do céu,


Sodade 1 -
Quem quisé moço bunito,
- Sodade ! -
�p
tt
J J J J J I J J J J IJ l J l l
111.. la., 1!1-u.l•.t1t! ·Pl.u., pi.u, pi.&& mu.la..\a.,
IJ. J J •• 1.
Pi. sa d11
JJ J J
11, mu.la .u!
De tão alto desfolhou; Arme um laço na parede;
na.borra.

- Sodade 1 - - Sodade t - 1.
Quem_ quisé casá cumigo, Inda onte apanhei um
- Ai, sodade 1 - - Ai, soda.de 1 - Sambelelê está doente,
Vá pedí a quem me criô. Num laço de fita verde! Está. com a cabeça quebrada,
- Aii soda.de l - - Ai, sodadc ! ··- - Sambelelê precisava
É dumas boas lambadas
Pisa, pisa, pisa mulata l
· Pisa na bara da saia mu- �bis.
lata!J
Rod& Padre Francisco II. III.

□ 1J)I.J
J, ...
iU
10 l J J J 1
- ôh, mulata bonita
li'il" !J l ,1 Jlr J ll - ôh, mulata bonita,
Como é que se namora f Onde é que voce m6ra,
- Põe-se o lencinho no bolso, - Moro na praia Formosa,

s n l5 1
Se.nhorpa.d111 Fran.c!1. eo\ O quo ê,meu a. • mllr? Sa.nhorp&.dr,, F'n.n.

1
� ,» e r 1, JJ JJ3 1 1 111&1"';' _J''J JJ J J IJ J J Com as pontinhas de fora. E daqui vou-m� embora 1

"r
cis.col • O que r',meu & • mor? Eu.ma.velhAmlli.to vo.lh&que&qulvemsecorJu. Pisa, pisa etc.
,•11¾ J j 1 ô Jj •e: J j .EE 1
J 1 JI " CANTOS DE TRABALHO

n ; •J
, .. 1r1, B do.pois de e011..re. lt,. d& dois bPi. Jl.ithoc ,ou lhe di(r!, J,lu,de en.\ri. !ri! M&nde en.

��i; J 1; ' 11
Ronda R, GliANDE DO SUL.
( Znu 111i1116,...ir<1),

tri. trHQll'euJiTOUihe OOnJ'H • ,i. (r),

- Senhor padre Francisco ! Jl bis


•J 1 1 r i r r Ir r r r Ê ê rl
li. C4n. 111..do, Meu r�.lho t& re.ben. ta.do, ldinll&.teo.po.ru t.i.oque.
QI
- O que é, meu amorf
�I CiD JJn I Di-4h---'4B
br&du,lde� l&.GO t,Í. desar • ma.do.

- t uma velha muito velha - Mande entrá ( T) l Mande en-


Que aqui vem se confessá ( r), [trá (r) ! �leu cavalo tú eans1do,
Que eu já vou lhe confesai (T). .Meu rellÍo tá rebentado,
E depois de confessada E depois de confessada .Oiinbas esporas tão quebradas,
Dois beijinhos vou lhe dá ( r). Duas praga ( s) en vou rogã {-r l ! Meu laço tá. desarmado.
MÁRIO DE ANDRADE 1-:NSA!O SÔBBE A MÚSICA BRASILEIRA 87

;.... Pedreiros CAPITAL ,.,,RAL


Canto de wiina.. Cana-Fita
1!2.
PKRNA!,!BUCO,
> > >, > > �.
11-J.tk
� }3Jj l]Õt IJh .JJ IJjf'IIO.JJ l;j1 lfz•d l 1,Jt 1 >-- >-
&
.p*J=
□ t1 Ir·
Eu •. pra.ntei ... 111, na.rH.la do Só
e • e r Ii ·
Pn. 11.u.cê mi • Ó: Nu.ctu a ca..u. •

1,r € r r u i r­ s E
O.1.o.i, o. i! O1,amcu-enirih& o.l O.i,o.l, o.i� Ol,&more..ninh.t., o.li

� tt 1 1
A u • 11.oaa • pi •

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h., Ca.111, ,,... 1• • tê ra1Au11. e• do

t:J LJ IJ .) ' 1
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pri •

t ...
r � U @ 1J 1 11 1 �
-# '·
,
Oi! (ter)
r.Toma cô bo • 111.h, A u. dna.a. mii • u. Tema câ bo. aJ .11.,
Oi, a moreninha, oi!

Eu aprantei cana A usina apita,


Na resta do Só Cana nas istêra !
Este canto-de-trabalho admiravel foi me comu­ Pra nascê mió: Assuca de primêra
Nasceu a cana-fita. Tem a cô bonita.
nicado por Germana Bitt.encourt. Não é perfeita­
mente meladisavel no grito "Oi!" (olha!) A vogal (' una-fita, cana listrada. Resta = Restea.
··o" é bem nítida e sonora mas baixa num port.a­
> Canto ·de u11ina.
�-:160.
Ai! Baiana
l . n Il l j l J m IJ n n.f¼
mento em decrescendo de forma que o "i" do P.RRNAMBUCO.

g-rupo vocalico sai pianíssimo e se torna quasi oral. !i,V 1 4 .j


1� j
Co • lo • 01&, u. 11 .11& C• • ten.de, Ro.ç•.dim de oell M�n.de, Pi.ra.n.gl de

i J J J, J, D I J 3 .) J l l I J j l l l LLl.. r Q /j7
1
PIBlfAMBUCO
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ba..J..., •• do!
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O ,, Ai!
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Bo.l • •. 11a,
Bal • a. 1111,,
• .,.;""'"
i,
i 1 ;i , , .) .) i UJ.
Bal • 11, • m. quaiiquo ha.11-
B�i • 11,. no., meu a..mÔ1 _
n
llh, oomp&.llhelro, hlllll! Eh, leva.n.t11-p1uira,hum! Êh,linme'.la,

�-1r QrêJ
- � Colonia,, (}a,tende, Roçadinho, Pirangi, = no­
bwnl Êh, li pe.u. d&� hum! Êh, bQ.ta. fôr.�, hum! mes tle usinas. Mende = Mendes; Cando = Can­

� f u DâJ 1[
clido.
Êh,comp&llhell<l,hu.m! Êb,plllC.,pedra, hum!
Neste canto o ritmo é curioso por causa do
Eh l&Veme.J&acola, hu.m!
desencontro de acentuações de ritmo musical e
poetico.
Eh, companheiro, hum 1 I,
Êh, levanta: pedra, hum! Colonia, usina datende,
Êh, lá vem ela, hum! Roçadim de seu Mende, Ai! Baiana,
�h, ( es) tá pesada, hum 1 Pirangi de seu Cando, Baiana que é que hai f
�h, bota fôrça, hum 1 Neste mundo eu ando Ou! Baiana,
:Glh, lá vem ela acolá, huni ! Cumprindo um sina Baiana, meu amô !
�h, companheiro, hum! Q11i inté nas usina
:flh, puxa pedra, hum! ,Hl tou trabaiando !
88 ;n iH rO DE ANDRADE ENSAIO SÔBBE A MÚSICA BRASILEIRA 89

il. Ill A êste canto-de-usina se pode comparar e acei­


l':.iim:ue, Hcbcrão, hcada Da usina .:iou cuUo de istera,
Eu teHho nmtr namorada Trabaio nas cardêru. tar como variante, êste que segue, delicioso :
Que me deu um broqué; Da luz do motô,
A yorta é crué Sou distiladô 5sperfo, m,u stm rigor. R. ORA..''IDB 00 NORTE,
Na namoração,
@�
De esprito de vinho,
#
No apêrto de mão Intendo um -poquinho ''11 1 ,,ª'}uf,�
Foi s'imbora o ané! De cunzinhadôl
Bal. &.n1,q11emfo1qae� d.i.zeQue ba.l&do
Ai! Baiana, Ai! Baiana, etc.
etc. .---,-..
lV. D} fflgl-1iffeJnJ J @J

�s� .ma+wi
Baiana só qué bebã vinho ;Lfle Ma.\ &.va run.
�mi A bn.la que 111&.u. o b:i.la de re.
Zinebra Fokinho,
Conhaque e licô;
Cigarro Condô > ;.> - ---
Marca Lafayettc, voJ.vc, Cbnquoc!enstrP.mo.vc,'from..b,..d� de trem._
Toma deforéte
Quando .fai cnlô. Baiana,
Ai! Bain.nn. f'fo. Quem foi que te dixe
Que bala de rifle
Matava ninguém!
A bala que mata
Pabna.re:g, R-iberão, Escada, são usinas. Broqué :É bala de revolve,
= hroqnel, enfeite, presente. Choque de �siromove, (autom6-
[vel) (!)
Trombada de trem.
"11 volta é, cruel" pra indicar que o caso é peri­
goso, sofredor.
A primeira frase, que aliás não apresenta ne­
Os quatro ultimos versos da segunda estrofe nhuma originalidade grande, é sempre curioso de
significam que a mulher gosta de explorar o namo­ comparar com êste passo duma cantiga popular
rado e que num simples aperto de mão depena o russa:
camarada.
Cunzinha.dô = Cozinhador. Profissão das mais
bem pagas nas usinas. O cunzinhadô é que dá o
ponto no mel de que vem o assúcar. (L«e•gn•<. "Ruim•� ,;,, ln Musiq�" �d. Dtlt1gr,s,.,,P,,ris,

Zinebra Fokinho = Genebra Fokine. Cigarros


/</ P11.rt� �QI. V, •••!""ºª"'�"U pgs.2188 �3211),

"Condor" da fabrica Lafayette. Tambem numa "Saltona" das Canarias aparece


Deforéte = descanso, sesta.
o movimento :
Este canto faz parte tambem do "Samba do
"Matuto" especie de dança dramatisada, transição,
diz Ascenso Ferreira, entre o Maracatú e o samba (l) A silaba "ve" do "ostromove" é qmrni inexisbwte. .\ pro­
aodia é "ostromov''.
comum.
90 MÁRIO DE ANDRADE E:\iiAlO 8ÔBHE A MÚSICA BRASILEIRA 91
Canto de u11ina. Sabado de-tarde PERNAMBUCO.

ff-����,jl
Fanjangoe FORTALEZA (c,a,,i).
J=n. m -�
,�" , tf-1-bn-i±��R(�ri �
S&.bo do \ar.d• Na vor .to do C'u...6B • u Le.van.tci ban.de.�a a • .ui, Mo.de olHmpun;Al., Ma.ne
A.

�� � Wt-FfFV-® -' -=-'5-½a±idf.i -1:j:@


Br&.I TumtLle.a.to de Ili<'> . tô Na ge dP d� Cn.i• . di, Qnc.ro vit" pa..u, voa?
----:r-- -:r--
,, , J Iâ] J J y.'&R-i #J=@_-tt'ftrt..-&n J#jJjll
Pouco ffl<!n-OS.
Culhidt>s na Praia do P1u.\•' .

...__,z__...
E ... ta mi.nha m.ú10. _ Fa. ço um ,h,lé de <>oro,D,nlr<>ponhuumtuouro Doo depr,so!'l• a.opa.trio!

Batuque. Jablrá
Saho dP tarde
:-;:.1 rnrta du Cucaú
Len111td lJ:rndera azú J-j esta a minha razão
.:\lode o trem passá; Faço um chalé de ouro
Ai, M:rnt' Brai Dentro ponho um tezouro
Tem talento de motô, Do_u de presente ao patrão!
Na sede do Caiadô
quero vê a pnia voú

DANÇAS
Samba Subi pelo Tronco
•=' 10◄•
SÃO PAULO.

�J üJAç ULJJ i DnJF)l I Q d I PJ H EB-81


Su.bi �-lo ttoru,o,dr,;c,I pd� r,a..io;Vl.vu. LeiTreicde Maio! Vi.uaLciTroie® K,Jo!'

SnUi yelo tronco,


IlPBci pelo gaio;
Viva a Lei Treze de Maio (bis)

l<Jrn easa Branea existe a quadra:


l:;ubi pelo tronco,
J )es<:Í pelo gaio;
Mariea, me acode
l:-iini'i.o eu caio!

Fand•••o

Rema que rema NOROBSTB
p
'"ª"·
" •• • • 1 • l j- § - - ,- do
�'il'll� ? J l • 1•J.j
' - =' - ��J- O refrão inicial traz verso obrigado:

� ►A,hJJ 1 0 J JJ Ia 1 t JJ J 1 9 O J J • 1 w l -11
O quebra-quebra Jabirá
J<j.u c1nero vê quebrú !
úh qw�bra aqui, qnebni :11·0!:'1 '.
(ltmrqné geito é 1p1t> hn\:
92 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 9:3

Quadrilha
As toadas e danças, principalmente na zona

J : 112. YARAJÓ.

<la Leopoldina, seguem sempre êste prelúdio tradi­


,.. FJ1.'ffl 10 JJQ HU FJ1HJH IJ .n 1J3,Jb

cional:
' ;rJ fr 1•J § 1-0 õ 1.g Ê/ i Q I D FJ IJ JLJl1P 1J •li
1 Tanguinho do Clarinetista "'º sou•ôzs.

u · r:r1u·--tt 1 8 , 1i HEJdd
"=96. - - 1 2

• Batuque Dança do Caroço


CAl'AGtlAZES (l!i...,,).
�F,�p,, 1 ;r rEr ,
J::ni.

�w," �]ffj § Ir" tdÕJ Ü ir'


A d.o.n.ç-. do C'a. ro • çoÉ& .d,,n.ça. do ineu bem
PitlÜ 1
A d&11.ç& do Ca..
l@a a I L· e 1[JIcftrá# u Io lf ID'Cl 1� ,li
Colhida dum clarinetista que ia na 3.ª do São
,� r kfüuro • 90Ea dan.ça do meu
'F' litutf iELJLJiruui
bt:n Cor. re,dan.�a.<la cor. :e,dan..ç11.dô Cor. 111qunpolieiu1.
Salvador, vaticano subindo pra Iquitos em Junho
de 1927. É uma variante da melodia sem letra da
li "Ciranda" que escutei na mesma viagem e de que
nml Cor. red&11.ç1..d3 eor . redan.ça..dol Cor. r11que1.po.li.rJ.i..e . nm! dei nota pela "Revista de Musica" de Buenos
Aires, N. 0 6.
A dança do Caroço
É :1 Clan�a do meu bem
8ono, dançadô, corre, dançadô, Valsa. lenta. Saudosa

a +±Ei-uGi Ir '
J: !00.
c•rr 1
Corre, que a polícia evem ! .SÂO PAULO.

i r 1 � R©r· tu Ir
Ru balo
•• #··
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,011=,<�

Bat.uque Cará CATA0OAllS (Jl'la.,)


Mil

1c r J r lc , rtfêrr111,ttta 1n,tttc1r·w 11 w!D ElJud


> > 11. >

v., CC tr
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r:«rr r 1 · 1, fLEcp r 1,t.tâf I r- 1 ·' r I r- 1
f'a./1. oltlmpo
lt, , N1.
11, r 1, r
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� t,.; 1 ir H �

-prr_!ft11 ttiÊia I r 1,c1�_ r 1JP 1J) 1J@


Botei meu cará no fogo, Eu quero falá, eu quero
Maria pra vigiá, Na earritia do "dão"
:Maria mexeu mexeu, As moças de Cataguaiz Esta valsa em duas partes foi Mario Amaral
Dcixô o eará queimá. Não anda de pé no chão que fez. Era musico a valer. Não estudou nada ou
quasi nada e por essa felicidade conservava um
No nordeste chamam de "carretilha" aos re­ cunho forte de 'Brasil dentro de si. Ficou hetico
refrães em metro mais curto dos "martelos". trocou o violino prejudicial pelo violão e morren


7
9-t MÜUO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 95
moço. X o violiio chegou a possuir um toque vir­ Algodão
FandRngo.
tuosistico. Só executava composições dele mesmo e CANANEA (S P,11110}

wa11_
Ja.,. �
eram muitas. Dentre tarantelas, preludios, peças.­
caracteristicas etc. só se destacavam mesmo pela J QueeuniopW\lassealg o • dio , La dfl ban.da dn �r.
Ca.ma.r1..d:i. me a.vi . sô. ai!
originalid'ade e ex1JOntaneidade as peças brasileiras, tãn. De bat.:i:o do ma.to
urde.Embaixo do mato ur.
maxixes, tangos, valsas. Não ficou nada escrito dele, r-.do,Quelemo c.... 111&.le.
io, Tam.bemo bl.eho bor.
com excepçiio desta "Saudosa" valsa lenta de boa bio, Ta111bemf\ for.mi.« •
pre1.a,Que &nda. porba!Jt.o do
tempera bra8ileira, melosa e séresteira como o quê,
<JUe ele escreveu por minha insistencia e me deu.
1, 0 J J • i lJ-�1' l' 1
7
e:::Y 1:: 1:::1;
cltã.o.S.z.ra. t11 .lin..g.,., �•1.[o ver . • de Lá t�m q�� fa.; cu, t11 • ci.o!•••

MazUl'Ca. Vacariana

1:�: 1
R. GRAND!:: DO SUL. Camarada me avisú1 ai!
Que eu não plantasse algodão,

m:
Lá. da banda Uo sertão,

:'
Debaixo do mato verde,
Em_ baixo do mato cerrado,
Que tem o camaleão,

); : : a. w : J [
1; 1:;., r 1:.r � 1� ' • 1
Também o bicho borbão,
Também a formiga preta,
,e pote 1 '" 2 """ Que anda por baixo do chão,

□J , : J JJO :
Saracutinga e grilo verde
La tem que faz·-cena�ão!

!I!;' : �J • : 1: 1: o; 1: I: J
�;
"Fandango" no geral é sinonimo de baile. Nele
se dança de tudo e principalmente danças regionais

D! : J
1 fi guratl'as. Tem "fandangos batidos" mais rusticos
j B 1 •: J :l J: J � em que o batepé é obrigatorio e os "fandangos bai­
lados" mais chiques em que o batepé é proibido. Os

1e1:; HJJ: 1 ;;.:].:: . 1: 1: n 1


fandangos que exponho são todos bailados. O canto
sempre em falsobordão e tirado no geral pelos ins­

OJ � •
trumentistas. Quem dança não canta. O fandango
J J.: J é sempre cantado.

f : m •: I;' : 1;, t,t: 1: Lr 4 i J u I n iu 14 i,u J@ ft9 ,,11 1 io n u1i


Fandango De Manhã CANA.NBA (s• .r..10)

3
j J:t28.

Jl : l
"T
�•1 ,,
1 f l Dt lll&llhi aiuuo ce •
Cha.gudulle1.r1 d(I
Nun • ea vi col.11 m.tit
Ili. ahoQ�
ri. (1 Que
Un .da Qun
IMUfOl.to fui 11..tl,
mP po.Mo11n.p1.rli:
d1n.�• do tnn. p.tá.
'Nijn. u v1 col.u. mil• lin da Que o pn.u.. ri.nllo d111.çli!.. , Quu.doeuu..dopron.nu.,
96 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO, SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 97
Texto do 1.° Fandango: 'l'exto do 2.° Fandango:

Os galos jâ 'stão cantando Os galos já 'stão cantando


De certo logo amanhece, Isto é madrugadinha.
Quem tem seu amor ao longe
De manhã muito cedinho Eu vi meu querêquetéque Meu amor foi no cinema,
Muitas saudades padece,
Que meu rosto fui lavá, Sai no baile dançá; Passando pro Seu bemzinho Com traje de alfomadinha.
Cheguei na beira do rio Fazendo que não conhece! ..
Chegou no salão do baile
Que me ponho a repa.rã.:
Nunca vi coisa mais linda Uma dama foi tirá; Vem, minha rosa,
Que a dança do tangará Chegou no meio da casa, Meu a.mor é uma rosa Pra aqui minha flor!
Nunea vi coisa mais linda A dama não quiz sai; Que em qualquer jardim flo­ V�m, minha rosa,
Que o passarinho dançá! [resce l .• Tu sois meu amor!
O povo que viram iaso,
Quando eu ando pro caminho Dele p egam a se ri;
Vou com isso na lembrança:
Nunca vi coisa mais linda Ficou muito envergonhado,
Quando o passarinha dançá! Também já não dançou mais.
Fandango.
Que Moça Bonita
1u,.2!-,8!-,44- vez. IIM vez. <lANANRA (S,hí.to),
Pôs o,ehapéu na cabeça: J:1.2s.

[
- Meus senhores tá-amanhã;
Eu já 'atou eneonvidado
Para o baile de amanhã.
' li j ilJ 1 1 i
Que 11\G-�ll 'bo • 11i •
1
! i i 1 1 1 • } ffl 111 j
la,Nht.Be.ne • dl. t..;
i. FIM,
1
Pa.re.0&11.m& 10 • U,.Nhalla..ri. co. ta.;
Quê-dele meu lenço branco D•oln.t1t.r11. ri. iu.,Nlu.llo..u . li.na;
Que eu te dei para engomá T u.m.a. be • lo. u., Sl.llllATo. re. Hf
Para põ no meu bolsinho Q1Mo11:Llho,; u
Para mais graça me dã.

1 4t vez,

2 Fandangos da Madrugada =.,. rs.,...,,J. li 111@1, li ... e.


''i: J im r. in n in n iu1d ,,u J • ,,
J ...o,. 1. 2. 3.
0 Com teii ra• • to tom. pa • r,1..•
01 ga.loa ji "1Uo un • tan.do De ctr • io lo • ,:o !l.m& • n.lie. ce,
Q11tJritem"u 1.:mor 11> 1011.gt Mui.ln� u.u.da.<les pa • do • ee.
P11.undo progeu b�m. il.nho.Fa.irn. do que nio co. nho. co?... Que moça bonita,
Nha Benedita; Me pus a contar estrêla

LJ f f r Ir' LJ Ifj ffl i •


Parece uma sota,

r
I A do norte não contei,
Co,ti,aa °'' �111' '
.\leu a.mor o· u.mn
ffl
ro. u.queemqu&LIJIU!rJardlm fio. re•
íl'co!..• Nha. Maricota;
Da cintura. fina, Aquela mais bonitinha
Nha Rosalina; Com teu rosto comparei ...
Uma beleza,
0 ··'''º, ,JliJ'• li A J 1 U IJ li JJ 1, UJIJ. 11
Vem,minh:t 1·0. sa.,Pra.o.<1u1 mi.oh•
1
llo,r! V•m,1ninh1 ro. 51• Tu •oi■ met1 a. • mor!
Sinha Tereza;
Que os 6lho é ligêro,
Que moça bonita,
Nha Benedita; etc.
Que é um desespêro 1 ..
98 MÁRIO DE ANDRADE E1'SAIO �ÔBBE A MÚSICA BllAS!LlfülA 99

Fandango Não canto por cantá CANANRA.(S.P«�lo )


Menina bonita,
Pra adonde vai f
A moda bailada
É bom de dançá

tF ' UJílílJ1J iU �­ O 1
hHJ11J I J {'6 1rni
..le:So. Cabelo cortado, Si é maia puladinho,
Faixa pra trai, (tráa) Mais bonitinho;
Vestidinho branco, Si é mais repicado,
Euni.oc1.11toporc..ot1., Cbor• rno. re_nn! NemporübomclUlta.dô,Kiuuia, 11hon.l .ll,qu.11111eho. Tenis ao pé ..• Mais maxixado;

�I tU j]i IU • i ffi I RJ ffi I RJ • 1ii J • J IÍ {fl Si é mangirão


É mais engraçado 1
A moda bailada
rã Qllse11ll.11111n io.Dei;e11\l.aien.tol,.,Q IWldop11.1õ.wi.do Cbo.r.lport&,-J eho.ru, 4o1 •.
Vamo dançá!
Na moda batida
Eu não canto por cantá, Vamo escondê,
Chora, �o rena! Que é para o povo
Nem por sê bom cantadô, Não percebê!
:Morena, ehora 1 .A diluição da sincopa fatigante em tercina com
Ai, quem chorá de sentimento,
De sentimento 1 ..
ou sem acentuação no som central dela é muito co­
Quando passando mum no cantar da nossa gente. Vila-Lobos aliás já
Chorei por te vê chorando! .. se aproveita disso bem. No caso dêste fandango que
fiz a minha colaboradora repetir várias feitas o
Por êste documento e pelo pregão do Cego que curioso é que a tercina concidia nos mesmos lu�a­
vem mais pra diante se nota uma tendencia brasi­ res sempre. O que parece provar que já estava
leira pra aceitar o hipolidio. Em todo o caso são sistematisada ! ...
os dois unicos exemplos que topei. Neste documento /·J
Fandango Tenho um Vestido ...
a gente percebe a colisão entre o modo e a tonali­
ia ; u J2. J í; i • r1wra • 1l i iQ 1 -.-
1 -
CANANtA (S.P1111l0).
"''�
dade. Esta vence facil, numa vitória semostradeira
l'<'pdindo com insistencia o mi bemol.
� i li
' I
T•nhoumve,;tu!u rto.,oQuemPdeum•unamo ra.do Prapu.sAo.ooW>.min.f;:ocomfflcuhmli doutro

F..nd&ngo, Vamo Dançá OANANBA (s. PA,llo),


ffi=I-�4$1-J'JtEc�TW
-.-
E�
I

IR.Ui íJj UJUil


!a.,!º· Tudo is. soa.�nn.le .rH l'><1uem,·�.•a Conlravon.tad�Aquemca.,;IL Collln.von.

�1""'"
1•1 e I i U i lii i U i IJJfll J,G
Ke.nl.u bo .111.ta,Prudon.de ,-ai? SI é111&n.cl. ri.o Ê-i.e l!gn.ç&dol Amoct.b1I.
Oa.M.lo oor. ia.do,Pal..n pn tu1,
V..ti. dl •DO bra!IC!O,Te.1111 no pé ...
A 1110.ü bai • 11.d& B bom• da.n • çi.:
Sl41IWl' p11.l1.. dléo; Jlwlbo. Ili .-tlnbo1 ------------
fflii +t--Hi&dTI; J 1)-ffitJ-tjq , �
i
Blemalue.p l. u.do:lllall;ma,.11:l. ndo.

n JL IJt :uu J 1u n u;iu mie;.; ,i u, 11


da.rde pe•.ca . ri • & Arnn.Jii um cLm& . ,._da Pr.ipu.ei de noLto e oli • a.

'111
.\&.dl.Vunodan.oa N11,mod& b11,.tLd&VamoNoen.dê,Que� pLZ1Lopo.•0Nioperoe . b�!
cer. lo qucvou,meem.bo. ra Quevou-meem.bo . ra.prlL ti . do..do.Oe mim n!o 1.enhucui.d&.dol
100 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 10]
1 li rasto,il Despedida
Tenho um vestido novo Vou-me embora prá cidade R. G. DO NORTE
.L 811
m &bEII
Que me deu meu namorado Vou cuidá de pescaria
Pra passeá no domingo
Com meu bem lá do outro lado.
Arranjá um camarada �
>
7-�-M@1 r;
---· - :;,- •
Prá pescá de noite e dia. ,\dtuo. .ideu�.ronira enestrh Dh�f gr1.nac pl&\� • •li' ,\deuJ �.tê pua o -1, no.?-:Osqueremos�ira. qm'

Tudo isso acontece


A quem casá
É certo que vou-me embora CORO
Que vou-me
. embora prá ci-
Contra vontade [dade. Adeus, adeus, contramestra
Si o marido tá no sitio De mim não tenhas cuidado! Dêsse grande pastoril!
A mulhé tá na cidade. Adeus, até para o ano,
Nós queremos vir aqui!

Este documento notável bem como os outros As Talaras


,olliolo"" S, PAULO,

row r e.t 11 J '5J 1


fandangos de Cananea, são fandangos incontestavel­
mente bem nacionais. Foram colhidos de gente 1ffl fJJ IB,j
caipira dos sítios do arredor da cidade,. gente sem Sie Bell& • dl • to Í ,1.n.to de pra.to, E. !e be..be p; • l'I. .p1. B ro11.e1. ao
nenhum contacto a não ser mesmo com outros cai­
piras brasileiros. É gente que não sabe mais em w,�1 J J l J t IP J Jj íJ J
- > >
)J> ! I@; J J 1rl' 1
pel.to.ln-do.té • ,:ê • N ,111.1111 N1..n • ré! In • de. d· ri • r, J'e.■u N1..•1. • li!
que geração passada teve algum estranho na ascen­ 1 li
dencia. 8ão Eenedito São Benedito
1'; santo .de preto. Não tem mais coroa,
Ele bebe garapa Tem uma toalha
}j ronca no peito. Que vem de Lisboa.
DANÇAS DRAMATICAS Inderé-ré-ré
• Tesus Nazaré!
JJ bis
. Inderé-ré-ré
Jesus de Nazaré! )f b 18
.

Nau Catarineta G. de Mello registra outra versão dêste canto


Reis&do
NOROESTE no livro" A Musica no Brasil".
J.n
p-A-4.=¼--W ·1 l .·f-ffl p::::r@n IJ JA Canto de Mar&e&tú. Ou-lê-lê·lêl
A • bte-11111 H.\11. por • J
11, Tra • 11 .Ja • 11. - lil Que ,u ji -ve11' ro _ ri • do PKRNAMBUCO.

nI
J:12�.

J 3 J. • Ola. JJ.
�� Tra-1&-lâ
--,....
•IJ),JlJjlJ J IJ.1DIEQd ,1 � í 1�□ u
Ou li�lê • li--Ou-lê-lê-l11 i.J _ _ 011-ta-1.; • ID011-lê-lê-]u.i!

'
• lli.1 S&ng11ode teup•r-to, To•. li. na! S•r. �i.ri: de111.guen.10!
0

Ou. Iê-!G. Ju • i.! Ou-bí.-bí. 011.-11- Jô • l! 011-iê-l�-h1.ê! 011-l�-Ja. lu • ii, 011-Ji-Ji.!


Abre-me esta porta
Tra-la-lá la-lá!
Que eu jã ven'(ho) ferido ler: U r]§f F R 1RfflJJ1 J J Q I Fl
punp,éonrdemã_ É o vu.dn m.: dena..ve.g&! ..,_ 011-lê-15 • Jê_
Tra-la-lá la-lá.!

,�EE;tJ I l 11 tí.l IOHG]d.lÜ IN;E!Jj: 1


Sangue de teu peito,
Tolinal
Servirá de inguento ! __ (n.)1-li-lv. á_ li: 0 111áde p1111p,.;onrdeln&_ É o ver.d& mi den.,..n.gi..?..._
102 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 103
Ou-lê-lê-lê Eu ando atrai dum poeta de Ala­
Ou lê-lê-luá ! [goa
É o má de punga1 Pela rima e o trac;:ado que êle fail
ll:: o verde má, Essa baiana tem as voze muito
É o verde má, [boa
De navegá! .. Mas tem um pigarro na gaiganta
fqui não sai!

Sobre os maracatús, Pereira da Costa ("Fol­


Tra,çado = Trocadilho, embolada, verbalismo
dore Pernambucano'', Revista do Inst. Hist. e de complicação proposital; Baianas são as dança­
Geog. Brasileiro Torno LXX, pg. 207), dá esclareci­ rinas.
mento bom. É um cortejo que sai pelas ruas, pra
cantar e dançar, em tempo de farra ou nas datas Sa.mba do Matuto PERNAJIBUCO.

�,. , .-1 1 r nn □ 1 , i ; t; 1 i
J,100.

historicas. É eerto que estão desaparecendo e prin­


cjpalmente se empobrecendo mais inda existem po­
rêm. Este ano inda no dia 18 de Maio, a Nação do 1
1 '
Leão Coroado foi ,1ançar na frente da estatua de
l
1 '
1
N abuco em Recife. Cada 1rnrraeatú se intitula "na-
l'AN'l'ü RELIGIOSO
1,ão"; -Nação de ] 'nrto Rico, Nação da Cambinda
Velha... Os sapafrados �oreograficos da negrada Coração Santo
SÃO PAULO.
são ás vezes duma virtuosidade extraordinarja.
��" P � 1; � UJ 1•
J,60.

Pelo Estado, na zona asRneareil'a principalmen­ Co.•L�i.o un. to, Tu uin11 . rásl Tu ncs•o enoan.!o Sempre u.rlll! Juus •· ma. do,Jnu1 pi,.

I r e w ii· ''tt-dfifUlr o tu ir e ln 11 �J .::a 1J , 11


te. o maracatú se transformou no que chamam de
"Samba do :Matuto•·. Este é já bem nacional. As do. sa, P•1 a1110 • ro. so,Fragu1.de a.mor! Aos leu• p�s venho,Si tu me de!u•,Sentld.asque1:rasHumi!de por'
cantigas dele versam no geral sobre os trabalhos de
.resus amado,
nzina e aconte,·inH•1itos do tempo. ,Tesm:1 piedoso,
Coração santo Pai amoroso,
'l'u reinarás Fragua de amor !
'l'u nosso encanto Aos teus pés venho,
Samba do Matuto Sempre serás! Si tu me deixas,
P&RNA..MBUCO. Sentidas queixas

1WJ-JJ J J 1 Humilde por! etc.

ri. m• e o lro..ç• .do qu• <.l• Histórico e -versão portuga deste canto, vêm
no "Cancioneiro" de Cesar das Neves, fase. 71, n.º
562.

-�·---J
104 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 105

Canto de Xangõ Terço


Bncan\ação RIO D! JANEIRO. . RIO GRANDE DO SUL,
;,58
J. 60

r_,....� d jh•1JAJ1J ;q- 11J
Et e

w·7
; ertro J 11 h 7
Li vem o DomJe • •uis, Coma luiz na :n.i.o Só noi1t&..mo re. 1&11.do comoro.,Ltlo de li&.

1 Í º'J 1- J lâ.
ri.a .• Cho..ga.i, cho. ga1,
;J )JlP=$U1J 1J fillJJJ 1
Chego.i,ol,. po.ea. dô Va:.mo pe.di per dia Pa..re.oDe!U<NouoSe.
-,-.

Esta encantação de origem africana provém


�fe,ca4kl J JL'4.J#j lJ • J l • J IJ J J I tt1
-4--,--,- I
',5! Va • n;o de ru.ntnl ru.a, Dopor.tne.m por.ta,Ven.doos f1 ol Qu�•iofi.el de. 1'0.lo!.. ,

da11 macumbas do Rio de Janeiro. "Xango", diz na Lá. vem o Bom Jesuis Chigai1 chegai,
revista musical inglesa "F'anfare" n. 4, o escritor
0 Com a luiz na mão Chegai, oh pecadô l
S6 nois tamo rezando Vamo pedi perdão
Com o rosário de Maria ... Para o Deus NoSSo Senhô
Watson Lyle, é o deus do trovão entre os negros
Vamo de rua cm rua,
Jorubas. De Jorubas o Brasil se encheu na epoca ela De porta em porta,
Vendo oa fiel
rscravatnra. Que são :fiel devoto I .•

No Nordeste por informação que me deu Ascen-. Canto de Peregrinos. Canto do Joa.zeiro

F1 plt] E(à 10 S·ÔIU :r •I E:_Êrl


so Ferreira, poeta, "Xangô" 'é uma dança espe­ J • 72 JOAZBIRO.

cial. Esses deuses africanos aliás não só entraram


A Lgre - j1.:o Rorlo • f . li. de P"-dra.Temmait de mil ced,1.llt no pi

�· rcE l"CHD 1 fre- □ 1frft □ 11 r ,11


_ � da Cru.ui.ro
a se identificar com os santos, anjos e Deus cato­ �

licos, como ainda se espalharam pra dar nomes de

enr
Noou0Po.1 e d1. . dei.roeo.H ni.11.KUeni vêeuioqu"-l"o SI.. bion.de,; Jo.a

�J , e,---, €f 1 1�1r•,. r..1•- @5 e I "'


�� ui rol

danças e até de ajuntamentos humanos. Com efeito


h □,Jffi
"Exú", deus africano que não sei identificar, e que Eu vi o Sol ll'e • mi! Eu vi 1. L11...1. lll.ml u.do ll".Dli, d.opr1.D8t1.U • n.uo,pilmo. do venta 1,.,_ li.e,!•.

nas macumbas é o diabo, deu nome a um lugar per­


nambucano. CANTIGAS MILITARES

A indicação rítmica que grafei é exata á me­ Soldado da Guerra do Paraguai


dida do possivel. Tem sempre um rubato eminen­ J, ,66. SÃO PAULO.

temente oratorio nessas encantações que es,:apa a


�=f#=!-FP l J 11, J I; J 1JJ J 11 J 1J JJ I J 1
qualquer grafia metrica. Mesmo porquê varia 110 �
-J• �I
•· J J 1--:;)fft:�:''I lffe±Jg Q-:--l±---igJ J J-4---r-41
mesmo l'antor cada vez que êle entoa o canto. :-, 1.I ��"' r• '"'" �-- . ,o Xi.o ..,,, "'• • ,._,,
l 106 MÁRIO DE

Esta cantiga é muito antiga que escutei em


ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 107

criança minha mãi cantando. Não me lembro mais

�-
do texto nem ela. Só ficou porquê me impressio­
nava muito a última parte da estrofe.
dl1. 1

Recrutas Cear.�ses
Marchante ;, na. CEARA. 1.

Ir • J O
O meu eonsôlo é viver nesta alegria
Cambaleando, ve11do a Lua em pleno dia;
Mi. 1. r1.un', !ihuca. poteemeubol"D&. lo, M!.a bal.o.11e,t&emi.a gr& na • dêra O meu consôlo é viver sempre na água,
Porém meu peito não conhece o que é mágua !
Mia riun', II.
Meu capote e meu bornalo,
Mia baioneta e mia. granadêra ... Os taberneiros já não podem vender mais.
Depois das sete não posso tomar meu gaiij
Mas sou um cabra que não perco a minha linha,
Mia= Minha Trago no bolso sempre a minha garrafinha.

Riuna = calçado militar III.

Bornalo = Bornal
Quando eu passo um s6 momento sem beber
Fico maluco, penso até que vou morrer,
Granadeira = Fuzil Mas dos paus-dáguas sou o rei, sou coroado
E na tendinha sou freguês considerado.
É o canto dos recrutas sertanejos do antigo Ba­ IV.
talhão de Segurança da policia militar do Ceará. Quando eu morrer quero em minha sepultura
Uma das pipas das maiores, sem mistura;
O encanamento que me venha até a bôca
Em pouco tempo deixarei a pipa oca.
CANTIGAS DE BEBIDA V.
Ninguém repare, êste é meu naturul,
Ninguém repare, êste é o meu moral,
Quando eu for pra: Cadeia Ninguém repare eu andar cambaleando,
ARARAQUARA (S, P,n,lo). Adeu� adeus que ,jí1 são horas, vou chegando!

n,,,
- - > :> - 1:.

li IJ jô; í IJ 2p Escutada no rio Madeira, de gente que sabia


pren.d&-1'&-rO: De. bai. :i:odomeu
ler, se percebe logo. É vulgar, porêm espressa bem,
�I
;,g1J l1 1J3,J1lJ1JpJIJ J 117,J J IJ &i Ii 11
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texto e musica, esta malinconia paciente, meio iro-
tão Qian.doeu ror P&. r1. a ea. • dtl& Que. ro le • TU llell pr. r1. • Boi nica 1do nosso povo.

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108 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 109

Li. vem seu Juc& Coco Mar!& Mulé

,
R. O, ?>O NORTJ.
ARARAQUARA (S. hwfol. ,J.108.

J )1J IJ J t ' 3 J. J 1 - "-P


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J,i. ea do1 Ca . n • U. nho1, Do.�o d& ca.■a, Se11 Ma .u. Na Olll' . rei. ra da Gol • &.114, mu.1.;1 O • lê, Ma..rl.e, C'\11. • Jé!
Ni.11 - guem po. da nia.i• pu. a.i êib, mu.lé!' O lê, Ma.ri.&, mu • lél

J 'JJJJ, I J JJJJ,;,IJ: >fi, :: g31J1JJ >- JjJI -� li 11n lf1 E' 1J J lJ, ,, tt
Edebr1..-011 pi. ri.o,p1rio.p1rio!E v1.v11 pai,...deg-. Jotc••r•. fio!
qui.nhol Ê do Do.111,I • r,é AI, nizl..guem po. do mAls pa., • •�, ôh mu.Jé! O ,�. Ma.ri. a, mu • iél D.C.

Lá vem seu J'uca É àc Dominé


Solo Na carreira de Goiana, mulé! ..
Do� cavalinhos, É de bratios Côro Olê, Maria, mulé l
Dono da Casa, Pirão, pirão, pirão! bis, e Rolo JSolo Ninguém pode mais passá, ôh mulé 1 ..
Seu Manequinho ! E Viva a pandega iu�daào lCôro Olê, Maria, mulé!
Do garrafão 1 f11Jr "Ai"

A mistura de latinorio em cantiga-de-beber Solo Mode o cheiro da menina, mulé 1 ..


Côra Olê, Maria, mulé 1
nos veio tradicionalmente de Portugal. fJi.-;, o .�olo fSolo E a fulô do macaasá, ôh mulé 1 ..
iniciado lCôro Olê, Maria, mulé l
"Ai"
CôCOS por

Coco
Capim da Lagô& PARAÍBA
J.110.
�•· l)1cMe111 • u,1tquern Coco Mineiro Pau

, ;_·u 1�•-••&s_,,e01Ji,a - �
lJ 1 □ A IJ.
Selo
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li, • gn. TI ll4o CID. meu O e&.plmd& la. goa TI • ado �o • meu MI .nei • ro pa.u! �i.n,i • ri, paul Vou-m'em. bo. to. pro Pa • ri! 1,{l.nel. ro

Í. JB C i"□
> - - > Solo Câro

□ 11,rl @' J. !J W +-p--9±+J □ J J 1 Jilj


rr.- - ;i_l
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51 pw! MLnel.ro pu! Vol. o • •e.ma.. ! n.,. que nml )!Lnel.r,, p&U! Minel,ro pu.! Quemnio
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Solo

Solo Menina, si queres vamos, Côro O cupim da lagôa 1 I


O veallo comeu ... me co.11lie.ce, cbor11-, Ml.net.ro pllll.! MLnel.ro p1W.! Qua r,. rá que111meq11u berr:!
Não te ponha a maginá;
Quem magina eria medo, Ai t •.
Quem tem medo não vai lá! O veado comeu ! .. Côro Mineiro pau! (bis)
Solo Vou-me embora pro Pará
O que caracterisa o coco e o determina em geral Côro Mineiro pau! (bis)
é o refrão. As estrofes ou são improvisadas no Solo Volto a semana que vem;
Côro Mineiro pau 1 (bis)
momento ou são tradicionais. A estrofe que vai Solo Quem não me conhece, chora,
aqui por exemplo, foi me dada também no coco Côro Mineiro pau! (bis)
norte-riograndense "Olê Lioné". Solo Que fal'á quem me quer bem!
110 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 11]
Mulher não vá Observar a confusão entre "êste" e "êsse".
Cooo PER.'IAMBUCO
J,ua. A 3.ª quadra citada é variante ou fonte inspi-
,�� JJ 3 iJ IJi-r§ iJ iO IQ OI radora daquela uma de maxixe famana:do;
)lu.lhu,IIMI ,&! MuJhu,não ,i:! Mulher, vo:ci: nio vã

p!Wl• •J j"j 1 ;i,, F lü D 1J d1 1 "Menina diga a seu pai


lá! l,b.. ri.do,cu vou! lol&.ri.do,eu vo11! Quepr..paim.1.ndouci,... mi.!
Que eu sou o teu namorado,
Mulher, não vá! (bis) E avisa teu irmão
Mulher, você não vá lá!
Que me chame de cunhado".
Marido, eu vou! (bis)
Que papai mandou chamá!
Quanto á musica reparar como o geito impro­
"Mulher não vá" se aparenta bem ao "Mineiro visante com que ela é construida é que leva ás vezes
Pau". Este corre já por muitas partes do Brasil.
as subtilezas ritmicas. A peça vai seguindo ritmi­
É bem antigo e Pereira da Costa registra êle com
variante da estrofe que é espalhadissima e de ori­ camente bem simples e é no momento de acabar o
gem portuguesa. Tambem o refrão ás vezes é tro­ solo, pra dar certo, que surgem subtilezas e compli­
cado por "Maneiro pau". Quanto ao "Mulher não cações ritmicas. Já no coco do "Balão Mané Mirá"
vá" não sei esclarecer si o cantam dialogando. É se dá a mesma coisa.
possivel,-porquê outro coco em dialogo que possuo e
fica pra outro livro, sei que é cantado por duas pes­ Musicalmente, sem que tenha descendencia ob-.
soas se respondendo. jetivamente perceptível, êste côco se aproxima bem
Cuco de gt.a:ui. Onde vais. Helena das rodas coreograficas portuguesas pra adultos.
J,u. R.O IlO ,,VRTE
,.,, De fato na musica -do nordeste a ascendencia portu.
�:;J',

®..,Eí#-f-fr3=$3i#J Jl I J il J jtl R=c;;=l=
ga se percebe. A nossa musica do nordeste é como

n ª um w , u .., 141rliº'
"'
Pr'oode �1.11, He.lo.na,Pt'ond& ui• ...._1!.tal'Vi.ipr1- lrÚ, He.le.u,,-.a.b.l d.o demiml is,u

�- □ .r-=p 1 . i
�� �
que um desenvolvimento da fonte portuguesa. Du­
ma variedade, duma riqueza e sobretudo duma bo­
110\�HQMld=.I Somu. •.ep�nuudoemu \'oudci.:u.rdo 1� a.in&t Qu,i pra ,u po. ':ii"dn..in1

Côro Solo
niteza que os portugueses não sonharam.
Pr 'ondé vais, Helena Essa noite eu não drumi
Pr 'onde vais assim f Somente pensando em ti
You deixar de te amar Coco de ganzâ
Nunca mais eu vi
Vai pra trás, Helena,
#J,,... _
R G DO N'ORTI!:
Que é pra eu podê drum.i.
Tenha dó de mim! > >
Jlne
j,jJIJ J ll D ld;, lfJJ1 ll J
> .-,88

@t{fl
Côro (Refrão)
Solo 11
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Menina, diga a eeu pai Ai.� mú eo y\! Be.l& lllll.lldml mech&.IIW''Al,1111D.ca m.iJs eo

lt!JD lnªJ 1/J D Ir: □ 1 D Diu □ 19Jl 1:f• .'II


Que não eoma de eolher,
Que êle tem de eer meu eôgro
E Voeê minha mulher.
lê ca.. u.lo pa:apoCa.n. loal&.� • :d.alldaie.o. <'alo II for radoComfer.rodaCon.plllhl& �
Côro (Refrão) j

!\i,IIIUIC&

J
112 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 113
Solo. Olêlê, cavalo pampo,
Côro. Ai, nunca mais eu vi 1 Cavalo alazão-caxia.l pa:.p,.pá.
O meu cavalo é ferrado
Bela mandou me chamar 1 Com ferro da Companhi:1.
Coco de gan1í,, LO.J>O NORTE.
Ai, nunca mais eu vi 1
ô 1 ;, 1 o O
J,ee. J, ...
. -,..

=••
Côro. (Refrã-0) �
Solo. Olêlê, cavalo preto,
f11Jj D 11 1
l�Ul 1 �01
Cavalo alazão foveiro,
Pa.,-.., • . pi. • mi,
to.1\ID qu.lldo
Solo
ff.Ja.
- rl
Pa. pa. p,. • pi li.! Ai, OllleoAII • ou.kH.tN.
Que chegou no atoleiro,

'
RefugOu, não quis passá!
11111 • oe�1.10 lit • ,:i Tla.b1.
1PJJ] 1,P
Côro. (Refrão) A.� &

O refrão talvez se tenha adulterado com o tem­ lu. • ba,Bolll.-Jll'.dw e Clo.71. • 111.W, Be. 1- • PI. )li.ri • 111. b&, n.J1. li\

po e seja "vim" em vez "vi". Torna mais com­


Solo. Ai, Chico Antônio quando <:unta
preensível o refrão. Aliás o solo parece indicar Estremeee -êsse lugá :
Timbaúba do Pilar
mesmo -a idea de viagem a cavalo. r'r'. ro. Papapapá meu rimá, Até a barra de Natuba,
Papapapá veja lá! Bom-.Jardim e Goyaninha,
Belém e Pipirituba,
Veja lâl
Balão, Mane Mirá.

'
Coco
R. G. DO XOBTI,

Rincií = rimar, substantivo.


Grafei o ritmo bem como foi cantado pra mostrar a comodidade com que se canta. Os 5 pr1 ·
meiroli compassos do solo correspondem evidentemente aos se��s como e�quema rítmico, po­
rêm edio mais diluidos Wendo do movimento .C, um caraeter1sbco J.t. J\, coisa que na cnumrra­
çio desaparece em seguida. Atê nesta enumeração se emprega a seguinte varianle ritmica,medis-
.... ê .., , etc. - J\JJb.
,
�► r dame\ n Pa.ru
Q•J.,•l!Ol.\a □ dl.a qW.la.ri • .i. ll:qunli' oo ....90ae&11.tÍ.!
se meu colaborador: t::::.I =- !
TiJo.b., . ú • ba do PI • li A.té • b.oi • rra
A e111111e.raçio de terras e engenhos se prolonga á vontade,dentro do ritmo repelido.
_
A enumeração de terras e engenhos se prolon­
Côro. :f'.:h balão, Mané Mirá, l b. ;::,1 a ,·ontade, dentro do ritmo repetido.
Olê, olê ! J ,s.
Solo. Lá vai a Lua saindo (bis)
Naquele salão de lá; Coco do Aeroplano Jaú R.O. DO NORTI.
d ,t:t.
�·1.. li)
! 0@
'
Quando dá da meia-noite
� 11, fl.JIQj_i) IJ{[rl iw,,........
.

Para o dia quilariá


. K1I •1- MJVpla.N O..�-, ln

,�,. 1 n n u n, ,if,""'T@ p::


&.'t0.&11.do...
(Refrão)
Ê que começo a cantá!
1�
Q1:i\ariú clarear. fll.l IIO la.t, A .ri.Ili, 0. .n.pr-• - . MI-
r

114 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 115


Solo. Eu vi um aeroplano
Cocoa de L&mpeio Ê Lamp, á L!mp, é L&mpa
l
Avoando ... �: 76. NORD&STI.
Côro. Devagar com a mesa! ..
81RA1J 01AJJIJ IHDllJJjd
....
Solo. E eu fui no Jaú, 11
Aribú... A •11.lber dt t...iape • io trao NI • 41, dt P' ao ,
•·
•1,.W J J J. J I J1 ]iü ·1130 l J IJ ll•!J Ii..;_.
e....
Côro. Devagar com a mesa! ...
,J. '•· �
etc. J J J';_J 1

loo•Ji□ •11J n 1 i
11• - L•• • 99 de u. 4& u. mio. de se . 4& - mio. B 1.am ,

l J 14 J p. 131 ;J 14 •,I
Pena meu colaborador não ter pegatlo o texto
inteiro.
...-aV\r.gu. U.oo, O�y,i. Udll<Í1-,- . �!
Solo A mulher de Lampeão Côro Ê Lamp, é Lamp, é Lampa,
Não anda de pé no chão, É Lamp, é Lampião,
Anda de meia e sapato O meu nome é Virgulino,
Lenço de seda na mão. O apelido é Lampião 1
Solo. Minha mãi me dê dinheiro Solo. Minha mãi me dê dinheiro
Pra comprá um cinturão Pra comprá um caminhão
Pra enchê de cartucheira Pra enchê de moça velha
Côro Eng enho Novo (bis) Solo Eu dei um pulo
Pra brigá mais Lampeão. Pra mandá pra Lampeão
Engenho Novo Dei dois pulos, dei trêl! pulo:,;
(Gôro). (Gôro).
·�Bota a roda pra rodá! Desta vez pulei o muro
Quaje morro de pulá.
Solo. Minha mãi me dê dinheiro Solo. A mulher de Lampeão
Pra comprá um cinturão Ê pra dentro e é pra fora,
Côro (Refrão)
Que a milhar vida do mundo Com a criança no _Eraço,
Solo Minha menina É andá mais Lampeãol Valha-me Nossa Senhora!
Quem te deu tamanha sorte! (Gôro). (Gôro).
Foi um soldado de linha
Do Rio Grande do Norte.
O refrão dêste coco é uma variante apenas do
grito dos companheiros de Lampeão: É Lamp é
Lamp, é Lamp. É Virgulino Lampeão, já regist;a­
rr
s.,,
do na musica, dentro do "Oatimbó" de Ascenso
1
Cl:plm d" Ferreira.

e.e.... L&mp,ão Mulher Rendeira NORDESTR.

�mm i J 1 ,o n 3 1J J n I J ti•, :, 1u 1-�1


p\a.D.U., :U.q11&. s:lJ\119 mo • I.& mo. la;Bit 'P&Hoi pe • l& 0& • pe. l.. .,, dob; pll.OUW 110 &I • lá. s.,•.
�100 J :�';'-
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Lr.Jllp<! • ..odes.ceu " oer.r._ Ocuum bdlocmC&.j&. zel.r&,

#D ,. Jí:lt_,fR Il fJ j IJJ JJJA J J ;•fil IJ] D Ipfi


Solo Cupim de planta, Bo.tou &smo.�•don.u.b. Prac.111.tâMu.lherrcn.dti.ra. O li,, lfflllherrm .
Xique-xique mela mela j
Eu p assei pela capela
Yi dois pmlres no alt:l� dtl.ro.! O • 1;, Jl.·Jlhern:n. da! Ta.mecn.sLc.:,.a. ta..1U N!n.d& Queuten.sl.no&DA.mo. ni1
116 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 117
Solo. Lampeão desceu a serra
Deu um baile em Caj azeira,
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1) IJJ J) ll F
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Botou as moças donzela A mui. 4 ML&a..p<1 . ia Tev•� ... Ili. 1\11 l1, , 1il.o, U.Jll& H!ld1.ii ta B1
Pra cantá "Mulher Rendeira".
1ílg1Jl 1Dq11,,1
ai.ele. Ou.,IH b&lld.lÍ L•111pe • io, imul.í ren.llel.ra.l i -1.., ru.. til
Côro. Olê, mulher rendeira!
Olê, mulher rendá 1
Solo. A muié de Lampeão
Tu me ensina a fazê renda
Teve um menino lazão, Côro. É muié rendeira !
Que eu. te ensino a namorá 1
Uma banda é de Benício, E muié rendá 1
Otru banda ó Lampcão.
Solo. As moças de Vila Bela
Boi Noite
Não têm mais ocupação :
É s6 yivê na janela e-
,. J.Qª .jJJ IP íl� âdJ IJ n� IU] IJJ a� 1631) 11
�: 120 R. O. DO NORH.
Namorando Lampeão,
(Côro) A1 ..... ........... • Mlt.,lo.-.••1.M!lrildi O.Ili!� a don&Q CLU>Jw,.1& ,.....,. ••!

Solo. Lampcão subiu a serra Boa-noite, boa-noite,


Com apragata de algodão, Boa-noite lhe dê Deus!
Apragata pegou fogo, Cadê a dona da casa,
Quaje morre Lampeão. Por ela padeço eu 1
(Côro) Este é um dos chamados "cocos de zambê", coco
dançado. Zambê é dança, aproximadamente o batu­
Solo. Lampeão diz que não corre,
Mas correu lá da Varginha,
que ou o jongo. Ou a mesma coisa que êles. O com­
Deu um pulo pro lado passo quinario tambem dá certo pra danças birrarias
E saltou almofadinha. ou quartenarias no compasso •desque tenha quadra­
(Côro) tura estrofica talequal aqui.

Coco cantado por Lampeão com o pessoal dele Olê Lloné


quando atacaram Mossoró.
Como já corre nos engenhos e cidades do nor­
deste é lícito a gente imaginar que as 2 ultimas qua­
dras não pertencem pro pessoal de Lampeão.
A rima dos 1. 0 e 3. 0 versos da 2. 0 quadra bem
0
como a rima toante dos 1° . e 3. versos da 1. 0 podem Sr,lo. lJa Baía me mandaram Côro. Olê Lionél Cadê LianM
ser mero acaso porquê isso não é do geito popular. Uma camisa bordada, Solo. Que eu tava na varanda
Eis a variante paraibana do "Mulher Ren­ Na abertura da camisa
Tinha o nome da safada, Quando a morena passô,
deira": Lionél ... Lionél
118 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 119
Solo. Balancei um pé de lima Solo.
ºº'° Vapor de seu Tertulino
Oh que coqueiro tão alto
Que nunca foi balançado Na cacimba de bêbê; 1. O. DO NO&!I,
�I1.
t j''"' 1'10 1
JJ1iJ J;3J"'l1d ®- Jj1
Namorei uma menina Todo o mundo tem inv•eja
Que nunca foi namorado, Dêste nosso bemquerê,
Tu.tu . li.no, seu --. .•o, 8d I!& • n. p- 1,, CU&H
Lioné 1 Lioné 1

(Refrão) (Refriio) W.:u,


t,10 IJ10:n.n19toJJJí@JI
l.t. km - ff. (li.la. • ti ai, 1n ma.no,! be. 1l.1'01cb>nl .ro, rv. . ma.qt,.

Solo. ôh que coqueiro tão alto O vapor de seu Tertulino,


Que de alto vai ao céu; - Seu mano,
Eu conheço o meu benzinho S6 navega cum água na caixa,
Pela copa do chapéu, Ele tem um reguladô,
Lioné ! - Ai, seu mano,
E boeiro e cinzeiro e fumaça.
(Refrão)

Este coco maravilhoso deve ser cantado mo­ :Mariâ


lengo porêm sem malinconia. Uma grande calma PIRNAllBUCU

ardente. É tão livre que hesitei em lhe botar indica­


ção de compasso e pus em pontuado as barras de
divisão do dois-por-quatro que parece ter servido
I II
de metro na criação. Porêm cantado, êle é livre de lfariá1 eu vou me embora, Mariá dá cá um beijo,
qualquer compasso possivel, um recitativo legitimo. Vou me embora pro Ceará, Que eu te quero carregá,
O 1. 0 verso da 1. ª estrofe é tradicional e serve de Mariá. Mariá.
abertura pra muita quadra brasileira. O mesmo se Eh Mariá ! (bis) Eh Mariá 1 (bis)
dá com o 1.º verso das ultimas estrofes. Em S. José
do Rio Pardo (S. Paulo) corre a quadra: Eu VOU;VOCê não vai
Coco
"Que coqueiro tão alto ...
R G DO :,lORTR
Ôffl- �,;s
Deu cacho na raiz 1
Que moço mais bonito
[1 fJJ IJ J$#ffi¼#.1���1�
J, s �
�ljtjj 11,
Eu,·ou, ,·o.d,nii.0Ya1,ahmu.l� Be.laman.dõllll!clwn.ó.Õhmu lf E.ti> láquoa.g.-. m

' i 1 • j I l • J Jw lfl • F Jj J i/4.+��


Com dois palmos de nariz!"
O refrão do coco corre no nordeste. Possuo a me1mo me lem.l;,rrl d8Chi00Aotoruo ,E•p11L,:anlatem curouha Eé d.o. • iwl& pra.a.\,. ri. ôb mo, . 1�. Ku ,·ou

variante seguinte que é paraibana: Eu vou, você não vai Solo Eta lá que agora mesmo
- ôh mulé - �e leinbrei do Chico .Antonio,
Bela mandou me chamá, Espingarda tem coronha
- ôh mulé - E é danada pra atirá
Ai LI., . 9',AI W.o . li& &v.«.1.&.n.1111.n..ran.d1. Qi.lldo.mo.«.na. ... il - ôh mulé -
120 MÁRIO DE ANDRADE

Um refrão paraibano canta assim:

i 11 3 1
� J, .. ,11
h, • ti, {o. lt., &1, &. l.a d!l (llle li � �!

Iaiá Ioiô
Ai Bela mandou me chamar 1
Iaiá Ioiô
Ai Bela diz que eu lá não vou 1

Um dos efeitos do excessivo individualismo


nosso é que as variantes dum canto trad�cional mais
parecem cantos novos. Música Individual

Bochedo, S111há.
-a.a.DOiroan.

□ a 1 1, sr '
lle.·al. u,leu.palalo 911r,.. Olne 10 •. 1111, 81 • U.t(l11uu. -

Solo - Menina, teu pai. não quer ..•


Córo - Olha o rochedo, Sinhá!

Solo -Que eu me case com você;


Bote-lhe · terra nos olhos
Que o homem cego · não vê.

Côro -· Olha o rochedo, Sinhá 1


ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 123

ESTRIBILHO (solistas ou corais)

Acalanto
Sapo Cururil ARARAQUARA.

�o,, Jt9íJ8i-)-4 1 J J\l J 1 1 1 O U 1_ W A 1


J,eo

Sa. po C11.r11. ni Do. bo.l.ra do rio Qull&.o u.pc, grita, ki...u.,

i' � J A b$\.Jl.;-0 D 1., J. J1 14. Jd 2 1JJ J J J, 1 J 1


J,ee
I
cc-
Di1'l_1111edicom frio. Rs. li. l!n.,gi;e é bom i>n'lo"'llquerjo. gi C,.m,,1111aia � que mln;,or1'1. l.il

A mulher do sapo
Diz que está· lá dentro
Fazendo rendinha
- Baiana
Para o casamento.

Estilingue é bom etc.

,. Refrão do Mutum
9AÚ


UI

j p lffj D 1, J , � 1ffi IMJ


"" ma..11. de Sio Mi • g,,,; OQ • <ri dola mu.twn p , mê K. !. p.rneu.

1 .t 1 i 1
7 .,..
•1 il
• • �.,)� - 1' - .,) 111.J 1 •
d 1 •• § íí+í íJ>-■ I Í ! li
fi p:
' •m. "A.ra..ra.ra.rn uhm,ulutt, uhm! A-rn•r•r&,n,, uhm Ullllllbm,u.hm.J A·u,-r1,r1.- ra, êla 111�1..•

Na mata de São Migué


Ouvi dois mutum gemê
:f:lc geme assim:
"Ararurara, uh�, uhm, uhml
Arararara, uhm, uhm, uhm, ul1m 1
Arararara eh ãh" !

Este refrão foi colhido por mim da boca de


violeiros baianos vindos pelo sertão pra S. Paulo,
gente bruta. Improvisavam sempre e tudo, letra e
r

124 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 125


musica. Com muito geito fui vendo si conseguia CôROS DE COCOS
uma toada que já fôsse cantada por outros. Não
sabiam de nada. Lhes parecia meio incrivel que (R. G. do Norte)
musica fosse repetir coisa já cantada. No meio da
autoria monotona, cujo interesse estava só nos ver­
sos, um tirou uma moda e fez ela seguir dêste re0
frão. Pelo caracter mais musical do refrão ima­ ÃL•n . wlab.10 toeoH.nlll
- .
n. Asu.•1-� Aue.
.,/

ginei que era uma coisa tradicional. E era mesmo. Assovia êsse coco esmerá (do)
Depois pedi, passadas várias cantigas mais, que Assovio!

repetissem a moda da "Mata de S. Miguel". Repe­


tiram porêm só o refrão. A melodia estrofica já 2
J,.,
era outra I E das outras cantigas nenhuma não
possuia refrão. Entre elas um A B O. As outras:
w#"
if I 1
!' l :J J J J íj J J R l:J Q J l lj i J _Q 1
,;._,êli, �.
n!j J
Êlt. t� , il!. ôh mu.lol ih ,;m, ih 1:m, ,11 ,;_, Ili 11111.i. ia
martelos mais oú menos historiados, melopéas me­ -M• ; 1 Q 1 1 j 1. J J J j J J J IJ ,1
lancólicas vulgares, variantes umas das outras, so­ tlllll,êl!. twa,ila kw, 6b.11111.leV&1 ,i, ec, .t1.1h&,fuea.re pr•M 1o . miíJ

bre o tipo basico tradicional de que "Na Baía tem" :gh tum, êh tum, êh tum, ôh mulé (ter)

'
pode servir de exemplo.
Vai à cozinha, faz ciifé pra nós tomá!

3
Refrão Cearense %;.,• El I jJffJf:@F�
'" M I J j
O li - ão e chale o cha. le O li • ,i,:, é dwa a . 1nõ'
J,u
J J J 1 1 • J1 1
Do.-· J • J J I J • 1
1

•• IH . i9 INl!llapad' 11&.P J:.io oba�•11eu. �1•1MI& O Cio! O 1iü0 é chale é chale


la m• • '9 d• RaJl,d' lib • ..- N' Du.-'a IMI;•-- • Clo-S• fw aecl'I O lião é dois amô !

E a muié do eumpad' Mané João


Dansou um chot' bem ligêro mais o Cão 1
4
s,'" □ n1u .,
J,,.,
�-
□11 1 01 1 u1
E a muié do cumpad' Mané Ped'
Dansou um ehot' mais o Cão chega a f'er med, t
C•·J" . e1. rua.b• . lou, A.�• • lou 4rLua.bl • li

Chot' = Schottish. F'er = Fazer. Cajueiro abalou,


A bulou (1cixa abalá!

9
126 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 127
TOADAS
41hk>
J."
� JJ JJIJpJ l:J •I
; ,.
C'a Ju e1.ro&.ba toa 1,Q.l,.llill,4'!u1a1...b&-· &
Toada. Cabocla Bonita
AWA.2:0ffAI,

... .
D 1) l·J :::1
N n.º 4 (primeira versão) é variante da roda
infantil "Marcineiro faz assim, faz assim, também To·-·
!' u �
Vo. eê d.li 11,uea.ll!or 11lo dei No fijp • do do

e It:.l.í e J ifl oi□-, 1 J J J • 1 J ,1


cio,

w
...
assim" do Surupampo da Vingança. Isso comprova
a observação que fiz noutro coco da ambiencia de Dlot • TI.'l'&M1.1oenle,ôbea.bo.OU.bo.ni.ta., Vo.Ja ,, •• " , do,
roda que a gente percebe em certos cocos, e a proxi­
midade de que alguns estão da roda adulta portuga. Você diz que amor não doi Senhora dona da casa
No fundo do coração, Um favor eu vou pedir:
Tome amor e viva ausente, Meia hora de relógio,
ôh cabloca bonita, Oh eabloca bonita,
Veja si lhe doi ou não 1 Pra seu nêgo divertir.

'º" .□
Canto Antigo
R.O. DO NORTI.

1, ii □ 11 J B+4 MJ
1, J , 92

Eu eom • prel u. mo. ga • li • nh& Por qua • iro


1J J Jl1
m!I e í)_ul • nh,n • to•, Q111,11..do
Vira a bombordo
A boreste
E à proa
� JJÍl I J A I i?]p.1
po.guol no. ga • li. MI. Os pln. toa p!A. a. r�m dcn.tro.
• 11 .O I l J 1 1
Sol • \�, s� • nho. ta,
E à ré
Vira pra aqui, fa¾- J J • ; 1 1J , 1 tl
Quecs.so. ga.li.nhaé m,.nh.a!
TJ l-f-fl.l I J [J IJ:J li
Mal. d.i.t1.a ho. ra Quoeom.prel es.,a ga. li.nhl!
Pra acolá!
Não sei si isto é bom,
Eu comprei uma galinha Solte, senhora,
Si não é,
Por quatro mil e quinhentos , Que essa galinha é minha,!
Vira isso pra lá!
Quando peguei na galinha Maldita a hora
Os pintos piaram dentro. Que eu comprei essa galinha 1

ªJJ ,, rn rn
Refrão •
Gavião Peneirou NORDESTE.
Segundo me informa Antonio Bento de Araujo

I j .f;)J tH 1' j _b 1 1 1 1 ' ·M


J:60 Lima, colaborador inapreciavel, êste documento é
�i' 1" antiguíssimo, vindo talvez do inicio do sec. XIX ou
011.TLio pe.11e.rü, pt.11e.ri, pe.1111� ra... G•.vt.io Pt.1111.rô, lle11e.rô, pe.ne. ru ... mesmo mais longe. Não se tem por onde provar isso
(bis) Gavião peil.erô penerô penerô ... e até ... o preço da galinhãprova o contrário. Mas
128 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 129

isto pode ser modificação de texto. O que é certo O inicio do "Pai Cajuê" obedece a um esquema
_
pra quem conhece a cantiga, é que ela já existia pelo melod1co bastante tradicional e bastante glosado no
menos nos meados do sec. XIX. Brasil. É com êle que principia o "Meu barco é
vdeiro" que corre por todo o nordeste.

Tow

, J,,.
h t
:Menina teu pai não quer

• 1 Li w J 10 • n 1
0, 1 n i
(la,,•-- ._ .. _,,._
Me. 111.u,u.&p&llllllll
o IJ q,a,ê
- •• O, DO NOllTI.

el1 ...., ..,.


À versão da Paraíba aproveita apenas o arpejo
do acorde de tonica :

Meu ll&rco é Veleiro


Coco. PAU.ÍU.
'>'
J ilJ•I ,111 R U 1' F Itr D I l 11P leJ ( i IÊ t Ct ICJ D I t 1
..--
4JJ1J &-011

> > >
pala dai 1111."' IIM!a C11-b-U M.1 Cu _._.u 1&1 Meuhrooh,.lel.ro Litro.ra.kzn hl.1116EU amoa.eôrmo.tell.lAoarmo.ren.&êq11111111 •.1111,

Menina, teu pai num qué Meu barco é veleiro


Que eu me case cum você; Lá fora tem lama;
Aos despois dos nove mêis Eu amo a côr morena
1
Cumo ha de sê! (bi8) ,. A côr morena é que me amn.

Pae Ca.juã Já a versão Pernambucana é mais aproximada:


1

� □ 1lJUJ �-l'J 1
Toou ll O, DO NORTI,
J,72
,,
w>'OJ, ..,1 J J J l•r 1J 3 J J, Andante. Allegretto,


,J, -r- s...

,.. J,li'J J J
e,,,. ,,-,-
J u íJ .J J :;I.S, 111 J JJ
u. e 510 o.OJ.94 01J u. n ,11
-
MwpdC1.J11 • i, IO.nh& m1J C&. Ju • iã, O.lM• b&. rs • • I&

1!
ro IIU H.IIIM 4D .,;;;--' .PsLDpl • a..h,111....

J.;i..J. ú!· j jl ; J J • • .....•. 1, j • &) J 1 J j .1 11


•• be ... ,...... u Ji.! 0.lheah.ra •

Meu pai Cajuê,


u. &.be u. p.re.do Ji.! Meu.�C... J11 .
rio .... 111. a.
jJ
ser. ra. Vog,111e1mbo,n.
j
� _,
ler,ra,Vov w.n..n ,.., ...
Minha mãi Cajuá,
Olhe a barata. Papacapim
Sobe na parede já! Guriatã, rola galega,
Eu pisei no pé da nêga

,,
Dificilimo de grafar o ritmo. Os compassos de Fiz a nêga se daná!
5 a 7 têm as fuzas muito diluidas, quasi iguais ás '

semicolcheias proveniente isso da prosodia. Quasi Meu barco ... etc.


que seria milhor grafar: Cabra danado,
Você diz que dá na bola,
Vontade também consola:
Na bola você não dá!

Meu barco. . . et e.
130 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 131

E como as coisas vivem numa ligação fraterna Toada do Trapiâ. CIAJ.K.

bem comovente inda cabe lembrar que a estrofe da iJ'=Jul


� 0011 t,1tnn 1; 'J IFJJ I Jjí 1. 1
� 9JJ) IJ ... 11, [Jj J J 14, J 1 r jj 'J • J 1
versão paraibana andou no centro do Brasil e talvez
□•
pelo país todo, convertida num lundú famanado ,
"A cor morena". .,
1n J h i tJlJ J 1J , J •IJJ J]J.JJ IJ A
1,

Não ha home cumo o reis

1nn 10_ -@hJ 1nt5 u. □ -n Is n 1


R.0.D0 NOR.TI,
..l•t04.
Tatú é Caboclo do Sul
��, 11 i , To....,
COIAZ

���
Ta. • tú IÍ e&bo.�lo do . •ui,

Não ha home cumo o reis, Pouco menos. J.913


Nem mulher cumo a rainha
Nem peito cumo êste meu
! ! •lfítrLI.rl 1 D
m,, llu.la.t:i. bo.J1i • \.a eda.1>&11.ãde 1'..

i� rr 1 1 , 1, row d 1! ,o j •□ 1n g 1 1
J.l.Ln. dei eliamu o,.a. • ro • M,Kio

Nem guela cumo a minha 1


Cantadores desta terra
1
,1
S6 cantam por vozes minhas! �e <JUi. ,e.ram 01&n..dlll'; Uan .dei du.ln.,.rlh.rl . qw1.Dli:,, Dorn-dom.S111.� .dei quer��. tlll'!

Tatú é cabloco do sul,


Romance Sert&11ejo Peixe-boi é barão de Pará,

□ D J D IOQ O J ,p -li•
Peixe-boi é do fundo do rio,

&1QtJI
Mulata bonita é da banda de lá.
Mandei chamar Generosa,
Não me quiseram mandar;
Mandei chamar Mariquinha,
- Dom-dom -
Saudades quer me matar 1

Infelizmente meu colaborador não sabia mais


o texto. Contava porém causo de amores desinfe­
lizes, noivos que não casaram e calamidades dêsse
genero. É pena não se ter guardado o texto porquê
esta melodia, de sertanejos manifesta influência Zé Pum! Zé Pum!
portuguesa e de certo continha alguma deformação É .na linha do Zé Pum!
Por causa dessa criola
de romance tradicional. Eu inda dô na cara dum!
132 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 133

Toada
de Violeiro
ido violeiro Nitinho Pintor .1 S. PAULO.

w, J IUJLJlf ! l!JLJ I�• � 1tr/Ulf t'IWLJ 11, i


J=so PIRA(llCABA.(S.l\uol�l
J.ee.

ÇJi "., • ffi1 1.J 1U, U H H 1 ,J.


:_;;l_M �
•, Me . cêdliQUl!'l"IUC1..d, i'llt deu �1u. lo. Clll& C.. si.cu.mmuiê ei1Llne11t11 Pra oer,1 ci-lll&I■• jurl&I
Na.,;.cea. lu.&,11a1«es.tri, !& Pra Moéua.lu.rni. á,

Home casado num poCe Num cnso cum muié mngro


11 Na festa fazê mesura Que tuda. gente censura,
Quero casá cum muié gordo,
ti • 110, h 111&.d OIOpn,tea..mã1 Ai, ai, ai, al_ Eun.u.d lõÕpr.l.ea.mál Quando êle quê diverti
A muié tá de oiadura. Que.ro morrê na gordura.

Nasce a lua, nasce estrela Nasce o tigre, nasce a. fera, Logo pega: Bamo, bamo ! :Meu sogro matn cnpndo,
Pra no céu alumiá, Pra no sertão habitá, Nem que a noite teja escura, Eu mando busc:í. fressnra;
Todos nascem com destino, Todos nascem com destino, Adjunta os barrigudinho, Nois semo só nois dois,
Eu nasci só pra te amá 1 Eu nasci só pra te amá 1 A travessa na cintura. O mcno tres dia dura.
Ai, ai, ai, ai 1 ... Ai, ai, ai, ai 1 ...
Eu nasci só pra te' amá! .•. Eu nasci só pra te a.má.! ... Vô na casa do meu sogro
Me passa discompostura
Eu bem quero trabaiá
Nasce o cravo, n·asee a rosa, Mai a prigui�n me sigura.
Pro jardim noa enfeitá,
Todos nascem com destino,
Eu nasci só pra te a.má!
Na Venezuela (J. M. Furt, op. cit., pg. 51)
Ai, ai, ai, ai ... corre uma quadra assim :
Eu nasci só pra te amá! .•.
"No voy a los fandangos
Porque mi zamba (obrigação, niiilher) no
quiere
de Violeiro
Toada Porque dice que cantando
\do violeiro Nitinho Pintor, de Pirac1cabal,
8. PAULO. Enamoro las rnujeres"
-11 e· r Ir r e- r Ir r
Ja82

E E1 de Vi11letro Toada

�r r 1 fl1J Jf]
. Possuia letra se referindo ao general Isidoro De Cataguazes (Minas Gerais) possuo a toada
Dias Lopes. Infelizmente não registrada. (
de "Sô Mané Joaquim", muito antiga e é interes­
sante ajuntar a esta de Nitinho.
de Violeiro,
Toada Sô Mané Joaquim CATA.OUAZIS, fJlí-1.

1w.n 1r; � ,m., 11, ,·1mu 1u u 1nn� lf 1


8. PAULO.

,p► ,, 1•1mn1J p1.C0101 1 H(#UI


Ido violeiro Nitlnho Pintor.>

,,1;;"�
134 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 135
1 2
Toada ,,..,,u.

n nIn aI u u nm
Eu entrei num galinheiro Abre-te cambos e serras,
J.,,
f§wif111a�1-1
Pra eomer carne à fartura quero correr com cautela,
Apontou as barras do dia quero ver onde vai morrer
Senho.rado.01.d:i. u.u,S;i..la fü.ra,venha. y,3, O umb1.noier.u.l.?O,tâque.rendoam.lnhe .e�! E se veio a cadela escura. a fama desta cadela.

Senhora dona da casa, 3 4


8áia fora, venha vê, Corri legua e corri quadra, Me atirei no Quaraim,
O samba no terreiro, pensando que ia solito. naquele nado sem fim.
Tá querendo amanhecê 1 Quando eu olho pra traz, Tornei a olh::tr para traz
Ai, se vinha a cadela aos g-dto. E a cadela atraz de mim.
Tem de curioso trazer a frase do "Guarani", 5 6
quasi inteirinha. 0oincidencia, Influencia do "Gua­ No descer um costabab:o Eu saí a trotezinho
rani" 1 Ou foi Carlos Gomes que botou frase po­ e no subir um chapadão, no rumo do vóio Estácio,
pular tradicional na ópera dele'/ Tudo é possível já me afrouxaram as pernas, me saltou quatro gaucho
porquê esta toada paranaense me comunicada por
.
já me esmoreceu o garr5.o. de facão e bola e laço.
7
aluna, obedece como tipo melodico a um verdadeiro Vinha um desses gaúcho
8
Vinha outro dos gaúcho
nomos tradicional, frequentíssimo em variantes in­ Em um bagual colorado. Em um bagual picaço.
finitas, - dotadas sempre da mesma monotonia me­ Mas ô bagual que corre Torceu o bagual pra um lado
lancolica, entre os cantadores brasileiros, especial­ e que me traz atropelado 1 e me mandou a argola lo laço.
mente de Minas e S. Paulo. E aparece até no Rio 9 10
Grande do Bul. E possuo mesmo um documento da Vinha outro dos gaúcho Vinha outro dos gaúcho
Amazonia Bill que esta mesma frase aparece. Não Em um bagual tordilhiriho.
�ste me pegou um laçaço
que nem parecia gente
pois levou a. mão no rev6lve,
dou êle aqui porque entra noutro estudo de interesse desde a cola até o fociilho. levantou te.rra na frente.
mais particular. 11 12
Chegou o fim da minha vida, Antes de eu morrer
Toada do Chico Sôrro Ei é triste de se ver. tive um bonito regalo:
i1 J.,. R. GR.ANDB DO SUL (S�P,.I.

gí 1" WIU!J U1J I i1tt+, h f4uJffi 1,lzim 1


Nos dentes desta cadela distância de. quatro leguas
�r±I±± conheço que vou morrer. Eu ouvi cantar o gâlo.

411 an ian ij i, iH H RH
13
ffíl Jffl 1hH Na cochilha dos venta.nas

,�1 H J u H J J 1 ®�H-tt rtflt r r


morreu um forte guerreiro,

r rt r �
comandante de polícia,
Chico Sôrr-o de Oliveira.
!11 m.lreinwn ga.11 • llllel. re Pra eo.mer eu.Mi fu

Sôrro - zorro, raposa, ladrão de galinheiro.


tu. ra..Aponto11 &$ l;,u.ras do
1 j H .ls--ttJJ-3 r; J u
dl.1.,I M e& .de.l._e. Tambem no Rio Grande do Sul é costume o

''11 i i j u.,
• eu. n..A.p&n.1011

u bar. ns
li j
di. a.,e .j J j i J J
n. '°"' ca. .de.a.H
IJ J
. e• . .._
,. r r !}li canto em comum sempre baseado num falso-bordão
de terças e sextas.
136 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 137
Toada do Lauro Louro
SERRA
Prenda minha
.;,
r •. I' E � □ 1-1:1n1.anuJ,p>J1J..-----,,u
(R. Gn.W "' S.Z). R,G, DO SUL.

�i1111J Jj J
rrn J u n □ 1wJH-Mm, 1 J cm
Ve. lho P&u • 11.11a t<!m 11J11 ri • lho qua • �i ho • me, quan. do tem rni • u. oio \"011-metmbn r�.•·ou-mePm.bo.ra,l'rtDC!&mi.11.ha,Tellho mui .toque r,. .ur:

� . '
Ii iw
co.me,Pegi..,fLe&ew,i brl • ga� Por i�. •o mesmo que m�chamo L&uro Lou.ro, Melo& fa.ca., li.roo
1 -J#�
§, 1111 J., }1114-JJU N I J. !
ier: Te11io d'ir pu.,
n;_JJ O I J J J UJ,IJ_!J�F
ro.de.lo,prend•millhA,No-.po
rr.---1

dobem.qiie.nr.T,nlw

c011m,e ra.,a bo.. tas pn, cal • çar.


l'&w J o □ 1
� .,I�
1 J IJ
J J J IJ .J 1. J 1• J J J 1
w IJ J J J IJ .J U -1 J uJ.JIJIlj-:-il
Velho Paulino
Tem um filho qunsi homc,
Quando tcri1 raiva não come, � _ o.e
Pega a faca e vai brigar;
Por isso mesmo
Vou-me embora, vou-me embora 1
f bis.
Que me chamo Lauro Louro,
Meto a faca, tiro o couro, Prenda minha,
Tenho muito que fazer: J
E fuço botas pra calçar.
Tenho de ir para Rodeio, l
Prenda minha, }
No campo do bem querer. J
Tolda do Oneron Noite escura, noite escura,
R,O. 00 9UL,
'tk11tl-,o dlt Boqulrlt, M,ufnl
Prenda minha f bis.
Toé!.a a lloite me atentou
Quando· foi de ritadrugada 1} bis.

=" lJ J
Sou flllto do U.p "'°'· "'• ª Prenda minha
Foi-se embora e me deixou. J
1 J ] Ir • •

•= u .. .J 1
" . r• •..:li.-•
.J
;
111,11 , lo
JJ
M.eJlo • ,. • •o•
1 1 •1
O refrão é instrumental.
Sou filho dçi tigre mouro,
Neto do tigr_e pintado, Sílvio Romero nos "Cantos Populares" dá uma
Me chamam �e tira-sciama, versão sergipana da 2.ª estrofe.
De muito tenho tirado!
138 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 139

MARTELOS, DESAFIOS, CHULAS Desafio

� � nu Ô ara)] ,n
de Violeiro. �UNAS,

Martelo Esperança �,,,J.,,.


IJ oram
cJf�:'l'
1 PERNAKBUOO.

� J 1J l 1 '.i J '.i 1 • l i • l i IJ l j ±l J 1
La no 111e11 ser.lii.o 1°9ffl mu,.ta '}u1. u. h, Quetl c11.me d& ca.bra, Tu,..

..... 5 J. DJ� i J. i 1 , l 5 J J
cr,�.ti.o, Pa! mas.•� ILI m'IO, Dá
1 1 D jJJ 2
dl; · de •bar.ri.gil..• Tom ea..lln. d1 a. �e que. Cachorro que engole osso
Nalguma coisa se fia
Quando eu topo muié veia Quando eu topo muié veia l
Dou benção e chamo tia Dou ben�o e chamo tia S bis.
Caititú de mato grosso
Corre mais do que cotia.

Desafio
-n#•·
NORDBSTB.

,.. t.r iJ □ 1 J
••
ptl 1J g ffl □ 1,JJ
Li no meu sertão 1
Tem muita quixaba, ffi Jl IJ IJ •I
· Que é cumê de cabra, •�--- -
S.11Mani do RI.a • chio Que J>3.ea.do1laot. u11! llm &. l!O tla bomd'l11.,er.11C1 Seu ri. &.ehoniooor. nu!
Também de cristão,
Fai massa na mão, Cabeceira: Riabhão:
Dá dô-de-barriga ... Seu Mané do Riachão Meu riacho não correu
Tem cabra de aço Que pecado são os seu 1 Lhe digo, meu cavalheiro,
Que morre e não briga 1 Um ano tão bom de inverno E que as chuvas foram pouca
Seu riacho não correu 1 Pra cima, prás cabeceira,
Esperança 1
:e da mata verde } bis. Desafio entre os celebres cantadores Mané do
Riachão e Cabeceira.
Notar a· deliciosa extranheza modulatoria da
O Martelo, informa João do Norte é uma poe­ peça, sem que por isso ela perca o caracter brasi­
leiro.
sia historiada. O refrão em :rp.etro no geral mais
curto, chamam comumente de carretilha, me ·infor­ Desafio a Ma.nué do Ri&chão
()!asi recil4livo. P!RNAJOUCO,
ma Ascenso Ferreira. Este martelo se confunde
,n1111 •LJ1, rwirwi i nw.1J,1
'""- -
,Jjl 1'!"15!
com a forma generica do coco nisso de possuir estro­ StuKu.1111 do Ili.a .ellio, ln.da - UI!> per.pn.U..

fe de musica simples e refrão mais melodico e bem


curto.
1#!11 li• J 1 ;WfJ Ir ¼] I Q/4_.W@i
O q,w ,i qnoo O.MI " Qu ., mienio pnd• � p
140 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 141
Seu Manué do Riaehão, OuéoSolouéaLua. nima rigidez estraga por completo uma peça assim.
Inda vou. lhe pergunta, Ou as estrêlas ou a fumaça, Evidentemente se trata duma musica, primitiva
O que é que os óio vê Ou é qualquer obijeto ainda sob o ponto-de-vista artistico, quero dizer,
Que a mão não pode pegá T Trancado numa vidraça.
ainda interessada em que a significação das pala­
vras é que tem importancia decisiva e absoluta. O
Esta melopéa magnifica de malinconia, parece que não impede que justamente por causa dêsse
ter pertencido a êsse cantador famanadissimo que clesequilibrio os nossos nordestinos cantadores te­
foi Manué do Riachão. É muito comum deante de nham atingido uma riqueza prodigiosa de liberdade
certos cantos do nordeste a perplexidade do coletor, rítmica.
tal a liberdade e a subtileza do laisser aller ritmico
com que a gente de lá canta. Cantam com a subti­ Chula Par o ara
Al!AZONIA..
leza ritmica de quem está falando, com a maxima
p-r� �Itfffl I D D
J•St .

despreocupação. É muito possivel que nessa gente


do nordeste cantando dêsse geito, em contraste de­ Se.nho. r& d-Ona Te.r,, .za Fui on.\emd.. em.pro.ga.do Ofe,.Jio n.u,mul.lo

cidrdo com a ritmica isoladamente musical estabele­ --,--


cida pela musica europea desque criou os valores de Fi+4�UWtftlii#4il-t�
ea .ro B acar.nosocaii fi .<lal.ga! Doii•lh� u.m.a,dmi,\hoduu,dnulhe troa, Lllhi.Te.

m_; 11 M
tempo musical e o compasso, é muito possível que
nesses nordestinos a gente vá encontrar uma repro­ �I � ;-q..q.g;w-fflqg lJ � 11 ,J§ íg
dução contemporanea da maneira de cantar dos rap­ re .zan:i.ome11epdes\a vez! SlnhA Te . re .u mefezdu suu, Pe,:w,moo. roupa, Jop;ou no. ru . li!

sodos gregos ou do canto cristão primitivo. Com Senhora dona Tereza { Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três,
efeito se dá neles uma união absoluta da musica e F ui ontem desempregado Sb� Sinhá. Tereza não me pega desta vez!
da palavra falada, de formas a tornar impossível O feiJ"ão está ·muito car.o 1 Sinhá Tcreza me fez das suas,
l bis
uma fixação ritmico-musical isolada. É a maneira E a carne seca é fidalga! J Pegou-me a roupa, jogou na rua!
de falar, natural e despreocupada, que determina As mulheres por natureza
ás vezes em absoluto a sucessão dos sons da melodia. Carrega sua fé segura:
Ora como a fala despreocupada nem sempre se rea­ Quanto mais mente mais fala, 1 bi8
liza exatamente da mesma forma ao repetir a mes­ Quanto mais fala mais jtJra. f
Dou-lhe uma etc.
ma frase pelo fato mesmo de ser despreocupada, As mulheres quando resolvem
sucede pois que repetindo a mesma melodia com o Falar da vida alheia
mesmo texto, o cantador já não ritmou exatamente Principia na lua-nova
da mesma maneira da primeira vez. Quanto mais si Acaba na lua-cheia.
Dou-lhe uma etc.
o texto varia! . Na verda:de a segunda quadra que Moça feia qúando casa
consignei Ou é o sol etc. já requeria nova ritmisa­ Julga logo por feliz;
ção da melopéa. Se dá pois em muitos dêsses cantos Passa uma pela outra
um rubato constante e subtil, maravilhosamente Arrebitando o nariz.
variado. Aqui é bem êsse, o caso. Qualquer e mi- Duu-lhe uma ele.

10 _J
'I
'

142 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 143

Colhida por mim dum paroara. Dêsses que de­ Este lundú tem um movimento muito coreográ­
pois de irem gastar na terra: deles o dinheiro ganho fico. A palavra "lundú" está desaparecendo. Aqui
na borracha, voltam de novo pros seringais. Assim no centro elo país indica especialmente uma cantiga
praceana de andamento mais vivo que o da modinha
êle ... Era moreno; corpo rijo, e de palidez pra
e com texto de. caracter comico, ironico, indiscreto.
nunca mais. Cantava pouco, quanto falava, mas O "Gosto da Negra" que segue, corresponde bem ao
tudo bem. Era deliciosa a maneira rubatisada, que chamamos por aqui de "lundú". No norte lun­
cheia de -acentos e prolongamentos inesperados com dú inda permanece mais proximo da dança. No
que dizia esta chula de tanta malinconia. interior do Estado do Pará "lundú" é ainda urna
dança, me informa o prof. José Domin gues Bran­
A segunda estrofe lembra Portugal: dão, de Belem, autor ele duas Rapsodias Brasileiras
pra orquestra.
"Lindos olhos tem a cobra
Q 'ando olha de repente;
L...i.i
..... Gosto da Negra BRAOANCA. ts. ,-,o>.

Ninguem se fie em mulheres,


Quanto·mais jura mais mente".
, .J ......&J J1fJJJ,í
.. M .pNt•d9•ur.d.o, hW.W
ITT1R JJJ Ji
por • . 1-sn""- ,.... •

Lei_te de Vasconcellos ("Tradições Populares �h .1! b r; r i r- ;j• O 1â 5 J J , 1 r ' .1 l .11 ]


de Portugal", Porto, ed. Clavel e Cia. pg. 143.) •
:do, Qu itnam'.la. por.a 'l• f•.lcm 1W mim, hp.to 4- 1111. era-.-... •ta�

1
Eu gosto da negra Que bem m 'importa
Gôr de earvã?, Que falem de mim,
LUNDúS E MODINHAS Eu tenho por ela Eu gosto da negra
(._-fraude paixão. :Mesmo assim 1
Lundú com Ga.nzá .......... A aluna que me comunicou êste lundú, ignorava
a continuação elos versos. Tanto pela forma e ex­
pressão musicais como pelo simples facto de ser
caracteristicamente lundú, êste documento parece
provir elo sec. XIX.

Lundú de nrgro \'elho.


Ma ?.falia

4:�---n 1�. o [JJ 11


Cantado por preto com acompanhamento de ).100
FRANCA. <s. P...Jol

ganzá, o que aproxima este lundú, tão provavel­


mente afroamericano, dos cocos de ganzá. O cola­ M.a.11&. li • a..m1. amw .ti, Ida.Mo.. li • 1,11U.• mw.e, Um r.. . •Ô n. vu li pi.

borador ignorava a letra e não precisou o Estado


nordestino em que escutara o documento.
,-Ü □ 1HJ}ffr,;31gmJ]1J 'J.llA bw11
di Um (a. , ..õ eu �Ili u pi • di. Qua.nn rond,i. vi& mi bw.un • "4, QU&110 ron.da .,iftmi hu•llll • o.,
J
144 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 145
,l
:j!:fJJJ íJ 113Jjjj U ,g (bis)
II.
Lá nus caminho ri Mina
S..IA•cll - u..e4,!,la.lh.ll.a,.ml&mul. &, (bis) Uma onça mi roncô
Pi.Ili 11. M d.! Su...t.,Cnw,1i.n1111m D111
Li.n. un.to ti.nll li.,o'li ma.. 16- (bis) Quano eu fui zoiá. para ela
(bisQ Meu curação palapitô,

�• • -13 íHhJS••0) 1-1 -1- -13- U- ijj alalalal 1-1j. -I -D- Sala-cu-saco, ma Malia, ma famá,
ZGio dela cumo tá rigalado,
Ll.n. u•.lo ti.uU.,01I-. aô Ti. pln..dil. h,.do&u,MígiaidiOa.lA. CL11..1o!T,i; pla_du. Nalizi dela cumo tá libitado,
Pelo dela cumo tá lipiado,
Pata dela cumo tá calapaçado !
, J 1J. lUtJ (bis) Tengô, tengô, ma famá, (etc.)
lt..<fo.S. h.io 4i Ba.pl • U. \&l TH • gô ten.,tô 111& ta • iü T(n • cô migõ ma ta •
III.
Quando eu era nu meu tera
rll IJJJJ.JI IJJ UJ ;JJJJI
(bis)
�► ; (bis) Era rei de Zinangora, ( Àngola)

*
- Wa.li. •• mi.• .., . 1,. n11J11al ra.n.--or. d,..do• Ma.li. a dil Coagv,1111.111m.l ra.ra. di P•. (bis) Gora tô in tera di blanco
(bis) Zoga cabungo foral
44., t 1tn 111".J, 1Q Ud 01fJ•J1IA u.r l Sala-cu-saco (etc.)
Q..llol Ili Ili ba hal- U 11111 e&..mU!ho ri MI.•• La 111aa e... mi. Ilho rt (como da_I.a vez)
1

• O LI.j I F3
lll.aa V • nu. ota ,- •
lA IJ
mi 1(111 • câ U·1uon • 'I& mi
.._
N>a • e&
'J ) 1
O R é sempre brando. Algumas coisas, como
"sàla-cu-saco" não compreendo. Cabungo, nos luga­

'f Q O DJ l�l •n IPcg 1


N H.14 pala • • k Q111.no• !ili u.14 pa...1&
□ LJ1••JiJJJ 1
r. K.i11 "" • npt,,. . 1-.pl •
res sem latrina de geito nenhum, é o barril onde
jogam as fezes que depois o empregado vai atirar
longe.

U
u-1, □ bsa 1-1 11·tJ o Iu a a u 11sf±L-
U.. eu. • r&.4iop,. . la.pi . tõ s...1...... • U..CIOlll&KI..Ji.& 111&f& . 111.i.
Grafei pedaço mais longo da musica, embora
lo.M de.la l!U..IIIO tá repetição, pra mostrar a variedade rítmica ocasio­
Na 1i-d de.la e,, mo U, ,Lbi • tau
ri.(& • !,,do

h•ID de.la eq.mo U. li. pi • ado na:da pela prosodia em parte, pela irregularidade
0

h.L& M.k •·- ti.•. la.,-·""'-'""'


I
do verso mal feito, e em grande parte tambem pela
(bis) Ma 1falia, mia muié, fantasia que vai se libertando e se manifestando
(bis) Um favô eu vai ti pidi:
. (bis) Quano ronda vié mi busun,cá,
mais, á medida que a peça continua. Com efeito na
(lJiS) Ocê fala quí eu num tá ai. 1.ª estrofe o ritmo está bem batido e sob o ponto-de­
Sa la-cn-snco, ma Ma lia, mia. muié, -vista brasileiro é simples. Depois se complica
Pelo siná di Santa Cruiz, liva num Deu
LiYn santo tít nu livo zi mai6 extraordinariamente, as sincopas se multiplicam,
Lh"a santo tá nu livo zi menó alJarecem antecipações rítmicas;, pequenos apres­
T:'i. pindulado são Migué di Calar:mzo 1
Tá pindulado são Juão di Bapitita sados, rubatos subtis, dificílimos, impossíveis de
(bis) Tengô tengô ma famá grafar com exatidão absoluta. O refrão da 2.ª es­
li.falia, mia muié, hum mi fara cum sordado !
li Malia du Congo, num fnra di pecado! trofe repete a musica do refrão da primeira e vai
Rôhê! ... haha! .. sempre assrm.
146 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASrLEIRA 147

-
A palínilhar longas Estradas Estela. S. PAULO•

'4H ;, uarr1 1r i ; 1rz::untm · rn 1,-, Sh�,u


-
Modinha. R.0. DO NORTE. .l-116

ll-,J3 IR=iJ,J Que


i
n�1teopleru.lun io e cornocm �onhoassim ri. sonho BoLan.do lá no céu beijando
trelas peloa..zu! Vag.,.m&0r • rmdoestásdnr. nitr,do Eu venho meu
o m:tr As e�,
A P•l.ml . lhu fon.g:H es • Ira. da.s íle lon.g,, Tim p&. U, \e a.. mor tedespcr.tar

"
..-
m Oll.Vin.dou !ris • l.oa o, • r& • pon. gas NBA ma.ta• lrl• . \es & ge . · mor,
�tnn11 a1r, 1r ri 1r u@cr1r i Ir 1�
Al, oomo bel.J11-o 11W' o lu • arl O ffl&l'SU�pl.rf, ge. mee iremo! B do
A palmilhar longas estradas rr,---,�
l'i B li t.Cl IFtsdlt
- ',1
De longe vim para te ver 1· ·1r rI-•1•1mw
rr 1 -
Ouvindo as tristes arapongas ai • toda céu 110rrlndo 11n • do. A. cor.da!abreaJ'l..ne. !a,Eúe.Ja.1 8 do
Nas matas tristes a gemer.
Que D.oite! o plenilúnio Em teu leito de sedas
É como um sonho, Dormes quieta.,
Nas Horas Mortas da Noite Assim risonho, O teu poeta

'
Boiando lá no céu, Canta para teu sono
8. PAULO. Beijando o mar! SuaviSà.r.
'J.u, As estrelas pelo azul Dorme f Cantarei·
11 J l l 1l l J I J 1 ) -· :.--= ==--
Vagam sorrindo,
Estás dormindo.
Como suave
Canto de ave,
Nu llo.ru mar.tu d& nol • se Co • 111<1i doeeo l9lt ,li &ar __ Eu venho meu amor Que gorgeia no céu
Te despertar 1

f �'"� .. r·"
Fitando o luar!

l J 1 1l ll 1 J l.l 1 J. 1�.
...J
Ai, como beija o mar
-u u.u..laa ""' Nu GD .du qule,IU �--=- (; O luar!
O mar suspira, geme

• 11
E tremei

Qutufo&Lll.&111&.�S.tO H
IJ J l IJ J. J I J
Brl.lha.n.WI liil.da.e r01 ..,
J E do alto do céu sorrindo
Lindo,
Acorda abre a janela,
Estela!
1 1J
.)
J. 1
ll j l 1 •1 JJ J Registro a poesia que nem escutei, deformada.
Co. mo don • te. la Vlli . do "" -..guas � "' •• ru! ___

Nas horas mortas da noite Fiz hoje um Ano


Como é doce o meditar S. PAULO.

·,l • w Y1 1 r i •na Ir ; • w 1:n I j "i 1 .11


J•s3
Quando as estrelas scintilam e). ,.-,-
Nas ond11s quietas do mar!
Fu ho.JellDI.. & • .IIO
j 1
hmnllllllelnbro&. l.n .d&
,.. Qilek.l&.n.• U11. .d& aom&llloo.lhutr:11 •

nu J1cr&:l 1i J.11
Quando a Lua majestosa .
1
Brilhando linda, e formosa
Como -donzela vaidosa 1 w- w nCtr 1i ;i�
c).1i' 0 811 r,J
to.11.bó, fubl!J�WII. &. 11.0 OOl!l.molembl'l)4.go. r., Que11.es.t11. ho. r& 1111111.pLrecestaem ..,.nliol
Nas águas se vai mirar!
Esta modinha é bastante antiga. Minha mãi a "j Faz
Que
hoje um ano· bem me lembro ainda
estavas linda com êsse olhar tristonho,

i
conheceu em meninota, o que dá pro documento já Faz hoje um ano bem me l1;1mbro agora
uns 60 anos no mínimo. Que a esta hora me apareceste em sonho!

'
'

i
148 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 149
É modinha bem antiga. A escutei piasote e vem 6
pois do sec. XIX. Não me lembro do resto dos ver­
Empadas
Andante.ritmado s. PAULO,
sos ou nunca sube mesmo.
w1�1 �¼ÍJJ�I
>
cJ•� >,- �
utrtfE
Senllo. ra do.n.. do u. 11,, ,•ew na. J•. ce!a.Lper.el. i.!

·u•pr �trr
PHEGC>ES -7'
> §
�.GJ;iJ r,,.
11
Ttnhaum. pa.4-. quen.tl.nha,C• . ma..rio ar. re.chel. 1Udol?..,
1
Amendoim Senhora dona de casa,

w& 1- r □ =
Andante. S. PAULO. Venha na janela aperciá 1

rr>
Pu. so 01.t.. rMD..doim tor • ri
1 t Tenho a empada quentinha,
Camarão arrecheá (do) ! ..

7
O Cego

I· □
2
NORDESTE
tento, recitad.9.

Andantino,.
Marcel& PBRNAMBUCO. 1r Ul
FD' F E, E,r r r ►
-ftv , d ICE i ; 1p • U IãJ tJ d IC rir r 1
E11 &e.n.ha llll.l'. e& • l& pra 11'11 • qs • MI • (rol!..

1� ' 1 li
<- Este canto maravilhoso me comunicado por
3 Lionel Silva esquecido do texto, é o unico documento
Cocada
f ••
Lento recitado. CAJl'ITAL ftDHAL.
brasileiro que eonheço em que o hipolidio está siste­
� J Co.q • ckt
F � J J • p�JJ4JJ
Pte.ta• brui • eal
li matisado. Porém êste se acomoda perfeitamente
com a psicologia musical do brasileiro e sobre isso
temos uma anedota que é bem fina. Quando L. Gallet
publicou a 1.ª edição das "6 Melodias Populares
4

.◄
Pinhão Brasileiras" ( ed. eit.) um- êrro feliz de impressão

}J� � J- -1
' � t li
8. PAULO.

J
fez com que a peça "A Perdiz piou no Campo" em
lá maior, saisse com 4 sustenidos na armadura de
PI.DhioqllOA • t,,queqw,l.m&& gen
#-
• k!.Bii qlll'II .te,JaU.l&. la!Sti 4uen. te!"'
clave. A peça ficava em hipolidio. . . Ninguem
quasi não percebeu o engano, a melodia ganhou mui­
to sem perder o caraeter e foi assim que O. Respighi
Sorvete a empregou na "Suite Brasiliana". A honestidade

r Jlf
de L. Gallet o obrigou a restabelecer a armadura de
Anda�. S. PAULO.
• '
•• '';
..
�i 1 � 1 J Jl- lá maior na 2.ª Edição. Honestidade feito muitas
.1&.li, •
Sor . u. le, • 001.• outras: louvavel porêm lastimavel ...
1
l

NOTA FINAL

E esta nota é só pra agradecer, não por mim


que êste livro não é meu, agradecer por todos, a
serie grande de gente que concorreram prá exposi­
ção das melodias. De tempos pra cá os meus esfor­
ços e m registrar melodias nacionais encontrou o
apôio de alunos, amigos e mesmo patricios que vie­
ram me dar com o nome e a residencia deles ( coisa
indispensavel pra controlar a verdade da colabora­
ção) muito doeumento interessante. Si é certo que
muita coisa eu mesmo colhi do natural, talvez quasi
metade do livro é feita por colaboração. E dentre
os colaboradores que me derammais dum documento
registrado neste livro, é bom guardar o nome de
dona Germana Bittencourt, Antonio Bento de Arau­
jo Lima, Ascenso Ferreira, José Americo de Al­
meida, Lionel Silva, Mario Pedrosa, Rosario Fusco
e Pierre Silva, Benedito Dutra Teixeira, Rui Cirne
Lima, Fabiano Lozano, clona Aida de Almeida e
João Cibclla.

\
'...
A Música e a Canção
Populare8 no Brasil
r

EXPLICA CÃO

Mario de Andrade escreveu "A Música e a


Canção Populares no Brasil" em janeiro de 1936,
para o Institut International de Coopération Intel­
lectuelle. Nessa mesma data o trabalho foi divul­
gado pelo nosso Ministérip das Relações Exterio­
res e publicado também pela -"Revista do Arquivo
11íunicipal", ano II, n.º XIX, São Panlo, Depa,rta­
mento de Cultura, janeiro de 1936, O. ln,stitut In­
ternational de Coopération Intellect·ue-lle, pelo seu
Département d'Art, d'Archéologie et d'Ethnologie,
só o publicou três anos depois, em ·' F'olldore JJu-
sical, Paris, 1939.
Ern pasta destinada aos estudos que deueriam
compor êste vol. VI das suas Obreis Completas,
Mario de Andrade deixou um dos exemplares mi­
meografados de "A Música e a Canção Populares
no Brasil", distribuídos pelo Ministér-io da.� Rela­
ções Exteriores, e nêle fêz correçíies r acrésci1nos
pequenos. Ao exemplar foram agregadas, na en­
cadernação, muitas fôlhas em branco. ."vla-rio 'de
Andrade começou a utilizá-las para uma '·Conti­
nuação da Bibliografia" contida no trabalho, mas
chegou a registrar apenas cinco livros. Dentro do
volume encontrou-se ain<J,,a uma fôlha de papel, sôl­
ta, também
0 com novos registros de livros, e várias
fichas bibliográficas. As anotações da fôlha sôlta
1,36 MÁRIO DE A�DRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 15í
forani feitas quase sempre apenas pelos nomes dos posteriores à bibliografia piibl(cada: O _mesmo se
autores ou das obras; e só na "Continuação dirá de vários livros estrangeiros incluidos tanto
da Bibliografia" há notas críticas aos trabalhos nas fichas quanto na bibliografia, �os qua�s r:,pare­
registrados. ceram, depois de 1936, boas traduçoes brasileiras.
Nas fichas estão quase tôdas as obras rnenc,io-, O possível argumento contra _o P;imeiro pon:o
ncidas na bibliografia de "A Música e a Canção
Populares no Brasil" e niais duas que não aparecem é a existência, nas fichas, de dois livros que ;)'ªº
nela. Confrontamos minuciosamente essas fichas aparecem na bibliografia. Não conheço u"!", Os
com a bibliografia. O resultado do exame parece Tupis do Gurupi" de Raimundo Lopes, assinalado
mostrar que elas representem não uma revisão des­ como irrpportante; ma_s o @utr�, o ':Maxambomba:s
sa bibliografia, mas /talvez o material de qiie Mario e Maracatus" de Maria Sette, e inuito fraco e real­
de Andrade se serviu para organizá-la: mente não merecia figurar numa bibliografia sele­
cionada. Somos levada a pensar que, após um me­
1) A biblio,grafia de "A Jliúsica e a Canção lhor exam.e do material Maria de Andrade afastou
Populares no Brasil" contém livros que não estão os dois já no tempo en:, que organizara "A Música
registrados nas fichas, inclusive, trabalhos impor­ e a C;,nção Populares no Brasit. O fato. de ter
tantes de Maria de Andrade. Apresenta ainda no­ assinalado como importante o livro de Raim�inclo
tas par!J, obras que aparecem nas fichas sem a me­ Lopes não invalida a conclusão, pois vário� livros
nor crítica. são tratados com muito entusiasmo nas fichas e
bastante moderação na bibliografia.
2) Quando há dessemelhança entre as nota.�
da bibliografia e das fichas, aquelas estão quase Ao segundo ponto também caberia uma_ objeção:
sempre em versão melhor. boa quantidade de fichas têm notas 'f!l'ais ª'»'!'l?las
que as escritas na bibliografia, incluin�o criticas
3) Tanto na bibliografia quanto nas fichas, mais detalhadas e, em muitos casos, mais severas.
o "Compêndio de História da Jliúsica" de Maria de �
Entretanto, as modificações e conclensaçoes que es-
Andrade e a "História da Música Brasileira" de sas fichas teriam sofrido, ao sere?'fl' incorporadas
Renato Almeida estão registrados em edições anti­ definitivamente ao. tr_abalh�, exl?licam-�e com fa­
gas: o "Compêndio", na 2." ed. (1933) e a "Histó­ cilidade: como a bibliografia. foi organizada para
ria", na fraca primeira edição (1926). Do "Com­ um serviço oficial, destinada à_ �ivulgação no es­
pêndio" apareceu em 1936 a 3." edição e em 1942 a trangeiro, e possivelmente condicion�da a um<!' en­
1." edição com o título de "Pequena História da comenda que fixaria número de páginas, Mario d;­
Música; da "História" de Renato Almeida saiu em Andrade deve ter achado melhor abster-se de cri­
1942 a importantíssima 2." edição, pràticamente um ticas minuciosas. Optou assim por observaçõe.�, de
novo livro. Ora, Maria de Andrade não de·i-xaria ordem geral, principalmente indicações do, conteutll;
tle assinalar essas norns edições. sr as fichas fóssem dos livros, critério mais adequado ao genero e a,

li
158 MÁRIO DE ANDRADE
ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 159
destinação do trabalho. Mas, como frequentemente
fazia, guardou as fichas primitivas, que lhe po­ lógica, 0 "Centro de Pesqu_isas Folclóricas ]Iario
de Andrade'' ligado à cadeira de Folclore do Con­
deriam ser úteis quando quisesse ampliá-lo.
servatório D;amátíco e Musical de São i:a_ulo, Cen­
É bem provável, assim, que Mario de Andrade tro fundado e dirigido pelo_ prof. Rossini Taya�es
pràticamente não tenha tocado em "A Música e a de Lima , a Comissão Nacional e suas C omissoes
Canção Populares no Brasil", após a sua publica­ Estaduais de Folclore, subordinadas ao �becc
ção. Apenas se limitou a corrigir levemente alguns (órgão da Unesc� no Brasil), criadas e apoiadas
êrros e a anotar sumàriamente mais alguns livro,s por Renato Almeida.
incluíveis no bibliografia. Dêstes poucos, os últi­
mos em data são os seus estudos "Música do Por tais explicações e por se tr�tar �e trabalho
Brasil" e "A Nau Catarineta", ambos publicados feito há dezenove anos, não é P:eciso dizer gue as
em 1941. E ·cabe notar, em refôrço da hipótese de partes informativas de "A Música e a Ca_nçao Po­
que o trabalho não sofreu revisão i,erdadeira após pulares no Brasil" estão ag_or_a ba�tante incomple -
1936, que nos seus novos registros bibliográficos . tas. Mas julgamos necessario salientar q!"e� ape­
Mario de Andrade nem sequer. mencionou sua mo­ sar das limitações trazidas pelo tempo, a bib_liogra-
delar monografia "O Samba Rural Paulista", pu­ . fia e a discografia continuam válidas e úteis,. pe!a
blicada em 1938. seleção e crítica de obras que permanecera'i:1' indis­
pensáveis ao conhecimento do folclore mu�ical bra­
1lfario de .Andrade deixou também com o seu sileiro. (Dos livros recenseados por Maria de An­
conteúdq primitivo a discografia que constitui a drade, muitos têm edições novas, algumas anotadas,
parte II de "A Música e a Canção Populares no feitas recentemente).
Brasil". A 3.ª edição do seu "Compêndio de His­
tória da Música" (São Paulo, L. G. Miranda, A grande importância de "A Música e a Can­
1.'J36) traz, no capítillo .XII, relcu;üo mnior de discos ção Populares no Brasil" re�id� _ na sua p e qii�na
de música, popular brasileira, relação aproveitada mas fundamental parte doutrinaria. Nas conside­
na"Pequenci História da illúsica" (Süo Paulo, Li­ rações com qiie precedeu o levantam;e1:to da do�u­
,
vra.r·ia Jl[art ins, 1.942) e excluída, com tôda a d·i,ç­ mentação então existente sôbre a musica folclor_ica
cografia, da edição do mesmo livro feita para a.� brasileira, Mario de Andrade expôs pontos-d�-vista
Obras Completas (i•ol. YIII, São Paulo, Livraria que representavam, no tempo, u_ma verdadeira re­
·Martins, 1.'J44). Os discos recenseados nessas dis­ volução das principais bases teóricas e':11' que se f1:,n­
cografias estão esgotados há muito tempo. davam os estudos do Folclore. Part�n.do da: s dife­
Na parte destinada às insti'trµ,ições públicas renças de formação e estrutura sociaif _existent�s
que se ocupam do folclor.e miisical brasileiro, seria. entre os povos da Europa e os �a :4-mer3:ca, 111a:;io
preciso mencionar hoje, entre as surgidas após de Andrade salientou pela primeira ":�f, em A
1.936, pelo menos as mais ativas: em ordem crono- Música e a Canção Populares no Br_a�il , a _neces­
sidade de rever-se o conceito de tradiçao e a impos-

· EH
mi
'I

160 MÁRIO DE ANDRADE


r ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA lti]

si�il_idade de con_siderar-se as manifestações fol­ 3) Foi respeitado o proc,esso que Mario if,,
cloricaf3 como fenomenos essencial e exclusivamente Andrade adotou para o registro dos livros, ein/;om
rurais. O tempo ffrmou essas verdades, que se in­ êle fuja aos preceitos técnicos de organização bi­
corporaram à teoria brasileira e americana do Fol­ bliográfica. Corrigimos apenas um pequeno nú­
mero de erros mitito evidentes, qiie atingirwm om
�lore,
, _e que muitos folcloristas europeus também nomes de autores ou de livros, ora a imprensa, e
Ja aceitaram ou redescobriram, levados pela obser­
vação não só da realida.de amieric(J,na, mas també'/11, assinalamos êsses casos com dois. asteriscos.
dos seus próprios campos de estudo. Na parte destinada às instituições brasileiras
que se dedicam a pesquisas de folclore, julga:mos
. Neste volume VI das Obras Completas de Ma­ de bom alvitre:
rio de Andrade, "A ],fúsica e a Canção Populares
no Brasil" é incluída tal como está na edição mi­ 1) Esclarecer, em nota de rodapé, um peque­
meografada feita pelo ,vfinistério das Relações Ex­ no engano referente à Discoteca.· Pública �Municipal
teriores e corrigida pelo autor em seu exemplar de de São Paulo. Tratando-se de trabalho informa­
trabalho. Entretanto, tomamos o cuidado de escla­ tivo, pensamos que também seria útil assinalar ern
recer ou retificar os seguintes pontos relativos à tal nota a existência, nessa repartição, de uma co­
bibliografia (partes III e IV): leç�o fonográfica mencionada por Mario de Andra­
1) .Na impossibilida.de de determinar com de em outro ponto do mesmo capítulo.
absoluta segurança se as fichas bibliográficas avul­ 2) Juntar uma nota sôbre o antigo Instit·uto
sas são anter-iores oit posteriores à primeira edição Nacional de Música (hoje Escola Nacional dr,
do trabalho, registramos em notas de rodapé as Música), em obediência a lembrete escrito por 1lfa­
ob�ervações críticas nela,.� contidas, sempre que am­ rio de Andrade na fôlha sôUa já várias vêzes
pliassem_ oit esclarecessem o nota. já publicada. ·mencionada.
Igual a�it�tde ado�amos pa.rn com as fichas que re�
ve�ª:11'. JUi�os muito fa.voráveis, ref armados, com Oneyda Alvarenga
criterio evidentemente melhor, nas versões constan­ (17-9-1954)
tes da bibliografia.
.'J) Registramos os dois livros existentes em
fichas e que não constavam da bibliografia, bem
como as novas obras indicadas numa das página.�
a�rescentadas �o exemplar de trabalho e na fôlha
solta. Seus numeras foram postos entre parênte­
ses e foram marcados com •as obras de que Mario
d,e Andrade anotou a.penas os títulos ou os nomes
dos autores.
A MúSIOA E A CANÇÃO POPULARES
NO BRASIL

O estudo científico da música popular brasilei­


ra ainda está por fazer. Nfüi há sôbre ela senão sín-'
kses mais ou menos fáceis, derivadas da necessida­
de pedagógica de mostrar aos estudantes a evolução
histórica da música brasileira. Por isso, o que existe
rle publicado tende naturalmente a estabelecer gene­
ralizações, muito mais de ordem crítica e prática
sôbre origens, influências e possibilidades musi­
cais, deixando de lado qualquer análise técnica
mais profunda, que possa realmente interessar à
musicologia folclória.
É preciso distinguir primeiramente, que cm
aossos países amerirnnos, há sempre dois campos
-distintos que a nmsicologia folclórica deverá cul­
tivar. Dum lado está a música dos Ameríndios,
,lo11tl'O a rnúsiea J"l]IHial' mieiorrnl propriamente
dita.
A música dos "\11wrínclios do Brasil é quase
,l,·semihecida em srnt,; <criaçôes melódicas. Jean de
J .,·ry já grafava, em 11osso primeiro século, algumas
melodias dos 'j'upi., do litoral, mas tanto dessa
c,,rno de outras cont ri lrni,J,es de igual gênero, não
ternos possibilidaclt• algnma ele contrôle para deter-
1uinar se são exatas 011 não. O mais provável é que
sPjam tôdas inexata�. i'.'ící no século XX aparecem

l'
'
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''
IG..J- MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA

estmlos perfeitos sôbre a vrática musical dos Ame- tados. (E mesmo clêstes, uma grande figura de fol­
1·Ílldios brasileiros, mas são poucos numerosos !l cir­ clorista, como Amadeu Amaral, levado pelo concei­
cunscritos a regiões relativamente pequenas. to do anonimato multissecular e generalização po­
Quanto à música vopular nacional, propria­ pular de Folclore, se viu obrigado a aceitar apenas
mente dita, a bibliografia também apresenta peque­ em número muito restrito, nos seus estudos.)
no número de obras de valor reahnente folclórico. Porém êsses documentos recebem melodias várias
A musicologia nacional está na infância, e só recen­ em cada região e mesmo em cada lugar. Será pos­
temente se vão fazendo colheitas de melodias' eom sível alguma rara vêz determinar, pelo estudo des­
espírito científico. sas diversas melodias sôbre um mesmo texto, que
uma parece mais antiga que outra; mas é impossí­
Aliás, o problema da música popular brasileira vel, pela ausência ele. elementos ele confrontação,
é de natureza muito especial, pelo fato de sermos imaginar o grau ele ancianiclade ele qualquer dela�.
uma nacioualidade de formação recente e não pro­
priamente autóctol!e. llS próprias condições e pro­ Assim, não teremos o que cientificamente se
gressos 'Cle feição arneritana, transformam podero­ chamará de "canção popular". Mas seria absurdo
san1ente o processo Lias nossas manifestações, po­ concluir por isso que não possuimos música popu­
pulares ou não. Por trnlo isso, um conceito rigida­ lar! Tanto no campo como na cidade florescem com
mente científico de ··<'anção popular", tal como a enorme abundância canções e danças que apresen­
etnografia a define, uos levaria com o sr. Julien tam todos os caracteres que a ciência exige
"1 Tiersot, na Encyclopér/ia de la Musi q·ue de Lavign ae, para determinar a validade folclórica duma mani­
a enearar a possibilidade ele negar a existência ele festação. Essas melodias nascem e morrem eorn
cançües po)luiarcs entre os povos americanos! rapidez, é verdade, o povo não• as conserva na me­
A bem <li½er, o Brnúl 11üo possni canr;iies popii­ mória. Mas se o documento musical em si· nã.o é
lares, muito embora possna ineontestàvelmente mú­ conservado, êle se cria sempre dentro ele certas
oica pop·nl-ar. Quero dizei·: nós não temos melodias normas de compor, ele certos processos de cantar.
tradicionalmente populares. Pelo me11os não exis­ reveste sempre formas determinadas, se manifesta
tem elementos por onde provar que tal melodia tem dentro 'de certas combinações instrumentais, contém
sequer nm século de existência. Os pouquíssimo8 sempre certo número de constâncias melódicas, mo­
documentos musicais populares impressos que nos tivos rítmicos, tendências tonais, maneiras de ca­
ficaram, de fins elo século XVIII ou princípios elo denciar, que todos já sã.o tradicionais, já perfeita­

1'
,i
século seguinte, já não são mais encontrados na bôca mente anônimos e autóctones, às vêzes peculiares, P
do povo, que dêles se esqueceu. Existem textos po­ sempre característicos elo Brasileiro. Não é tal (:an­
pulares, princ-ipalmente romances e quadras sôltas, ção determinada que é permanente, mas tudo aqnilo
<le origem ihfrica, que permanecem até agora can- de que ela é construida. A melodia, em seis ou dez

:Ijr.
,j,______
166 M{Rro DE ANDIIADE E'<8Al0 SÔBRE A MÚSlOA BRASILEIRA 167

>inos poderá obliterar-se na memória popular, mas acaba, o earnpo principia. E realmente numerosas
os seus elementos constitutivos permanecem usuais ,·idades brasileiras, apesar de todo o seu progresso
no povo, e com todos os requisitos, aparências e mecânico, siío <le espírito essencialmente rural.
fraquezas do "tradicional". (1) . ·
Por tudo isso, não· se deverá desprezar a
Outra face do problema que exige adapfação documentação urbana. Manifestações há, e muito
americana especial, é a questão do urbano. É de boa características, de música popular brasileira, que
ciência afastar-se de qualquer colheita folclórica a são especificamente urbanas, corno o Uhôro e a Mo­
1ocumentaçã� das grandes cidades, quase sempre dinha. Será preciso apenas ao estudioso discernir
llllpura. Sera possível adotar-se semelhante crité­ uo folclore urbano, o que é virtualmente autóctone,
rio para o Brasil 1 o que é tradicionalmente nacional, o que é essencial­
mente popular, enfim, do que é popularesco, feito
A_s condições de rapidez, falta de equilíbrio e à feição do popular, ou influenciado pelas modas
de umdade do progresso americano tornam indeli­ internacionais.
mitáveis espiritualmente, entre nós, as zonas rural
e urba;1ia. Nas regiões mais ricas do Brasil, qual­ Recusar a música populal' na('ional, só por não
_
quer c1dadrnha de fundo sertão já possui água en­ possuir ela documentos fixos, como recusar a do­
canada, ·esgôtos, luz elétrica e rádio. Mas por outro cumentação urbana só por ser urbana, é desconhecer
lado, nas :maiores cidades do país, no Rio de Janeiro a realidade brasileira.
"?º Reci�e, e� Belém, apesar de todo o progresso:
mternac1onahsmo e cultura, encontram-se núcleos I
legítimos de música popular em que a influência
deletéria do urbanismo não penetra. Institwi('Ões Públicas
A mais importante das razões 1dêsse fenômeno 1 - Museu Nacional, do Rio de Janeiro, -
está na interpenetração do rural e do urbano. Com Guardam-se no Museu Nacional os cilindros grava­
exceção do Rio de Janeiro, de São Paulo e poucas dos pelo prof. Roquette Pinto, entre os índios de
mais, tôdas as cidades brasileiras estão em contato Mato Grosso. Estes cilindros estão bastante dani­
'
direto e imediato com a zona rural. Não existem
1 ficados, mas atualmente fazem-se esforços no sen­
1 a bem <dizer, zonas intermediárias entre o urbano :
tido de salva-los.
, o rural propriamente ditos. No geral, onde a cidiwe
:j
2 - Phonogramm-Archfo, de P8ychologischen
(1) Do parágrafo que começa com "A bem dizer" até êste ponto, h:í, Institut, da Universidade de Berliin - Guarda-se
no exemplar de trabalho, um traço lateral .:êeito a lápis. A frase "mn�
tudo aquilo de que ela é construida", compreendida nesse treeho 1 foi nesta instituição a coleção dos fonogramas gravados
grifada a lápis. De acôrdo com os méÍodos de trabalho de Mári o 11 1' por Koch-Grnenberg, entre os índios do extremo­
, Andrade, êssea traço� !'leriam marcas para fiehamento1 estudo mais <lrse11- norte da Amazônia, bem como várias outras coleções
volvido ou aproveitamentt, l;!fil outra obra, (O. A. )

:,
168 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 169

menos importantes, de Ameríndios de outras partes [i - Gons.ervatório J)ra;mático e MusiGal, ue


do Brasil. São Paulo - Conserva em sua biblioteca uma pe­
quena coleção de estudos de alunos s?bre música
3 - Discoteca Pública Municipal, de São Pau­ popular. Êsses estudos contem melodias grafada,
lo - Esta instituição, fundada em agôsto de 1935,
por meios não mecânicos, e de precisão folrlórir'a
iniciou suas gravações científicas de música popu­
muito escassa.
lar brasileira em 1936. Possui um arquivo de ma­
trizes de discos populares, uma coleção de discos 6 - Musée des A.rchiues dr lu Parole, da Sor­
populares escolhidos entre os que têm algum valor bonne Paris - Êste museu possui uma pequena
científico, _e um museu de instrumentos populares. coleçã� de canções populares brasileiras, em disco>'
Guarda também em seus arquivos uma coleção de cantados por cantoras artistas, como sta. Capote
várias centenas de documentos de música popular, Valente e sra. Elsie Hom�ton.
registrados cientificamente mas por meios não me­
r,ânicos, contendo melodias dos Estados de São
II
Paulo, Minas Gerais, Pernambuco, Mato Grosso,
Pará, Amazonas, Paraíba, Rio Grande do Norte,
Discografia
Bahia e Alagoas. (2)
4 - Instituto Nacional de Jfúsica, do Rio de (As gravações de música popular sempre ti­
Janeiro -- Há na biblioteca do Instituto uma cole-· veram entre nós finalidade comercial. Acontece po-
ção bastante numerosa, não catologada, tanto de ma­
uuseritos i'Olllo clr impressões de modinhas do século Entre as nottis para acréscimos a serem feit?s a _ê� te, trabalho� M�rio
de Andrade deixou a seguinte: "Trabalhos umversltanos de Itibere e
XJX. (3) J,uís Heitor". O lembrete se refere certamente às 11rimeiras cadeiras
de Folclore criadas em escolas Superiores do Brasil. Com a reforma do
(2) Nesta nota sôbre a Dis(',oteea Pública Municipal de São Paulo , Instituto Nacional de Música feita em 1931 por Luciano Ga�let, Mário
�\{ário de Andrade se enganou em dois pontos: os serviços de gravação de Andrade e Antônio, Sá Pereira, criou-se nessa data a cade1;a de. Fol­
foram iniciados em maio de 1937; as melodias grafadas são dos seguintes dore da escola. O concurso p ara p rovimento da cátedra s6 foi reahzadü
Estados: São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Ceará, Rio Grande do Sul, em 1937, ganhando-o o prof. Luís Heitor Corrêa de Aze':edo, ':)n: 1poH':lfülo
Mato Grosso, Rio de Janeiro, Pernambuco, Piauí, Maranhão, Pará. l'ffi maio de 1939. Em 1943 foi criado o Conservat6r10 Nacional_ de
Aliás, o primeiro caso não constitui prôpriamente um engano: o texto Canto Orfeônico, do Rio de Janeiro, e nêle a cadeira de Etnografi� . e
Pesquisas Fo1cl6ricas, regida desde a sua criação p elo prof. BraH1 ho
primitivo -dizia "iniciará suas gravações", sendo a primeira palavra cor­ rtiberê.
rigida para "iniciou". Ao fazer essa mudança, Mário de Andrade talvez
estivesse pensando na filmagem sonora de dançaa-dramáticas de Mogi das Ao prof. Luís Heitor Corrêa de Azevedo deve-se a c_riação _d? Centro
Cruzes (São Paulo), realizada de fato em 1936. le Pesquisas Folclóricas da Escola Nacional de Música, oflciahnente
�n:rngurado a 6 de nove�bro de 1944, embora funcion_asse desde_ 1942.
Cabe assinalar também que, em 1938, a Discoteca Pública Municipal Em colaboração com os Archives of American Folk-Song, de L1br:::.ry
obteve do Staatlichea für Võlkerkunde, de Berlim, cópias doa cilindros of Congres, de Washington, U. S. A., de 1942_ a 1944 � _Centro d_e
fonográficos indicados no n.0 2. (O. A.). PeBquisas Folclóricas realizou viagens para colheita fonograflc� de mu;
siea folclórica tendo registrado vários discos nos Estados de Goms, Ceara
(3) Em 1931 o Instituto foi anexado à Universidade do Rio de Janei­ e Minas Ge-r�is. Em 1946 o Centro gravou, no Rio Grande do_ Snl,
ro ; em 1937 a Universidade passou a chamar-se Universidade do Brasil mais de mnn centena de discos, trabalho em que teve a colaborac:no do
e o Instituto, Escola Nacional de Música. govêrno dfis,:e Estado. (O. A.)
170 MÁRIO DE ANDRADE
}!NSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 171
rém que algumas dessas gravações são estritamente
10 - Sainúa - Vietor: ,l3404; 83413; 33211;
científicas. Estão neste caso, es1,ecialmente as Mo­
:mS08; 33880; 33927. (Há o Samba rural e o Samba
das dos caipiras de São Paulo, bem como algumas
nr•bano. O primeiro confuncle-se com o Batuque e
manifestações da feitiçaria do Rio de ,Janeiro.
não está representado na d"1Scograf"rn mw10na
. l • To
A êstes discos, perfeitamente folclóricos, reunem-se
tlos êstes são exemplares do Samba urbano.)
aqui mais alguns que, pelo caráter, são exemplares
específicos de música popular.)
III
1 - Moda caipira - Gravação Victor (nu­
meração do Brasil) : 33299; 33395; 33394; 33297;
Bibliografia sôbre a Música dos Amer-íncUos do
33922; Gravação Columbia (numeração do Brasil) :
20021; 20007; Gravação Artefone: 4019; 4079; Brasil
4121; 4124.
A - Algumas obras contendo documentação
2 - Feitiçaria afrobrasileira - Gravação miisical:
Parlophon (numeração do Brasil): 13254; Grava­
ção Odeon (numeração do Brasil): 10679; 10690; 1- Jean de Léry - "Histoire d 'un voiya_ge
Victor: 33586 (êste último tem influência urbana na fait en la terre du Brésil, autrement dite
instrum�ntação). Amérique". (Algumas das edições do
3 - Cateretê - Victor: 33235. século XVI contem os documentos muc
sicais que se acomodam muito bem com
4 - Cururu - Victor: 33236; 33796. o qu� conhecemos sôbre a músic1z dos
5 - Toada de Mutirão - Columbia: 20033. nossos índios.)
6 - Folia de Reis - Columbia: 20032. 2- Spix e Martius - "Reis� in Brasilien '.'
7 - Batuque - Artefone: 4023; Victor: - Munique, 1831. (O album anexo a
33253 ; 33459; 33471 (êstes três últimos apresentam obra contém 14 melodias ameríndias, co­
influência urbana). lhidas, com bastante espírito etnográ­
fico.) (4)
8 - Jongo - Victor: 33380; 33421 ( ambos
cantados por um cantor de rádio, que guardou as (4:) "Obra importantíssima, cheia de observaçoes,- descr�· ç?·e8 e J"uizos
(irítieos sôbre instrumentos, dan�as, canções,_ festa� , t:ad�ion�is �;i_º

melodias da sua infância).
de ameríndios brasileiros, como já do Brasil do m1c10 o aec. . h ·
Além disso a. obra traz um caderno de melodias, conte�do 7 modm :s
9 - Chôro - Victor: 33204; 33433; 33262 ; uaae tôdas de S. Paulo, algumas da Bahia e uma de Minas; um lun u
33597; Odeon: 10656; 10946 (o Chôro sendo gênero �antado em Minas Gerais, e um lundu (landum) dançado q�e é realmente
a única peça. que parece prõpria.mente popular <la coleç�o. Tôda_a �
musical urbano, êstes discos podem ser tomados outras são peÇas urbanas e de salão da. pequena. burguesrn.. Term.in
como específicos da sua manifestação). 0 caderno 14 peças ameríndias que, é de crer-se, foram colhidas eom o
maior espírito cientifico ... da época."

__J
1í2 MÁRIO DE ANDRADE �]NSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 173

··""* :3 - Barbosa Rodri,qiws - "Pacificação dos 8 - 1'heodor Koch-Gru,enberg - "Von Ro­


Crichanás" - Rio de Janeiro, ed. Im­ roima zum Orinoco" - ed. Strecker und
prensa Nacional, 1885. (5) Schroeder, Stuttgart, 1923. (No terceiro
' volume vêm numerosas melodias colhidas
-;+*
4 Barbosa Rodrigues "Poranduba dos fonogramas da Universidade de Ber­
.Amazonense" - Vol. XIV, n. 0 2 dos lim, acompanhadas de um estudo do prof .
.Anais da Biblioteca Nacional do Rio Von Hornbostel.) (9)
de Janeiro. Rio de Janeiro, 1890. (6)
: i
9 - Felix Speiser - "Im Ducster des Brasi­
5 - Karl von den Steinen - "Unter der Na­ lianischen Urwalds" - ed. Streck und
turvoelker Zentral Brasiliens" - Ber­ Schroeder, Stuttgart, 1926. (10)
lim, ed. Hoefer & Wohsen, 1894. (7)
•:+ ·:+
10 - Roquette Pinto - "Rondonia" - :J." ed.
ô P. Nicolao Badariotti - "Exploração Companhia Editôra Nacional, S..Paulo,
no Norte de Mato Grosso" - S. Paulo, 1935. (Transcreve alguns dos fonogra­
Tip. Salesiana, 1898. (.A autenticidade mas do Museu Nacional.)
das melodias nestes quatro últimos li­
I' 11 - R. Laclvman - "Musik der .Aussereuru­
'! vros é bastante discutível.) (8)
1

paeischen Natur-und Kulturvoelkcr", i11


7 -- H. H. Manizer - "Música e Instrumen­ "Handbuch des Musikwissenschaft" n.º
tos de música de algumas tribus do Bra­ 35 - ed . .Athenaion, Wildpark - J>ot­
sil" -- in. "Revista Brasileira de Mú­ sdam. (Estuda as tendências gerais da
sica", vol.-I, dezembro de 1934. (Impor­ música dos .Ameríndios do _Brasil, rela­
tante estudo, inicialmente publicado pelo cionando-os aos outros povos·prirnitinis.
Museu de .Antropologia e Etnografia, de Serve-se exclusivamente dos fonogramas
Petrogrado, em 1918.) colhidos por Koch-Gruenberg.)
(,5) 1•Contém 4 cantos criehanás que têm tôdas as aparências de serem 12 - P .. Antonio Colbacchini - "I Bororos
:mt&nticos, apanhados no lugar. São bastante característicos da pobrezfl
melódica primitiva." Orientali" - Societá Eletrice Internél­
(6) "Traz além duma série de textos cantados, duas melodias de discu­
zionale, Torino. (11)
tível cientificidade folclórica''
(7) "Obra fundamental· para conhecimento doa ameríndios do Brasil (9) "No 3. 0 vol. traz a mais séria coleção de melodias ameríndias nos
e seus costumes. Esplêndida coleção de máscaras. Dois documentos limites do Brasil no extremo norte extraida de fonogramas conservados no
'

:1
Pbonogram-Archiy, da Universidade· de Berlim. O estudo é feito por
1

musicais, de valor cientifico mais fraco." Para o mesmo livro há outra


fiehn. que diz: "Descrições científicas da maior importância de instru­ Erich M. v. Hornbostel.".
mentos, máscaras, danças etc. Duas melodias de melancólica auten­ (10) "Tem um capitulo estudando a música dos Aparai com 2 melodias."
ticidade." (11) - "Dá uma pequena série de notações musicai� com espírito _bas­
1

i (8) "A melodia dada como dos índios Chiquitos à p. 65 e que o autor tante cientifico e terminologia de quem conhece música. Mas afirma
"aprendeu de ouvido" é absolutamente inautêntica, sob o ponto de vista que êsses Bororos ignoram a melodia1 pois todos seus cantos são num som
1 ameríndio. Como linha melódica tem elementos tradicionais brasileiros." sü, excetuados apenas 2 onde surgem doi sons I Ora isso discorda da
. •
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1
174 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 175

B Al,qmnas obras, contendo informações descrição de festas musicais, nomes de


etnográficas sôbre a música dos índios instrumentos e de danças. Enumerá-las
do Brasil. tôdas seria o mesmo 'que organizar uma
bibliografia completa sôbre o Brasil.)
1 - Marciano Brum - "Através da Música"
- Rio de Janeiro, ed. Bevilaqua, 1897. 7 - A. Métraux -· "La Civilisation Maté­
(Obra de escasso valor.) (12) rielle des Tribus Tupi-Guarani" - ed.
Librairie Orientaliste Paul Geuthner'
2 - Hans Staden - "Viagem ao Brasil" - Paris, 1928.
ed. da Academia Brasileira de Letras,
8 - A. 11fétraux - "La Religion -eles Tupi­
Rio de Janeiro, 1930. (13)
nambas" - ed. E. Leroux, Paris, 1928.
3 - Gl. Couto de Magalhães - "O Selvagem" (Na primeira destas obras A. Métraux ·
- 3.ª ed. Livraria Magalhães, S. Paulo, nos dá uma síntese bem feita sôbre os
1913. (14) instrumentos musicais dos Tupis. Na se-
4 - T. Koch-Gruenberg - Zwei Jahre bei gunda estuda festas e danças.)
den· Indianern Nordwest-Brasiliens" - 9 Curt Saclrn -· "Geist und \Verden der
ed. Strecker un Schroeder, Stuttgart, Musikinstru1uents" - ed. Dietrich Rei-
1923. (15) mer, Berlim, 1929. (Sào computwdos os
** 5 - Pero de Magalhã,es de Gandavo - Ameríndios e catalogados seus principais
"Tratado da Terra do Brasil" - ed. tipos de instrumentos.)
Anuário do Brasil, Rio de Janeiro, 1924. 1.10) - Raimundo Lopes - ·'Os Tupis do Gu-
rupi" - Separata das "Actas" Tomo I
6 Ji'ernão Cardim - "Tratado da Terra e do XXV Congresso Internacional de
Gente do Brasil" - ed. J. Leite & C.,
Americanistas - Universidade de la Pla­
Rio de Janeiro, 1925. (Obras no gênero
ta, 1932. (Informes de verdadeira na­
destas duas últimas, bem como a de Sta­
tureza científica sôbre cantos e festas
den, feitas por viajantes catequistas, co­
cantadas <los ínclios Urubus e Tembés.)
lonizadores, etc. trazem sempre alguma
s (11) - Karl Gustav Izilwwitz - "Musical and
melódica pobre sim mas inegável não só de todos os ameríndios do Other Sound Instruments of the South ·
Brasil como dos próprios Bororos pelos fonogramas dêles existentes no
Museu Nacional." American Indians" - Goteborg, Elan­
(12) "Compilou imperfeitamente alguns dados sôbre a música doi: dus Bektryckerí Aktiebelag, 1935.
ameríndios do Brasil."
(13) - HTem descrições de ótimo temperamento observador aôbre fes ·•·•· ·c12) - Luís Heitor Corrêa de Azevedo - "Es­
tas musicais dos indios." cala, Ritmo e Melodia na Música dos
(14) - "A autenticidade dos textos de cantos ameríndios não toi até índios Brasileiros". Rio de Janeiro, Jor­
agora discutida� talvez deyido ao notável valor do autor."
(15 ) -" Importantes descrições de instrumentos e danças."
. nal do Comércio, 1938.
176 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 177

1
IV 5 Guilherme T. Pere-ira de Melo - ''A Mú­
1: sica no Brasil" - Tipografia de São
Bibliografia sôbre a Música Popular Brasileira Joaquim, Bahia, 1908. (Melodias po­
pulàres colhidas na Bahia.) (20)
A - Obras contendo documentação musical . 6 - Pedro Fernandes Tornás - "Velhas
não harmonizada. Canções e Romances Populares Portu­
** 1 - F. J. de Snnt'Anna Nery - "Folk-Lore guêses" - ed. França Amado, Coimbra,
Portugal, 1913. ( Contém pelo menos
Brésillien" - Librairie Académique Di­
duas melodias brasileiras, colhidas pelo
dier, Paris, 1889. (Contém 12 melodias
autor em Portugal.) (21)
populares do século XIX.) (16)
2 - Alexina de Mngalhães Pinto - "Biblio­ 7 - 1lfanuel Querino - "A Raça Africana e
teca Infantil" coleção Icks, série C - seus Costumes na Bahia." in "Anais do
ed. Ribeiro dos Santos, Rio de Janeiro, 5.° Congresso Brasileiro de Geografia"
1907. (17) -Imprensa Oficial do Estado, Bahia
** 3 - Alexina de Magalhães Pinto - "Canti­ 1916. (22)

gas das Crianças e do Povo e Danças 8 - Afonso A. de Freitas - "Tradicües e


Populares", coleção Icks, série A - ed. Reminiscências Paulistanas" - ed." l\fon­
Livraria Francisco Alves, Rio de Janei­ teiro Lobato, São Paulo, 1921. (23)
ro, 1911. (Duas obras de escasso valor 9 - Jlario de Andrade - ''Ensaios si>hrc
etnográfico. (18) .Música Brasileira" - ed. I, Chiarato
** 4 -· Julia de Brito Mendes - "Cauções Po­ & C., Siio Paulo, 1928. (24)
populares do Brasil" - ed. Ribeiro dos (:!O) ,;Tem estudos bastante desenvolvidos sôbre nossas festas music:il:a;,
Santos, Rio de Janeiro. (Muito pequeno canções e danças dramáticas tradicionais, colhidas na Bahia. Contém
algumas melodias como exemplo, bem grafadas mus sem preocupação de
valor etnográfico.) (19) perfeição rítmica."
(21) 11 Contém algumas melor1ias de origem brasileira, confirmada pC'lo
(16) - "Estudo bastante importante sôbre o folclore brasileiro em .
próprio Autor."
geral, com parte dedicada à. poética popular e aeompanhado de 12
melodias populares do séc. XIX. Alguri1as destas permanecem até agora, (22) "5 melodias mal grafada!-l rHmicamcnte. <''.01n os· textos, à parte
. e dificilmente se acomod�1Hlo à. llf1h11/to romo est:í. Ma:-- pnr<'cem sinceras.
com variantes. O aspecto das notações bem como a capacidade de quem
anotou boa parte delas, M." B. Itiberê, lhes dá garantias de autenticidade". O estudo é impol'tantíssimo como documentação das práticas feiticistas
musicais dos negros bahianos n
(17) "Contém as melodias de alguns romances e cantos intervindo
dentro de histórias faladas. A autora grafava mal os compassos, pare­ {23) "Além de numerosa colheita de poesias cantadas tradicionais e
cendo conhecer pouco a subdivisão rítmiea." históricas populares da cidade de S. Paulo, duas melodias urbanas, uma
(18)._1• "A autora às vêzes oscila na fixação dos compassos, mas o livro se referindo n um romance nordestino tradicional, out1·a a uma roda
é importante e a A. tem certo desejo de ser cientifica" infantil."
(19) "Contém 130 melodias, a grande maioria de modinhas e lundus (24) "Estuda algumas das constâncias e tendências rítmicas, tomli�
urbanos. Não passa de compila�ão, mas é importante para conhecer ê8se harmônicas, melódicas e formais da música popular cantada do BraRil.
ramo da melódica popularcs('a :iiaC"ional". Tem um repe1·tório de 122 melodias populares, de que um numeroso gnip('
.178 M ÁRlO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 17!}
10 - Mario de Andrade - "Compêndio de 16 - Fabiano R. Lozano - ".Minhas Canti­
História da Música" - 2/ ed. L. G. tigas" - ed. Livraria Liberdade, São
Miranda, São Paulo, 1933. (25) Paulo, 1934. (28)
11 - Mario de Andrade - "Modinhas Impe­ 17 - Fab·iano R. Lozano - "Antologia Musi­
riais" - ed. Casa Chiaroto, São Paulo, cal" - ed. Ricordi, São Paulo, 1933.
1930. (Estas três obras, escritas para us0 ,•.oral
12 - Mario de Andrade - "Os Congos" in das escolas, não têm intenção folclórica.. )
"Boletin Latíno Americano de Música", (29)
Tomo I - Montevideo, Uruguai, 1935.
18 - Luciano Gallet- "Estudos de Folclore"
13 - :Mario de Andr.ade "Música, doce - ed. Carlos "\,Vehrs e C., Rio de Janeiro,
Música", - ed. L. G. Miranda, São 1934. (Além de duas sínteses sôbre a
Paulo, 1934. musica dos índios e dos africanos do
*'" 14 - Elsie Houston-Péret - ':Chants POJJII­ Brasil, traz uma coleção de danças do
laires du Brésil" - ed. Librairie Orien­ Estado do Rio e mais 19 melodias do
taliste Paul Geuthner, Paris, 1930. (Co­ Nordeste e da cidade do Rio de Janeiro.)
leção de 42 melodias, precedidas dum (30)
estudo do sr. Philipe Stern e com notas
da autora.) (26) 19 - Artur Ramos - "O Negro Brasileiro"
- ed. Civilização Brasileira, Rio de Ja­
15 - Fabiano R. L.ozano - "Alegria das Es­
neiro, 1934.
colas" - 2.ª ed. Livraria Liberdade, São
Paulo, 1931. (27) 20 - Artur Ramos - "O Jfolk-Lore Negro üo
foi colhido diretamente da bôca dos cantadores. As outras foram colhidfü Brasil" - ed. Civilização Brasileira,
de pessoas cultas, mas de garantida autentieidade e bom conheciment<• Rio de Janeiro, 1934. (Estas duas obras
do canto popular. S6 o documento "Prenda Minha" é rltmica.ment"
falso, e está. ritmicamente certo na harmonização que dessa toada fê� contem algumas melodias afro-brasilei-
Ernani Braga (Prenda. Minha, ed. Ricordi). 11
(28) "Coleção de peças 1rnra orfeão, na maioria. rodas e canções infantis
(25) "Nos capituols I, XI e XII estuda-se em sintese, os caracteres
populares do Brasil. Aindu sem nenhum espírito c�cntíffoo. Os textos
históricos, técnicos e estéticos da música ameríndia do Brasil e da música estão deformados para correção! As notações musicais são verídicas/'
popular brasileil'a. Os exemplos musicais são compilados ·ae livros ante­
riores." (29) "Melodias para solfejo das escolas. Algumas são canções popnlnre:._
(26) "bole<;ão com introdução de Philipe Stern e notas da autora às brasileiras, colhidas sem espírito folclórico."
42 canções. Nem tôdas as informações são perfeitas, várias das canções (30) "Importante livro que compila dados tradicionais sôbre o índio
são compiladas de livros anteriores brasileiros e o processo de notação c o Negro na música brasileira, em duas memórias. A isso o autor ad­
é a colheita não d 'aprês nature mas de pessoas eruditas que conheciam junta observações próprias colhidas com grande espírito de exatidfio
de-cor as canções populares, E várias destas têm autor e são popularescas científica. O livro apresenta ainda o estudo sôbre Cantigas e Danças
e urbanas. Mas a colheita é importante, as notações são excelentemente Antigas do Estado do Rio, colhidas no lugar e de cantatlores populares
bem cuidadas." rurais. E' a melhor contribuição do livro como espírito científico. As
(27) "Livro organizado com fins exclusivamente didáticos. Contém 19 peças de várias regiões brasileiras que terminam o livro, sempre re­
no entanto algumas canções populares. no geral rodas infantis, sem colhidas com espírito de exatidão científica, são porém quase tôdas re­
:t!·ompan hnnwuto." colhidas de pcsso!'l.s ermlit,1s que decornrnm cnnçõr.s ouvi.da;• do povo.,:
''
: i
180 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 181
ras. de feitiçaria do Rio de Janeiro e da "'*(28) - Luís He-itor Corrêa de Azevedo -
Bahia.) "Dois Pequenos Estudos de Folclore
21 - Ernani Braga - "Toadas de Xangô do :Musical" - Rio de Janeiro, 1938.
Recife", in "Estudos Afro-Brasileiros
- ed. Ariel, Rio de Janeiro, 1935. B - Obras contendo documentação musical
**(22) - Melo Morais Filho - "Cantares Brasi­ harnvonizada :
leiros" - ed. Ribeiro dos Santos, Rio de
Janeiro, 1900. (Obra de escasso valor 1 - Albert Friedenthal - "Musik, Tans und
etnográfico.) Dichtung bei den Kreolen Amerikas" -
- ed. Hans Schnippe, Berlin, 1913. (31)
(23) - Icks (Alexina de 1lfagalhães Pinto) -
"Os noss·os Brinquedos" - Collecção 2 - Albert Friedenthal - "Stimmen der
Icks, serie B -· Tip. da "A Editôra" - Volker", 6.0 volume - ed. Schlensin­
Lisbôa, 1909. (Contém principalmente ger-s.che Musik-handlung, Berlim. (Nes­
rodas infantis com descrição de sua co­ tas duas obras o autor estuda e documen°
reografia. Nem tôdas as melodias · são ta imperfeitamente a música popular
populares.) brasileira.)
(24) -- Icks (Alexina de Magalhães Pinto) - 3 Cesar das Neves e Gualdino de Campos
Contribuição do Folk-Lore Brasileiro - "Cancioneiro de Músicas Populares"
para a Biblioteca Infantil" - Collecção - Pôrto, Portugal, iniciado em 1896..
Icks, serie C - ed. da Autora, feita em (Obra de pouca importância folclórica,
Paris, 1907. (Contém histórias com can­ mas que contém munerosas melodias po­
tos intercalados.) pulares brasileiras do século XIX.)
** 4 - João do Rio - "Fados, Canções e Dan­
(25) - Flausino Rodrigues Valle - "Elemen­
tos de Folk-Lore Musical Brasileiro" - ças de Portugal" - ed. Ga:rnier, Rio de
ed. Comp. Editôra Nacfonal, São Paulo, Janeiro, 1909. (Obra de quase nenhuma
1936. (Obra bastante incerta, pouca importância folclórica, mas contendo pe-
documentação e muita literatura.) (31) "Tem um capitulo dedicado.ao Brasil, com um estudo bastante
inteligente sôbre a nossa música popular. Infelizmente as observações
**(26) - Luís da Câmara Cascudo - "Vaquei,ro foram feitas pouco cientificamente, mais sôbre a música popularesca
e Cantadores". Pôrto Alegre, Livraria urba.na algUmaa cm:µ autores conhecidos que sôbre a verdadeiramente
popular e rural
do Globo, 1939. trata séc. XIX
**(27) - Antônio Osmar Gomes - "A Chegan­ O autor reuniu uma coleção de peças das que estudou nesse livro, núma.
ça" - Rio de Janeiro, Livraria Civiliza- coleção que forma o sexto caderno de Stimmen der Võker, ed.
Schlesinger'seh Musikhand.lung, Berlim". (Ficha evidentemente esboça­
ção Brasileira, 1941. dn.)
í1

I' 182 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 183

ças populares do Brasil, ou aqui popu­ C - Obras colecionando textos da poesia po­
larizadas.) (32) pular cwntada, ou descrevendo costumes
musicais populares:
5 - João Gomes Jr. e J. Batista Julião -
"Ciranda Cirandinha" - ed. Companhia
de Melhoramentos de São Paulo, 1924. 1 - Basílio de ltf.agalliães - "0 Folk-Lore
(Contém 50 rodas infantis, colhidas no no Brasil" - ed. Livraria Quaresma,
Estado de São Paulo.) (33) Rio de Janeiro, 1928. (Éste livro contém
uma bibliografia bastante completa dos
6 - Ceiçii,o de Barros Barreto - "Cantigas estudos publicados no Brasil sôbre o fol­
de quando eu era pequenina" - ed. Pi­ clore nacional. Citarei mais, apenas as
1 i'
menta de Melo e Cia., Rio de Janeiro, obras fundamentais, as omitidas e as
1931. (15 melodias infantis, colhidas em posteriores ·a 1928.)
Pernambuco.) (34)
2 - Vincenso Cernicchiaro - "Storia della
7 - Luciano Gallet - "Canções Populares
Musica nel Brasile" -,_ ed. Fratelli Ric­
Brasileiras" - ed. Carlos Wehrs e C.,
cioni, Milano, 1926. (Nos capítulos III,
Rio de Janeiro. (São duas séries, uma
IV e V, trata imperfeitamente da mú­
de seis, outra de doze canções, colhidas
sica dos índios e da popular.) (35)
sem intenção etnográfica, e trabalhadas
para -uso musical artístico.) 3 - Renato Almeida - História da Música
(8) - Yilla-Lobos - Collecção Escolar" - ed. Brasileira" - ed. Briguiet e C., Rio de
da Superintendência de Educação Mu­ Janeiro, 1926. (36)
sical e .Aitística, do Departamento de . 4 - P. Simão de Vasconcelos - "Crónica da
Educação do Distrito Federal. (Esta Companhia de Jesus do Estado do Bra­
obra não visa absolutamente finalidades sil" - 2.ª ed., Rio de Janeiro, 1864.
folclóricas porém apresenta um acervo (Uma obra como esta, bem como os três
numeroso de melodias populares. É a volumes de "Cartas Jesuíticas", publica­
coletânea mais vultuosa que possuimos das pela Academia Brasileira de Letras
de rodas infantis.) em 1931 e 1933, estão nas mesmas condi­
(32) "Ed. nada científica de canções e danças no geral populares por­ ções das de Fernão Cardin e Gandavo
\
tuguêsas. Contém algumas peças que se popuJarizaram no Brasil e de
que ainda não se determinou se são nossas ou portuguêsas pràpriamente."
citadas atrás. São livros antigos in.\iis-
(33) "Contém 50 das canções dançadas, as rodas, do populário inf.anti1
brasileiro. Apesar de harmonizadas, pois a obra tem carácter didático, (35) "Nos cap. III, IV e V, trata -da música indígena e da popular
as peças, colhidas em S. Paulo, são certas." brasilelra, no geral compilando. O cap. sôbre msica popular, além de
(34) "Reune 15 canções populares infantis (rodas, bereeuses, parlen­ não ter exemplos musicais não apresenta nenhuma compreensão científica
das) harmonizadas primàriamente e com interêsse didático. São no ge• do que seja música popular."
ral versões nordestinas de · cantigas universalmente célebres no país (36) "Nos primeiro e último capítulos estuda esteticamente as origens
todo.-" e algumas feições da música popular brasileira (sem exemplos)."

' ,,.

Li,
184 MÁRI O DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 185

pensáveis para conhecimento das origens 12 França Junior - "Folhetins" - 4.ª ed.
das nossas práticas musicais populares.) Ribeiro dos Santos, Rio de Janeiro,
1926. (39)
5 - Sílvio Romero- "Cantos Populares do
Brasil" nas duas edições de 1883 e de 13 - Vieira Fazenda - ".Antiqualhas e :Me­
1897. morias do Rio de Janeiro" - volumes
n.º 140, 142, 143, 147 e 149 da "Revista
6 - Sílvio Romero - "Estudos sôbre a Poe­ do Instituto Histórico e Geográfico do
sia Popular do Brasil" - Rio de Ja­ Rio de Janeiro". (Estas duas últimas
neiro, 1888. obras contém numerosas indicações sô­
7 - Sílvio Romero - "História da Litera­ bre música popular.) (40)
tura Brasileira - Rio de Janeiro, 1888. 14 - Pereira da Costa - "Folk-Lore Per­
(As duas primeiras obras de Silvio Ro­ nambucano" - tomo 70 da "Revista do
mero são fundamentais.) (37) . Instituto Histórico e Geográfico do Rio
8 - Melo ll{orais Filho - "Festas e Tradi­ de Janeiro". (Obra de valor funda­
ções Populares do Brasil" - nova edi­ mental.)
ção, revista e aumentada, Livraria Gar­ 15 - Simões Lopes Neto "Cancioneiro
nier, Rio de Janeiro. (38) Guasca" - 2.ª ed. Livraria Universbal,
Pelotas, 1917. (Poesias populares co­
9 - Melo Morais Filho - "Cancioneiro dos lhidas no Rio Grande do Sul.) (41)
Ciganos" - ed. Garnier, Rio de Janeiro,
1885. (O autor não tem espírito cientí­ 16 - Afonso Arinos - "Lendas e Tradições
fico, mas essas duas obras são sempre Brasileiras" - Tipografia Levy, São
imprescindíveis.) Paulo, 1917. (42)
17 - Gusta110 Barroso - "Ao som da viola" -
10 - Carlos Góes - "Mil Quadras Populares ed. Leite Ribeiro, Rio de Janeiro, 1921.
· Brasileiras" - ed. Briguiet e C., Rio de
Janeiro, 1916. 18 Gustavo Barroso - "Terra de Sol" -
ed. Francico Alves, Rio de Janeiro, 1923.
11 - Rodrigues de Carvalho - "Cancioneiro 19 Gutavo Barroso - "O Sertão e o Mun-
do Norte" - 2.ª edição, Livraria São do" -·ed. Leite Ribeiro, Rio de Janeiro,
• Paulo, Paraíba do Norte, 1928.
(39) "Contém descrições de festas e costumes musicais do Rio de Jà-
neiro. Apesar do carácter literário, fazem fé."
(37) uNo 1º tomo tem um capitulo bastante imperfeito e deficiente (40) "Coleção preciosa eom muitas indicações de carácter etnográfico,
de' análise à nossa canção popular." descrições de festas, nomes de instrumentos, de canções etc."
(38) "Um doa linos fundamentais para o ·conhecimento da canção (41) "Importante repositório de quadrinhas, desafios- e outros proces•
popular e das festas musicais tradicionais do Brasil. A autenticidade sos de poética cantada popular."
não deverá ser discutida, mas o A. é duma ingenuidade talvez pouco (42) "Descrições do algumas das festas populares mais tradicionais
cientifica no acolher textos:" do Brasil."
186 MÁRIO DE ANDRADE ENSAIO SÔBRE A MÚSICA BRASILEIRA 187

1923. (Obras de base científica, estu­ 27 - P. Chagas Batista - "Cantadores e


dando o ,folclore nordestino.) Poetas Populares" - ed. F. C. Batista
Irmão, Paraíba do Norle, 1929. (Es­
20 - Manuel Querino - "A Bahia de Outro­ tuda, com numerosa documentação, o
ra" -·- ed. Livraria Econômica, Bahia, canto indivrdualista dos cantadores po­
1922. (43) pulares nordestinos.)
21 - H. de Carvalho Ramos - "Tropas e 28 - Cornélio Pires - "Sambas e Cateretês"
Boiadas" - ed. Monteiro Lobato, São - ed. Unitas, São Paulo. (Estuda com
Paulo, 1922. (Apesar do caráter literá� numerosa documentação, a poesia can­
rio, contém excelentes descrições de fes­ tada dos caipiras de São Paulo.) (45)
tas tradicionais em Goiás.) 29 Artur Ramos - "Notas de Etnologia"
22 - Amadeu Amaral- "A Poesia da Viola" - Separata da "Bahia Médica", 1932.
- ed. Sociedade Editôra Olegario Ri­ 30 Artur Ramos - "Os Horizontes Míticos
beiro, São Paulo, 1921. do Negro da Bahia" - Separata dos
"Arquivos do Instituto Nina Rodri­
23 - A. Americano do Brasil- "Cancioneiro gues", Bahia, 1932. (Estas duas obras
· de Trovas do Brasil Central" - ed. são excelentes memórias sôbre festas
_ Monteiro Lobato, São Paulo, 1926. feiticistas, instrumentos e ritmos afro­
24 - Leonardo Mota - ''Cantadores" - ed. brasileiros bahianos.)
Livraria Catilho, Rio de Janeiro, 1921. 31 - Nina Rodrigues. - "Os Africanos no
(44) Brasil" - Companhia Editôra Nacio­
nal, São Paulo, 1932. (46)
25 - Leonard,o Mota - "Violeiros do Norte" 0
32 - Luís Edmundo - "O Rio de Janeiro no
- ed. Monteiro Lobato, São Paulo,
Tempo dos Vice-Reis" - volume 163 da
1925. ( 44)
Revista do Instituto Histórico e Geográ­
26 - Leonardo Mota - "Sertão Alegre" - fico Brasileiro", Rio de Janeiro, 1932.
Imprensa Oficial, Belo Horizonte, 1928. (47)
(Estas três obras de Leonardo Mota, '33 - Alberto Lamego Filho - "A Planície
são excelentes repositórios de informa­ do Solar e da Senzala" - ed. Livraria
ções sôbre a música popular do Nar­ ( 45) "Grande repositório dum observadQr agudo, das poesias e dife­
deste.) ( 44) ren� processos de poética cantada doa•.eaipiras da zona paulista."
(46) "Vasto repositório -de influências e reminiscências africanM naf'
(43) "Descreve e dá textos de várÍas danças cantadas tradiciona:ui." festas populares brasileiras."
(44 "Bom repositório de informações sôbre festas tradicionais, instru­ (47) "Nota·incompleta, de que a primeira palavra foi cancelada com
mentos, terminologia musical éte. Grande coleção de romanaes e outras um traço de lápis: u Compilação interessante onde estão descritas numero•
formas poéticas de poesia cantada." sas festas tradicionais brasileiras, eomo dança8 dramáticas".
188 MÁRIO DE A NDRADE
Católica, Rio de Janeiro, 1934. (Traz
um capítulo. batante pormenorizado sô­
bre danças populares do Estado do Rio.)
34 - Elsie Houston - ·'La Musique, la
Danse et les Cérémonies Populaires du
Brésil",· in ".Art Populaire" - ed. Du­
chartre, Paris, 1931. Excessivamente
ráprda exposição de nomes de danças,
instrumentos e canções.) ( 48)
35 - Grove's Dictionary of 1l1usic and 21lusi0
cians" - (.A terceira edição, de 1914, no
pouco científico artigo "Song" traz al­
gumas informações inexatas :,ôbre a Mo­
dinha Brasileira.) ( 49) 1
1

**(36) - Mario de Andrade - "Namoros r,om a


Medicina" - Pôrto .Alegre, Livraria do
Globo, 1939.
ª''(37) - Mario de Andrade - "Música do Bra­
sil" - Curitiba, Guaíra, 1941 (Coleção
Caderno .Azul, n. 0 1).
**(38) - Mario de Andrade - ".A Nau Catarine­
ta" - in "Revista do .Arquivo Muniei­
pal", ano VII, n.0 LXXIII. São Paulo,
Departamento de Cultura, Janeiro 1941.
**(39) - Revista Brasileira de Música - ,Ini­
ciada em 1934. 10 volumes publicados
até 1944.
(40) - 1l[ario Sette - "Maxambombas e Mara­
catus" - ed. Cultura Brasileira, São
Paulo, 1935.
(48) "Rápida exposição de nomes de danças, canções instrumentoc.;
1:m
l Impresso em 1972 nas oficinas da
que pela sua rapidez de síntese ffoou bastante imperfeita."
EMPRESA GRAFICA DA REVISTA DOS TRIBUNAIS S. A.
(49) "No pouco científico estudo sôbre a canção popular (artigo
"Song") dá informações lmstante inexatns e som valor erítieo sôbrc ;1 Rua Conde de Sarzedas, 38, fone 33-4181, São Paulo, S.P., Brasil
Modinha brasileira, mostrando rleseonhe<'f'r a p1·úpria hihliografin ingles·r com filmes fornecidos por
'.,Ôbre a mat(•riri." LIVRARIA MARTINS EDITORA S.A.

1
i
PUBLICAÇÕES DO INL

TEIXEIRA, Bento. Prosopopéia. Introdução,


estabelecimento do texto e comentários
por Celso Cunha e Carlos Duval. Rio de
Janeiro, Instituto Nacional do Livro,_ 1972.
143 p. facs. ( Coleção de Literatura Brasilei­
ra, 6).
Nome completo do autor: Bento Teixeira
Pinto

Cr$ 12,00

A GRANDE aventura de Rondon. Introdu­


ção, notas biográficas, seleção de textos e
glossário de Mário Garcia de Paiva. Rio de
, l. Janeiro, Instituto Nacional do Livro, 1971.
178 p. ilust. 21 cm. (Coleção Documentos,
i 1) .
Contém: A grande aventura de Rondon
(síntese biográfica), por Mário Garcia de
Paiva. Nota sobre E. Roquette Pinto. Ron­
dônia, por E. Roquette Pinto. Nota sobre
Theodore Roosevelt. O Rio da Dúvida, por
Theodore Roosevelt. Nota sobre Esther de
· Viveiros. Rondon conta sua vida, por Es-
ther de Viveiros. Ode em louvor de Ron­
don, por Bastos Tigre. Glossário.

Cr$ 6,00

OLIVEIRA, Maria Hilda Xavier Gouveia de.


Os sete tempos. Rio ·de Janeiro, Instituto
Nacional do Livro, 1971. 377 p. 16 cm
(Coleção Novíssimos, 2).
Contém: Prefácio de Rachel de Queiroz.

Cr$ 5,00

TIGRE, Manuel Bastos. Recitá/ia. Brasília,


Instituto Nacional do Livro, 1972. 171 p.
16 cm (Coleção de Literatura Brasileira, 8).
Contém: Poesias para recitar, comemorati­
vas, cívicas e didáticas, infantis e juvenis.

Cr$ 5,00
� ---------·

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