You are on page 1of 43

[J" ü

DE I'ILOLOGIA - N? 1I
BIBI,IOTTqCA BBASILEIBÁ

SEGISMUNDO SPINA
(Da Faculdade de Filosofia da Universidade de S' Paulo
e da Pontifícia Universidade Católica)

Àpresenlação
da
r t': ^e. Tiovadoresca
P-
!- ução, Antologia crÍtica, Glossário)
à-"
:-ã
§!-; CÚ!E
=
: v-

--
!: 1E-= 7

= "";ú-ps
E

= 7 áãE a
; 5EE tl
= ê= 9==-
--

=
-v=u- *tvRARlA acaoÊrratca
RIO DE JANEIRO
1956
X
F
rl\
f''i tr,
E-F -
oõ,r, á
PÀIO SOÀRES DE TAVETROOS

(séc. XII-XIII)

Como morreu guen nunca ben


ouve da ren que mais amou,
e quen viu quanto receoú
d'ela e {oi morto por eni
Ay mia senhor, assi moir'eu t

Como morreu quen foi amar


quen lhe nunca quis ben fazer,
e de guen lhe f.ez Deus veer
de gue foi morto con pesar:
Ay mia senhor, assi moir'eu I

Com'ome que ensandeceu,


senhor, con gran pesar gue viu,
e non Íoi ledo nen dormiu
depois, mia senhor, e morreu:
Ày mia senhor, assi moir'eu !

Como morreu quen amou tal


dona gue lhe nunca Í.ez ben,
e guen a viu levar a quen
a non valia, nen a val:
Ay mia senhor, assi moir'eu !

(c, A. 35)
t92 SI{(iISIIIiITDO SI'INA

NOTÀS - Canção tipica clo amor incorrespondido. À desventura


de não lhe "Íazer ben" (conceder-lhe mercô) a dama eleita, alia_se
a
desgraça ainda maior de vê-la arrebatada por alguém que não
a merece.
Na comparação e,stá implicito o drama do próprio trovador. Repare-
se no sentido climático do soÍrimento do poeta; a darna nunca lhe MARTIM SOARES
proporcionou unla graça, jarnais pensara nisso, e, sôbre endoidecer
o
infeliz cortejador, entrega-se imerecidamente a outro, A antítese n6 (séc. XIIi, 1.+ merade)
dois primeiros versos é digna de nofa: ntnca, a expressar a negativa
permanente da mLrlher; e nlar's, a superlativar a exclusividade do amr.r Mal conselhado gue [ui, mia senhor,
do homem, Deus intervpiu no julgamento das causas da coita: lhe quando vus fui primeiro conhoceÍ,
fez
uee, que foi morto por pe,sar por causa dela. À sintomática passionatr
ca nunc'ar pudi gran coita perder,
)á se eshoça nesta cantiga do prirneiro trovador peninsular: a sandec:,
a perda do contentamento, a insôni.a e a lrtorte por amor. nen perderei ja, mentr'eu vivo for'I
Nen viss'eu vos, nen quen mi-o conselhou I
Nen viss'o dia 'n que tus fui veer I

Ca des entom me fez o voss'amor


na mui gran cuiia, 'n que vivo, viver.
E por mi-a non leixar escaecer
e mi-a fazer cada dia nrayor,
[az-me, senhor eÍl vos sempre cuidar,
e faz-mi-a Deus por mia nrorte roqaÍ,
e Íaz a vos a min qran mâl fazer,
E quen se Íez de mi conselhador
que viss'o vosso mui bon parecer,
aguant'eu posso de vos entender,
de mia mort'ouv'e de meu mal sabor.
t E, mal pecadol non moir'eu por en,
I nen moiro, porque seria meu ben,
nem moiro, porque queria mofrer,

E porgue me seria mui melhor


morte ca mais esta coita sofrer;
pois non mi-á prol de vo-la eu dize.r,
nen vus faz outren por min sabedor,
nem me val ren de queixar m'end'assi,
nen me val coita que por vos so[[r'i,
nen me val Deus, nen mim poss'eu valer.
:'(r,1 SE(;ISM I rNIXt Sl,lN^
 tltu,i.st{N't'A{n à 0 I),{ Lítt IC^ .ütov,{DOilFl.§(
tA
Pero, enlanto com'eu vivo for,,
queixar_nr,ei sempre de vos D'amar a guen non ousarei
e d,anior,
pois con..rslh,outro non posso,i prender. falar, pero non perderei
grân coita sen seu ben-fazer:
(c. A. 51) Vedes gue coita de soffrer !

NOTÀS _ Àmor à,primeira vista Por gran coita per tenh'atal


e perda da Jiberdade pesso;rl :i d'amar a quen nunca meu mal
partir do dia em que o trovador
conheceu a sua dan:a por intermédio,
de um terceiro, À idaia de que nen mia coita ei a dizerr
o amor resulta na supressão de nossa Vedes que coita de soÍfrer
Iibcrdade individual continua !
vigente na poesia lirica do século
É cuidar que se ganha em se perder/... XVI:
É servír a quem ue.nce o oenca.
dor (Camões). Desde E vejo gue moiro d'amor.
murher, d*t. d;q,:".::fi:il:' ;ff;'.:"::;:',tJ§":"
a partir e pero vej'a mia senhor,
samos a vassalos "
da mu.lher amada. O carater litânico
do estilo ade-
ri: nunca o per min á saber:
gua-se perÍeitamente ao estado
de angústia irremediávei: Nem ulss,cu Vedes que coita de soffrer I
tros.../ Nem uíss'aquel../ Nem uiss,o
dra.
"./ Nen moíra.../
Nem
mc t,al ren...l Nen me ual coita.../
Nem me ual Deus... Àfora (idem, C. À. 56)
elemento obletivo, ainda assim o
descolorido, da presença de um ter-
ceiro, é de ver como
passionar se arrasra NOTÀS
pesadamente p"ru. q,,ut.: Xj[::r:""l".:::::T" - Segundo a intimidade entre o trovador e a
rsta cãntiga pertence ao grau do fenhed.or (V.
dama"
cxpressa um sofrimento Iongo
como a própria "" fíinda - gue
G/ossário) na escata
amorosa de sua vassalagem: sofrer d'amor sem
Ninguém melhor do que Martim "r::.t" declarar-se, isto é, auoçjo
Soares definiu o cuidar da poesia do namorado timido. Sofrimento sem esperança, pois
galego-portuguêsa: é muito a inibição de de_
mais intenso, mais doloroso o .,cuidar,, clarar-se é total e irremediável (3.{ cobra); e a
conseqüência fatal dessa
nesse iirismo do que o..longo imaginar,, da poesia angústia sem evasão. dêsse drama sem comunicação
Cuidar é viver em proÍundidade do século XVI. e sem esperança
portanto da correspondência da mulher amada,
o drama pr.siorrl; é refletir sôbre os. é a ..morte po. ,-o.;.
efeitos da paixão; é congeminar Dois tópicos: a "incapacidade de decrarar-se" e o 'morrer
Iongamente as conseqüências d.,amor,,.
revelando observar que o próprio da coita, Tal foi o abuso desta imagem Iiterária por parte de Rui
ato refiexivo da coita vai recrurje- eueimado,
cendo progressivameDte a angústiâ que suas poe.sias Íoram objeto do escárnio irapiedoso
sentimental do poeta (2.r estroíe). de pero Garcia
Burgalês (CV 988) : Rui Queimad.o morreu
umory en seus can-
"on
tares...,/ mags tesurgiu depogs ao tercer dia! etc, À trajetória dos
sintomas da "morte por amot" parece haver consistido,
primeiramentc.
na uesáo da mulher; logo a seguir a entrega do suieito a
- lotal
Non ouso dizer nulha ren essa impressão; a elaboração de um drama interior _ a coita _ cpm
base psicológica no doloroso cuídar; o alheiamento
a mia senhor; e sen seu ben do real e perda
do equilíbrio da sensibilidade; finalmente a sandeçe, a -perda
non ei mui gran coita a perder: :cn": nisto devia ter consistido o morrer d,amor,, dos trovadores do

Vedes que coita de soffrer !


galego-portuguêses, Martim Soares não nos
esclarece sôbre a causa
Ja impossibilidade de levar à mulher a mensagem do seu coração:
-T
st,:(;isltt Ntx) st,tNA

rrr,rs niro prxlcrenros dizcr, cclrn fulalques Braqa, que o tenlzr dtsl.r
trnlir;:r scja o "scqri'do trovadoresco.' (Cacioneirit da A!«la,
I vol., pii11, I l7), pois cssa virtude da arte amatória con,sistia elu
rr:-ro rt'vtlar â fe.ccir().s o objt to de seu.s arn$res e as relacões qur:
conr ôle mantinha.
Mcrece observar a conlposjção da cantiga: além de comprome_ PERO DA PONTE
titl;r pelo rctralc (recurso formal dos cantares d.aurigo), apresenta ilma
cstrutura guase paralelí.stica, não só pelo núrlero de cobras, como
pela reyretição do tema em cada estroÍe (Veja-sc nôsso trabalho Fe- (século XIII, 1." metade)
rrrlnrenrr-s ft>rrrrai.s da ltotsía prinítioa, "paralelisnro dialetico", pág. 5l
).
Senhor do corpo delgado,
en forte pont'eu fuy nado I
que nunca perdi cuydado
nen afan, des que uos ui,
En forte pont'eu Íuy nado,
senhor, por uós e por mi I

Con est'aÍan tan longado


en forte pont'eu fuy nado I
que uos anro sen flleu grado
e faço a uós pesar y.
En forte pont'elr Íuy nado,
senhôr, por uós e por mi !

Ay eu, cativ'e coytado,


en forte pont'eu Íuy nado I
que serui sempr'endóado
ond'un ben nunca prendi.
En forte pont'eu fuy nado,
senhor, por uós e por mil

(c. A. 292, C. C. B. 570)


NOTÀS * Cantiga de cxecração da vida por causa de um antor
irrealizávei (En f<>rte pont'eu futy nado: nasci nuru, dia aziago). A er-
pressão sen meu grado" (contra minha vontade) choca-se com a de-
claração de que a ama desde o dia ern que a conheceu. É evidt'nte qtre
se trata de um serviço serh perspectivas de correspoüdência p()r tr):lrte
t
,Êi

zqÍj' SIGÍS]\{I]NDO SPIN,Â

da mulhcr; setui sempr'endõado ond,un ben nunca prendí, isto é, sern_


pre seÍvi sem razões a alguém gue nunca me proporcionou uma demons-
tração de recompensa, Carolina.Michaelis traduziu a cantiga, sern
Iazer contudo reÍerêÍlcia à contradição ou pelo menos explicar o paÍâ-
doro: ich Euch in so langem Harme gegen meinen Wíllen /i6e und Euch . ÀIRAS CORPANCHO
dadurch erzürne; e os versos gue falam da incorrespondência da mu-
lher: .. . Euch ohne f,ohn gedient und nie einen Gnadenbeweis erhalten
habe (Cancíoneiro da Aiuda, vol. I, pág. 585) Amat contra a vonladc
é uma àberração dentro da doutrina do amor cortês: tanto para os rro-
vadores,'como para os clássicos, o amor é deliberado, um ato de vo:r-
tade, Podemos aventar, todavia, uma intenpretação: amam-se, mas a Desei'eu muit'a veer mha senhor,
condição de ambos impede a realização de seus propósitos: da parte e pero sei que, pois dant'ela for,
- porgue a serve sem objetivo
dôle (en Aado), sem a menor espe. non lh'ei a dizer ren
rança de ser correspondido; ama-a, pois, conlra a vontade, isto é, pre-
de com'oi'eu averia sabor
tende fugir à causa do serr soÍrimento, não continuar a sua vassalagenl
e lh'estaria ben.
amo.osa,'causando por isso desEostos à mulher amada: da parte deia
- porque -a sua situação social impediria (talvez casada). Resultadt,:
uma verdadeira desgraça. imputável exclusivamente ao fado, à má sorte Fola veer moir'e pola servir,
do dia em gue êle veio ao mundo. À muiher está longe, portanto, de ser e pero §ei que, Pois m'ant'ela uir'
a "helle dame sans merci": ela também sofre com a situação. non lh'ei a dizer ren
Um instantâneo da mulher: scnhor de corpo clclgad.o, ligura ir:r- de com'oi'cu poderia guarir
precisa, que dá uma idéia muito vaga da beleza fÍsica da mulher. Àliás, e lh'estaria ben.
o retrato físico da mulher na poesia lirica trovadoresca era rnais pobrc
do gue o retrato moral. Tratar-se-ia de falta de recursos da língua
portuguêsa para a pintura do retrato feminino? Falando do material
Se lh'al disser, nõ me dirá de nõ.
lingüistico do português literário dos primeiros séculos, diz Àntôniu mais da gran coita do meu coraçõ
José Saraiva: "Para elogiar uma mulher os poetas contentam-se coin
non lh'ei a dizer ren
certo número de generalidades imprecisas, quase sempre meras conven- que lh'eu diria en bóa razon
Ções muito gastas. Os seus retratos são inteiramente desprovidos dc e lh'estaria ben.
pormenor e não deixam no leitor imagem alg.uma (Hístóría da Cultuta
em Paúugal, vol. I, pág.340). Mais adiante: "A mesma razão que explica
a pobreza e a natureza abstrata do vocábulo aplica-se iguaimente à Pero ei gran sabor de lhe falar,
raridade notável de imagens, metáforas e tôda a espécie de compara- quando a ueio, por lhe nõ pesar,
ções (pá9. 341 ). Ou esta imprecisão do retrato seria uma cau- nõ lh'ei a dizer ren
tela do trovador, em observância ao segrêdo do objeto amado? Ou de com'eu podeda led'andar
tratar-se-ia ainda de uma imposição da arte amatória do tempo, pois e lh'estaria ben.
as preceptivas poéticas legislavam sôbre a descrição plástica e espi-
ritual da mulher? (c. A. 65, C. Ç. B. 152)
J(r) Sli(;lSf\,ll NI)í) SIllN.4

NO'IÀS Àn:ilise da pcrturbaçãr: da atjtudr gue o cavalciro


-
scntc diante da mulherl incapacidade cie djzer o gue gueria
e o qilc
conviria à .sua dama. Desejo e temor, sstados sentimentais primários,
gue correspondem ao lrrimcircl crrau na escala das relaÇôes amorosas
corn a dama eJeita. Prudente, o U.ovador sabc que podonífalar com
cla sôbre outros assuntos, arheios à declaração rra s,a coita: nesses JOHÀM GÀRCIA DE GUILHADE
ela concordará... (,Se /y'r'al di.sscr, nítn flrl' diú de ngn).
À ritrtima cobra pode ser interpretada: funda que cll tcnha uma (século XIII, La metadc)
vontade imensa de falar-lhe, logo gue a vcjo, sinto-me incapaz
de
- paÍa não nragoá-tra _ a rnensagem que rn€ faria Íeliz,
transmitir-lhe
Estes meus olhos nunca perderán,
senhor, gran coyta, mentr' eu vivo fôr;
e direy-vos, fremosa mha senhor,
d'estes meus olhos a coyta que an r
choran e cegan, quand'alguen non vee.n,
€ ora cegan por algucn que veen.

Guisado tõen de nunca perder


meus olhos coyta e meu coraçon,
e estas coytas, senhor, nrias son,
mays os meus olhos, por .âlguen.v€er,
choran e cegan, guand' alguen non veen,
e ora cegan por alguen gue veen.

E nrrnca ja poderey aver ben,


povs gue amor "já non quer nen quer DÊus;
mays ,os cativos d'estes olhos meus
morrefán sempre por veer alguen:
choran e cegan, quand' alguen non veen,
e ora cegan por alguen que veen.

(O. Nob., 1l)


NO'I'ÀS ,_ O soÍrimento anloroso do poeta, irremediávcl e inevi-
tár'cl, consiste numa dotrorosa conjuntura, pois a ausência da mulher
trâ! noit(s dc lágrirnas para os seus olhos; e, guando na prescnça dela,
ficam ce6os corn o seu deslumbramento, com a sua L,eleza, É dc notar
as qualidades vísuais do trovador galego, cujo mundo rmotivo con-
st,j(;t.s&tI rNtx) .st,tN \
vtrgc J)irra os Olhos.
vlfnra clo anror illtpossi,
rc"sponsabiliza a 'ui'' irrcaliziivel' ('
Deus cssa desventuru, l'r)cta
('antares d,amor presença divina
o""u- 'ot.
blasfêmia. Dz o prof. "l:'ot utp"ttor,-^lu'n
nos
^
Rodrigues "a da ação de graças à
Joaguim de carvarho il" :
erâm -
mais uma tradçao
matéria de crença;
m;:"::J;::,::,J,:"j"":T ii";?
"*.,1;'
eram devidas ; ;;.'"J;;:":mente urua rebeldia em
cort o tema da coita_exnia"u^--^.1_'1"'",1". perigosa Ía&iliaridaC.l
xptação' otra de Deus," -""**
para provar a paciência da ,r, ni" ."
poesia lírica..., pág.
do namorar.';
,o;;.tont""cia f"*-""à", aJ
D. loAN SOARES COELHO
(sêcuio XIII, meados)

Noutro dia, quando m'eu espedi


de mha senhor, e quando *h_ouu,, hir,
e me non falou, nem me quis oyr,
tam sen ventura fov que non morri,
que, se mil uezes podesse morrer,
meor coita me fora de sofrer.

Hu lh'eu dixi: con graça, mha senhor,,!


catou-m' un pouco e teve-mi en desden;
e, por que mi non disse mal nen
ben,
Íiquey coitad'e cõ tan gran pauor
que, se mil uezes podesse morrer,
meor coita me fora de sofrer I

E sei muy ben, hu m'eu d,ela quitey


e m'end'eu Íuy, e nõ mi guis ialar,
ca, pois a]i non morri com pesar,
núca iamais com pesar morrerey,
que, se mil uezes podesse morrer,
meor coita me fora de sofrer I

(c. A. 174, C. C. B. 26s)


NOTAS
- Flagrante admirável de uma cena de arrufo entre dois
nanrorados. Motiuo: a despedida da
mulher zangada. O poeta
conquistado a dama e perdera o amor ,á h.;;
dela por culpa própria. Àtitudir
cla mulher: silêncio, desatenção às palavras
do trovador _ gue pede
licença para uota explicação (con g"uç^,
senhor!), olhar desde_
^hu
.i\/i, .s,,](;t 1\íl Nl)() sl,lNr\ ,\r,Rt.:st,;N'1,\(,,\o I),,\ Lllll(:,\'l'llo\'\lx)lll':s(:^
rihoso, indiÍcrcnça íncr7l nral ncm
ócn); atitude interior do pot,ta: rc.
rrenroração dc dctalhes da cena; sentimento E nunc:r vi cousa tan desguisadar
de desventura; preferôn_
cia da morte à coitâ de amor; pavor diante de chamar ome arna tal molher
da mulher, exper.iência
de um pcsar jnexcedivel. I^rg"nt emotiva
de evidente cxaçêro Ían pastorinh', e se th'o non disser'
-l Jite-
rá.rio: -sc mi1 r,c:cs Ttrrlc-ssc morrtr. À
cantiga a""un.iu ;;.;;:;
por tod'esto que eu sei que lh'aven:
grau cla escala amorosa do trovador: porque a vej'a lodos querer ben,
a clo intcnclcclc>r, j:i namorado
da nrirlher anrada' Às atitucres da rnuil:er já ou porque do mund'é a mais amâda'
aparccem bern caracterj,
.:adas.ai cantiga clo lccu,do trovador. O
l.rgu, e o ternl)o átlrarecci,
tambénr caractcrjzados yror ft,nômenos aÍetivos": E, oide como vus eu disser',
qtie, Pero me Deus ben fazer guiser',
"Hu rn'cu dela quitey', sen ela üon me pode fazer nada.
"c;uanclo rn'eir
esyredi,,,
(c. A. 166) t

É irnlortirnlc il(rtitr o,ri Interpretaçàtt: Conheço aqui alguérn a quent denolninam "ama",
r)a ra tá ti ca, su e se :*':,.ii;l", e. desde quc nasci, nunca vi corisa tão descollccrtallte - -se por unra
",,",1:""""",,:";l':
sofrimento I)e"sado, angustioso, il, l ll,..;;,il'",:.,"i)'. :,
que se \/ai arrastando ató o final
do
destas duas razões não é assim chamada: otl porquc sc.la realmentc
tcrceiro vcrso. Jrara dt.Jrois o pocta
cont lrtir rtLtn. êstc o seu nome, ôu porque é ela arnada. / Talvez por ser formosa, ou
e dolorosai Írr, -r"n r,"nturn rlegante.,. Podeis crer que por alguma razão "ama" se deve chamar
frru rltrc r,.r rr,rr.r.Lt?fi:::'H:,r:?,'::
estroÍe exigiria uma entonárção únic:r.
pcsacla, ininterrupta, até o verbo e gllenr sabc pelo Iato d,: eu amá-la muito * pois lhe quero bcm e
orlr (ondc ie faria a arsls, pzrr;r clcpois posso ãté jurar: nunca nulher t:io atnada vi, desde qtre vim a conhe-
descer até o final do refrão.
O poema todo exigiria essii lcitura- cêla./ E, nlrnca vi cousa tão singtrlirr conto chatnar "ama" a urra mu-
lher tão .juvt'nil. Todavia sci quc isto rcsulta, ou do Íato de ela que-
rer bem a toclos, ou tlo Íato dc tlo ntttndo ser a tnais amada./ E or.rvi
o gue digo: se Dctts qrtiscr proltorcionar-tle lelicidade, scm ela nada me
conscçuirá.
Atal vej'eu aqui ama chamada
gue, dê'-lo clia en que eu naci, COMENTÃRIOS ,- À titulo dc curiosidade transcrevemos unla
nunca tan clesgrri.sada cousa rzi, das cantigas de ama do fccundo trovador João Soares Coelho. que
se por üa d'estas duas non é. pretendeu mudar o preceituiirio anloroso coln essa inovação. "For-
por aver nom'assi, per bõa fé, mam seu conteúdo encontios dirigidos por um veteratlo a ttma Inãe,
ou se lh'o di:en por que est amada. criadeira de filhos c dona de ca-sa, contra o costutne palaciano qu.''
mandava celebrar sõmente nrtninas-donzelas, encomios que nrotivaranr
várias manifestações de agrado e desagrado" (C, Michaeli-s, Cancto'
Ou por frernosa, ou por ben_talhada, neiro rla Ajuda, vol. II, págs. 82; 369). À razão e.stzi mcsrno em rom-
Se por aquest'ama dev'a seer, per com os <luadros convencionais da poesia, rnas o Íato dc qtle as
é o ela, podedel-lo creer, cantigas d'amor fôssent exclttsivamente feitas lxrra celebrar meninas-
ou se o é pola eu muit,amar, don:elas ó muito discutível. Esta opinião da ilustre rolnanista, freqiient''
ca ben lhe quer'e posso ben jurar: e firme em suas obras, parece não corresponder totâlmente à rcali-
poi'-la eu vi, nunca vi tan amada- dade social e moral dessas cantigas (Veia-se Àntônio ]osé Strl'aiva,
História da Cultura em Portullal, vol' I, págs. 291-?92). Está clar<> t;ttt ir
.'t(,ó
^\[CtS:\ll]Nl)í).!l,tNr\
gencralizaçào
'o"lll cla(
"ro=". Antônio saraiv
u"1: -'"' ito scntjdo
.';enta realmenr" n""is""'"i.t;, "t" etn alsgn5 da exnrs55;6
o1^l"u:o cantares apte-
cornptetamente
-::",1t:" ""ratul i;'"; rí'"i<:r'
- e nisso muda
eoconrrâ&os, " Illo"t: 'i"'l*;;. ;'J:'*n"correjadas,
absoruramente "rrr.o._"_1.- rerativa ;;*".1:. etrpregadapor outro rado
em situações
ciso irmos ,,uito t",o
rTltít"*
transcrita ur."""nrJong"
à cata "o'ê1"";;".' semântico' E não é pte-
'"'"""'ri'tt
que se opõe
Entre as
.n*,i,:1.:;:"'-'"'",r.'fi"":.Ji:'.::
man
:T:il;l; NLINO FERNANDES TORNEOL
poerica do fidalgo desasrado que mereceu a
1:t'::u.*
da côrte d"
.de -
Àf.;":' inovação (séc. XIII, meados)
Dem incisiva: ;o esta de Juyão
Bolseyro c

ce Pram as merhores Quando mi-agora for'e mi alongar


;*t:":::.:*' que eu nunca de vos, senhor, e non poder veer
a'""".af1oi,t"s vy,
Per entendedorás esse vosso Íremoso parecer,
.u, u"§^1"'asstra.es
qu" hu hy' quero-vus ora por Deus preguntar:
ro"u ""v
"u.Illu]'
d,yrdes il- ;:âlJ".,:i,;, ::n
* Senhor fremosa, gue farei enton ?
sempre guand,"_r", Dized' ay ! coita do meu coraçon !
*rroo..,l."ao.".z. ..
rcv zs6). E dizede-me: en que vus fiz pesar,
:,[:y::.,.fl1i1#*:imenro primeira dasinvectivas por gue mi-assi mandades ir morrer?
sue surqiran,
repisa o rema
da ,..j,1:*i:',_.'
ra" "Éi;J': cantig. Ca me mandades ir alhur viver !
rogas cle oÍicio; 1á se ."r"." l""l'"ul^u^-outra ", qu.
;oes provocadu* ,,oa E pois m'eu for e me sen vos achar,
a._
Senhor fremosa, que farei enton?
á'qui un trobador
m Dized' ay ! coita do meu coraçon
1"11r"""'Í:,
xl da ôma sen razon- !

Por outro lado, (cA E non sei eu como possa morar


as c: de loâo soares 171)'
rnesmo rema,
.. .o,no ,.. 'j^t'n_l-. u non vir' vos, que me fez f)eus guerer
.; j;":hi;, ;à,,",,TLT J':;;; ;i ..J"::IT :,:'.::,.::
. ben, por meu mal; por en qu.ro .áb".,
conqrista o" ,.o"1oor, e guando vus non vir, nen vus falar,
ãror*]."" _*^tjl, sue m
por Picandon hurr"r'".:r;:"i:' nas lides da re Senhor fremosa, que farei enton?
des poéticas - o ,.or.^,T-"'cion' a..0"i""'ott'T - recomendado Dized' ayl coita do meu coraçon !
uoito, cujas qualida-
" f".rndidrtllr.mantuano
rde tinharn ."""
,-. Vedes, F "r.u"".,l aquêle segrel'
(c. A. 76)
soo maravilhar]" '"'
eu d,en a".l:Íro"n,
que ouço enrenções
muiras e n*lll NOTÀS ,- Dos trovadores mais sinceros da geração g,alego-por_
tuguêsa. Por motivos que fogem à nossa percepção, a mulher deci-
{cv 1O2t) diu-se pelo afastamento do seu amante para Ionge do lugar ondc elrr
vive" Essa deliberação é, para o trovador, sinônima de morte. r\
3OB SEGISMTJNDO SPINA

humildade, uma das grandes virtudes


da romântica cavalheiresca, tra_
duz-se nesta poesia pela obediência
do e.namorado, disposto como está
a. cumprir o destino proposto pela -,ni
dama: quando for,e
alongar de uos... o trágico não reside ^i-ugor"
âpenas no ato de afastar_sr-
dela, de partir para outras terras, mus
ainda no fato de alongar-se, D',ABOIN
de ir para regiões muito distantes. para
a maior intensidade do drama
loAN
amoroso, os trovadore.s exploram com
muita arte todos êsses porme- (sêc. XIII, meados)
nores da motivação sentimental. ainda o clima aflitivo er-
.Veja-5g
presso no refrão, a confirmar estâ'Íôrça
criadora daqueles poetas que
adivinharam ser o amor a mola essencial
da existôncia: Nostro Senhor, gue mh-a min faz amar
lhe ,poderia dar resposta^ àquela interrogação pungente: só a mulher a melhor dona de quantas el Íez
senÁor lre-
mosa, que farei enton? O trovador mostra e mais fr'emosa e de melhol Prez
intuir a perda do objelo
amado; o senso do amor proÍético apontalhe
a precariedade dos e a que fez mais fremoso Íalar,
bens que conse§,uimos.
el. me dê cl'ela ben, se lhe prouguer,
ou mha morte, se m'aquesto non der,
me dê, por me de gran coita quitar.

E, se m'el aquesto non quiser' dar,


que lh' og' eu rogo, rogar-lh'ei assi
que lhe possa com ela quer a mi
querer, ca esto me pode guardar
da mui çÍran coita qtle eu ei d'amor,
e, se m'esto non der Nostro Senhor,
por que rne fez el tal senhor Íilhar ?

Ne'no sei eu, [ez-mh-o por se vengar


de mi, per est' e non Per outra ren;
se th' algun tempo fiz Pesar, PoÍ en
me leix'assi desemParad' andar
e nôn me quer contra ela valer;
por me fazer maYor coita sofreÍ,
me Í.az tod'est' e nom me quer matar'

(c. A. 157)
NOTÀS .* Amor incorrespondido. Se Deus Íoi o respons;ivcl
pela dellagração do arnor no coração do poeta' só a Êle compettr
agora reaiizar uma altelação no <iestino do infeliz apaixonado: nri-
ilo SEGISÀ,TUNDO SI'INA

nistrar-lhe a morte, ou pelo menos eliminar a coita do seu


coração __
gue lhe possa com'ela quer a mi querer, isto é: não me faça
ter po;.
ela amor algum, pois é êste o amor que ela tem por mim. para o,
trovador, quem cria o mal deve criar também o remédio: e, se m,esttt
non der NosÍro Senhor/, por que me fez el ta| senhor
fílhar? Certo
de que Deus não ouve a sua súplica, supõe tratar_se de alguma vin-
gança de Deus ,- por algum desgôsto que o poeta, sem o
saber,
Lhe teria proporcionado (3.! estrofe). ÀFFONSO FERNANDEZ
Merece atenção o tratamento Iiterário da Entidade Divina,
vet_
dadeiro deus pagão, que desce para o plano das ações
terrenas, com
scntimentos humanos im,perfeifos. Deus é uma espécie (séc. ?)
de senhor
feudal, rancoroso e vingativo, que tece amôres e fica depois
a ver
o resultado de seus arranjos amorosos.
Na primeira cobra o painel fisico e moral da mulher enrigueceu_ Senhor Íremosa, des quando vos vi,
"rc, dentro da imagem hiperbólica da beleza: impossível e superlativa sempr' eu punhei de me guardar que non
-- a mais perÍeita criatura do Senhor; a mais bela, a mais
soubessem qual coyta no coraçon
honrada
r a que fala com maior donaire. Entre outras qualidades
aparece a mulher na poe§ia galego_portuguêsa,
com que por vós sempr' ou(v)' e' poys Deus quer assy
disting,u"a-"", o
(o juízo, a ponderação): falar de bon ".r, gue sabham todos o mui grand' amor,
r"" de boa razon, de cor-
".r, a
dura etc,; o falar mansso, o riir franoso,: esbelteza do talhe: áen a (mui) gran coyta que levo, senhor'
talhada, fremoso parecer; esporàdicamente os olhos verdes (em duas por vÓs, des quando vos Primeyro vi'
cantigas de foão Garcia de Guilhade), os -
cabelos ruivos e o peits,
ranco (numa cantiga de um judeu de Elvas).
E, poys souberem qual coyta sofri
por vós, senhor, muyto mi Pesará
por que ei medo que alguem dirá
que sen mesura sodes contra mi,
que vos amei sempre mays doutra ren
e nunca mi quisestes fazer ben,
nen oyr ren do que Por vós sofri'

E, pois eu vir, senhor, o gram Pesar,


Ce que sey ben que ei mort' a Prender,
con mui gram coyta averey a dizet:
Ay Deus, por que me van assy matar !
e Veef-m' an mui trist' e sen sabor
e por aquest(o) entenderam' senhor,
que Per vós ei tod' aqueste Pesar'
Iil: ,su(;tst\,t|ND()
^st)tNr\
E, poys assy é, \renho-vos
rogar
.
gue vos n
" *" o,"ill::.;i:H: ":;..;;T,,.
que dig;r
eu atant(o) eo ,r."u-.urrru.,
que a dona
lue m' en sseu pãa"" t",
que sodes vós. rnha ,"rrho, J
e mais d,esto non vos ouso *"u U.r, PERO D'ARMEA
rqÍJuar. I
(C. V. 15, C. C. B. 404) (séc. XIII, 2." metade)
NOTAS _ Dese
Muytos me veen preguntar,
:n:;:r"::Í;ír:iitÍ:#:i*,i;::*"";r::'::,:,"j:.,":;
l

senhor, que lhis diga eu quen


qüôncias Íunesras qu" o,n,'o*,u percebe
as conse-
poa".ao' :;;;,- oesta
;:,"" est' a dona que queÍo ben
amorosa. À poesia
_inobservância da cortesi,r e con pavor de vos pesar
",.;.;;"",.^:rvrr
:l,:i[.i:;. :"]n ::": :::
j":'rl' ::' :::; *l;:: ;:":**l' j:
d:rs coisas relrritnidas.
non lhis ouso dizer per ren,
senhor, que vos eu quero ben,
a divulgação ," .un .oil"'agador
"anrad;' Mas. J;";;
soir ir)tc.,rcrada corno
murhe. farla dc "rnesura.. da
;;;.;;"" atcnuantc para a inflaÇão
advertindo-a ;"
;;;;: ^urrrzr disciplinar, Pero punham de m'apartar,
continuar na sua vassalagenr .;r...;"";:";";
permissão dela, proclaml ' se poderan de mi saber
ou por qual dona quer' eu morrer,
:X"*;**#;.:1ril":"llii#':":"1"T" ""rhu' qu" o
ltatrtcc ""scn
. e eu, por vos non assanhar,
quis fazer ben ao,ro'u .u'''' ',r...rr::1'":::':::::.: non lhis ouso clizer per ren,
":;:::
*,iJ:;",;;;;;:."',#,1J":;. :::,:,j.'.." o .", .or.i.",io.-"
,,-^ 1 e niridez
ríngua segurança
senhor, que vos eu quero ben.
do r'rsilrr)cnro, cujo
uo,r.u,,,."r,,,""-,,',1
p( ::t:::.ahsolura
equilil:rir
.J,r
atitude intelec,ruf a"" e'stá a denunciar
,ru.ro. 1,".unt" J',";í.'" a
E, por que me veen chorar
d'amor, queren saber de rni
por qual dona moyr' eu assy,
e eu, senhor, por vos negar.
non lhis ouso dizer por mi
per ren que por vós moyr' assi.

(c. v, 677, C. C. B. 1085)

NOTÀS - Tema do anror-segrêdo. O trovador teme revelar


o objeto das suas paixões, p,ara não contristar a sua dama. Esta cau"
tela, uma das virtudes cardinais da romântica feudal cavalheiresca, cons-
tituia uÍra nota natural e necessária dentro dos quadros morais da viclu
3I4
"SEGISMUNDO SPIN^
íeudal no sul da Fran,
pouco do .",, .ig,iÍi."ll penínsura, perdia
ções sentimentais ._ gue
;;T:i],ffi:,"olli.l adulterino das rela-
um
está evidente oo
uu ,r"r'""
lr:s_mo occitânico,
atcnuado na ]irica uro"o."^ aparece
,^
"---]''^'
m;::t-:xl:":ü Il4: 3:x.:"Yill,!,')il:T*""."f
d"tntão
'u
amorosa peninsular,
,rrrh
o e no silêncio'
;;
a sua razão de ser
segrêdo,;; D. AFONSO, rei de Leão e Castela
para a duração o" como requisito essencial.
No ponto de vista "*J,1.
conteúdo, a cantiga revela-se
(séc. XIII, segunda metade)
de idéias e ausente o" paupérima
or^11- os sentimentos
:;;'rrji::: expressos -- amor, temor,
ranos e aqui desprovidos
Par Deus, senhor,
"of"imento,
calor humano. .onrpt"tunl"otl.-ã* emquant' eu ffor
de uós tam alongado,
nunca en mayof
coyta d'amor,
nen atam coYtado,
Íoi eno mundo Por sa senhor
homê que Íosse nado,
penado, Penado'

Se(n) nulha rem,


sen uosso ben,
que tanto eY deseiado
que iá o ssem
perdi por em
e uiu' atormentado;
ssem uosso ben,
de morrer erl
ced' ê muy gu(i)sado'
penado, penado.

Ca log' aly,
hu uos eu uy,
fuy d'amor aÍficado,
tam muit'en mi
que non dormi,
nen óuui gasalhado,
e, sse m'este mal durar assY,
eu nunca fosse nado,
penado, penado.
(c. c. B. 362)
3l(t
sl,](;rsÀil rNrx)
sr,lNÁ
NOI.ÀS * À di
rrrn drama rtrttlhcr aruad;
d* nr";;-'il"u 1o cria na al,ra do poeta
sareso-porrusuêsa são :rj:nsidale- ô: ."11l' fortes na poesia
perJariva; o íovador .jllj""tuoo. s"Lr;",rr-'""os a sua
o q.uc soÍrc mais.,
o 'too paraforma su-
"" .";;;;'i"' "; '"'"'s'
.^oll-u'utarrtorogico, se julgar
o crrma dc todo o ;.; vez lr'octrra traduzir
o. *
tlll--:*" ,o ,,o"r,ui..""n"
l,cnado. sâo tópicos "",.lua? apaixonado: penatl:,
supcrrarivo, a perda
l.:r1:.*r,.,r"
altorrct-lrovador:
primcira \..isra e
o" a mortc ,." o amor
u "il t insônia' o amor
senra sôÍnente "*".-.1']'-to' o" o'" lJlr;":"r'' À cantiga apre-
à PERO GARCIA, BURGALÊS
a murher, nada"pede,
.ron.]''ll-l o" ,."rro"ltcer:'
n^^o-o.ro.rur nâo argurnenta
srnceridade poetica expressa *r"rur["',l Iroeta' com
'
rorvencjonais: ur,"nu.
pa"e.T
;J."';".0"
contuclo' a (séc. XIII, 2,à metade)
ot"r^t-ompromctida
íar a pr(.§cnç, ;;';; i.,:1:, .:T,:"j. #'""ii,l,,il'T::."';"',:TJ;::
Pois contra vos non me val, mia senhor,
cle vus servir, nen de vus querer ben
mayor ca mi, senhor, nen outra ren,
valha-nrc ja contra vos a mayor
coita qr.re soffro por vos, das que Deus
fezo no mund', ay lume destes meus
olhos e coita do meu coraçon I

E se rne contra vos non val, senhor,


a mui gran coita, que me por vos ven,
per gue perdi o dornrir e o scn,
valha'me ja contra vos o pavor
gue de vos ei, que nunca ousei dizer
a coita que me Iazedes aver,
que neguei sempr', á i mui gran sazon I

E se m'esto contra vos, mia senhor,


non val, quer eu a Deus rogar por en
que me valha, que vus en poder ten,
e que vus .[ez das do mundo melhor
falar, senhor, e meihor parecer.
E se m'esto contra vos non valer,
non me valrá logu'i se morte non I

(c. À. 83)
!),(I S.LGISML,\DO SPINÁ

NOTAS .. Considerações
apaixonadas
-rru-"f",do trovador, dirigidas
mulher, sôbre os meios à
de n* arrrá" ,d. ruta- contra
dência feminina: a) sua .1",J;-:'"::t a incorrespon-
,n" ,;";;;';";', ;, j:,ff11'';,ã bi;'f.,;"í
esfado de perturbaçao H:nda.dama; pela insônia e peto
oo espirito;""i,o""'i:"I
;-J,'-":::l: d) o pavor" diante da m,-
Iher; e) ; ffi:';"!"", "":
p.ocura t*"" das vontades; f) a morte.
JOHÀM AYRAS DE SANTIAGO
iustificar . .1]'
:::::..up.".",,tu
depois
;.
;"';::Í';xã::1': ao
da análise dos u:":
u*" ..,,;";;.--;
"-;;;
tratar dêsses elementos; (séc. XIII. 2.': rnetade)
r"a" t"r.,r^'-^'^',rLrqdoe

"".;ã;{*#fr i:ob,"'li"o-;;;;*;"
morte
procura tocar a
-,*:i:"il:?':::;,:"f
lã."
,:
sensibil.
o.*.. ";i""';la
- desde que Vy eu donas, senhor, en cas cl' el-rey,
tudo que êre sabe fremosas e que pareciam ben
"". ..'111".'"'-"i""""r.i:1ffiJ""T.":;.,:r:ff::
j
qx ;*i" *:;r" gf;;,t"üffi
e sen
:.11? : r*iJl,,;lx
e vi donzelas muytas hu andey
e, mha senhor, direy-vos hüa rcnl
rnuther e r-r;;;o;.':;::." o dormir; o retraro hiperbórico
<ru a rnays Íremosa de guantas eu vi
long' estava de parecer assy

Come vós, e muytas vezes p'rovey


sse veeria de tal parecer
algíra dona, senhor, hu andey
e, mha senhor, quero-vos al dizerl
a mays fremosa de quantas eu vi
long' estava de parecer assy,

Come vós, e, mha senhor, preçluntey


por donas muytas, que o.1 ioar
de parecer, nas terras hu andey,
e, mha senhor, poys rnh-as foron mostrar,
a mays fremosa de quantas eu vi
Iong' estava de parecer assy.

(c. v. 534, C. C. B. e46)

NOTAS ,- Cançáo tle louvor à beleza da muiher. Nenhum pr«>


blema é apresentado no que sc relere a drama íntiÍnos do poeta, tal a
pledominância de sua atitude visual. Devia ser um trovador andarilho,

?',i
ii..0 SEGXSI,{{JNDO SPINÁ

pelo gue contâ de suas observações


sôtrre as mulheres; era, coütudo,
freqüentador do Faço. () trovador não sô ôbservou diversas outras
rnr:lheres * faaenctro corlparação com
a sua dama _mas procurou
laesmo belezas raras para ter o prâíer
de ver que não se engrrnava
jutrg'ando seí a sua a rnais betra. À adrariração sem limites faz supor o
arnor, embora o poeta não fale diretameate sôl:re o assunto.
À cantigia se diz de atafinda, ísto é, o trovaclor FÀE GOMEIZ ÜF{ÂRII{HO
§amento, serl inteffupção, até o úlrino verso
leva o seu pen.
do poema.
(séc. XItrI, 2." metade)

Muytos çtizerl con gram coyte d'amor


que qire[rialn u10r1er e qüÊ a§s]r
perderiam cüytfis' ÍuaYS em de mi
qu€ro diãer verdad' a Ínha §entrnor:
qtreria-Íne Ih' eu muí SraÍn hen querer,
may§ flon queriô por etra morrer,

Corm'omtros ulorrers$, e que pÍol ten?


ca, de§ que r0orrer, n0n a veerey,
nen bõo seruiÇo lluncê tht ÍareY;
por elld' a senh$r que eu quero ben
queríct-me th' eu mui gram ben querer'
mays non queria por elie rriorrer,

Coür'otrtrcls $rorrerom rno ü'lundü iá,


que c[eçloys nümca podelrÔn l]ervir,
as pof q'de morr ron, nen ltris pcclir
ren, por end'e§ta que Ex'estâs coitas dâ
Euetria-$-le th'eu mui
gr:aÍ$ ben querer'
rsays nÔíl querÍe por etra slorrer,

Ca nunca lhi tan tren' Posso fazer


serviço $ioÍto, cÕr00 §se "iver'

{Ç. v. 393, c" c. ffi" 809}


.\t,t(;ll.it\,t t,1Ntx) st,tNt
NOIÀS _ Re sensatas de
lrriitico, que põe um apaixonarlo mas APIlLlsr,tNl',t(:Ão DÁ I-ilil(;i\ r'fio\'ADoRES(,/\ :rzir
", ,t':*u."t
crise um dos tópicos
lúvida o;;;"":#.trovador
d,amor,,, e porranro cm
majs exprorad..
márica do varido or;_;;:. E do meu corpo gue será, senhor,
sua vida náurica,
de
,,,jj:::
il]i";,"il1J:'il: àilrrH"T quand' el d'alá o vosso desejar?

:T";:*::,.::jiii.*",.*:, 01T,"maritima'
de que t"'ni,"rf'
;
tu'-
p"r. p"opi*; e que fará quen vos á tal amor
e vos non vir, nen vos poder Íalar?
doloroso do gue 'out"u amoroso é mtrito ca vejo vós e por vós mor' aqui;
u, urr"n'u " mais poys gue farey ou que será de mi,
Na presente cantiga ,lu"gtt""t carrsadas o"i-l'" do mar íc À' 251
trovador )' quand' en terra hu vós fordes non for ?
amante paÍa a a"tnurilidadc da rrorte
Dunro' t:::"-t" ""''""'u-u''oa do
que êie viu morre*o,' ;;;; clos outros
t""''uo" u'iuo"' .. --
Termi,a nr cantiga ,ru,l ;;"u'io*'n"t'a e pâra o amor' Ora con graça de vós, a melhor
ao id"al '''lh"t
em vida, para êle .'run,tl'""tto
o dona do mundo, ca muyt' ei d'andar
lhi tatt hen,os."6 trib,ito ;, ;r#""::,-.:, ?:"::lJj
1rr",.ld1d-eiro
serurço mc"to' co,,a e vós ficades de min pecador,
ss? r'i'er' ca vos servi muyt' e galardoar
Enrbora discursiva,
â non mh o guisestes, e vou-m' eu d'aqui,
ffi "::, j:":.:;:l]*iT,,Iii:,
n,i a
i:"0i,*1,10 ",
ca d en un ci a
s
de seus meios hu eu tanto lazerey e servi.
los a vcr o cíe

il,;;i; ;-;"t'u buscar hu vyva pouq' e ssen sabor.


'daquela Íórlnura poética 'poeta
ro .on,",, c
J,::::',,' ::;: .;: r1:;:.:l
"
E, mha senhor, torJ' est' eu mereci
---i::-.___ a Derrs, mais vós de como vos servi
mui sen vergonha hirey per u for
?.o:. venlr' eu, sei:hor, espedir ora con qraça de vós, mha senhor.
l"^_":",a
e
que muyr
ora me guero de yos
, ;;;ffi;:_,
sen galardon de ca
partir, (idem, C. V. 397, C. C. B. 813)
que vos serví, e temP' e)'
o.'l-1"h:
en. arar ,ã...'r,, 'fl,T:;i,:: vvver NOTÃS * Longo cantar para expor em pormenores tôda a expe-
veja, nen cante, nen riência amorosa do trovador: esperança da reconpensa, a desilusão, a
possa riir. resoluçáo de partir, os planos dc viver solitário e triste, num lugar
apartado onde possa redobrar o seu drama sentimental, e a previsão
Ca sõo cerro, des dos soÍrimentos Íuturos, longe da rrulher. Diante da inexequibilidade
o vos non
quu out.o-p;;r;;",r:t'" 'ir. da correspondência feminina e da inevitabilidade do seu sofrimento"
:-",ul s"" T,r.oss,,
l.;'ffi.":ã? o trovador preferiu cumprir a sua pcna emorosa - distante do objeto arnil-
do. À mulher da cantiga reveste-se de notas bem rcais: apesar de ser
:_T:-" " e assy andarey ''a melhor dona do mundo"
rnste, cuidando segundo o convencionalismo do elogio
no i -
e chorando ;;;;. r'osso pareccr. Íeminino, não é a dama distante e quase imaterial: o trovador tem.,;
",
*.nr,"., Ià ;';;'r'i".rTff j'::;,, costume de vêla e de falar com ela. l.Ia fiinda há uma proÍissão de
humildade, confessando-se merecedor da angústia que Deus lhe envlir;
por outro lado, procura pôr em relêvo a consciência de hc.vcr servido
sua dama de acôrdo com o código do perfeito cavaleiro.
ÀFnESENTÀÇ"ÁO DÀ i,InICÀ TROVÀDORU.§CA sa5

quc ern coisa algtima se apXicoÚ tanto coÍ$Ô na elab'oração clos encan-
tos .des,ta clama; porém, criou-a intencionalurente para a Cesgraça d'>
poeta. O esmêro com que o Criador se deteve na cornposição da bc-
Teza <1a r::uiher recardâ. uma caoção do trovador Feíie Vidal, em
quc
decÍara haver Deus reservado à mulher ffrais perfeições do clue para
si próprio (V. l\. leanroy, f-a Foêsie Í.gtique" ', t' In' pç' 306) ' À
E§YHV.À I\/i FmRhtANmfZU ü,fi,LV.AS mtrlher apresenta ainda quaiídades de Ürdem intelectitatr, alárn da sua
esplendente e incornparável bcleza fÍsica: é corcpreensiva e pÓrtadora

(séc. XIItr-XtrV da palavra Íácil.


?)

A rnha senhor ffezo Deus por meu mal


arn fremosa, tamr de bom sem, atal
que ser,leiiaa que nuncâ en al cuidou:
por dar a min esta coita u, qru .,rolr,
sú]i eu gue a, [f.ez El e non por al,
se m' ela con todo este ben non val.

Muy ben aa ffez ffalar e entender


sobre quantas donas EI ffez nacer
que semelha que nunca en al cuidout
" por dar a mim esta colta en que vou
ei eu que a Í.[.ez tan ben frarecer,
se m'ela con todo esto nen valer,

Esta senhor gue min en poder tem


fez Deus Íremosa e de muy bom sem
gue semelha gue nuüca en al cuidou;
por dar a min esta coita en que vou
. sei eu gue a Í.e2, üon por oulra rem,
se m'ela con todo este ben non rzern.

(c. v. 218, C. C. B. 617)


NOTÀS .- Àpresentação da ,,dame
-
luto
sans merci,,, cujo domínio abso-
a coJoea numa posição
de suserana de Íato. Deus é um Criador
de gôsto: presunriu t6das as perfeiçôes numa
mulher, de tal forma
ÀBItESIINT^ÇÃ0 D^ LIrilcA TItoVÀDORlts(lÀ "t27

NOTÀS - Todo o drama do trovador resume-se numa inter-


rogação: proibido pela própria mulher a conÍessar a sua coita' a
quem haveria de relatar seus sofrimentos de amor - senão a ela? À
rnulher não parece disposta a discutir às claras o as§unto' atitude arü'
ficial, pois de um modo geral tôdas gostariam de ouvir repetir' inde-
D. DINIS Íinidamente, gue está sendo obieto de amor e motivo de sofrimento'
Por outro lado, o trovador mantérn-se Íiel à mesura' procuraodo ex-
pressar o seu drama em solilóquio, náo vulgarmente a terceiros' Sendo
(séc. XIII_XIV) o pensamento principal um só - desabaÍar-se' o rei-trovador revela
arte, repetindo as mesÍnas idéias, com uma forma diferente em cada
cstrcfe e sem o auxílio do refrão-
Vós me defenclestes, senhor, _-: : :
gue nuncâ vos clissesse ren
de quanto mal mi por vós ven, Preguntar-vos quero- P'or Deus,
rtrays Íazede-me sabedor, senhor Íremosa, gue vos {ez
por Deus, senhor. a quen direy mesurada e de bon Prez,
guam muito mal (lev'e) levey gue pecados foron os meus
por vós, se non a vós, senhor que nunca tevestes Por ben
?
De nunca mi fazerdes ben.
Ou a quen direy o meu mal,
se o eu a vós non disser? Pero sempre vos soub' amar,
poys calar-me non m' é mester des aquel dia que vos vi,
e dizer-vo-lo non m,er val. mays que os meus olhos en mi,
E, poys tanto mal sofr'assy, e assy o quis Deus guisar,
se con vosco non falar hi, que nunca tevestes por ben
por guen saberedes meu mal ? de nunca mi fazerdes ben'

Des que vos vi, semPr' o mayor


Ou a quen direy o pesar ben que vos podia querer
que mi vos fazede-s sofrer,
vos quigi, a todo meu Poder,
se o a vós non for dizer,
e pero quis Nostro Senhor
que podedes consselh'i dar ? que nunca tevestes por ben
E, por en, se Deus vos perdon, de nunca mi fazerdes ben.
coyta d'este meu coraçon,
a guen direy o meu pesar ? Mays, senhor, ainda con ben
se cobraria ben Por ben.
(c.À. 85, C. C. B. 502)
(c. A. 128, C. C. B. 525)
.328 S§GISMUNDO SPM{A DÀ LÍRTCA TROYÁDORESCÂ :Ill9
ÀFRüSET{TÂÇÃCI
I§orÀs ,_ lnterÍo6'ação carfiô e aÍtística sôbÍe â.§ po$§íveis
infra- I{OTAS - D" Diais discute, t}eí'te caÍtar, o problema da aiu'
ções ao fomralisrno amorosô gue teria& Ievado a mulher
ceridade clo amor nas poe§ia§ p'rovençais. pois a sua experíência
pes-
resporder às esperanças clo vassaio. Ã liugu.agiem
a não cr:r-
e a forma denunciarn soatr o ensinou Eüe o ãmor perten(* a tôdas as estações'
e os trovâ-
uma tranqüilídade que desmente a sineeridade passional
dores da Provença §ó cântavam de amor na primavera' Náo
c{o poema. dcixa
À íavorabilidacle fenninina está quase se$ipre prr.n fnnçáo da na poeSia provençal, ernbora aChe
ceiitrera- çle reConhecer uma arte sUperior
ção divlna: é o Senhor quem cria a dona mais perfeita. mais nresurada do <laqneles não se coml'arà
grre de fato a intensidacle dra§aa ar-noroso
e de óon prez (honrada); é o Serhnr qrru .o*pa* a err especial
sua beleza para corn a gue vlvern os trovadores rle §ntre Douro e Mínho'
a perciição do trovadon é o Senhor qrxe prelrarã as clecisões prÔflrra
{eminlna (guísar); em síntese, é o Sentror o responsávei
da alzna o propio D" Dinis. 0 mais fecundo dcs nossos Govadores
petra situaçãc pôr er:r evictrência a versatilidaçle dos poetas da França meridionai'
dramádca do amante. Ê vulgar a conciusão, na flinda, poetas e a
du qru ,rro estabelecendo um paratrelo eâtre a arte de ocasião dâsses
bem se paga com outro,
poesia que parte reahnente do sofrimento âmoroso que o poeta aíirma
-possuir. mas que
SoÍrimento que não depercle da vontade' I'ermâ-
nece em tdo o tenpo. Bem, é precíso atenÍar para o seguintel
os

própritx trovaclores de alérn-Fírineus tinham algumas vêzes consclên-


.,u-du qu" o amor desconhece estações 'propicias para â süa
Froençaes soen rriu! ben trohar existêneia'
e dizen O próprio Bernardo de Ventadorn afirmava pouco mais ou Inenos:
eJes gue ê qon arnor,
"Nunca reparel na estação Írem no mês, nern quando desponta a pri-
mâys os' gue trobam n0 ternpo da flor de rnim um riguíssimo
e non en Outro sey eu ben que non ÍuaveÍa. ". pois enr gualquer tempo §e apodera
gôzo de amor..." (apud Riguer, obra clt" pag' 269\'
ani tâul gran coytâ no seu coraÇon
qual m' eu pôr rnha senhor vejr.r levar..

Pero que troban e saben loar


sas senhÕres o mays e o melhor
gue eles grden, sõo sabedor
gue os que troban, guand, a frol sazon
á e non ante, se Deus mi perdon,
non an tal coyta qual eu ey sen pa.r.

Ca os que troban e que ss'alegrar


van eno teüpo que ten a color
a írol consigu' e, tânto que ss for
aquel tempo, Iogu' en trobar razon
non an, non viven (en) qual perdiçon
oj" eu yyvo, que poys m'á de matar.

(c. À. 127, C. C, B. s24)


\lNlt l,;sIN't'\(.] io t) \ t.ÍtilC^ 't'no\ Ât)olil,.s( \ :I| I

2. E uma vez que ousei viver sem vê-la, loucurn mí.-


nho, é corn razão que ela julgue mal de rrrirn, da irr-
seilsatez que cometi. E, vitima de uma anç;úrstia passio.
DOM TRISTAN, o NÀMORÀDO, nal sem ]imites, amparo nenhum terei se f)eus ou sua
Íez (e)sta cantiga mesura não vier em meu socôrl'o.

Muy gram temp'a, par Deus, gue 3. Pois clesde o dia que me fui de minha Dama . - meu
eu non uy
Quen de held.ade uence toda rrem Iume e minha vida, mereço a rnorte por havê-io Íeito,
E sse re m'ela que)rxasse porem, por viver tanto tempo sem retornar p,ara c lugar ondt:
Gran derevt'(h)e. ca eu ho merecy. ela mora. E agora, se sôbre minha cabeça pesam o Íjeu
.tr bem me pode chamar desleal rancor e o seu desprêzo, desgraçaclo de miml 0 meu
De querer eu, nen por ben nen por êrro é ter nascido.
mal,
Ijiver corn ora ssem ela uíuÍ.
COMENTÁRIOS * Esra composição é um dos cinco /ars que
E pois que me de uiuer atreui úrem o Cancioneiro de Colocci-Brancuti (Veja lais, Formas poéticas,
a ueer, en que fiz muy ma] ssem, pá9.73 e segs). À adaptação galega alierou a substância primitiva da
xen
Uereyto Íaz, se mc llal talarn tem, composição francesa, na estrofação, na medida do verso, na :rtmosfera
Por tal sandiÇc qual eu cornetyl" moral e no tonus psicológico. Já se apresenta batizada por algumas das
.E con tal coit'e tan de.scomunal, características mais evidentes da lirica amorosa galego-portuguêsa: o tonr
sse me Deus ou ssa me.sura melancólico e trágico de quem se sente desamparado do favor da
non ua], dama ou da providência divina; o motivo do dia da separação cômo
Deífenson cutra non tenh,eu
Oo, rn,. ponto histórico de referência, e a execração do dia em que nasceu.
O sentimento de desgraça que pesa sôbre ôle nôs versos finais da poe-
Ca daguel clia en or
sia, é uma nota tipicamente galego-portuguôsa. Outros caracteres, em
D" ;;l;"' iXi,',,ilJi"*",
^h;o Íiz, a morrer
" 0",,. relêvo na cantiga, são do domínio comum da lirÍca trovadorêsca: o
Porque me conuen, elogio hiperbólico da mulher amacla; a sanha da senhar por hawer o
Íanto, sen tornar aly, narnorado inlringido um dos preceitos da romântica cavalheiresca, isto
,P:rr,,,,u,,,
I*lu ela (h)e. Sse por en sanha é, ter estado tanto tem,po desligado dc sua vassalaGem. C) lais 1,;
Filhou de mim e mc ss. merçee tal aparecs contaminado também pelo receituário dos lrrqares-cor:lr1l1s da lirica
fÍal,
Ày eu cariuol Eror (he) trovadoresca peninsular: meu lume e tile(r l_rem", morrer Íne
ü;;;;.' convém", "Ài eu cativol". À posição da explicatrva Ca, no início
--%
(c. c. B 3) da terceira cobra, denota outra caracteristica da poesia amorosa dc
entre-Douro-e-Minho: o trovadol luso-galego ,:,stá sempre a investi-
Há muito tempo, meu Deus, gar as causas do seu sofrimento passional, e continuilntúnte a extrait. als
rrão vejo aguela que triunfa
sôbre tôdas as coisas pela conseqiiências do seu drama. Daí a constância estilístic:r clas partitula*
de mim, é um direito qy*
beleza;'J:j, rem queixas de rralor causal ou conclusir-o.
Ihe asstsà fo,. f,"* o
reço. E aré pode consiclerar_ir" me-
mais nem menos, Ionge ;;.úi;.r viver, sem,
dela .;;"rJ; viviclo.
---

r ,t"o'"-" 5c.l_

CANTIGÀS D'AMIGO
El-rei D. SANCHO I
(séc. XII-XIII)

Ai eu coitada !
Como vivo en gram cuidado
por meu amigo
gue ei alongado !
Muito me tarda
.o meu amigo na Guarda I

Ai eu coitada !
Como vivo en gram desejo
por meu amigo
que tarda e non vejo !
Muito me tarda
o meu amigo na Guarda I

(c. c. B. 456)
NOTAS * Expressa apenas uma idéiai a saudade pela ausência
"do amigo, que se encontra na Guarda, cidade da fronteira, a serviçt>
de sua reedificação. Dedicadas à mesma mulher (Maria Paes l?.i-
beiro), a cantiga de guaroaga (de Paio Soares de Taveirós) e êstt
exemplar de D. Sancho I iniciam a lírica trovadoresca na Península.
Se aquela jár traz o hálito cortesão da poesia provençal, esta ainda
ressumbra a atmosfera de ingenuidade da poesia rudimentar do campo
e da saudade . D'esejo - na acepção que tem o latim desídeilum, gne
nas cartas de Cícero a Terência expressa no exílio a recordação sau-
dosa da mulher. O núcleo sentimental da lírica trovadoresca
- o
saudosismo, o atraso no regresso do amigo (que foi para o fossado,/.
,:a uisão da criatura amada, a reIlexão sôbre o drama passional (cui-
.dado) e a sensação da distância indefinida, esboça-se nestes primeiros
versos da alma poética de Entre-Douro e Minho.

i, 'l

li^.,ir Í1^t I { ir,,n'pxrtl


t '1, Í )l(is(rllA
-J
I'H HsliN'l'^(,rà (, DA L,IRtrCA ',.fliov/ADORqSC &97
^
NOTAS * LIma mulher a interrogar cêticamente sôbre a pouca
valorizaÇão da beleza feminina, o descrédito do amor, a indiÍerença
do homem. O tema reÍlete um conhecimento profundo da alma ferni"
IOAN GARCIÀ DE GUILFíÀDB nina: consciente da supremacia dos seus encantos pessoais (sobretudo
Íisicos), sentir-se-ia dominadora dos corações masculinos; loâsr vcÍl-
(séc, XIII, ].a cida pela indiferença de guem passou e não percebeu a presença rla
metade)
dama sedutora, sentiu-se só e projetou contra os homens o desdém de
Por Deus, amigas, que será, tôdas as mulheres. Ferida no seu orgulho, buscou a solidariedade das
<onrpanheiras de sexo.
pois (gue) o mundo non é ren,
nen guer amig' a senhor ben ? Repare-se para a ausência de refrão Ê procÊs§o poemático carac-
e este mundo que é já terlstico da pocsia primitiva: trata-le de evidente influêacia dos crn.
larcs dtaolot.
pois i amor non á poder ?
gue presta seu tron parecer
rreii seu bon talh'a quen o át ?

Vedes por gue o drg' assi,


porgue non á no mundo rei
que viss'o taiho gue eu ei
gue xe non morresse por mi,
siguer meus olhos verdes son,
e meu amig' agora non
nre viu. e pas.sou per aqui.

Mais dona que amig' ouver


des oje (creâ per Deus)
_mais
non s'esforç'en os olhos seus,
ca d?s oimais non lh'e mester,
ca já meus olhos viu alguen
e meu bon talh' e ora ven
e vai-se tanto que s,ir quer.

E, pois que non á de valer


bon talho, nen bon pareccr,
pârescamo§ já como quer.

(c.v. 34{, C.C.B. 742\


MARTIM CODAX
PERO VIVIê.EZ
(séc. XIII)
Mha irmãa íremos (?)
u ru is,"iu d;^ü;;:";,'T,j?,:"Jil1:,
e miraremo,_las ondas Pois nossas madres vam a Sam Simon
de Val de Prados candeas queimar,
Mha irnãa fremosa-, treydes nós, as meninhas, punhemos d'andar
a Ia igreia de V:g', hu é de grado
o _." í"J;J;: con nossas madres, e elas enton
e miraremo'_]as ondas
queimen candeas por nós e por si
A Ia igrgia de Vig', hu é o mar e nós, meninhas, bailaremos i.
salido,
e uerrá hy, madre, o mell amigo:
e miraremo'-las ondas. Nossos amigos todos lá iram
poÍ nos veer e andaremos nós
h ,ro1",u de Vig,, hu é o mar levario, bailand' ant'eles, fremosas, en cós,
f_uerrá hy,
e madre, o meu amado
e miraremo'-las ondas.
r e nossas madres, pois que alá van,
queimen candeas por nós e por si
(c v. 886) e nós, meninhas, bailaremos i.

NOTÀS .- Marinha. O quadro


cantares d,amigo já se apresenta com qrise
paisag,isiico e episódico dos Nossos amigos iran por cousir
a costumada espera do amigo no todos os seus elementos: como bailamos e poden veer
pôrto depois da sua longa
a presença da mãe e da irmã ausência;
."_o .or,rlidl"rrtes cio drama sentimental baiiar moças de (mui) bon parecer,
da donzela; a igreja como ponto e nossas madres, pois lá queren ir,
cle r.eferência dos Íatos mais
tanres da vida amorosa das popuiaçúe, impor_
;;;;;;r. do ternpo; e a par- queimen candeas por nós e por si
it;cipação da natureza: as
cnda;, o ,r,o, J..upclado, e nós, meninhas, bailaremos i.
meraütente utilitária. À feição cuja Íunção é
paralelística, .udlmenta",
peiição das pequeninas imagens ;ustifica a re-
gue dão .orr,*rro poético a
um con_
1.eúdo circunstancial.
(c. v, 336, C. C. B. 735)
:l il) 5[CISMUNDO SPINÂ

.yOT+t
olasião -
das epregrinações:
Cantiga de romaria. Belo
re o;J":Tr::j,,rH
a carolice 0". ,";;jt"j:"
tio Íazer (canC*as qu"tr*rr),-"nr-^lJ,
_promessa.s
superÍicial e indilerente (rr* j".i"r"á;;
de rererência
;;r;n::: :**]" tJ"X
;,:T#;::.".",ffiffi;" amorosos; dia,te PERO GONÇÀLVES POR.T'OCÀRREIIiO
'u'" ""àoos
raios e-ruru", ,"'lã:ãJT: ffi::""::ffffi"fi: if*;ff:l (sêc. XÍll, meados)
ção no tanatísmo das mães, , ao. ,u,r§r,§
fro*un. flao
do que é hojel nao*iera' nesse tempo, maior
Per Deus, coitaiÍa vlvo:
nossos amigos iran por
coiisír
pois non ven meu amigo:
como bailarnos, . .,, pois non ven, que farei?
maus cabelos, con sirç1o
elr nôn -ros liai:ei.

Pois non ven de Caslela,


non é viv', ai mesela,
ou mi-o detem el-rei
mias toucas da EsteJa,
eu non vos tragerei.

Pero m'eu leda semelho,


non me sei dar conselho;
amigas, que farei?
en vós, ai meu espelho,
eu non me veerei.

Estas dõas mui belas


el mi'as deu, ai donzelas,
non vo-las negarei:
mias cintas das fivelas,
eu non vos cingerei.

(c.v. so5, c, c. B. el8)


I{OTÀS * Cantigâ que celebra um tompimento de compronrlssos
amorosos. À presença do costume de se ligarem os cabelos com sirgo,
vestigio de tradição germânica como testemfinho de gue a mtrlhcr está
comprometida para casamento ou já casada, faz supor nesta cantjga 4.3
st,l(;tst\tt Nt)o sl'tN^
duas hipótese.s do seu estado civil. O loivado
era co4umeote selado
por dõas, presentes inúmeros gue o amigo
Íazia à futura companheira:
toucas de Estela, panos para gonela (túnica),
cintas de Rocamador,
cspelhos e fivelas, escaravelhos gue ainrla
hoje não perderam a sua
atualidade, À moça, diante das amigas que
assistem ao desespêro íe
sua coita pela demora do amigo, não nega
gue recebeu do amado
aquêles Íinissimos brindes de ncivaclo; SANCHO SANCHEZ
rnora do amigo .- que Íôra servir nas
-u.,- a vista da misteriosa de-
lides em Castela (e lá teria
lnorrido ou sido conservado para serviços
promete romper com as relações amorosas
extraordinários de el-rei), (séc. XIII, meados)
e desfazer_se das doas re-
cebidas. Teófilo Braga parece optar pela
segunda idéia, e as toucas Amiga, bem sey do meu amigo
que a mulher afirma nâo usar, seriam uma
alrrsão à sua viuvez, dado
que o anrado tivesse morrido (non é uív,ai que é mort' ou guer outra dona bem,
mesela,..) (Epopeas,.la
raça moç'ârabe, Porto, rg71, págs. 7o-7r)
. se o uso da touca denunci;r ca non m'enuia mandado, nem vem,
r.iuvez (e êsse costume ainda se encontra e. quando se Íoi, posera comigo
em Espanha na poesia tie
Gonçalo de Berceo (meados do séc. XIII)
e numa cantigã contem- qrle se veesse logo a seu grado,
porânea da Ilha de São senon, gue m'enuyasse mandado.
lorge (Cantos do Arquipélago, págs. 3gZ, 3gS,
apud Braga, ibidem), o certo í que,
em outras cantigas, as toucas
(sobretudo as que provinham de
Estela _ cidade espanhola de
não apresentam êsse valor simbólico. Nesta poesia, Navarra) À mim pesou muyto, quando s' ya,
pastorela de pedro Àmigo de
bem como nuula e comecey-lhi entom a preguntarl
Sevilha (euu)a, eu hun dia cuydades muyt' amig' alá morar?
Compostela,../ s,rge a palavra no plural, fug en
o que nos leva
a crer e iurou-me él por santa Maria
que nest⧠cantigas o valor simbólico
desapareceu. Nesta últlma que se vesse logo a seu grado,
o cavaleiro encontra, numa romaria a Santiago, uma
donzela, a guem senon, que m'enuyasse mandado.
faz uma declaração sentimental e oferece
uma série dc presentes;
cntre êstes, as úoucas de Estela. Ora, em
hipótese algunra, ,"* Oo,
irnagem literária, o galanteador iria I-Iu estaua commiçJo falando.
oferecer antecipadamente à murher
o erublema de sua morte, dixi-lh' eu: que f,rrey se uos nom vir.
Outro aspecto que merece observação: guando ou se uosso mandado nom oir
os lugares 6e<,
gráficos do serviço militar aparecem,
êstes e.tão g".ul*"nte Íora de ced'? enton jurou-me ei chorando
Portugal e da Galiza como na presente canção, gue se vee,sse logo a seu grado,
-
Que farei? é um clichê, tal a constância com que se non, que m'enuyasse mandado,
sia trovadoresca peninsular; mas é uma expressão aparece na pce-
gue ainda guarda
irm inienso valor psicológico, como retrato
da irresolução, da perple_
(c. v. 524\
xidade da mulher perante o único problema
de sua vida: a falta do
arrrigo. Têm certo sabor aincla os dois primeiros
.
NOTAS * Esta cantiga conÍirma o caráter instável das rela-
versos da 3,a cobra.
Pcro m'eu leda semelho,f non me sei dar ções amorosas nesse mundo rnedieval enr que os homens tinharn sem-
conselho, que procuram
traduzir a consc;ência gue tem a rnulher pre clue partir e as mulheres sempie qrre ansiar, esperar e viver dr
da incapacidade de demons.
Írar no rosto ;r grande perturbação de sua alma" âtrozes conjecturas sôbre o clestino dos homens. O caráter repetitivo
do Íema demonstra a feição popular da cantiga. O conteúdo, entre-
;\.1,1 ,\t.:(;ls l lrNl)o sl,lNr
tanto,
dcsenvolt,i:.sc clentro
de clois nomÉ:artos diferentes:
em gue a donzela relata o p.esente _.
às .,.ríid";;;;-;';, e
êles por ocasião ria parti<ia co:nl:inacio entre
.o .,,-.,-r^:-"- * "i':aril
uo cta pocsi;r,
_íinat l."Jrr,ai"';#';.;J:ssaclc
relr€I1loração,
rlue precromina
mática, harmonia *rrt"o Continuidade t"_
as -l]__rvuv
". peças da nai"ratir
rápida de u. .orrr.rt"

:;m,fX;" li;Xi: :f;*"":j


pÍessenrimento, o.
amôres corn alguém?), "u*
estii ern .or,t"u.iição
.i JOAN LOpEZ D'ULHCÀ
- de gue .1a .onhece tu, o a"xino-;;";:' a afirrnação ante.ior
iustificam a ausência das notÍcias Às duas hipóteses
ou" o u-1ll' (sêc. XIII, meados)
* ff .,: Hj"":JjH :: il?,1;.j:1' üi:. " 1 i"ffi "x;:T::""J"ilil:
e o morivo das apreensõe. ";,;:, ,:rrt"Tsticos do regresso Ày Deus, hu é meu amigo
J"-0"*":r.
certa serenidade de julgamento, too""' p.'lrtce guãrdar
supondo .o*o que nõ m' enuya mandado.
fil'ff ,' : ", : :*ll;,, ã *.: ; 1;;;' ;'?.' H:"J'XT:lT,*l :
",g." ca preyt' avia comigo,

il*
:::"' "
J.",t,";;
pesares,
f; ",1

: ::" _[i,;,,1
i."t,"jl i.j :
;:: ;

ffi;.ji"';,,I"T;;jiluj,1'u"''u' 't"i'
*.
ã'r",1
#il; ergo se fosse coitado
de morte, que se uãhesse
o mays cedo que podesse?
concertos amoroscls,
e sobretudo os seus
ideal gue jura uma fidelidade , ;;,r:samente não o
cre.s_
cavaleircr
*.rrà,' ;;". :t'0" Quando ss' el de mi partia,
;:T:
"', :'::;1, Jil l;,,";i # *l;,:::i,"T':;, ü:í§" T::::* i :: chorãdo, fez-mi tal preyto
e disse quand' e qual dia,
ergo se fosse mal treyto
de morte, que se uõhesse
o ruays cedo que podesse.

E ia o praz' ê passado
que m el di.sse que uerria
e que mh-auia iurado,
sen gran coita todauia
de morte, que se uêhesse
o mays cedo que pr:desse.

eu end' al soubesse,
11, sse
que nüca ihi bê qtrisesse I

(c. v. 2e7)
?rl,í) SEGISMUNDO SPIN;\

NOTÀS ,- Cantiga de lamentos e remelirorações da pariicla clc.


l.i;rrigo, num verdadeiro tom de prece dirigida a Deus.
Vida sentimen_
tal a de'pender de "mandados" (notÍcias) do amigo que partiu para
c fo.ssado ou para serviços de el-rei. À mulher vive sernpl.e nessa
atmos-
Íera de emoção, sobressalto, saudzrde, inquietação, conject*ras
ciumentas,
Ilensamentos vag,os. A cantiga dá a entenCerr corro muitas outras,
IUIÃO BOLSEIRO
i;ela ausênc.ia prolongada do homem, que a atitude habitual dêle era it (séc. XIII. meados)
vida real: eteÍnamente inconstante, esquecido da promessa do ,,man,
dado", Ionge da mulher; o drama da partida vivido pelo homem tes-
iernunha a aÍirmação de que o amor constitui na sua vida um
FuY oi' eu, madre, veer meu amigo'
mero
capítulo; ao passo que na mulher corresponde a uma novela inteira. gue m'enuyou muyto rogar por en'
Às juras e as lágrimas são freqüentes nesses cavaleiros que mais pa- per qtle sey eu ca me quer mui gran ben'
recem fiéis ao seu rei do que à donzela enamorada. O drama feminino mays uedes, madre, poy§ m' el uyo con sigo'
srrrge desde o rnornento errt que o cavaleiro-galã triunfa sôbre o seu foY el tan ledo gue, des que nacl'
espirito; e se desenrola, depois, com a conseqüente e imediata indife- nunca tan led' ome con molher ui'
rença do conguistador. Nos cantares d'amigo o homem parece en-
contrar uma r'álvula para aquela situação de recalques e inibições que Quand' eu cheguey, estaua el choranclo
a vida cortês impunha rigorosamente. lfma espécie de vingança. e non folgaua o seu coraçon'
E iá o praz'é passado. À mulher podia calcular perÍeitamente os. cuydand' en mi, se hiria, se non,
dias ern que o namorado devia regressâr, pois a duração do seu ser- mays, poys m' el uyu hu m' estau' aspefando'
viço militar compreendia no máximo três a quatro semanas, convocados.. foY el tan ledo que, des que naci'
por ocasião da primavera. nunca tan led' ome con moiher ui'

E, pois Deus quis gue foss' hu m' el uisse,


diss' el, mha madre, como uos diÍei:
"uei' eu viir quanto ben no mund' ey"
e uedes, madre, quand' el esto disse,
foy el tan ledo que, des que naci,
nunca tan led' ome con molher ui '
(c. v. 773)

NOTAS - Cantiga do otirnismo Íeminino' quando a mulher estJr


imantada pela certeza do amor do homenr' Estas situações sentimen-
tais são esporádicas con:pensações na alma Íeminina' O reÍrão aprc'
"nunca taÍl ledo"
senta duas expressões do seu estado de exaltaçãor
e "des que naci", eviclentes exageros nascidos da euforia Íeminina' "'A
simplicidade da coilfidência dos seus sucessos amorosos à
mãe' stlpõc
um amor sem receios, lícito e puro' Já não há aquela distância entrc
a rnoça e o amigo, Recados. assentimento, encontro' É uma mulher
real'
de em seu "épanouissement"
de carne e osso e a transbordar alegria
,,',í, >I..(;ls\lr ND{, S,,lN \
AIrltfft,tN't Ão I)^ LlHt(t^ .t]t0\,AD()ttllsc^
lr:rtural. Veja_sc o co.nlpoÍia'nento
:t t9
psicológico da- muiher: ^(,t
correspondência plena tranqueza,
NOTAS - Cantiga das inquietações noturna.s da mulher pela
;n:1"r;,.,T::::":: ":iffi ;:' :11 l,:" H ; JT:jJ'.
j'l,",ffi: :rusênciado amigo. O tema da insônia tem sugestôes das a/âa.s, cuja
Ío.a do
interpeJar a mulher, "
saber .,rogar,,,-;il;;; hrevidade das noites é alvo de execração por parte dos amantes.
.;,,;;;;_";.ern com moça' capacidade ";Lr- O
tempo cronológico difere ou é assincrônico do tempo psicológico: longc
<Jaclo" gue traz hesita.rjtro .a a" .rr*.r,
consciência de todos os rlo objeto amado. na soiidão, a sensação do tempo cronológico é unra
a,"nr"-r.-l*;- ;''";:::t'' bens ,u ,rulh".
torturâ interminável; perto dêle, a alegria e os sentimentos circunvi-
*::, ;1,,"-:":
;,,,;;;;
j:::'li:::TT:,::'':,:":ffi ;.*ÍT; zinhos abreviam a duração das horas. Na poesia essa realidade psico-
lógica não se explica ern si mesma, tnas por uma causa de natureza
vidade do
inquietação; c) :i"iTfill ;"J:',ffi;j:""" jffi::rã "i:; crterna: Deus.
Íinalmenteo progressivo l".lu*O"urr"nto de alagria,
hiperbotica l'.
:.::,:";';,:"ilffi"":ff::' osimagern
motivos de
criatura amada o
-
das imagens ; .;,]'*ii. sua felicidade' o cliura iit*ra.iJ
sentimentais prejudicou
caridade poética ao uu,ol.tu""
". nur,. u ,rfu

Aquestas rroytes tan


longas
que Deus íez cm graue
dia
por mi, por que as non
clórmio,
e por qlle as non fazia
no tentpo gue meu amigo
soya f;rlar comigo ? "
Por gue as fez Deus
tan grandes,
non poss' eu dormir, coitada
e de como som sobeias,
J

quisera-m' outra vegada


no ten:po que rxeu amigo
sova íajar comigo.
For gue as Deus Íez tan
grandes,
sen Ínesula e desiguaaes,
e as eu dormir non posso
pol gue as non Íez ataes, ?
no tempo que meu arnigo
soia íalar comigo?
(Idern, C. V. 752)
PERO MAFALDO
JOAN DE REQUEIXO
(séc. XIII, meados)
(séc, ?)
Ài amiga, sempr,avedes sabor
de me.rogardes po, _"r-à*igo
que lhi faça bem, e bem
Fui eu, madr', en romaria
vos digo a Faro con meu amigo
*'" e venho d'el namorada
il:"iii:'J';:J,'#: ::';ffi':on Íarer por quanto falou cornigo,
quant,el guiser, pero lrem lhi farei. . ca mi jurou que rnorria
Vós mr por mi; tal ben mi queria I

q u" rh"' r"",ffi


:H':,Í.?,..'"ã1""
ca me seria.mesura(e) Leda venho da ermida
bon prez,
e por vos(s)o rogo e por e d'esta vez leda serei,
al non
farei-lh,-eu bem, mais ca falei con meu amigo,
ã. p.u, non farei
quant,el guiser, perc bem que sempre (muito) desejei,
lhi íarei.
ca mi jurou que morria
Rogastes-mi, amiga, per por mi; tal ben me queria
bõa fé, I
que Ihi fezesse Àauuiu À."
por vós, e, pois vós queredes,
que o faça,.mais, pois convern Du m'eu vi con meu amigo
que assi e, vin leda, se Deus mi perdon,
farei-lh,.eu U"*, _uir-a"
guant,el quiser, pero ben Oru, non farei ca nunca lhi cuid' a mentir,
lhi farei. por quant' el diss' enton,
(c. c. B. 373, C. A. %4) ca mi jurou que morria
p'or mi. tal ben mi queria.
NOTAS À
- am é.uma terceira pessoa no
que se esboça. r, pegueno
"l;
roürarlce

::*rt
uo,rlnt
(c. v. 894, C. C. B. 12S9)
*lt[ff "'
!]:,f ;,:t"'d;:'i
;i."'"t-:':il":,:'
por
a.ssim a eíerenci a J.I.:: j: NOTA§ * Cantiga de romaria, em que a donzela enamoradn
-dêsse comportameoto;
a
a literaria
-"lra
1::1,
"ff i,, *::,: confidencia à mãe os bons resultados da peregrinação ao santuário t{e
cantiga, a .atmosÍera
autoria masculina, " denunciar, nesi.a Faro
- lugar montanhoso da Galiza. À cantiga de Requeixo, poLrre
'trs móveis da alma
n." ""1p'-0" ,",tge conseguiu traduzjr dc idéias, consiste apenas na narrativa de um fato e na exposição
fsninirr6.
352 slrGlsÀÍ{rNDo cpuiÁ
singela da euforia espiritual
da moça em amôrr_s satisfeitos:
irnagen idiüca, cheia de- frescura, é uma
gar silvestre, moftentos ôstes
aà"*r-n*r"r"s à ermida, num
Iu-
que fr".*.r"'_"L donzelas
de seus sonhos amorosos. a realização
Agui u *ii" I ,ra" e a filha assume
arpectos diferentes: notc_se ""t"çao
a Iiberdade co*;;
para relatar o sucesso d.o ; ,"*" se dirige à nãe
passeio, bem como a confiança
sitana filha .- que te\re naturalmente que esta depo_
,"..,raro para ir à
acompanhada do anrigo. rornaria loÀN SERVÀNDO

(?)

Diz meu amigo que lhi faça ben,


mais non mi diz o ben que guer de min;
eu por ben tenho de que lh'aqui vin
polo veer, mais el assi non ten,
mais, se soubess'eu qual ben el queria
êvcr de mi, assi lho guisaria.

Pede-m'el ben, quant' á que o eu vi,


e non mi diz o ben gue quer aver
de min e tenh'eu que d(e) o veer
é mui gran ben e el non tetl assi,
mais, se soubess'eu qual ben el gueria
aver de mi, assi lho guisaria.

Pede-m'el ben, non sei en gual razon,


pero non mi diz o ben gue guerrá
de min e tenh'eu de que o vi iá
gue lhe (é) gram ben e el ten gue non,
mais, se soubess' eu gual ben el queria
aver de mi, assi lho guisaria.

Par (San) Servand', assanhar-m'ei um dia,


se m'el non diz qual ben de rnin queria.

(c. v. 71s, c. c. B. r152)


35,I, SEGISMUNDO SPINÁ

NOTÀS * Cantiga. bastante artística quanto


mesma idéia, elegante, leve e finamente
à composiçâo: uma
áesenvolvida. Através do
texto pode-se perceber o leve sOpro
de hun
do uuÀr pau ,i,npri.iàade da
-*".
a r,rol'1:t";;,"
ãa mulher "':T:ilfii:
mento da idéia, frisando bem a ingenuidade
fe.rnlela e sem compreender, em tôda a .uo,rnu, -- que ficou
Íido das palavras do amiso. A canção o verdadeiro sen-
ilustra bem os dois ti.pos dê
amor: o masculino e o da mulher:
esta (cuja natllreza espiritual, quando PEDRO AMIGO, DE SEVILHA
cu]tivada, tende para certa espiritualização
do amor) contenta-se per-
Íeitarnente com o fato de ver
o amigo e lhe falar; aquêle * gue parece (séc. XIII, 2.n metade)
ter enr sua constituição humana urna
capacidade menor ile transcender
as manifestações físicas clo amor .-
.".p." julga gue o simples amor
de sentirnentos não é o bastante.
N" .;"ç;;; Quand' eu hun dia fuy en CornPostela
autor, corir seguranÇa
€ arte, estabelece o contraste entre as
duas en romaria, ui húa Pastor
cle,tro de rôda a sua ingenuidade,
está o""or.;::,t;':u":;rr*rJi: gue poys Íuy nado, nunca vi tan bela,
amigo, logo que ôle externe o ,.ben,,
que dela esperâ. Sôbre o pre_ nen ui a outra que {alasse milhor,
tenso caráter eufêmico da expressão ,,Íuz"r
mentários que fizemos à segunda
o ben,,, releiam-se os co_ e demandei-lhe logo seu amor
cantiga de D. ]oão Soares Coelho. e f.[.iz por ela esta pastoreia.
Dix' eu logo; "Fremosa poncela,
queredes uós min por entendedor?
que uos darey bõas toucas d'Estela
e bõas cintas de Rocamador
e d'outras dõas, a vosso sabor,
e ffremoso pano pera gonella.
E ela disse: "Eu non uos queria
por entendedor, ca nunca uos vi
se non agora, nen uos filharia
dõas gue sey gue non son Pera mi;
pero cuid' eu, sse as {ilhass' assY,
que tal á no mund' a que Pesaria.

E, sse veesse outra, gue lhi diria,


sse me dissesse "ca per uÓs perdi
meu amigu' e dóas gue me tragía"?
Eu non sev ren que lhi dissess' alyl
se non foss'esto de que me temi,
non uos dig' ora gue o non faria".
3Iró StrtC tSÀl t tNI)í) .tl,tNÂ
r\l'til,l:il,)N'l'ÂÇ\o l)Â LÍlll(:\'l'lio\ \l)otilils(:\ :t51

Dix eu: "pastor, .§sôdes bem rrazõada,


e pefo c[eede, se uos non pesar, XiI sl: faziam à Igreja de santa Maria. É também coiltrastalt(" {)
gue non est oi' outra no mundo con.rportamento da tnulher nos verso'J filais da canção' ct'tja consciitrr:i'r
nada^
se uós non sodes, que eu sábha amar, rcligiosa parece bem Íturdamentada: ela somente s:e prontlfica a irct'itltr
e pof aquesto uos uenho rrogar a proposta do cavaleiro, assim que a rÔmariár estiver terminada' Alúlrr
clisso, a cantiga ainda desmente a cÕrnuü1 finajidade das pastorelas,
que eu Seia uoss, ome esta vegada,,.
islo é, serem Íeitas para deliciar aos homens da côrte cotn as gros'se-
rias rústicas das pastôras (oposição elltre a uilttúa e a corfcsla'l'
E diss' ela, come ben
ensinada:
"Por entendedor uos qr.,"ro
[ilh.r,
e, pois for a rornaria acabada,
aguí dtr sõo natural, do S;rr. Dizede, madre, que me metestes
cuido, s.se me queredes leuar, - tâl prison e Por Po(
en. gue mi tolhestes
ir-m' ev uosqu e fico uossa pagada,,. que non possa meu amigo veer?
-- Pol que, filha, des que o vós conhocestes
(c. v. 6se) nurlca punhou ergu'en mi vos tolher'

NOTÀS Os caracteres artisticos desta E sei, Íilha, que vos trag'enganada


cstão a conÍirmar que esta cantiga devia colocar_sebrlissirna pastorela
Senão vejamos: se o ambiente entre as d,amor. con seus cantafes, que non valen nada,
qr" decorre a cena não é palaciano, que lhi podia quen quer desfazer'
por outro lado é evidente a "r, intenção artistica cla composição,
elementos estéticos gue pefteilceln conl Non dizen, madr', ess en cada Pousada
à esÍera clo amor cortê.s: arnor à
pr.imeira vista, a beleza incomparável os que trobar saben ben entender.
da mulh
trovador de.scle que veio ao mundo;
fcnrininas: a desenvoltura no falar,
o .onlr,ntJtd; ;fi: ;ili#i:
muita ponderação e inteligêflcia, Sacacle-rre, madre, d'estas paredes
encântos intelectuais .+ôbre..qs quais
insiste o próprio trovador; o re_ e ve(e)rei meu amigu' e veredes
tráiülento reflexivo da mulher, disposta
a privar-se do anror que lhe que logo me rnet'en vosso Poder.
é ofcrecido para não.prejudica. u outr" que
-
ser o obleto dos amôres do poeta possivelme,te devia (Non vos sacarei ct'aquestas paredes),
(veja-se ,.," ê*r" jér trazia
consig()
-nen 1n ar venhades tal Preito mover,
os presentcs (clõa.sJ para a amada);
ut'r"ê.r.iu de expedientes poemá,
ticos da poesia popular; perÍeita "
unidade narrativa e nuita segurança
no diálogo. Àlém dêstes caÍacteres, Ca sei eu ben qual preito vos el trage
outro aiuda favorece a classifica_
çâo dêste cantar corno cl'amor: o fato de e sodes vós, filha, de tal linhage
gindo^se à rnurher' cãracteristica
o h;;",r, falar primeiro, diri_
dos cantares d'amor segundo precei-
trra a ÀrÍe de Trat,ar galego-portuguêsa. eue derría vo.s.so servo seer.
rais gue denunciam as relaçôes sociais
É àe ,ota. os valores cultu_ Coidades vós, madre, que ê tân sage
entrc u Gulrr" e os pais€s v.i_ -que podess'el comigu'esso Poer?
zinhos: devia ser de alto estilo
a rnoda das toucas de Estela .- cidade
e.spanhola de Navarra, bem
como as cintas de Rocarnador .- povoü.
ção da França meridional, celebre p"lu" Sacade-me, madre, d'estas prijões,
.orn*lus gue desde o s{c.
ca non avedes de que vos temeÍ.
:.t58 SEGISMUNDO
SPTIVA
..--
Uirl", ben sei eu vossos
ca non queren gram corações,
pesar atender.
(Idem, C. V. 823, C. C. B. 12IB)
NOTÀS ,* Inr

#:i:"'::"ij:: T. i*: Ti=:i,"i:.#. :"i: I."",u" pr.cura im.


veriÍicava rre
as 1"ffi
en ?:i":"fi ij::,":;::, : :: , IOAN ÀIRÀS DE SÀNTIAGO
rurança contra os
u.5.., ":":3,:..^;#;.
.o}'":":::"
co.locavam suas
filhas cnr se-

":",ff :i:i,Íil,&[;"à*?,Jr,:.H;ãà:,'T::,,x;;i;{}i},,J ( séc. XIII, 2.4 netade )


corresponde ao 4.a t.

::istocrático. É evidente 9ue, para burgut's, urbano


c Pelo sor-rto de Crexente
servo', de sua filha
_ ;;;_;- """ ,Jjftl"r considerado com.
o trovador
pertences§e à
:::
seu futu marido' o pretendente úa pastor vi andar
classe o'--: ^tu* ^que
ai pousada o *...-r'u'itt
-oJm Pouco obscuro: talvez muit'alongada da .clente,
o significado
"r,rr""."'u11','êsa'
serões literário*
o., o'-tot ;"odl"o"oi 'un'" de rurtião' para alçando yoz a cantar,

::.-0.;;"
j;;;fi
srre se jursa ,o".u,ao"jb1lht:t;
:;: j::,,"T*"..:,::,;:::::.J;,:."",,::
:,ffi
apartando-se na saia,
quando saia la raia
)' ",,,*,','r"o,li,r'"1", "::::lr,l.:
:ff ;,::''J'L,
,o'". i:':;,:T", 1' d e sr a z er
já ccnsagrados peJo jutsan,",r.- "'
: ::
0..'r,."]]
do sol nas ribas do Sar.
"r,"*,lll;
.Hily":;; i,.;;""11"'"::'r'::"'"':"",':l':.".""1o'"ãt",,oqu;''::;x
a §ua vigilância' quase
E as aves que voâvan,
tância da o*'ricr guando saia I'alvor,
-oru .ru*ol:tl:ot " "i" todas d'amores cantavan
tro_ paredes; ;- ;;;:T,i"l,:"rr"::::##"
entregue, nesta época,
u"_
ryif:-*oi
-"1_rlr"l^"'os,, como se depreende, ;"J:_
estava
pclcs ramos d'arredor,
mais non sei tal qu'i'stevesse
;Ht'. T;":,i*.rt:.:*L",^d: "",*,r "',;.#ff ;'1.,f: que en al cuidar podesse
nesta,
época, pera urna insrirújçâo
fregüênc," ."^"n,i"'1"11",,"r^,o,r"il, senon todo en amor.
ver da cantiga 190 ': re-attza", tal como
se uodr
do c rz ,-':'.
da autoria de D. Dinis
Iosé saraiva, ,,"i." à".1;,Y, iã ;r#::
;":'"';:;::"i*i#,Jii-lr,:ii ji;l*íi Àii 'stivi eu mui quedo,

IilTtJffi
sente
cantiga. truu rDUlto seme]hantc
ao da prc-
quis falar e non ousei,
empero dix' a gran medol
-- Mla senhor, falar-vos-ei
un pouco, se mi -- ascuitardes
e ir-m'ei, quando mandardes,
:rais aqui non 'starei.
360 ST](;ISiI( NDO SPIN;\

- .- Senhor, por Santa


Maria,
nos estedes mai:; aqui,
mais ide_vos vossa via;
faredes mrsura i,
ca os gue aqui chegaren,
pois que vos aqui acharen,
ben diran gue mais ouv, i.
D. DINIS

(c. v. (século XIII-XIV)


55.1. c. c. B. s67)
NOTÀS .- foão Àiras foi, conro Meu amígo, non poss' eu guarecer
fectrndo dos trovaclore-s da
D. DinÍs em portugal, o mai-r;
Galiia, sen vós, nen vós sen uri; e que será
trovador. De vida sentirnenta.l ""_ .orr,Iro haver superado o rei-
cantigas cfamiso. vol. I, págs.
acidentada ri.. d" episódios
{V. Nlrnes, de vós? mais Deus, que end' o poder á,
"
zr6--2t;;,-"'r;i
pela sintpliciclatle com qrre canuga destoa um pouco lhi rogu' eu que el queira escolher,
decorre u a"rro urno-sa
trovailor de Conrpostela. À entre a pastôra e r: por vós, amigo, e des i por mi,
cantiga u
quadro.s e pela riqueza ".""""i,"a.ia pela dinâmica dos que non moirades vós, nen eu assi
do c." c en te, * ;;; ;;,
s
*
d
",",t::
:'" iT :: : L:l;:ff : ff I:::: :_
.I*
a entoarem hino.s de Ic Corno morremos, ca non á mester
sas por entre os .,^o,"'J;,.
naturera, suscitadora de estaclos
;.""nl.T:*rJ:.ff:".ff1,""T;: :*.Í de ta1 vida avermos de passar,
amorosos, vai alargar-se
urn pouco
ca mais nos valrria de nos matar,
mais em alguns poetas do
Cancioneiro Gieral d" Ga"ciu
de Rezencle" mais Deus escolha, se a el prouguer,
tais conlo Francisco de Sousa
estrofe, para o sentiment,
e Diogo B;;;;;"- Repare_se, na
última
por vós, amigo, e des i por mi,
serha ao .,,,ur"i,.o .1.,,;':.i:,i:'il,::,fi,*:"r:,'ao u pu*to,u u.on que non moirades vós, nen eu assi
visto no campo com urn homern lue outros digam têJa
estranho. Conro ntorremos, ca ena maior
coita do mund' ou ena mais mortal
vivernos, amigo, e no maior mal;
mais Detts escolha, come bom senhor,
por vós, amigo, e des i Por mi,
que non moirades vós, nen eu a-§si

Como morrernos, ca, per bóa fé,


mui gram temp' á que este mal Passotr
per nós e passa e muíto durou,
mais Deus escolha, come quem ele é,
por vós, amigo, e des i por mi,
que non moirades vós, nen eu as-si
.fit2
st.(; l.\r\l t iND()
Sl,lN.,\
\ l'lil,l)ii,l\'l' \(.1 i o l) \ l,rll lcA 'l'lt()v Atx)|il,;s(,^
Corno
..,*"rÀ l, "j;,:ill.,,
l,I"J"" o,:ln
", non sei de min que seja
e da mort' ei enveja
(c, v. r8.1, c. c. B. 5S1) a tod'ome ou molher que já morresse.
NOTÀS _ Carrtioa
,-.
,,dsrco cla nt.t:-s
ji^Jr1r-ar.
(ldem, C. V. 196, C. C. B. 593;
e dj.lemárico. l" antor crn gue a nlulher
cxpõe'
pode viver
."n, o outl intrrossi""l ;"r"
t"t rt'rredio nutrl torn
urn não NOTÀS ,- A mulher aqui tolna as atitude;i, os sentir)rentos r lj
ral'ez, os ,;;;;"r" ,,--
so,.çôes mais
irlr','r"^^'n,""""".1, "'.l,
or,no", ; ;.*;t'"Çâo impcdc contittuar. expressões gue o homem usa quando fala em seu próprio norne no.\
fclizes ol']^0" livres' ltaver'a
coroca: ou rnorrer t"' f1.
ourras cantares d'amor. Lamenta a impossibilidade de se verem; clai a prr,
c muito pior; o de :T:-" '..il*]õ-se;, alternativa' entilo, r;e
-r,rrr.'r" ferência pelo "não ser", ao invés cic existir na privação do amor; daí
certo é Tlt :tt de amar
,o..n,o. ,ro é ."tuç0..' .;;;JJ'*"" a execração contra a própria vida _ que non nacesse; dai invejar àgue_
sirrração o amor oo'- orrp
âmbos se vêern "::^"_.".,r.,,"" les que já morreram. Observa J. J. Nunes (Cant, d'amigo, vol. III,
obrigacr:"t":t"' tase crítica Pn "t"
'i,.o,."rrrrqestrnas'
a- trma decisã;';";",,,r'" pág. -.Í9), que a expressão Amigo, uitto tan coitada pot ueer_L,as
oup
'!rI(r, rnai.s reÍnenre u D.,]: Todavia' a mu- aparecc
as coisas), prefere j,^,"u lorgue ,;"';:';:"''e' também numa canção do trovaclor peire \ridal; Domna, tan stú
sue de uo"
o . oezec c<titos (apud |. Anglade, Antlx;lo17ie des Troubadours, paris,
e.r pe,r ien tJ ;;;."r.; ;:.1 ;:",-*:; r;,# :[I"::.,] .t:,il: tr953, pág. 122). Se há identidade de expressão, não há todavia
de
situação seniimental. Não parece sincero o tom da presente cantiga
de D. Dinis, er11 grre a mulher sai de sua sinrplicidade, l]lesrtra e
leveza de ânimo, para choramingar unr clestino sern remédio.
Coitada viv,, arni,
e vós vived"."i.,Yl;.otrÇue 1'ss non veio
de me ,"";;
(on gran deseio
;tad_e
sempr'en ;.;j";r';'?,Loo' en sejo [{üa pastor se queixzrua
que non n]'é muyt', estando nor:tro dia,
se n,
come guen -rir,, e sigo medês fale,ua
a*T^Torte,
mrgo, en tam
grarn desejo. e choraua e dizia
Por vos veer, con amor que a forçarra r
amic
e vós por;"'r""i''"L_vivo tan coitada, "Par Deus, ui-t' en qr,;ri.re clia,
a_ vida oi rnais non é nrd, ay amor l"
r;;';;il.:ue e maravjthada
sõo de ;",,.;;;:"s
solrendo tam
esquivo Ela s'estava gueixanclo.
mal, ca mais mi
,rt"riu de non seer come molher con gran coyta,
nacla.
e gue a pes€rr:, des quando
n,acera, non Íôra doyta,

i #[ ,,":1 ;
T:"';, :'.T"
:iiit' ;eu, gue non nacesse. T:;."..".
por en dezia, chorando:
"Tu non és se non rnha covta
", ay arnor l"
t(vl ,rI.l(;lSXIliNf.X) SI)L\,,\

Coytas lhi dauan arnores,


que non ih'
e crevrou-s. ;.,1T
e disse ccln coyta
ff,Tl.I""",
"l\{al ti venha -p"" forter
u [or"., LOURENÇO, logral
cil non é.s se non mha morte,
ay amor 1,, (séc. XIII, 2." metade)
(Idenr, C. V. I02) Tres moças cantavam d'amor,
isOTÃS .* ^;';.,,;1"0., mui fremosinha-s pastores,
NarraÍ
*,io..i",," ern sue o tro_ mui coitadas dos amores
_,11:
pressáo Íiel :,:"j:X:I,"0".,In*,,o,
oe amôr' Não parece e diss'end'üa, ilna senhor;
sentiment.. .;
<ios ::r^1-T
da rnulher do campo; a ex-
sirspira assirn tangurar,lll" da cidade é qrre "dized', anriga.q. comiqo
t=,rr. t,.*ierrr, ;;"#;:'"^"t:-.dc .a'nor e desfalece em seu sofrinrento. o cantat ctü rneu amigo".
ckrenro,
"*o",,un",-u-'i",;,,1:*:';"
;;;:,
j"T"reclara não
past§ra recém-apaixonadu ";::,
,,tr".----:"':" ."":"
gue nascera. ]\{as
Todas tres cantavan mui ben,
r*" a"*j". ""'*::i:,:: :":,:T .;"::?:jj::,""i11,,1
a
suspiranres,
come moças namoradas
e dqs amores coitadas,
e diss'a por que perç' o sen:
" dízed', amigas, comigo
o cantãr do meu amigo".

Que qran sabor eu avia


de as oir cantar enton,
e prougue-mi de coraçon
quanto mia senhor dizia:
"dized', amisas, comigo
o cantar do meu amigo".

E, se as eu mais oisse,
a que gran sabor estava
e que muito me pagava
de romo mia senhor disse;
"dized', amigas, comigo
o cantar do meu anoigo".
(c. v. 867, C. C. B. 1262\
866 SEGISMUNDO SPINA

NOTÀS Espionalem de amor gue Íaz um poeta,


-
.apâr'ece como sendo
que, no reÍrão,
o amigo da pastôra saudosa. São imagens
o grupo de pastôras, os cantos de reaisr
-qo.,
amor, as solicitações aãqua"
mais sofria e pedia que lhe cantassem
.digno de nota o primeiro
os cantares de seu amigo. f,,
verso, que alude ao baile das moças ;;
de três. Veja-se a conhecidissima bailia *;
do clérigo Airas
Nunes; gay-
lemos nos iá todas lrcs, ag. amigas,
]oan d,Aboin tambêm traz uma
passagem em que uma pastôra
canta, dirigindo-se a outras três: FERNANDO ESGUTO
. . . húa pastor siia.
cantando con outras tres
(séc. XIII-XIV)
. pastores, e, non vos pes,
e direy-vqs toda a vya Vaiamos, irmãa, vaiamos dormÍr
o que a pastor dizia (en) nas ribas do lago, u eu andar vi
aas outras en castigo. ,. (C, y, 2Zg). a las aves meu amigo.
Na estrofe seguinte surge outra das três
a dizer
de roda, de três ou guatro, em gue sucessivamenteo seu cantar. Baile Vaiamos, irmãa, vaiamos lolgar
.§rupo e, uma se destaca dc (en) nas ribas do lado, u eu vi andaÍ
à guisa de solista, canta sôzinha enguanto
as outras dançam. a las aves meu amigo.

En nas ribas do lago, u eu andar ir,


seu aÍco na máao as aves ferir,
a las aves meu amigo.

En nas ribas do lago, u eu vi andar,


seu arco na mãao a las aves tirar,
a las aves meu amigo.

Seu arco na mãao as aves ferir,


a las gue cantavan leixa-lasguarír,
a las aves meu amigo.

Seu arco na mãao as aves tirar,


a las que cantavan non nas quer matar,
a las aves meu amigo.

(c. v, eoz, c. c. B. 12e8)


2A
.'t6B su(;t,\,\ltrNtx) sl,lN,,\
NOTÀS_Éiur
,
ohscrva Ira.ralelisticà tlc assrrn
o arrigo ;
;j]: ';;'J'" idilico: ir nroça
s,('
sualqucr. arc onde ,-.," l'
" .t. .1, "., " ;,,"-
Há rrrn J;;ral;'Ir' co,r um l'retcrr()
da lorrra J,oJrrrlar 'il;::cnto de idiias. arrcsar
nro(« (i rninrrciosa "
n"'tt'.
,",.-.o
*uu.".,1 ".;;
o-l'" f,, ,.;;:;:1t' À ob'e^'2ç;o
e's ave.s que não
.,tt: lt)rpar .rnru,, rr " do lago": rna(;r '1''
artifi(ios'rpôur,il rr".ãn,or]'t'1'nt't
I alatttos
raJr.6; .11p1 -;r dcscurI,a
<lotntír' t'aia'
'n''n". ,;r: ;;';;; dc ir ao laqo'
,,oo
r'scr'ar crc ;'r,'j'l "t''"*"-, APÊNDICE
cncorrro. l,crro o ,,,,1:..^tn'otrigo, ou ".;;r;. u uror,,rnidade dc
";ra,'rr.ríl"l-r,,".
he a surlrrcs3 61.. ,,n,

(À titulo de curiosidade, porque a poesia árabe-an-


alaluz não se articula aos propósitos da presente antologia
que visa exclusivanrente a lírica românica trovadoresca de
-inspiração provença1, retraduzimos êstes três exemplares
poéticos, das mais belas canções da seleÇão que o ilustre
arabista Emilio Garcia Gomes nos apresentou na sua obra
Poenras arabigoandaluces (Espasa-Calpe, Col. Àustral, 2."
ed., respect. págs. 106, 177 e 116), com eruditíssima intro-
dução histórica e crítica dêsse movimento trovadoresco do
sul da Espanha. A presente seleção está dentro do nosso
critério fundamental : jóias do lirisrno arábigo-andaluz, são
as gue mais -qe aproxirnam do conteúdo e clo espírito cor-
tês da lírica românica, embora diferenças profundas estão,
a separar os dois movimentos poéticos, na técnica, nos mo-
tivos de inspiracão, mas sobretudo nas condições culturais
que determinaram a estrutura ética da doutrina erótica des-
sas duas florações literárias. À lírica andaluz está a reclamar
uma apreciação estêtica em proÍundidade: a sua rica e
exotissima imagética, rnuito distante dos quadros retóricos
da poesia trovadoresca pr'rvençal, recorda muitas vêzes as
nietáforas miraboiantes da poesia contemporânea. Vão elas
sem comentários: o leitor, que percorreu até aqui o lirismo
passional dos trovadores e jograis occitânicos, já estará ha-
bilitado para perceber a surpresa que nos proporciona a
poesia oriental ) .
A FORMOSA NA ORGIA DE QUE MLINDO SOIS?

Seu talhe flexível era um ramo que balouçava


sôbre o mon- Fertenceis ao mundo dos anjos ou ao dos homens? Escla-
tão de areia de seus quadris, e da qual colhia meu
co- recei-m'o, porgue minha inteligência ê incapaz de com-
ração Írutos de fogo. preendê-lo.
Os ruivos cúelos que cobrem suas têmporas
debuxavam um Vejo uma forma humana; porém, se aguço o entendimento"
lam na branca página da maçã do rosto, com ouro
que encontro ser um corpo que procede das altas esferas '
escof,re sôbre prata.
Bendito seja o que ponderou a maneira de ser de suas
Estava no apogeú de sua beleza, coÍno o rarso
se veste de criaturas, e Íêz com gue, por natuteza' Íôsseis uma
íolhas. luz maravilhosa.
O puro' li-
vaso chejo de roxo néctar era, entre
serls cledos brancos, Não há dúvida de que para mim sois um espírito
como um crepírsculo que amanheceu em gado a nos pelá semelhança que envolve as almas'
cima de uma
aurora.
À única prova gue confirma a nossa encarnação corp'oral
Saí,a o sol do vinhc, e eta sua bôca o poente, o oriente
a e nos permite estabelecer analogias é que sois visível'
rnão do copeiro, que ao despejaro vinho pronunciava diría-
-fórurulas corteses. Não fôsse porgue nossos olhos contemplam vosso sêr'
mos que éreis a Strblime Razão-Verdadeira'
E, ao pôr-se no delicioso ocaso de seus lábios, cleixava o
clepfisculo nas maÇãs de seu rosto. De BEN HAZM, de Córdoba (994'1063\

Do príncipe oineia MAR'ü/AN BEN ABD


,,\L-R.ql{MIN, chamaclo AL-TALIe (mor-
to em 1009).
CENÀ DE AMOR

Que formosu
. ",d"tlg dizer gue a lrornro
suas qualida, é apenas uma de
Não';"á;";;;:'"."*'mundo
sue exisre ros seus movjmentosro fora daquele
E uma lua tão bela, que.
se se disse
rendes ."r?,,, oo",;;;,^. à lua: 9ue pre_
,^.^"_-1,1.".1"
cer16 h6vslia
de seus hulo.'fo' de dizer, "#", "rl
GLOSSÃRIO
Quando a meia jr
ceu es.tá diante dela.
sua irn6gsrn J:^* e '- com,:
se olha no espê'lho' vista '-"t' TERMINOLÓGICO
o ,rrar pontua ,o "unno
vern nera o, ..1:''n: de seu rosto DO
"'"' que escre-

:r .lu ."-;;:":';.;r.':*tta. noite- permite LIRISMO OCCITÂNICO


'u' apro-rime, ..ú ,-;,; ^:-:::"" o roso 9ue se
r;s" ;;"',;; ,Jã illlX de meu ,r"J. *
Estreitei-a comoes
a"-" p.r^iJa;':"J'ir;"Jvaro o seu tesouro, abarcan-
e entrelacei-a com
a
sazela .r;"1"".àr'I::',:;,:eus braços porsue é
urna
Porém nrinha castid;
ção perman"a"r'or" ,recusou beijar sua bôca, e o !vrq-
dobrado sÔbre suas brasas' ' - cora-
Maravirha-te daquell
que sente arder ;
queixa au ,iaa"t
trazendo .-rJr]'rr'ir""Jj:X:1,. ."
"
D" S_{|WAN BEN
(1t6s_1202). _*-\ IDRIS,
,ut de Mírrcia

t,

You might also like