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Vítor da Fonseca (1987). Educação Especial.

Porto Alegre: Artes


Médicas.

Porto Alegre / 1987


de Vitor da Fonseca,1987

Capa:
Mário Rhnelt

Supervisaõ editorial:
Paulo Flávio Ledur

Composição e arte:
AGE - Assessoria Gráfica e Editorial Ltda.

Reservados todos os direitos de pubficação no Brasil à


EDITORA ARTES MÉDICAS SUL LTDA.
Rua General Vitorino, 277 - Fones 25-2728 e 25-8143
90020 Porto Alegre, RS - Brasil

Impresso No Brasil
Printed In Brazil
Sumário

Introdução . 7
1- Problemática da deficiênáa: sua prevenção e identificação . . 9
2 - Definição e classificação da deficiênáa 27
3 - Aprendizagem e deficiência mental . . . . 41
4 - A modifcabilidade cognitiva na educação especial e na reabilitação .
65
5 - Educação, educação especial e integração . . . . 75
6 - Integração como filosofia educacional . 84
7 - Envolvimento dos pais e educação pré-primária 95
8 - Formaçâo e investigação . . . . 99
9 - Princípios e conteúdos da formação dos professores do ensino
especial . .106
Anexo . . . . . . .121
Introdução
presente trabalho procura, dentro de uma perspectiva de
sensibiÍização,
responder a uma necessidade que tem vindo a fazer-se sentir em
Portugal no
campo da Educaçâo Especial (E.E.). A dispersáo de iniciativas, a
fragmentação dos
serviços, a inexistência de inves2igação, a carência de estruturas e de
estudos interdisciplinares, etc., vêm obviamente comprometendo a
mudança desta situação.
A opinião pública e o interesse governamental, local ou central,
deverão despertar para várias prioridades, que permitam efetivamente
materializar em termos
legais a aceitação, a compreensão, a educação e a reabilitação das
crianças e dos
jovens defíáentes. A urgente alteração das tradicionais atitudes
assistenciais tem de
passar por uma política de direitos humanos, que deverá garantir as
mesmas oportunidades educacionais, laborais e de bem-estar a todos
os cidadãos, deficientes ou
no.
É dentro deste contexto que se torna necessário um pensamento
educacionaL
Pensamento esse que obriga as entidades ofciais responsáveis a evitar
decisões incoerentes sem fundamento e sem conhecimento de causa.
A E.E. tem sido um
campo completamente abandonado. Nenhuma universidade se
preocupou, até hoje,
com o problema. A formação de professores só há muito pouco tempo
foi encarada,
independentemente das suas imprecisdes epistemológicas. A
investigação não se
pode promover em serviços sobrecarregados que não satisfazem as
necessidades. A
comunicação interdisciplinar não é coordenada nem estimulada. Os
técnicos competentes não convivem cientifcamente, nem são ouvidos.
O apoio ao setor cooperativo e às associações de pais não se planifica
nem se controla, etc. A situação não é
fácil e implica uma progressiva resolução na base de equipes
multidisciplinares, exatamente porque pensar em conjunto é pensar
melhor.
Este pequeno trabalho de reflexões no é um livro. Trata-se de um
texto que
se justifica no momento em que a Sociedade Portuguesa para o Estudo
Cientffico
da Deficiência Mental lançou mãos ao I Encontro Nacional de Educação
Especial
(E.N.E. ), a realizar durante o Ano Internacional d Criança (1979).
O campo da E.E. é demasiado complexo e extenso para ser abordado
por uma
única pessoa. Para tratar adequadamente deste tema, ninguém é
suficientemente
competente para o fazer. Só através de uma experiência vasta e rica,
de uma investigação pessoal ou grupal persistente e demorada e de
uma compreensgo profunda
dos problemas se pode vir a conhecer, a controlar e a transformar a
E.E. em Portugal.
Conscientes destas limitaçôes, para além de outras, tentamos
elaborar este
estudo de sensibilização de uma forma tanto quanto possível integrada
e unit`icada,
desejo este que vem desde a realização do curso de mestrado em
Ciências de Educação que efetuamos na Universidade americana de
Northwestern.
Para além de ser um levantamento de ptoblemas e de ser uma
caracterização
do universo da E.E., o objetivo do presente estudo é um pequeno
contributo para o
E.N.E.E. Noutros estudos futuros e com outra linguagem mais precisa e
amplificada, procuraremos reexaminar, estudar e investigar sobre: a
natureza do comportamento, a etiologia, a incidência, a prevenção, o
diagnóstíco, o desenvolvimento e a
intervenção nas várias taxonomias da deficiência.
Muitos destes temas nascem de múltiplas ações de formação nas
CERCIS Cooperativas para a Educação e Reeducaçgo de Crianças
Inadaptadas, no IAACF Instituto Antônio Aurélio da Costa Ferreira e no
ISPA - Instituto Superior de
Psicologia Aplicada e de ações de sensibilização desenvolvidas em
vários locais e
estabelecimentos de ensino, nomeadamente no Instituto Universitário
de Évora, na
Escola de Enfermagem de Coimbra, na Câmara Municipal de Estremoz,
no Centro
da Reabilitação de Paralisia Cerebral C. Gulbenkian, no Instituto
Antõnio Feliciano
Castilho, em várias Escolas Primárias, etc. A todos os que tiveram a
paciência de me
ouvir um obrigado especial.
O tempo não nos permitiu submeter o manuscrito à apreciação de
vários espeáalistas e amigos. No entanto, nâo posso deixar de
agradecer a assistência, no campo pediátrico, de minha mulher, M.
Filomena Eusébio da Fonseca, bem como as
sugestôes de alteração de texto de Maria Cecilia C. Mendes. Muitos e
sempre frutuosos diálogos foram travados com Bairrão Ruivo, Isabel
Felgueiras, Vítor Soares,
Helena de Araújo Sequeira, Arquimedes Santos, Ramos Lampreia,
Nélson Mendes e
outros, que muito ajudaram a precisar as reflexões agora
apresentadas.
Nova Oeiras, Janevo 1979
O AUTOR
1

Problemática da deficiênci:

sua prevenção e identificação


Ao longo da História da Humanidade, é freqnente observarmos que
muitas
condições sociais têm sido consideradas como deficientes, refletindo
normalmente
este fato um julgamento social, julgamento que se vai requintando e
sofisticando à
medida que as sociedades se vão desenvolvendo tecnologicamente,
em função de
valores e de atitudes culturais específicas.
Em termos antropológicos, ser "criança", ser "mulher", ser "velho",
etc.,
representou em vários períodos históricos, e representa ainda hoje,
uma condição
de subalternidade de direítos e de funções sociais.
Em algumas sociedades, como sabemos, a criança, a mulher e o velho
são
vítimas de abusos de poder e de superioridade velados. O mesmo se
passa quanto
ao problema da cor da pele, em que o "racismo" se esboça como um
espelho de
ridículos complexos de superioridade e de opressão. Outras e
variadíssimas condições e comportamentos são considerados
"distintos" e "diferentes" da maioria.
Basta referir - e a História é lamentavelmente testemunha disso - os
problemas dos
grupos religiosos e políticos minoritários.
Em muitos aspectos, a problemática da deficiência reflete a
maturidade humana e cultural de uma comunidade. Há implicitamente
uma relatividade çultuml 1 o *
que está na base do julgamento que distingue entre "defcientes" e
"não deficientes". Essa relatividade obscura, ténue, sutil e confusa,
procura, de alguma forma,
"afastar" ou "excluir" os "indesejáveis", cuja presença "ofende",
"perturba" e
"ameaça" a ordem social.
Vejamos: todo o estigma (do grego marca) traduz um eonjunto de
valores e de
atitudes dependentes do envolvimento cultural em que o indivíduo se
encontra.
`As chamadas numéricas remetem para a Bbfiogratia, inserida no
final de cada capftulo.
Através dos tempos, desde Hipócrates até hoje, os estigmas sofreram
alterações semânticas significativas.
Desde a seleção natural, para além da seleção biológica dos
espartanos - que
"eliminavam" as crianças malformadas ou deficientes -, passando pelo
conformismo piedoso do Cristianismo, até a segregação e
marginalizaçâo operadas pelos
"exorcistas" e "esconjuradores" da Idade Média, a perspectiva da
deficiência andou
sempre ligada a crenças sobrenaturais, demoníacas e supersticiosas.
Ainda hoje (e em
Portugal fácil seria indicar alguns fatos) estes aspectos veiculam a
ignorância, ignorância que por sua vez gera atitudes de culpabilização,
compaixão, desespero e indignaçâo.
Nos séculos XVI e XVII a mitologia, o espiritismo e a bruxaria
dominaram e
afetaram a visão da deficiência, de onde decorreram julgamentos
morais, perseguições, encarceramentos, etc. Em suma, meios
claramente demonstrativos de valores
de ordem social e de controle social.
A Revolução Francesa foi, neste sentido, um novo período em que as
atitudes
filosóficas e antropológicas se conjugaram numa perspectiva mais
humanista da deficiência.
É, porém, no século XIX que se iniáam os primeiros estudos científicos
da
deficiência, mais inclinados naturalmente para a defciência mental do
que para outras deficiências. Neste período, são de destacar, pelo seu
interesse global, os trabalhos de: Esquirol, Séguin, Itard, Wundt,
Ireland, Ducan e Millard, Morel, Lombroso,
4
Down, Galton, Tuke, Rush, Dix etc.
As designações de "idiota " e "imbecil" (Esquirol), "cretinismo "
(Ireland),
"demência " (Pinel), ` ánormais " (decreto-lei nó 31.801 de 26-2-41,
que cria o Instituto Antônio Aurélio da Costa Ferreira - IAACF), de `
grandes anormais ineducáveis" (decreto-lei ná 53.401 de 27-12-45,
que reorganiza o mesmo Instituto), de
"atrasado mental" (decreto-lei nó 35.801 de 13-8-46, que cria as
classes especiais),
de ` duros de ouvido " e ` psicopatas " (decreto-lei nó 43.752 de 24-6-
61, que modifica as condições do IAACF), de "crianças diminuidas"
(decreto-lei nó 45.832 de
25-7-64, que atualiza a orgãnica do curso do IAACF), etc., refletem
atitudes diferentes das que levaram às designaçôes de "defzcientes " e
de "inadaptados'; embora
todas elas sejam pouco objetivas e ambíguas, pois
encerramjulgamentos e critérios
sociais de rendimento e de normalidade.
O contexto do defíciente exige a mudança das atitudes, para
posteriormente
se mudarem as ações. Neste sentido, os trabalhos de Binet e SimonS
por um lado
e de Freud 11, por outro, vieram dar uma nova visáo à problemática.
De um lado a
criação do conceito da idade mental; do outro, o nascimento da
psicanálise como
técnica terapêutica, aspectos extremamente importantes pela
contribuição que trouxeram à compreensão e à educação da criança
deficiente.
Nesta sinopse histórica, faltou referir os períodos de pós-guerra (lá e
2á Grandes Guerras), que vieram imprimir novos dados ao problema
com o estudo da neurologia e da patologia do cérebro.
Com a progressiva acumulaçâo de fatos, foi-se construindo uma
teoria, que
hoje íntegra a defectologia humana3 e que envolve naturalmente uma
taxonomia

10
própria cujo objetivo primordial é encontrar um pensamento
educacional para uns
casos e um pensamento preventivo para outros.
Desta base, nasce a necessidade de materializar a tendência mais
atual da integração do deficiente, conferindo-lhe as mesmas condições
de realização e de aprendizagem sócio-cultural, independentemente
das condições, limitações ou dificWdades que o ser humano manifeste.
O direito à igualdade de oportunidades educaciónais é o resWtado de
uma luta
histbrica dos "militantes" dos direitos humanos, luta que implica a
obrigatoriedade
de o Estado garantir gratWtamente unidades de ensino para todas as
crianças (quer
sejam ou não deficientes).
O defiçiente é u_ma pessoa com direitos. ÌExiste, sente, pensa e cria.
Tem uma
límitação corporal ou mental que pode afetar aspectos de
comportamento, aspectos
estes muitas vezes atípicos, uns fortes e adaptativos, outros fracos e
pouco funcionais, que lhe dão um per Jil intra-individuall 6 peculiar.
Possui igualmente discrepâncias no desenvolvimento biopsicossocial,
ao mesmo tempo que aspira a uma relação
de verdade e de autenticidade e não a uma relação de coexistência
conformista e
irresponsável.
" O defciente pode não ver, mas não tem dificuldades em orientar-se
ou em fazer música. Não ouve, mas escreve poesia. Não aprende
matérias escolares, mas pode
ser excepcional numa atividade profissional ou num desporto.
Falhar o "rendimento normal" não pode ser motivo de estigma. Um
espástico
moderado pode ter uma vída "normal". Trabalha, tem interesses sociais
e formas de
ocupação de tempos livres.
Em nenhuma circunstância se pode privar o deficiente de uma
experiência no
real, pois todas as experiências servem para aligeirar a predisposição
ao isolamento.
Cabe aos pais a superação de culpabilidades biológicas e a criação de
experiências de
vlda que garantam a estimWaçâo adequada e a maximização do seu
ajustamento socíal.
As experiências precoces so de grande importância, pois devem
proporcionar
condições de desenvolvímento que valorizem a independência corporal
e a maturidade emocional.
Neste contexto, as atitudes dos outros desempenham um papel
essencial.
Quando nasce uma criança deficiente, a sociedade modifica as suas
condutas: ninguém envia cartões de parabéns, não há prendas; há
choros, emotividades provincianas e culpabilidades hereditárias
inconscientes que "dramatizam" ainda mais a situaçâo. 2 5
Uma das situaçôes mais críticas da vida do deficiente é a entrada na
escola ,
isto é, a ruptura=entre o envolvímento familiar e o envolvimento
socíal. Daí a importância de a entrada na escola ser prevista o mais
cedo possível. Outro período crítico é o da adolescência, período no
qual os valores sociais e as aspirações se chocam
com uma visão da personalidade, de novo abalada e consciencializada
pelo Eu do
deficiente.
Dentro destes estudos sobre a personalidade, os problemas
psicológicos dos
deficierites que mais têm sido investigados envolvem2 5 :

11
1 - "self-concept" (autoconhecimento) - Fatores de aparência corporal
e
pessoal. Problemas de personalidade. Limitação da experiência e da
exploração psicomotora. Introversão da frustraçgo, etc.
2 - Ausência de responsabilidade - Normalmente os outros adotam
uma
atitude de piedade e de compaixão, quando os deficientes o que
desejam e pretendem é assumir funções de responsabilidade, e não
permaneeer numa atmosfera social em que tudo se perdoa, como
reconhecimento de uma inferioridade .
3 - Dependência intersocial - Os outros procuram ajudar, mistificando
e
institucionalizando a dependência, que o deficiente procura, como
experiência de
vida, superar. Em nenhuma àrcunstáncia se deve valorizar a
dependência, ou a noção de "enfermo permanente" (sick-rnle). A
independência a todos os níveis é um
objetivo imprescindível ao desenvolvimento da personalidade do
deficiente.
4 - Ansiedade, depressúo, intolerância, fantasia, fuga, egocentrismo,
crises
de identificação, etc., são traços que variam de deficiente para
deficiente, conforme
o meio social. A sensação de "inadequado", de "inútil", de "fraco", é
inevitável em
períodos críticos; só que deve ser minimizada por um envolvimento
afetivo e sócioeducacional coerente e realista.
As convicções sociais e as crenças que gravitam à volta da noção de
normalidade ideall 2 têm de ser amplamente debatidas, pois geram
confusão e adiam a resolução dos problema. Temos, cada vez mais, de
reconhecer que o "normal" em saúde ou em condutas sociais é um
luxo biológieo ou social. As explicaçóes dos fatos
são multifatoriais, não se deduzem de causas exclusivistas ou
encantatórias. O conceito de "normalidade" não pode reduzir-se a um
sentido biológico ; ele tem de incluir um conceito de realização no
sentido social. O "normal" é uma moral, isto é,
envolve valores éticos que são inerentes a padrôes culturais
diversificados.
Durkheim, M. Mead, R. Benedict e tantos outros estudiosos dos -upos
humanos demonstraram-nos que o que numa sociedade é "normal"
pode ser considerado
"anormal" noutra. A. Freud 12 provou que há uma "normalidade" na
"anormalidade", e vice-versa.
As relaçôes sgo recíprocas e dialéticas; daí a necessidade de uma
atitude mais
aberta em relação aos defcientes - há uma limitação nalguns
aspectos do comportamento, mas há, em eontrapartida, condutas de
ajustamento e niveis funcionais
adaptativos. Como conseqnência; é urgente pôr de lado os estigmas,
as etiquetas, os
rótulos, que podem classificar comportamentos mas nunca pessoas.
Por outro lado,
as culpabílizaçôes hereditárias, as puniçôes simbólicas, a caridade e a
piedade não
têm sentido numa sociedade mais justa e organizada.
A abordagem da problemática da defieiência deve e tem de ser mais
positiva
em termos de direitos humanos. A intenção de ajudar ou de rejeitar
tem um papel
fundamental na socialização do indivfduo. Daí que a opção seja não
alimentar dícotomias ("normal-"anormal"; "deficiente" "não-deficiente";
"desviante" "não-desviante"; "típico"-"atípico"), mas superá-las,
avançando com a alternativa das necessidades individuais, ou melhor,
das necessidades educacionais especiaisb .
Do mesmo modo, podemos dissecar os critérios de adaptaÇão ideal,
na medida
em que o termo adaptação é visto como corolário das relações
recíprocas indivíduo
12
meio. É evidente gue o ser humano coexiste em dois tipos de meios
simultâneos e
mutuamente iniluenciáveis e interdependentes: o gesicg e o . No
primeiro,
o indivíduo relaciona-se em termos de assimaçâo e de acomodaão
sensório e perceptivo-motora; no segundo, a relação passa pela
apropriação sócio-histórica da linguagem própria da espécie humana e
concretiza-se em termos de assimr7ação e e
acomodaão simlrólica (receptiva, integrativa e expressiva).
< Chama-se inadaptado ao indivíduo cujas atitudes e
comportamentos ficam à
margem do seu erìvolvimnto. Os comportamentos (condutas-ações)
são analisados
prioritariamente em termos sociais. Quando se pensa em adaptação,
pensa-se mais
em "normas" e "valores" sociais, e não em termos de independência
funcional. Nas
sociedades industrializadas, por exemplo, dá-se mais importância aos
aspectos simbólicos e verbais que aos aspectos perceptivo-motores e
não verbais. As normas de
adaptação são fvcadas em funçâo de critérios partieulares de
rendimento e eficácia.
O adulto fixa as normas e facilita ou não o acesso a elas. Quándo a
criança
tem dificul_dáde em auyulgamento
sobre ela e nunca sobre si própt.p áotedo uma relaçã:.e poder, unt:
certo tipo
de colonizaçâo e um certo esquema de soufoxmídade.
A inadaptação é agravada pelas reações da criança a um meio que
oprime todos'.
A inadaptação é normalmente o resultado de uma constelação de
fatores mesológicos, dos quais a grande dose de responsabilidade
cabe ao adulto, mas que se
refletem, como é óbvio, na criança, independentemente de esta "ser o
pai do Homem " no sentido antropológico mais global.
Com o advento do desenvolvimento tecnológico, sem o
correspondente desenvolvimento humano, a inadaptação surge com
maior evidência, consubstanciando
um meeanismo de discriminação social e cultural.
É interessante encarar agora a noção de inadaptação nos diferentes
sistemas
sócio-econômicos, dado que interferem com aspectos sócio-culturais
determinados.
De uma maneira resumida, vejamos a díferença de conceitos de
inadaptaçâo
na Europa, nos Estados Unidos e na Uniâo Soviética.
Na Europa, as noções de inadaptação têm estado ligadas a duas
perspectivas
psicológicas de grande prestígio. De um lado, a obra de Zazzo4o, do
outro, a de B.
Inhelder, continuadores respectivamente de outros dois grandes
vultos, Wallon35 e
Pia_get2 2 . Zazzo introduz a noÇão de heterocronia, demonstrando
que o deficiente
mental se desenvolve em biorritmos diferentes nos vários processos
psicobiológicos
do comportamento. B. Inhelder4 o desenvolveu a noção de oscilação e
de viscosidade, provando que o deficiente mental passa
incontrolavelmente de um esquema conceptual a outro.
É claro que estas dimensões origínais e resultantes de longos anos de
investigação psicológica não esgotam a problemática da inadaptação,
dado que temos de
considerar também os dados da investigaçâo médica, em que se
destacam os trabalhos europeus de Bascou e de Heuyer.
Nos Estados Unidos, a ótica mais explorada foi a das escalas de
desenvolvimento, relacionando idade mental com idade cronológica.
Os behavioristas, desde

13
Watson3 ' a 52 6 . introduzem as relaçôes corpo-espírito (body and
mind) em
níveis criticáveis - ao ponto de o homem ser apreciado como resultado
do condicionamento das "forças" do envolvimento, não passando de
uma máquina de estímulo-resposta.
Thorndike33, Tolman34, Guthrie, Hulll q e outros vão desenvolvendo
as suas
teorias de aprendizagem, baseadas nas tentativas e erros, na
repetiçâo e reforço, na
associação dinâmica estímulo-resposta, na formaçâo do hábito e de
inibiçôes reativas, no condicionamento operante, etc.
Strauss31, Lehtinen e Kephart3o avançam com os primeiros estudos
de crianças com lesões mínimas no cérebro e abrem espaço às
concepções do "perceptually
handicapped child" (criança com deficiências perceptivas) e do "slow
learner"' 5
(criança que aprende lentamente).
Zigler41 distingue-se pelos seus estudos sobre o deficiente mental,
focando as
seguintes características: extroversão da atenção, nível de aspiração
baixo, conflito
relacional, síndrome do insucesso e deficiência neurológica específica.
Spitz2 9 e Ellisl o por modelos psicanalíticos e dinâmicos, estabelecem
os prérequisitos da ontogênese. Doll9 equaciona evolutivamente a
hierarquia da experiência e da adaptação social.
Cronbach' e Grossmani 3 revêem os testes de inteligência desde
Binet-SimonS
a Terman3 2 e Wechsler3 na base de estudos interdisciplinares,
analisando os prós
e os contras de classificar indivíduos por quocientes de inteligência.
Demonstram
ainda que a controvérsia reside mais na generalidade do que na
especifcidade dos
testes, e dessa controvérsia, no entanto, nada tem resultado para o
aperfeiçoamento
dos mesmos. Os testes, porém, têm revelado através dos últimos 60
anos incontestável utilidade científca, embora arrastem usos e abusos
psicossociais. A crítica feita
não é a favor nem contra os testes, mas, fundamentalmente, dirige-se
à maneira como os resultados têm sido usados. A aplicação dos testes,
que é necessária para o
diagnóstico e para perspectivar uma intervenção pedagógica coerente
e conseqnente ,
deve seguir a filosofia de Binet, isto é, o teste surge como instrumento
psicopedagógico, para, a partir dele, se construírem estratégias de
educabilidade da inteligência,
preparando o indivíduo para a sua integração social plena.
Na União Soviética, para além dos trabalhos de Pavlov
sobre condicionamento
clássico e de Sechenovz 4 sobre a atenção nos deficientes mentais, a
obra mais conhecida no Ocidente é a de Luria' ' .
Este neuropsicólogo de renome mundial tem uma perspectiva
psicossomática
da deficiência mental. Segundo ele, estão sempre em jogo processos
neurológicos
(transdução, deseodificação e eodificação) e processos psicológicos
(atenção, percepção, memória, motivação, etc.).
O cérebro, em Lurial s é estudado como um conjunto funcional capaz
de receber, armazenar, programar, planificar, decidir, realizar e auto-
regular funções distribuídas por três níveis (blocos) de organização. O
primeiro, constando da medula
e do tronco cerebral, é responsável pela atenção, vigilãncia, regulaçâo
e manutenção
da homeostasia. O segundo, composto pelos hemisférios cerebrais nos
lóbulos occipital (integração visual), temporal (integração auditiva) e
parietal (integração tatilo
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cinestésica), é responsável pela análise-síntese, codificaçâo,
armazenamento, registro, organização, combinação e associação
intersensorial. Por Wtimo, o terceiro bloco, o lóbulo frontal, é
responsável pela formação de intenções e programas de conduta,
como a linguagem e o movimento ideacional, para além de assegurar
com o
tronco cerebral a auto-regulação (feedback), necessária para as
permanentes adaptações que o envolvimento exige. Ver figura I .
É no cérebro, que resultou da experiência e do trabalho do Homem em
termos antropológicos, que a aprendizagem se opera, implicando
inúmeros processos
que no deficiente se encontram lentificados e rígidos e, nalguns easos,
pouco con
trolados e inibidos. É neste contexto que Lurial ' introduz a noção de
inércia
no estudo do deficiente mental. Inércia que não permite a regulação
dos processos
de excitação-inibição operados no sistema nervoso central. Processos
esses responsáveis pela atenção seletiva, pela discriminaçâo e
identificação pereeptivas e pela
retenção de curto ou longo termo, condições indispensáveis à práxis,
meio de relação social com o envolvimento pelo qual se edifica a
consciência humana e se edificou toda a Civilização.
Como vimos, o conceito de adaptação ideal (ou perfeita) é muito vasto
e ambíguo e engloba inúmeras perspectivas, normalmente
determinadas por contextos
sócio-culturais relativos e específicos de um dado sistema sócio-
econômico. A adaptação perfeita é possível somente nas sociedades
de insetos, onde cada indivíduo
está adaptado, isto é, está "programado" para realizar uma tarefa
determinada . .
Por natureza, a inadaptação é uma condição de aprendizagem do
deficiente e
do não-deficiente. A noção de inadaptado parece confusa e muito
vaga, serve para
tudo e para nada e nâo esclarece sobre as condições funcionais
inerentes ao indivíduo deficiente ou não. Inadaptados somos todos
nós, uns mais do que outros, em
variadíssimas situações de aprendizagem e de vida. A procura da
adaptação é no
fundo a condição de aprendizagem. Por isso, não podemos confundir
crianças inadaptadas com crianças deficíentes. A criança inadaptada
pode nâo ser deficiente, e,
como A. Freud explicou, podemos ter crianças deficientes
perfeitamente adaptadas.
A criança deficiente envolve um aspecto biomédico. A criança
inadaptada reflete
um aspecto social. Uma criança deficiente visual não é igual em
termos de adaptaçao a outra criança deficiente visual; uma deficiência
pode ser congênita, outra
adquirida. Daí a necessidade de não confundir criança inadaptada com
criança defieiente, pois podem dar-se todas as combinações possíveis,
que nâo permitem a compreensão da deficiência nem a urgente
precisâo terminológica, visto dependerem de
muitas condições e situações subculturais.
No cnmpo médico2 a deficiência é definida em vários fatores.
Nos fatores pré-natais2 n temos: alterações cromossômicas, quer
auto-sõmicas
(síndromes de Patau, Edwards, Down, etc.), quer genossômicas
(Klinfelter, Turner,
etc.), que contêm alterações da informaçâo genética; erros natos do
metabolismo,
como a fenilcetonúria e a galactosemia; as hemoglobinopatias; as
embriopatias; as
fetopatias; mães diabéticas ou com doenças crõnicas; toxemia
gravídica;incompatibilidade Rh, malnutriçâo; exposiçâo a drogas,
produtos químicos ou radiações,
etc., que podem igualmente estar na base de malformaçôes
congênitas. É notório

16
que estes fatores envolvem duas fases: a pré-concepcional e a pós-
concepcional, esta
naturalmente centrada na criação do melhor envolvimento intra-
uterino possível,
dado que agentes infecciosos podem causar lesões no feto,
nomeadamente rubéola,
síflis, toxoplasmose, doença de inclusão citomegália, herpes,
tuberculose, etc.
Os fatores perinatais2 s mais relacionados com as condições da
deficiência são
os do trabalho de parto e de proteção fetal, que decorrem num período
de grande
vulnerabilidade. As lesões que podem ocorrer durante o trabalho de
parto estão freqiientemente associadas a deficiências graves e
irreversíveis. Neste período, poderão
observar-se, durante e após o nascimento, os seguintes problemas:
prematuridade,
placentopatias, apresentação do feto, traumatismos de parto,
hemorragias, ruptura
precoce das membranas, presença de "mecônio", anestesia que pode
interferir com o
sistema nervoso do recém-nascido, nascimentos múltiplos, etc. Outras
condições do
próprio recém-nascido podem manifestar-se por técnicas de
manipulaçâo como o
"fórceps" (podendo causar pressões excessivas na face, nos nervos
exteriores ao
crânio, no cérebro e no tronco cerebral) e a intervenção por cesariana.
Outros aspectos têm a ver com os níveis de adaptação à vida extra-
uterina,
podendo ser observados clinicamente pelo Indice de Apgarz (cor da
pele, freqnência
cardíaca, reflexos (reação aos estímulos), tônus muscular e respiração)
aos 60 segundos e aos cínco mínutos após o nascimento. Todos os
cinco itens têm uma classificação mínimade 0 e máxima de 2,
originando um resultado total de 10. Segundo vários estudos
longitudinais, os resultados inferiores a 7 podem causar problemas, e
os inferiores a 5 estão normalmente associados a lesões e disfunções
neurológicas, situação de alto risco para possíveis condições de
deficiência.
Os fatores neonatais2 s mais sígnificativos que podem ocorrer depois
do nascimento, causando eventuais alterações no neonato, são: idade
do feto, tamanho do
feto, efeítos de doenças maternas, anoxia, doença da membrana de
hialina, incompatibilidade Rh, infecções, doenças metabólicas,
hemorragias, convulsões, etc. Todos estes fatores de risco pré-natais e
neonatais podem causar desde a lesão mínima
do cérebro ou disfunção mínima do cérebro até à paralisia cerebral.
Todos estes aspectos exigem medidas de controle e prevenção que
são do foro
médico, sendo de fato bastante mais complexos do que sumariamente
aqui indic3mos. É evidente que estes problemas podem ser resolvidos
com medidas sanitárias
preventivas e com proteção pré-natal adequada, como direito humano
inalienável
que em muito pode minimizar as condições que geram a deficiência.
Entra aqui em
consideração o desenvolvimento de processos de identificação,
rastreio e despístagem precoce de condíções de deficiência, através de
escalas de desenvolvimento,
para além da verificação e manutenção de determinadas condições:
nutrição adequada antes, durante e depois da gestação, aboliçâo de
drogas, controle médico, supervisão e cuidados ao recém-nascido, etc.
Todos estes aspectos implicam o acesso de
todos os cidadãos aos cuidados da medicina, pois estão em jogo os
seus potenciais
humanos.
Restam os fatores pós-natais2 s para termos uma visão etiológica
global. É
importante esclarecer que a divisão de fatores que estabelecemos
atrás é meramente
17
artificial, dado que muitas condições se manifestam através de mais
de um período
do desenvolvimento, quer sja o intra-uterino, quer seja o extra-uterino.
Com os fatores pós-natais entramos no desenvolvimento
biopsicossoctal da
criança3 5 que em muito depende do meio e fundamentalmente do
adulto socializado, proporcionando condições de afeto, de segurança,
de estimulação e de aprendizagem que possam, desde o nascimento,
equacionar um desenvolvimento harmonioso não só no plano
emocional como no psicomotor, no lingiiístico e no cognitivo.
A identi ica ão recoc de problemas de desenvolvimento deve constituir
uma preocupação dos investigadores. Estudos pluridisciplinares e
epidemiológicos
de crianas em risco5 eomo o que está a ser realizado pelo Centro de
Observação e
Orientação Médico-Pedagógico (COOMP)4 devem ser encorajados a
nível nacional,
a fim de prever as medidas de desenvolvimento demográfico a aplicar
num país
ainda muito pouco estudado, quer social, quer culturalmente, e que,
obviamente,
estão na base da prevenção das condições de deficiência.
A detecção precoce de problemas psicomotores e de linguagem deve
ser uma
preocupação do exame pediátrico trivial. Não basta ver o "corpo", é
preciso identificar sinais que possam comprometer o desenvolvimento
do "espírito". Esta dicotomia e este dualismo subsistem. O "corpo" não
pode continuar a ser realidade palpável e o "psíquico" realidade não
palpável. As escalas de desenvolvimento devem ser
encaradas com muito cuidado, quer na formação de médicos, e
principalmente pediatras, quer na formação de psicólogos e
educadores ou outro pessoal relacionado
com a proteção da infância (enfermeiras, assistentes sociais,
terapeutas, etc.). Assim,
e por meio de estudos longitudinais3 5 podem-se detectar problemas
quer visomotores e auditivo-verbais, quer sócio-emocionais. Quanto
mais cedo for detectado, mais
precocemente se podem aplicar Programas de Estimulação Precoce ou
Programas de
Aprendizagem ou Reabilitação Individualizada3 6 para crianças
deficientes, maximizando a sua normalização e otimizando as suas
potencialidades funcionais r'
Cuidados especiais devem ser seguidos com a prevenção de acidentes
e traumas, com as vacinações de poliomielite e outras, com o controle
rápido de antibióticos no caso de meningite e de febre reumática, etc.
Como se sabe, o ser humano é extremamente sensível aos efeitos do
meio durante o período da primeira infância, em que ocorrem as
mudanças de crescimento
mais extraordinárias. Q cére_ bro, por exemplo, cresce 90% desde o
nascimento até
aos cinco anos; daí o papel crucial que desempenha o
desenvolvimento que decorre
neste período. A estimulação, aqui, representa o alimento do
organismo, quer no
plano afetivo e cognitivo, quer ainda no plano nutricional. Todas as
privações nestas
áreas são responsáveis por lentidão e anomalias de desenvolvimento
(aspecto qualitatívo) e de crescimento (aspecto quantitatívo). É nos
primeiros anos que a mielinização se opera, as redes neuronais
crescem e se estruturam, os processos de informação visual, auditiva e
tatilocinestésica se organizam por níveis de atençâo, seleção,
discriminação, identifcação, seqnencialização, retenção, e os
proeessos de comunicação verbal se produzem através de funções de
formulação, planificação e controle
de condutas psicomotoras e psicolingnísticas.

18
Trata-se de um período tão significativo do desenvolvimento, tanto
nos defcientes como nos náo-deficientes, que urge uma solução sócio-
educacional imediata.
Daqui nasce a necessidade de se orientar e controlar os infantários, as
creches e os
jard cia - que devem ser dirigidos por pessoas competentes, formadas
em
escolas superiores e com dimensão multidisciplinar, de forma que os
currículos não
se encontrem dependentes de correntes pedagógicas ou psicológicas
exclusivistas. É
necessário dar ao educador de infância e ao professor de Educação
Especial (principalmente aos responsáveis por serviços domiciliários e
itinerantes) uma visão biomédica, psicobiológica e psicossocial do
desenvolvimento e da aprendizagem, a fim de
sistematizarem o envolvimento educacíonal básico.
A explosão e a aplicação dos conhecimentos médicos e
psicopedagógicos devem constituir os instrumentos básicos e
controladores da prevenção das condições
da defciência. Muito se tem feito na medicina, eliminando muitas
doenças. Meios
sofisticados são empregados por pediatras e obstetras na identifcação
de sinais causadores da defciência. Os "engenheiros genéticos"
penetram cada vez mais no conhecimento do código da herança
biológica. Pela amniocentese prevêem-se erros
cromossômicos. Por investigação, as causas das condições da
deficiência começam a
ser previsíveis, etc.
Muito se fez, mas muito há a fazer, nomeadamente no apoio que o
Estado
deve dar à investigação dos fatores defectológicos desconhecidos e na
aplicação das
soluções médicas conhecidas a todos os cidadãos em geral,
independentemente das
suas condições econômicas, sociais e culturais.
Estamos muito longe de atingir estas medidas preventivas, hoje de
rotina em
muitos países, e que se situam fundamentalmente no campo da
Saúde.
O reflexo deste quadro complica-se na Educação Especial. A Educação
Especial começa onde a Medicina acabal 6 . Por exemplo,
"diagnostícar" e "receitar óculos" a uma criança com perturbações
visuais, ou receitar uma ajuda acústica a uma
criança com perturbações auditvas, é um aspecto que diz respeito aos
médicos. Mas
"ensinar" uma criança a usar a sua visão e a sua audição residuais,
para que ela
aprenda por meio de compensações sensoriais, é uma função da
Eduçção Especial.
Se uma defciência auditiva pode ser compensada, esse problema
diz respeito à medicina. Se não pode ser compensada, então a sua
condição deve ser otimizada, diminuindo os seus efeitos através de
ajudas acústicas, treino auditivo e oralidade ("speeeh reading"). Este é,
por conseqnência, um problema que diz respeito à educação.
A Educação Especial em Portugal é subdesenvolvida, reflete a situação
concreta dos nossos índices sanitários e sócio-culturais, sócio-
econômicos e tecnológicos,
marcados por taxas de mortalidade infantil chocantes, para além de
condições de
desenvolvimento insuficientes, com poucas estruturas de apoio às
familias dos grupos mais desfavorecidos e que, em percentagem,
acusam, como não podia deixar
de ser, maior número de deficientes.
O aconselhamento genético e o planejamento familiar2 ' sâo outras
medidas a
adotar que só um serviço de saúde justo e organizado pode começar a
garantir. A
estreita ligação dos serviços de saúde com os serviços de Educação é
indispensável.
19
Sem essa relação recíproca, a Educação Especial refletirá sempre um
mosaico discrepante e humilhante, que nos coloca muito abaixo dos
países europeus.
Os orçamentos para a Educação Especial devem aumentar e ser
canalizados
para a aplicação dos conhecimentos médicos e para a investigação
interdiseiplinar.
Outros orçamentos devem canalizar-se para equipar o país com
escolas e centros de
recursos educacionais a serem construídos perto das escolas normais
já existentes.
Em Portugal nâo há dados muito exatos, o diagnóstico está ainda por
fazer,
mas o número de deficientes é calculado em 1.000.000 (crianças e
jovens), segundo
dados da Organização Mundial de Saúde. Números internacionais
avançam para uma
cifra - "em cada 100 cidadãos, 1 é defciente"6. Dados reeentes da
investigação
médica avançam que este número tende a baixar para as condições
defectológicas
severas e profundas, mas tende a aumentar para as ligeiras,
exatamente porque se
desenvolvem melhores meios de as controlar nos períodos críticos
(íncubadora,
controle de índices fisiológicos básicos, etc.).
A variável "classe social"4 o está muito associada com os estudos
epidemiológicos da defectologia, da defciência mental, das difculdades
de aprendizagem, do
abandono da escola, das desordens psiquiátricas, da delinqriência, do
analfabetismo
funcional, etc.
Bridges e Coler3 demonstraram que a ocupação do pai, o salário
familiar e o
grau de instrução dos pais pesam significativamente na etiologia da
deficiência em
geral.
Zazzo provou que o nível médio da inteligência se eleva com o
estatuto sbcioeconômico, o que explica o "recrutamento" da maioria
dos deficientes nos meios
sociais mais desfavorecidos. Apgar e Beck encontraram a maior
distribuição da deficiência mental moderada nas familias
desfavorécidas e "poucos instruídas" e a
deficiência mental severa mais equilibradamente distríbuída por todos
os grupos
sociais.
A existência de populaçôes abrangidas por condições defectológicas é
normalmente dependente das condições sócio-econômicas e sócio-
familiares, onde o meio
acusa o seú pendor discriminatório. Imensosfatores sociais influenciam
as condições
defectológicas, como por exemplo 23,27,40: estrutura sócío-política,
dogmas sociais, sistema de castas, níveis de aspiração, expectativas,
subculturas, valores e seu
conhecimento, pobreza voluntária, regiões incomunicáveis, habitações
super-habitadas e exíguas, desemprego, insegurança econômica
crônica, familias desintegradas e
instáveis, ostracismo social, analfabetismo, carência de oportunidades
culturais, níveis de higiene pessoal-social, qualidade proteica e calórica
dos hábitos alimentares,
etc.
Não podemos continuar a admitir condições indesejáveis de vida. Com
um
melhor envolvimento, o número de casos de deficiência diminuirá
substancialmente.
Esta é predominantemente a grande medida preventiva. Não se pode
contínuar a alimentar a idéia de que os "pobres" são "pobres" porque o
seu potencial biológico
também o é. Esta noção de "Darwínismo social" 19 que subsiste na
mente de muitos responsáveis por decisões político-sociaís, tem de ser
combatida através de medidas preventivas adequadas para uma
sociedade mais justa e equílibrada.

20
As grandes medidas preventivas da deficiência transcendem a área da
Educa ção e, em certa medida, a própria área da Saúde3 6 porque são
dependentes de re soluções políticas e sociais fundamentais. De
qualquer forma, a prevenção é sempre
a primeira medida, pois não só é a mais efciente como permite a
redução dos efei tos secundários. Depois da redução dos efeitos,
minimizando-os no plano da organi cidade ao mais baixo nível, há que
desenvolver ações precoces de normalização da
deficiência por aprendizagem e por educação o que, em si, implica a
criação de
estruturas de intervenção sócio-educacionais, dado que é cada vez
mais reconhecida
a importância das experiências de aprendizagem nas mais baixas
idades, cuja efciên cia é diretamente proporcional à precocidade das
mesmas.
q Ç P s9 P
É óbvió jue a interen ão recoce não ode realizar-se sem uma identifica
Ção precoce . Uma é dependente da outra, daí a importância da
identifcaçâo,
que permitirá evitar as conseqiiências de vária ordem. A identificação
precoce não
pode ser casual e assistemática; antes pelo contrário, a identificação
deve ser cientí fica e visa aligeirar seqnelas que repercutem no
desenvolvimento da personalidade
da criança deficiente ou não defciente.
Em alguns casos a identifcação precoce é óbvia; porém, noutros
casos, só por
exclusão e análise rigorosa de sinais se pode formular um diagnóstico.
Aqui a inves tigação tem o seu papel, pois a banalização ou a
subvalorização de sinais de desen volvimento pode adiar a redução
dos efeitos ou aumentá-los e complicá-los. A iden tifcàção precoce
grosseira é um perigo. Quanto mais estudos e investigações práti cas
se encorajarem através de um apoio concreto em termos
interdisciplinares, tanto
mais facilmente se distinguem e se diferenciam sinais, podendo-se, a
partir daí, de terminar a natureza dos problemas?o. Não haverá
progresso na Educação Especial
sem diagnóstico e sem identificação precoce; caso contrário,
"escapam" sinais e pro blemas de complexa resolução mais tarde.
Identifcar é urgente e necessário39. Por várias razões:
I - Orienta os pais;
2 - Especifica o tipo de intervenção educacional precoce ;
3 - Diminui os graus de inadaptação resultantes das condições
defectológicas;
4- Sistematiza a observância de fatores de risco,
nomeadamente no que
P :P
res eita aos sinais menos óbvios roblemas auditivos, visuais,
lingiiísticos, motores,
psicomotores, etc. ;
5 - Acelera o processo das recomendações;
6 - Combate as atitudes de negligência dos pais e dos educadores;
7 - Impede que os efeitos arbitrários do anonimato do sistema
educacional
repercutam no todo da criança;
8 - Constitui um meio de prevenção ;
9 = Encoraja o desenvolvimento de processos pedagógicos e a
formação interdisciplinar dos vários intervenientes (médico, psicólogo,
enfermeiras, assistentes
sociais, terapeutas, educadores e principalmente professores);
10 - Minimiza os efeitos cumulativos de problemas de
desenvolvimento da
criança

21
A identificação precoce é uma alternativa ímprescindível quando a
prevenção
pré-, peri-, neo- e pós-natal nâo se observou, pois só dessa forma se
suprimem condíções que podem agravar o desenvolvimento
biopsicossocial da criança. Trata-se de
uma medida de redução de custos, que tendem a aumentar em espiral
na Educaçâo
Especial. Para um país como o nosso, de fracos recursos financeiros,
estas duas medídas de intervenção (primeiro a prevenção e depois a
identificação precoces) são
meios adequados para reduzir os efeitos cumulativos da deficiência,
que põem em
jogo o potencial humano. Podem ainda garantir, por essa razão, um
controle de desenvolvimento da criança portuguesa, através de
estudos do seu crescimento, da sua
nutrição, da sua maturação social, do seu desenvolvimento lingriístico
e psicomotor,
que tardam ainda entre nós.
Despistar (screening) e detectar crianças que não apresentam índices
de desenvolvímento harmonioso permite a previsão das necessidades
de intervençâo, diminuindo os efeitos secundáríos, quer no aspecto
socíal e nâo verbal, quer no aspecto
educacional e verbal.zo
A identificação precoce deve ser uma rotina nos hospitais, nos centros
de saúde, nos infantáríos, nas creches, nos jardins de infância e nas
escolas pré-primárias,
mormente nas áreas da visão (discriminação, identificação, figura-
fundo, constância
da forma, seqnencialização, visomotricidade, posição e relação
espacial, etc.), da
audição (discríminação, identificaçâo, figura-fundo, síntese e
completamento, memóría, associação, etc.), da psiComotricidade
(controle tônico-postural, equilibração, lateralidade, direcionalidade,
noção do corpo, estruturação espacial e rítmica,
praxias globais e finas, etc.), da fala (armazenamento da informação,
compreensão,
integraçâo, formulação de idéias, imítação de palavras e frases,
vocabulário, silabação, articulação, etc.), da sociabilizaçâo (atividade
lúdica, participaçâo e aceitação
socíal, organização e orientação, atenção seletiva, responsabilidade,
realização de
tarefas, etc.). Os pedíatras devem dedicar especial atenção à
linguagem, na medida
em que ela repercute no desenvolvimento cognitivo da criançaz o .
A identificação precoce deve ser periódica e planificada, adotando a
observação nas idades criticas. Um ano e meio, dois anos, para a
motricidade e o início da
linguagem; quatro, quatro anos e meio, para o domínio sintátíco e as
aquisições psicomotoras elementares.
Todas estas medidas devem ser dimensionadas com uma ampla
informaçâo
nos meios de comunicação SOCllllB ,3 6 . Filmes didáticos, diaporamas,
programas de
rádio e de televisão, colunas em jornais diários e semanários,
conferências ao nível
de centros recreativos e culturais, escolas de pais, cursos de
sensibilização do ensino
secundário, etc., devem integrar uma ampla ação de formação e de
informação ao
público em geral. Tal açâo de ínformação será insuficiente se não se
criar uma atitude anti-segregacionista, facilitando o convívio e o
contato com os defícientes.
A noção de defciente nâo é objetiva, mas revela antes um complexo
de superioridade que se multiplica em sociedades ignorantes. É
preciso combater a ignorância e os preconceitos neste e noutros
planos, estando aqui a importãncia da informação no campo da
deficiência. O comportamento desviante pode ser melhor
compreendido quando se reconhecem as causas. xistem atitudes de
medo, receio, rejeiçâo,

22
negação, etc., por carências de informação e de contato com os
deficientes. Só um
crescimento cultural global da sociedade, alicerçado numa informação
e num esclarecimento contínuos, pode perspectivar uma visão mais
ampla de prevenção da deficiência.

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23
FATORES
PERINATAIS
Z
AT AIS P
Eg P N A
F ATOR R Desenvolvimento
período período T neuro
O, zigoto4ó cromossomas embrionário fetal O e sensório-motót
r
Fatores Alterações ) Fetopatias
pós-conoepcionais ctomossômicas t t'ÁTORES NEONATAIS
' . éi
Embriopatias . Hemorragia cerebral
. Traumatismo
. Convulsões
Sépsis`
. Prematuridade
Fatores . Apresentação
Pré-concepcionais . Toxemia anormal
. Anemia . Incompatibilldade Rh . Doenças metabóllcas Infecções da
mãe . Hemorragias
. Tabagismo . Drogas ,- " oxia
. Doenças hereditárias
e famillares ' Parto distócico
. Idade da mãe . Anomatias
congznitas ;
. Malnutrição . Malnutrição
. Diabetes . Meningites
. Encefalltes
. Endocrinopatias
. Doenças metabóficas
(fenilcetonúria, etc.)
. Traumatismos do
SNC (lesão ou
disfunção mínima
do cérebro)

)álogo tônico
m e-filho
Estdo impulsivo
e tôricomocional
(Wallon)
Reflexos e hábitos
motores (Piaget)
Des. postural
(Sheridan)
DESENVOLVIMENTO INTRA-UTERINO
24
socialização
, aprendiza8em

Desenvolvimento Desenvolvimento
da perceptivo e Desenvolvimento
finguagem psicomotor oognitivo

12

. Experiência . Função postural . Período sensório multissensorial


(Wallon). -motor (esquema
(visão - motricida- . Desenvolvimento da de ação)
de; audição - lingua- locomoção e da . Perfodo prépera gem) preensão
cional (função sim . Linguagem interior . Imitação e jogo bófica -
interiori . Linguagem não verbal . Ecopraxias zação da imitação)
. Compreensão auditiva . Construção da ima- . Período operacional
. Inaiismo gem do corpo (reversibifidade . Ecolalias
(locaçãoorientação) nservação - estru . Segue direções . Lateralidade
tura gnóstica e lógica
(linguagem receptiva) . Direcionafidade da ação)
. Gestos evocativos . Estruturação espácio- . Período formal
: Egocentrismo temporal (operações dentro de
. Holofrase . Praxia global operações - resolução
. Competência fingnis- . Praxia fina hipotéticodedutiva)
tica (Chomsky) . Dextrafidade . Julgamento de experiên . Compreende
palavras . Visuomotricidade cias e verificação de
. volução dos nomes . Desenvolvimento observações (Piaget)
aos verbos (Berry) perceptivo . Pensamento antecipa . Identificação de
objetos tatilcinestésico tivo e reflexivo
e sua nomeação (discriminação, . Anáfise e sfntese
. Regulações emocionais identificação, sistemáticas
e afetivas elementares orientação, etc.) . Domínio da linguagem
. Corpo percebido (Ajuria- . Desenvolvimento escrita
e da Hnguagem
guerra) perceptivo auditivo quantitativa
. Linguagem falada e visual (discrimina- . Operações. Produtos.
ção, identificação, Conteúdos (Guilford)
figura-fundo, Gestalt, . Desenvolvimento e
memória, seqiienciali- maturidade social
zação,integràção,
etc.)
DESENVOLVIMENTO BIOPSICOSSOCIAL
II
25
30 - STRAUSS, A. e KEPHART, N. Psychopathology and education of
brain - injured child.
Vol. II. Nova Iorque, Ed. Grune and Stratton,1972.
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26
2

Dezião e classificação

da deficiência

A definição da "criança deficiente" aceita internacionalmente, e qué foi


aprovada pelo Council of Exceptional Children (CEC)4 no I Congresso
Mundial (Stirling - 1978) sobre o Futuro da Educação Especial, é a
seguinte: `Á criança deficiente é a criança que se desvia da média ou
da criança normal em (1) caracteristicas mentais; (2) aptidões
sensoriais; (3) caracteristicas neuromusculares e corporais;
(4) comportamento emocional e social; (5) aptidões de comunicaçãoe
(6) múltiplas
deficiências; até ao ponto de justificar e requerer a modificação das
práticas educa- I
cionais ou a criaçâo de serviços de educação especial no sentido de
desenvolver ao
máximo as suas capacidades. "12
A idéia, aqui, está impregnada de umpensamento educacional2 2 que
materializa um dos direitos humanos inalienáveis: É neste
enquadramento que se coloca a
igualdade de oportunidades educacionais para todos, isto é,
deficientes e não-deficienTes.
Neste contexto, e para evitar o caos semãntico, é urgente avançar
com algumas definições e com um critério tanto quanto possível
baseado em fatos.
Segundo a confirmaçâo da investigação e da prática clínica, a criança
com paralisia cerebral apresenta essencialmente um problema de
envolvimento neurom
tor. Do mesmo modo, a deficiência mental apresenta uma inferioridade
intelectual
generalizada como denominador comum. Por outro lado, na criança
deficiente visual ou deficiente auditiva, o problema situa-se ao nível da
acuidade sensorial. No
que respeita à criança emocionalmente perturbada, esta apresenta um
desajustamento psicológico como característica comportamental
predominante 16 .
A partir deste âmbito, teremos de estruturar um critério para
distinguir crian- i
ças deficientes e não deficientes e crianças com ou sem dificuldades
de aprendiza-
gem .

27
A criança com dificuÍdades de aprendizagem não é deficiéntéj Na
criança com
dificuldades de aprendizagem verifica-se um perfil motor adequado,
uma inteligência
média, uma adequada visão e audição, em conjunto com um
ajustamento sócioemocionall 6 .
Só precisando e aprofundando estes parâmetros podemos superar a
confusão
terminológica e o caos conceptual em que a Educação Especial e as
Dificuldades de
Aprendizagem se encontram mergulhadas entre nós, onde a
investigaçâo é exile e
inerte. Noutros países, o diagnóstico é rigoroso e a investigação tem
provado que as
controvérsías e as superstições entre os "pró-hereditaristas" e os "pró-
envolvimentalistas" ou entre os "pró-afetivistas" e os "pró-
cognitivistas" nâo pode continuar a
"tribalizar" as concepções taxonômicas e dialéticas necessárias à
Educação Especial.
As taxionomias2 têm sido desenvolvidas em muitos campos do saber
(biologia, zoologia, botânica, medicina, etc.), visando
fundamentalmente à simplificação
de universos semânticos complicados, permitindo a identificação, quer
conceptual,
quer prátíca, dos seus dados, com a fínalidade de encontrar um critério
de classificação. É dentro deste quadro que a classificação ou a
categorização das várias deficíências se pode fazer com rigor científico
e com dimensão humana.

28
Deste modo, e numa visão didática, apresentamos a seguinte
taxionomia, não
deixando de referir que 90% dos casos englobam a multideficiência e
10% incluem
as deficiências típicas 1 s ,2 0 .
EDUCAÇAO GEML
dlslasia
dtslexia/Olsorlogralla
discalculia
Olspraxia
Adaptado de Terman e Merrill (Stanford-Binet Intelligence Scale-Ed.
Houghton
Mifflin Co. Boston,1960) e de Kirk.
Num estudo conduzido por Hobbs2, em que participaram associações
científicas de grande prestígio e investigadores de renome, chegou-se
às seguintes conclusões acerca da classificação em Educação Especial:
"(1)Ì a classificação de crianças defcientes é essencial para garantir
serviços, para planificar e organizar programas de intervenção e para
determinar os efeitos dos
mesmos; (2 a política pública e privada deve respeitar a
individualidade da criança
deficiente e a peculiaridade dos seus talentos - os processos nunca
deverão violar
este valor social fundamental; (3) cresce a preocupaçâo sobre os usos
e abusos de
categorias e rótulos atribuídos a crianças defcientes e uma maior
insatisfação pela
inadequada e descoordenada articulaçáo dos serviços; (4) programas
pedagógicos
especiais devem decorrer dos critérios de classificação para encorajar
a máxima participação possível das crianças defcientes em escolas
normais e em programas recreacionais da comunidade. O
encaminhamento ou orientação
pedágógica deve ter
em consideração o menor afastamento possível da familia; (5) as
categorias sâo instrumentos necessários para a criação de legislação e
para uma racional estrutura
administrativa da responsabilidade governamental."
A idéia fundamental da definiçâo e da classificação em Educação
Especial deve ter em consideração que se classifi_cam
comportamentos e não criánçás' s . A partir daqui, outra necessidade
decorre: o diagnóstico não pode favorecer a concorrência competitiva
entre especialistas nem a falta de uma linguagem interdisciplinar,
pois antes de tudo está em causa a dignidade da pessoa humana.
Todos sabemos o
29
I
perigo que constitui á "rotulagem" e a "etiquetagem" de crianças no
que respeíta à
diminuição de expectativas. Em nenhuma circunstância o diagnóstico
se deve afas tar do pensamento educacional, que lhe dá sentido e
coeréncia. Só nesta base s po de perspectivar a modifcação de
práticas educacionais.
, O combate aos rótulos nos casos de etiologia obscura, e nos casos
menos
óbvios, deve ser uma constante da_ Educ_ação Especial, sem no
entanto descurar a
. precisão científica do diagnóstico.
Estudos epidemiológicos na ilha de Wightl s (Rutter e colaboradores)
chega ram à conclusâo de que um caso entre os 6, 9 e os 11 anos de
idade tem uma ou
mais das seguin_ tes deficiênci_as: Quociente de Inteligência (QI)
inferior a 70; idade
de leitura dois anos e meio abaixo da idade cronológica;
comportamento desviante
evidente e uma defciência física crônica. Também concluíram que:
uma em cada
quatro das crianças deficientes tem mais que uma deficiência;
noventa por cento de
crianças defcientes mentais tinham outros problemas
(multideficiência); 4 em 5 ti nham dificuldades de aprenizagem.
Em Londres (Inner L,ondon Education Authority) investigadores
utilizando
o mesmo critério encontraram duas vezes mais aqueles números.
Noutro estudo
(National Child Development Study) revelou-se que : aos 7 anos, 0,4%
das crianças se
encontravam em escolas especiais, 5% tinham um apoio especial nas
escolas normais
e os professores asseguraram que mais 8% das crianças deveriam se
benefciar desse
apoio. Aos 16 vnos,1,9% daquelas crianças encontram-se nas escolas
especiais; l%
dos alunos das escolas normais eram repetentes; 5% tinham
problemas de comporta mento; e 1% acusavam deficiéncúr fisica ou
sensorial. Professores afirmaram ainda
que mais de 5,5% dessas crianças podiam estar integradas desde que
fosse assegura do um apoio pedagógico adequado.
Na Inglaterra, o "Warnock Report"2 2 avançou com o seguinte número:
Em
cada seis crianças, uma precisa e necessita de um apoio especial,
permanentemente
nuns casos, noutros por períodòs de tempo, durante as suas carreiras
acadêmicas. A
proporção altera-se na cidade (1 em 5).
Todos estes números são obviamente muito diferentes dos nossos, na
medida
em que as nossas condições sanitárias, econômicas e educacionais
são francamente
mais baixas do que as inglesas. Não estaremos a exagerar ao afirmar
que em Portugal
a proporção é de uma em quatro crianças.
Qualquer professor primário numa classe de 30 crianças deve contar
com cer ca de 6-7 crianças que vão exigir um envolvimento
educacional apropriado e dife rente dos programas aprovados, caso
contrário a escola passa a ser a grande respon sável pela "manufatura"
de deficientes mentais. A escola é mais responsável pela de fciência
mental do que a sociedade no seu todo, provaram os estudos
epidemiológi cos de Gruenbergl o .
O atual sistema de classificaçâo, por defciência ou por tipo de
difculdade,
deve ser abolido. Não basta colocar o rótulo nas crianças ou criar
escolas para "cri anças cegas" ou "crianças surdas". Não se pode partir
do pressuposto de que todas
as crianças com a mesma deficiência têm as mesmas necessidades e
a mesma perso' nalidade. Isto nâo é verdade, pois uma pode ser de
causa congênita e outra nâo; uma
pode apresentar dificuldades de aprendizagem secundária, a outra
não, etc. As crian 30
ças defcientes também são diferentes, daí a importância da
introdução das noções
de `perfil intra-individual"12 e de "necessidades educacionais
especiais'. Só as
"crianças cegas" e as "crianças surdas" podem ser definidas em
termos de métodos
educacionais específicos. Todas as uutras defciências colocam
problemas semelhantes de dificuldade de aprendizagem.
A categorização e a etiquetagem perpetuam a diferença entre
deficientes e
não-deficientes, e perseveram a institucionalizaçâo da deficiência, o
que deve ser evitado por razões humanas e científicas.
Os termos "anormal" ou "atrasado" que vigoram nas nossas leis, como

vimos, para além de utros estigmas ridículos e humilhantes, devem ser
abolidos pela sua imprecisão e ambigiiidade, pois partem do princípio
de que o problema é da
criança, quando muitàs vezes a defciência é o corolário do que se
passa no seu envolvimento social. ,
Será preferível a designação de crianças com dificuldades de
aprendizagem ;
(crianças D.A.), subdivididas por sua vez em: primárias, quando não se
ídentifca ,
ç
uma causa orgânica evidente; secundárias resultantes de limita ões ou
defciên-
cias devidamente diagnosticadas (defciência visual, auditiva, mental,
motora, emocional, etc.).
As dificuldades de aprendizagem primárias (DAIJ compreendem
perturbaÇões
nas aquisições especificomente humanas, como a linguagem, a leitura,
a escrita ou o
cálculo. Neste caso, as outras aquisições - motoras, sensoriais,
intelectuais e sociais encontram-se potencialmente normais. Se estas
últimas se encontram perturbadas,
elas são apenas a conseqnência de alterações "mínimas", "tão
mínimas" que não
são detectadas pelos exames psicológicos e neurológicos mais
utilizados - daí pois,
a confusão semântica. Os exames sensoriais, neuropediátricos e
psicológicos tradicionais sâo insufcientes para detetar distúrbios
simbólicosl ' .
As dificuldades de aprendizagem secundárias (DA IIJ compreendem
perturbaÇôes nas aquisições não especificamente humanas. Muitas
designações têm sido avançadas: paralisia cerebral, defciência visual e
ambliopia, defciência auditiva e hipoacusia, deficiência mental, afasia,
perturbações emocionais, desajustamento social, etc. As dificuldades
de aprendizagem são aqui uma conseqnéncia secundária de
defciências nervosas, sensoriais, psíquicas ou envolvimentais
(privações culturais,
desvantagens sócio-econômicas, fatores ecológicos, malnutrição, etc.)I
Muitas são as causas que podem provocar as dificuldades de
aprendizagem primárias, como, aliás, a defciência auditiva. Além disso,
são confusas e pouco exatas.
Ninguém conhece os sintomas exatos que permitem diagnosticar a
dislexia. Alguns
autores sublinham resultados obtidos em testes psicológicos verbais e
não-verbais,
outros em testes visuais e auditivos, e ainda outros em testes
neurológicos. Para muitos outros, a dislexia não é uma doença nem
condição; é estudada apenas nos aspectos sociais, com recursos a
explicações envolvimentalistas encantatórias, mas
pouco precisas e rigorosas cientificamente. O mesmo acontece com os
estudos estatísticos. Que tipo de confiança e validade se pode
encontrar em resultados que são
obtidos por estudos que não podem ser precisos sobre o que é que
significa a dislexia (ou outra dificuldade de aprendizagem
especifcamente humana)?

31
Em resumo, as causas das DA II são bem conhecidas e estâo
relacionadas com
fatores biomédicos (deficiências sensoriais, mentais ou doenças
crônicas prolonga das, prematuridade, anoxia, doenças infecciosas e
virais, problemas de matabolismo,
traumatismos, lesões cerebrais, ou outras causas que envolvam direta
ou indireta niente o sistema nervoso central)' ' .
' As causas das DAI são menos conhecidas e, por conseqiiência,
constituem ter reno fácil a choques de afirmações e a gregarismos
científicos. Aqui, duvida-se mui to das observações que são feitas por
especialistas que desconhecem o processo da
leitura, da escrita e da gênese da noção do número. Por outro lado, o
mesmo diag, nóstico, feito em lugares e por pessoas diferentes, está
longe de ser o mesmo e está
distante de uma metodologia similar. Por último, as interpretaçôes
variam consoan te ideologias e não segundo fatores comprovados
diferencialmente e interdisciplinar mente .
É essencial que se desenvolvam mais processos de observação
(exame multifa torial por EEG19, exames neuropsicológicos,
oculográfcos, perceptivo-visuais e
perceptivo-auditivos, vestibulares e oculomotores, vestibulares e
proprioceptivos,
etc.), de modo a determinar a existência de variáveis etiológicas e a
adotar interven ções pedagógico-terapêuticas que minimizem o
insucesso escolar, primeiro degrau
da inadaptação social.
A designação de "repetentes" e as suas famigeradas turmas devem
ser substi tuídas por núcleos de facilitaçâo de aprendizagem. Os
grupos têm de se criar na base
de necessidades educacionais específicas, e as escolas devem ser
progressivamente e quipadas com centros de recursos pedagógicos e
com professores disponíveis e espe cializados. Os centros de recursos
a criar pelo MEIC deveriam obedecer a uma dis Iribuição nacional, para
além de proporcionarem ações de diagnósticos, formação e
investigação, criação de material pedagógico e de currículos,
descentralizando ações
de reciclagem e compensando a rigidez do sistema educacional.
A visão da educação tem de ser aberta e positiva, abrangendo
também as cri anças com problemas emocionais e de comportamento,
não confundindo proble mas de aprendizagem com problemas de
motivaçâo ou com os tradicionais proble mas de disciplina.
O diagnósticol 6 tende a ser cada vez mais preciso e rigoroso. A sua
aferição
deve ter em linha de conta amostras significativas da população
portuguesa. O tra tamento estatístico deverá ser reavaliado
multifatorialmente por meios de compu taçâo mais atualizados. A
investigação psicológica e psicoeducacional tem de ser
promovida e acarinhada urgentemente. Os testes de "norma" devem
coexistir com
os testes de "critério", cuja aplicação informal poderá trazer grande
utilidade peda gógica. Aqui, uma nova perpesctiva deverá nascer,
munindo em termos de igual dade científíca o diagnóstico educacional
do professorz 2 ao lado do diagnóstico
clínico do médico e do diagnóstico psicométrico rigoroso do psicólogo.
O diagnóstico deverá subentender o aspecto interindividual e intra-
indivi duall 2 . O primeiro diz-nos que uma criança é significativamente
diferente de outra,
isto é, determina as capacídades individuais numa característica
particular dentro
de uma população dada. O segundo, compara as capacidades, as
aquisições e as difi
32
culdades da criança, subdividindo-as em áreas fortes e áreasfracas,
condição neces sária para planejar intervenções pedagógicas
imediatas. O diagnóstico em Educação
Especial deve justificar-se pelas estratégias educacionais que implica3
.
Em Educação Especial a criança deve ser estudada mais
objetivamente, com batendo a mistifcação das expectativas. Há que
ter uma noção dos processos recep tivos de informação visual-auditiva
e tatilcinestésica. Por outro lado, convém obser v ós processos de
integraçgo e organização simbólica e conceptual (atenção, discri
mmação, identificação, retenó, comreensão, lanifcação e controle). Por
últi mo, necessário avaliarosrocessos expressivos, nomeadamente na
linguagem (co ;' municação verbal e vocalização) e no movimento
ideacional (controle tônico-postu ral, lateralidade, imagem do corpo,
estruturação espácio-temporal, praxias e lingua gem gestual), para
além dosprocessos de ajustamento sócio-emocional, de acordo
com o modelo de informação (da pág. 34).
Este modelo de informação pode, a título meramente taxionômico,
permitir
uma classificação funcional (embora artificial) da deficiência de acordo
com os li mites integrativos das capacidades3 ,16 ,17 .
1- receptivas ou sensoriais;
! . 2 - integrativas ou intelectuais;
3 - expressivas, motoras e verbais;
_ !_ 4 - sócio-emocionais.

Í 1) Assim, por exemplo, nas capacidades receptivas ou sensoriaisl 6 o


critério
é mais objetivo. Tem sido amplamente reconhecido que uma quebra
auditiva (hea, ring loss) de 35 a 0 decibéis interfere significativamente
na comunicação. Resta sa ber qual o mínimo de quebra auditíva que
tem de ser considerado para não afetar a
aprendizagem normal. Experimentalmente, e especialmente em
termos psicológicos, %
o limite aparece próximo dos 30-35 decibéis, observados como média
necessária pa ra a comunicação no melhor ouvido. Uma maior quebra
auditiva implica obviamen, te uma alteração na aprendizagem, e por
isso cai no domínio da deficiéncia auditiva.
Da mesma forma se coloca o critério na deficiên_ cia visual. A
cegueira tem sido
defnida para efeitos legais e sociais como a acuidade visual de 20/200
ou menos (is to em pés - unidade de medida inglesa), no melhor olho,
subentendendo um ângulo
de visão não superior a 20 graus. O amblíope
("visually impaired") é definido com
uma acuidade visual não superior a 20/70 no melhor olho, com
correção. Clinica mente, a classificação de defeientes visuais é
colocada em termos de acuidade visual
ou clareza da visão, e baseada na escala de Snellen, onde a figura
superior da letra E
de 3,5 polegadas pode ser vista por um olho normal a 200 pés. O
símbolo 20/200
signifca que um indivíduo pode distinguir a 20 pés o que um olho
normal distingue
, a 200. Em termos educacionais, a termxnologia adotada considera: o
amóliope
(aqáele que ode prender a ler letra de imprensa), o cego (aquele que
não pode ler
letra de imprensa, e que, portanto, necessita de instrução de Braille).
Na base destes
resultados, uma visão 20/40 corrigida constitui o limite da capacidade
visual para a
aprendizagem normal.
É evidente que não se podem estabelecer critérios numéricos só por
si, na me dida em que se simplifica abusivamente o problema. Os
números, os pontos quanti
33
integrativas
interneurossensoríais
intraneurossensoriais

tativos e os limites devem ser seguidos com lucidez, embora em


termos de educaçâo
s torne necessário reconhecer os diferentes tipos de deficiência que
afetam, ou po dem afetar, a aprendizagem. Ouvir não é
necessariamente escutar, e ver não é sinôni mo de olhar. O importante
em termos educacionais é saber como a criança utiliza os
seus processos sensoriais receptivos. É necessário distinguir no
âmbito da DA se o
problema é provocado por privação sensorial, ou se é neurológico de
origem, pois
podem-se observar dificuldades interdependentes, podendo detectar-
se por conse qência um deficiente sensorial com ou sem DA Cabe ao
diagnóstico saber até que
ponto a defíciência sensorial interfere ou não com a aprendizagem, e
a partir daí
equacionar estratégias educacionais adequadas a cada caso, como
vimos quando ana lisamos as DA I e as DA II.

2) Nas captrcidades integrativas ou intelectuais' 6, devemos colocar


em primei ro lugar a diferença entre a deficiência mental e a
neuropsicopatologia da aprendi zagem. Mais uma vez e quase sempre
esta diferenciaçâo nâo se respeita, pois a con fusão terminológica à
volta da lesão cerebral (mínima, ligeira ou severa) tem sido

34
muito controversa. Uma distinção deve ser feita entre as
incapacidades e as dificuldades. De um lado estão as agnosias (input),
as afasias (integração) e as apraxias
(output), que podem envolver alteraçôes anátomfsiológicas de certas
zonas do cérebro, independentemente de estarem intactos os
instrumentos periféricos de recepção ou execução. Do outro, as
disgnosias, disnomias, disfasias, disartrias, dislexias,
disortografias e dispraxias, que podem envolver uma disfunçâo
psiconeurológica das
operaçôes nâo verbais e verbais.
Psicólogos têm demonstrado que a discrepância entre capacidades
não verbais e capacidades verbais está significativamente associada
com problemas de maturidade social.
Outros investigadores têm apresentado provas, mesmo com análise
"pósmorte" de cérebros, de que tais problemas traduzem uma
disfunção inter-hemisférica, visto estar provado que na maioria da
população o hemisfério esquerdo é o "dominante" nas operações
verbais (organização, seriação, análise, atenção auditiva, linguagem
falada, escrita e quantitativa, etc.) e o hemssfério direito é o
"dominante"
nas operações não verbais ("Gestalt", síntese, visomotriádade, atenção
visual, visoespacialidade, etc.)ls,l. De uma forma didática, o hemisfério
esquerdo é o hemisfério psicolingístico, ao passo que o hemisfério
direito é o psicomotor, tendo
este uma maturação mais precoce do que a daquele. Neste campo,
como noutros, o
julgamento clínico ou o critério social são insufcientes; daí que se
tornem essenciais demarcaçôes quantitativas, como meios de
orientação em universos semânticos
tão complexos como são os da disfunção cerebral e os da deficiência
mental, em
que entram em linha de conta a dialética dos fatores endógenos e
exógenos.
Na criança deficiente mental' 6 o potencial de aprendizagem é
caracterizado
por graus de incapacidade adaptativa, em que subsiste uma
inferioridade mental global. Na criança com dificuldades de
aprendizagem há um potencial normal de aprendizagem caracterizado
por discrepãncia entre as capacidades e o nível de realização,
ou seja, verifica-se uma integridade global sensorial, intelectual,
emocional e motora
e apenas se observa uma dificuldade na aprendizagem. Neste
conceito, a fim de não
aumentar a confusão, não se deve entrar em consideração com fatores
de privação
sócio-cultural ou outros de cariz sócio-econômico. O fator a respeitar é
de ordem intrínseca do cérebro da criança' '.
Temos de distinguir a criança com DA da criança deficiente mental e
da criança que experimenta problemas de aprendizagem por razôes de
desvantagem cultural,
de inadequado envolvimento pedagógico, de envolvimento sócio-
econômico e sócioemocional frustrado, ou por deficiências específicas;
típicas ou múltiplas, diagnosticadas cientificamente. O potencial da
criança com DA é normal e médio; o problema está em ajustar os
processos pedagógicos ao perfil de aprendizagem intra-individual da
criança.
Se este contexto semántico for tomado em linha de conta, muitas
crianças serão devidamente identificadas e apoiadas; caso contrário,
geram-se problemas de
inadaptação soáal. Identifcando precoce e cientifcamente crianças com
DA e não
as confundindo ou estigmatizando como "deficientes mentais", e
garantindo paralelamente meios e recursos adequados no início da
escolaridade, ganham-se cidadãos

35
alfabetizáveis, independentes e conscientes para as progressivas
transformações sociais. Esta ação preventiva pode representar uma
grande economia de gastos e um
substancial meio de combate aos problemas sociopáticos
(delinqnência, droga, prostituição, desemprego, alcoolismo, etc.).
Os limites quantitativos2 ,1 s dos potenciais de aprendizagem têm
sido estabelecidos por escalas de inteligência (WISC - Wechsler
Intelligence Scale for Children,
SBIS - Stanford Binet Intelligence Scale, etc.). Uma das mais
reconhecidas classificações desses limites tem sido avançada pela
American Association of Mental Defciency9, compreendendo os
seguintes tipos:

STANFORD
TIPOS DE DEFICIÉNCIA BINET WECHSLER
MENTAL Q.I. Q.I.

(mild) figeira 6 &5 2 69-55


(moderate) moderada 51- 36 54-40
(severe) severa 3 5-20 39-25
(profoundJ profunda C19 C24
Outras classifcações têm surgido no plano educacional, entre elas a de
Kirk,
que tem vindo a ser aceita internacionalmente, consistindo no quadro
seguinte 12

Dificuldade de Aprendizagem (Slow learner) 80-90


Deficiência Mental Educável (Educnble mentally retarded E.MR.J 50-55
- 75-79
Deficiência Mental Treinável (Trainable mentally retarded T.MR.J 30-35
- 50-54
Defíciência Mental Dependente (Dependent mentally retarded D.M.R.J
C 25 - 30

Estas classificações são úteis, mas terão de ser encaradas com várias
limitações
e cuidados, quer no plano do diagnóstico, quer no plano educacional. A
EE deve estabelecer um leque de resultados onde separe a criança
defciente mental educável
da criança com dificuldade de aprendizagem. Em vários paises,
essa `fronteira"situa-se entre os 50- 75-80 de QI. As crinnças que
apresentam acima de 80 (para além
de outros dados do diagnóstico diferencial não devem ser classificadas
como necessitando de EE16 . Se estes valores fossem aceitos, os
limites das DA iniciavam-se a
partir de 80 de QI. O grupo das DA situa-se dentro dos valores entre
80-90 de QI.
Myklebust e Johnsonl 6 definem a criança com DA com um QI próximo
dos
90, quer no resultado nâo verbal, quer no verbal, pois da sua
discrepância de fatores
poderão resultar processos de aprendízagem individualizados.
Mais estudos devem ser desenvolvidos para precisar estes aspectos,
não subestimando a necessidade de parâmetros clínicos definidos e de
demarcações quantítativas, pois só assim se pode assegurar uma EE
válida, eficíente e humana. É claro
que estes aspectos não podem ser vistos isoladamente, e só dentro de
um diagnós
36
tico, de uma definição e de um sistema de classificação
interdisciplinar se pode determinar os limites integrativos e
intelectuais adequados para a aprendizagem.
3) Encaremos agora as capacidades expressivasl 6. Os limites devem
ser equacionados em duas áreas: a motora e a verbal.
Os limites de integridade da área motora são postos em causa nos
primeiros
anos de vida. Aí se desenvolvem os sistemas de respostas inatas
(reflexos), que se
coordenam, estruturam e auto-regulam nos sistemas motores globais
(postura, equilfbraçâo, locomoção, etc.), complicando-se
posteriormente em sistemas de motricidade fina (praxias ideomotoras
e ideatórias, destralidade, etc.). Estes dependem de
uma imagem do corpo que se constrói mentalmente de acordo, e como
corolário, da
experiência com os objetos e com os outros.
A motricidade é um indicador significativo do processo da maturação,
quer
no desenvolvimento normal, quer no patológico. Nesse aspecto, basta
caracterizar a
criança com paralisia cerebral (espástica, atetósica, atáxica, etc.). Esta
condição
multideficiente, que causa inúmeros problemas de comportamento e
de aprendizagem, resulta da paralisia, fragilidade ou descoordenação
dos centros motores cerebrais Que afetam as capacidades expressivas
motoras e verbais (dado que o aparelho
fonador humano envolve, da mesma forma que qualquer conduta ou
qualquer movimento ideacional, uma programação e uma regulaçâo
dos centros motores efectores do cérebro).
Tendo a paralisia cerebral quase sempre uma etiologia (desordem do
sistema
nervoso central) idêntica à deficiência mental, deve ser no entanto
diferenciada no
plano dos aspectos neurogenéticos da aprendizagem, e, bem assim,
nos processos e
nos objetivos educacionais.
Não obstante, nunca poderemos demarcar os grupos, nem confundir
diagnósticos. Nesta linha, em nenhuma circunstância se pode
relacionar uma afecção da
motricidade (que se dá na criança com paralisia cerebral com
problemas de ordem
neuromuscular reflexa e automática, afetando os sistemas piramidais e
os sistemas
extrapiramidais, responsáveis respectivamente pelo controle do
movimento voluntário e pelo controle tônico-postural) com uma
afecÇão da psicomotricidade (que se
observa clinicamente na criança com difculdades de aprendizagem
com problemas
de adiadococinesias, sincinesias, assinergias ligeiras e subtis,
problemas de imobilidade e de auto-regulação vestibular e
proprioceptiva, lateralidade, assomatognosias,
aexterognosias, problemas nas relações entre espaço agido e espaço
representado e o
ritmo, destralidade, apractognosias, dismetria, etc.).
Mais uma vez a área motora tem carências de medidas
estandardizadas. As
normas de desenvolvimento de Gesell e Amatruda Doll S Bayley' 6
Oseretskyl 6 ,
Frostig' Kephart ' ' Kraus-Weber ' 3 Pohndorf' 6 American Association of
Health
Physical Education and Recreation, etc., começam a ser adotadas em
muitos países
como medidas do comportamento motor. Entre nós, muito pouco se
tem feito e nenhuma adaptação tem sido encorajada. Para quando em
Portugal um Laboratório
do Desenvolvimento da Criança Portuguesa, onde estes estudos sejam
encarados a
nível nacional? É que só a partir daí se poderá caminhar com precisão
para um diagnóstico e uma intervenção científica na educação em
geral.
37
A investigação atual não chegou ainda a demarcaçôes quantitativas
para indicar onde a paralisia cerebral acaba (em termos de disfunção
motora) e onde começa
a criança com dificuldades de aprendizagem (em termos de disfunção
psicomotora).
Numa, o centxo dos problemas é motor, (paralisia, apraxia, etc.);
noutra, o centro
dos problemas é de aprendizagem (dispraxia). Isto quer dizer que uma
dificuldade
psicomotora representa uma adequada integridade da função motora,
enquanto uma deficiência motora não.
Nesta área não podemos - e aqui coloca-se o limite das integridades
das capacidades expressivas verbais - subestimar o que está implícito
na noção de apraxia,
visto envolver as noções de afasia expressiva (no plano da linguagem
falada expressiva) e de disgrafra (no plano da linguagem escrita
expressiva). Ambas são expressivas, e, em termos neuropsicológicos,
consubstanciam a noçâo de apraxia, como uma
função de transdução entre os centros integrativos e os centros
expressivos. Todavia, não podemos integrar estas condições, como nos
referem Myklebust e Johnson,
no campo da paralisia cerebral, pois elas são vistas fundamentalmente
na área das
deficiências de comunicação (afasia expressiva) ou na área das
dificuldades de
aprendizagem (disgrafia).
4) Por último, os limites integrativos do ajustamento sócio-
emocionallb, embora mais recentes, fornecem-nos alguns julgamentos
de ordem clínica. Independentemente de os testes projetivos e de
personalidade (CAT* Rorschach, etc.) dependerem das análises
subjetivas dos diagnosticadores (dúrgnostician 's insights) e exigirem
facilitação verbal, nâo restam dúvidas, de que a sua utilidade é
incontestável, como
provaram os estudos de Cattel.
Aqui também não existem demarcações quantitativas. O problema
requer, para além doutros atributos, uma anamnese bem diferenciada,
com todos os dados históricos biomédicos e mesológicos, e a adoção
de escalas de maturidade social (exemplo da Escala de Maturidade
Social de Vineland de Doll)5 para além da indispensável análise
psicodinâmica e psiquiátrica do envolvimento social e afetivo imediato.
Conseqnentemente, convém determinar as relações de causa e de
efeito entre
o desajustamento emocional e as dificuldades de aprendizagem. Será
a dificuldade
de aprendizagem a causa do desajustamento emocional ou será o
desajustamento emocional a causa das difculdades de aprendizagem?
Na escola, a dificuldade é normalmente o corolário de uma baixa
realização acadêmica ou escolar.
A "defciência emocional" pode ser caracterizada quando se observam
reações agressivas indiscriminadas, hiperatividade, dependência,
isolamento, hiperirritabilidade, nível de frustração muito baixo,
agitaçâo, condutas sociopáticas, expressões reativas, neuróticas e
psicopáticas, autismo, fragmentações do EU, ansiedade,
depressão, fantasmizaçâo exagerada, bloqueio relacional, objetal e
social' 6 etc.
As aprendizagens humanas desenvolvem-se passo a passo num
ambiente psicológico adequado e identifcador. Quando o ambiente não
é adequado - e aqui
cabe uma grande dos de responsabilidade ao adulto - o
desenvolvimento das capacidades de aprendizagem está
comprometido.
'=Children Aperception Test - CAT

38
A famflia, nas primeiras fases do desenvolvimento, é o local
privilegiado de
aprendizagem. Os seus intervenientes desempenham um papel
fundamental no desenvolvimento e na epigênese da personalidade da
criança. Também as síndromes de
hospitalização2 ' e de institucionalização sâo condições típicas de
segregaçâo social
e afetiva que podem ter um grande impacto no futuro das críanças.
Daí a sua prevenção.
A rejeição do envolvimento corresponde a rejeiçâo da criançab . Neste
âmbito
o estatuto sócio-econõmico, as atitudes, o repertório das relações
emocionais entre
o adulto e a criança e o tipo de interaçâo e vinculação sócio-emocional
e sócio-lingnística desempenham um papel signficativo na edifcação
da personalidade da criança.
A escola, nestes aspectos, não pode esquecer que a criança é um
conjunto de
pensamentos, de movimentos e também de sentimentos. O
comportamento na escóla, no recreio, na famflia, com outros grupos,
deve ser conhecído e compreendido
antes de se esboçar qualquer desajustamento emocional. Ca esoola
adequar um
envolvimento às necessidades da criança, nunca desenvolvendõ
funções seletivas
mas, pelo contrário, integrativas. Caso contrário, o insucesso na escola
prolongarse-á num insucesso social que deságua na delinqiiência e
mesmo até em problemas
de saúde mental. Felizmente, muitas são as crianças e adolescentes
"repetentes" e
com "insucesso escolar" durante anos que não manifestam sérias
alterações sócio-emocionais e que rapidamente se adaptam à vida. E
isto porque a vida oferece mais
oportunidades de expressão e de realização que a própria escola.
A finalizar, verifcamos que a integridade emocional deve e tem de ser
determinada clinicamente, pois aqui as demarcações quantitativas não
resultam. O ajustamento emocional' 6 adequado significa, em
conclusão, que a alteração de comportamento está na aprendizagem e
nâo no problema emocional, mesmo que se verifiquem casos de
frustração e de disciplina.
Em conclusão: a defnição e a categorização em Educaçâo Especial é
acientífica quando apenas dependente de um QI ou de um critério
social. Só na base de um
diagnóstico tridimensional - médico, psicológico e pedagógico, com
consentimento
dos pais, porque lhes assiste esse direito - se pode
equacionar a educabilidade ds
crianças deficientes e a otimização da sua realização e integração
social.
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Educação Especial.

40
3

Aprendizagem e

deficiência mental
1- APRENDIZAGEM : CONDIÇÓES E MODELOS

A aprendizagem é efetivamente o comportamento mais importante


dos animais superiores; em si, compreende a mudança de
comportamento resultante da experiência. A aprendizagem, "grosso
modo", constitui uma resposta modificada, estável, durável,
interiorizada e consolidada no cérebro do indivíduo.
A aprendizagem põe em jogo, portanto, uma relação integrada entre o
indivíduo e o seu meio, isto é, coloca uma relação inteligível entre
condições externas e
condições internas, ou melhor, desencadeia um processo sensório-
neuro-psicológico
entre a situação (externa) e a ação (interna).
De momento, e na base de investigações em vários campos, a
aprendizagem
envolve complexos processos neurológicos, nomeadamente: reações
químicas, atividades bioelétricas, arranjos moleculares nas células
nervosas e gliais, eficiência sinápica, redes interneuronais,
metabolismo proteico, mielinização, ramificações dendríticas, etc.
Noutra dimensão, aprendizagem compreende funções de
descodificação,
transduçâo, armazenamento, combinação, codificação, reforço, etc.,
que colocam a
imediatividade da experiência social.
Vários autores, desde Pavlov, Thorndike, Tolman, Guthrie a Skinner,
Hebb,
Anokhine e muitos outros, foram introduzindo novos eselarecimentos
sobre a aprendizagem humana, a que não escapa a dialética entre a
Nature e a Nurture e entre a Filogênese e a Ontogênese.
Obviamente que aqueles autores nos ajudaram a ver os pontos
comuns e não
comuns da aprendizagem nos animais e no ser humano. No animal, a
aprendizagem
é arbitrária, circunstancial com um repertório restrito de
comportamentos, quase
41
sempre dependentes do instinto de sobrevivência. No ser humano, a
aprendizagem
e planificada, motivada, elaborada e avaliada, quase sempre
dependente dos aspectos sócio-históricos.
De fato, o ser humano não se limita a explorar ou a utilizar os recursos
da Natureza como o primata. 0 ser humano, vai mais longe, inventa,
recria e acrescenta
algo à Natureza. Para além de compreender a Natureza, o ser humano
transforma-a
de acordo com a conscientização das suas necessidades. Para isso, o
ser humano
evoluiu da ação com as mãos (Homo Habilis) à ação com as palavras
(Homo Sapiens).
Passou-se aqui um processo de transformaçâo muito significativo.
Transformou-se a
informaçâo sensorial num processo cognitivo criou-se a linguagem
interior e inventou-se o símbolo, produto mental, pelo qual o
pensamento se exprime e organiza.
Com o símbolo, o ser humano transmitiu a sua experiêneia e garantiu,
assim, às novas gerações, a apropriação da experiência e da cultura.
Desta forma, verificamos que a aprendizagem é a base da evolução
das gerações e do ser humano. Exige a observância de determinadas
condições, quer sócioculturais, quer neurobiológicas ou seja, a relação
dialética entre o meio e a hereditariedade.
Ellis provou que a inteligência resulta da interação entre genótipo
(características inerentes ao indivíduo) e o fenótipo (grau de
favorecimento do meio). As interações diferenciadas com o meio,
dependem objetivamente de características genéticas. Um potencial
genético favorecido, evidencia uma maior ativação enzimática
que se sabe estar envolvida nas transmissões corticais
(Rozenweig,1961). A hereditariedade influencia a capacidade de
aprendizagem, na medida em que está relacionada com o
funcionamento bioquímico do cérebro.
O enriquecimento do envolvimento promove uma estimulação muito
mais
significativa do que a que ocorre nos envolvímentos pobres. Tal
enriquecimento não
é apenas em estímulos, mas igualmente em ativação bioquímica
através de uma
maior variedade de enzimas neurológicos.
Com estes dados, tentamos caracterizar a aprendizagem nos seus
invariantes
fundamentais. A aprendizagem visa à utilização ótima de todos os
recursos do indivíduo, quer interiores, quer exteriores, no sentido de
maximizar o seu potencial
adaptativo.
E evidente que a adaptação favorável requer uma "homeostasia" de
variáveis
neurobiológicas, sócio-culturais e psicoemocionais (Fonseca, V.
da;1979), onde ressaltam sinais de risco que podem afetar a
aprendizagem. Em estudos epidemiológicos e etiológicos, várias
condições têm sido apontadas como interferindo com o potencial de
aprendizagem.
A aprendizagem normal e satisfatória dá-se quando determinadas
condições
de integridade estão presentes. Tais condições incluem funções do
sistema nervosn
(periférico e central) e também funções psicodinâmicas e sócio-
dinâmicas. Numa situação ideal, a aprendizagem envolve um conjunto
de sistemas psiconeurológicos
subdivididos em três componentes de processamento (Fonseca, V.
da;1979):1 processamento sensorial ; 2 - processamento cognitivo e 3
- processamento de conteúdo.

42
Os sistemas de processamento sensorial evocam as relações entre os
sistemas
neurossensoriais visuais, auditivos e tátil-cinestésicos, que se
relacionam e se integram em áreas específicas no cérebro, por níveis
diferenciados; uns intra-sensoriais,
outros intersensoriais e integrativos.
Os sistemas de processamento cognitivo, põem em destaque a
hierarquia da
experiência diferenciada em quatro níveis:
1- Percepçâo - Processo de conversão, seleção e interpretação das
sensações;
2 - Imagem - Processo que diferencia a percepçâo da retenção,
permitindo a
relação com a sensação depois desta ter sido interrompida;
3 - Simbolização - Processo de reexperimentação de equivalência
significativa_e de representação interior da experiência;
4 - Conceptualização - Processo de classificação e de categorização da
informação através de sistemas de agrupamento de atributos, que
permitem a formação
de conceitos e o acesso à abstração e ao pensamento formal.
Por último, os sistemas de processamento de conteúdo, colocam em
jogo a especialização hemisférica, condição antropológica básica da
evolução, diferenciando
as funções do hemisfério direito das do hemisfério esquerdo.
O hemisfério direito, responsável pelos conteúdos não verbais, realiza
preferencialmente as sgùintes funções:
- Funções visuais:
, locálização de pontos em duas dimensões;
-' enumeração de pontos e formas;
reconhecimento de faces e de figuras sem significado.
- Funções manuais (tátil-cinestésicas)
reconhecimento de revelo (tipo Braille);
reconhecimento de estruturas.
- Funções auditivas
. sons da vida quotidiana;
padrões melódicos.
Em compensaçâo o hemisfério esquerdo tem sido considerado
responsável pelos conteúdos verbais. Realiza, segundo Kimura (1973)
preferencialmente, as sguintes funçdes :
- Funções visuais:
reconhecimento de letras e palavras;
- Funções manuais (tátil-cinestésicas):
movimentos complexos;
fala.
- Funções auditivas:
. reconhecimento de palavras;
reconhecimento de sabas.
E evidente que as funções sâo, por um lado intra-hemisféricas, mas
por outro,
inter-hemisféricas e integrativas. Em todos os produtos do
comportamento humano,
fala, movimento, etc. se verifca o corolário das co-funções
hemisféricas, que no
fundo caraeterizam todas as realizações práxicas e simbólicas
especificamente humanas como sejam as aquisições da leitura e da
escrita.
43
Depois de termos referido as condições ideais de aprendizagem,
estamos agora, talvez, em situação para compreender os fatores
atípicos e desviantes do mesmo
processo no âmbito da deficiência mental (DM), mas para isso,
teremos que equacionar o conceito e as suas múltiplas e controversas
perspectivas.

2 - DEFICIÉNCIA MENTAL

A Defciência Mental (DM) é definida pela Associação Americana de


Desenvolvimento Mental (ex-Associação Americana da Deficiência
Mental - encontramos
aqui uma expectativa mais positiva...) como: "a condição na qualo
cérebro (órgão
essencial da aprendizagem, o parêntesis é meu) está impedido de
atingir um desenvolvimento adequado, dificultando a aprendizagem no
individuo, privando-o, de ajustamento social "
Nesta "definição" surgem conceitos fundamentais: "desenvolvimento",
"aprendizagem" e "ajustamento social", iniciando de certa forma, uma
nova era quanto às expectativas, o que conseqnentemente acentua o
enfoque educacional das definições de deficiência mental.
Não concordando com definições, pois normalmente são inúteis em
termos de
direitos humanos, não restam dúvidas que elas são necessárias para
facilitar a comunicação, a investigação e a intervenção. A maioria das
definições são desnecessárias e
potencialmente negativistas face às expectativas que criam.
Conscientes destes parâmetros, vejamos algumas classificações que
evidenciam
a variabilidade das signifcações do quociente intelectual (QI) e as
diferenciações
pragmáticas dos próprios testes.
Noutro exemplo de Sloan e Birch, 1955, a preocupação centra-se no
nivelamento do comportamento adaptativo, revelando aspectos de
maturaçâo, desenvolvimento, educação e ajustamento social (Quadro
II).
Desde Esquirol, Ireland, Pinel e outros até Zazzo, Inhelder, Luria,
Zigler,
Doll e tantos outros, os termos descritivos da DM procuraram
compreender a natureza do problema. E interessante notar que os
termos e as classifcações iniciais encerravam certos estigmas e certos
critérios sociais que encontramos em designações
como "idiota", "imbecil", "cretino", "anormal". Mais tarde, superaram-
se as estigmatizações e as descrições subjacentes a critérios de
superioridade e entrou-se numa
nova dimensão, começando por aceitar o problema, tentando explícá-
lo o mais objetivamente possível. Chegou-se à conclusão que a DM
apresenta um ritmo e uma atipicidade de desenvolvimento e de
maturação, onde se verificam evoluções conceptuais mal controladas,
para além de problemas de atenção seletiva e de auto-regulação de
condutas, onde o meio joga um papel fundamental, aceitando ou
rejeitando
comportamentos adaptativos, que são ou não "normalizados" ou
"padronizados".
Nos nossos dias o direito de ser diferente, é também visto como um
direito humano,
que passa naturalmente pela análise crítica dos critérios sociais que
impõem a reprodução e a perseveração de uma sociedade (e de uma
escola) baseada na lógica da homogeneidade e em normas de
rentabilidade e eficácia, que tendem facilmente a
marginalizar e a segregar quem nâo acompanha as exigências e os
ritmos sofisticados.

44
QUADRO I
` Nfveis de de:ciéncia mental segundo vários autores"
NARC - National Association for Retarded Citizens.
APA - American Psychiatric Association.
OMS - Organização Mundial de Saúde.

. No futuró o desafio está em garantir a todos a igualdade de


oportunidades sociais e educacionais. As apostas e as expectativas
deverão ser positivas, pois devem
acentuar a originalidade, a variedade e a heterogeneidade da pessoa
humana, elevando ao máximo possível o seu potencial intra-individual
e promovendo, conseqnentemente, a integraçâo social de todos os
cidadãos sem exceção.
As perspectivas sobre a DM têm sido várias, todas elas com aspectos
ricos de
análise e estudo. A perspectiva psicanalitica proposta por Freud,
confere ao inconsciente um papel determinante. Aperspectiva médica,
proposta por Kraepelin, Szasz,
Ausubel e outros, acentua os fatores causais, como por exemplo,
genéticos, orgânicos, metabólicos, cromossõmicos, perinatais, etc. A
perspectiva moral, proposta por
Mowrer é baseada na culpabilidade resultante das transgressões
morais. A perspectiva humanista, proposta por Rogers, Maslow e May,
baseia-se no autoconceito (selfconcept), na incongruência, no
comportamento defensivo e desorganizado do indivíduo, que no fundo,
advêm da insatisfação de necessidades da pessoa humana. A
perspectiva social não pode deixar de equacionar problemas políticos e
valores sociais impostos, valores esses diferentes de sociedade para
sociedade. Algumas sociedades, como na África, exigem aptidões para
caçar. Outras, como as sociedades ca 45
I QUADRO II
', "Nlveis de comportamento adaptativo" (Sloan e Birch,1955)
Idade pré-primária (0-5) Idade escolar (6-21) Adulto (21)
Maturaçáo e desenvolvimento Educação e treino Ajustamento social
LIGEtRO pode desenvolver a- Pode aprender aqui- Capaz de
ajustamen (mild) quisições de comuni- sições acadêmicas a- to social e
vocacio cação e de sociabili- té ao bó ano (6th nal
dade; grade);
'i Atraso mínimo nas Não pode aprender Precisa freq0ente úeas
sensório-moto- assuntos de nível se- mente de supervisão
Ì ras; cundário; perante 9tuaçdes e conômicas e sociais
sofisticadas.
Não se distingue da Precisa de E. E. aos
criança normal, se- níveis de ensino se não numa idade mais cundário.
avançada.
MODERADO Pode aprender a falar Pode aprender aqui- Apto para
ocupações
(moderate) e a comunicar; sições acadêmicas quafificadas;
i funcionais até ao 4ó
ano de escolarìdade,
I se inteado em EE.
Reduzida consciên- precísa de orientação
cia sociat;
em situaçÓes que exí jam o mínimo de a quisiçes.
Desenvolvimento
motor satisfatório;
Pode se beneficiar de
treino nas áreas de
auto-suficiência;
Pode ser orientado
com uma supervisão
moderada.
SEVERO Desenvolvimento pode falar ou apren- Pode contrbuir par
(sevcie) motor pobre; der a comunicar; cialmente em tarefas
completamente su pervisadas;
A fala é mínima; pode ser treinado nos
hábitos de hiene;
Não se beneficia do Não aprende as aqui- pode desenvolver
treino nas áreas da síções acadêmicas comportamentos de
auto-suficiência; funcionais; autoproteção em en volvimentos contro
lados.
Poucas aquisiçdes na &neficia-se de hábitos
íuea da comunicação. de treino sistemático.
PROFUNDO Crande atraso; Registrase algum de- Algum desenvolvi
[profound)
senvolvimento sensó- mento motor e da fa rio-motor; Ia;
Capacidades míni- Raramente se benefi- Incapaz de automa mas para
funcionu cia de treino na áiea nutenção;
nas úeas xnsório- da auto-suf,ciéncia;
motoras;
Necessita de cuidados Necessita de cuidados Precisa de cuidados e
! Í matemais lnursing permanentes. de supenisão perma care). nentes.

; 46
pitalistas, exigem capacidades cognitivas, tendo em atenção a
tecnologia avançada,
baseada no individualismo e na competição, que mais não são do que
conteúdos
moralistas e racionalistas camufladores de privilégios e obrigaçôes de
umas classes
para com outras.
Embora o termo DM seja de origem médica e explicado em termos de
sintomas, síndromes e desordens, o que está por trás são critérios
sociais.
Utiliza-se um critério social, mas assumem-se ações médicas curativas
e corretivas. Em resumo, a DM sendo um termo de origem médica é
definido por critérios
nâo médicos, isto é, por critérios éticos, morais, legais, psicossociais,
etc.
Estamos em presença de problemas ideológicos, económicos e
políticos. A
classificaçâo da DM, em muitos casos, tem sido um modelo disciplinar
contra as pessoas das classes mais desfavorecidas, muitas vezes a
favor da quietude e da autoridade da sociedade burguesa.
Freqnentemente, o hospital finaliza a tarefa social, quando o
comportamento da pessoa não é conforme com os valores sociais
instituídos e
dominantes.
Os DM têm sido esquecidos, são em certa medida exilados da
própriafam:?ia,
onde podem confluir valores e aspirações sociais ambíguas.
Numa perspectiva educacional, que na sua essência constitui a
intençâo deste
meu trabalho, a exclusão social tem de ser combatida em todas as
frentes com perseverança. Como evoca M. Foucault, nenhum avanço
médico, nenhuma dimensão
humanitária foi responsável pelo progressivo afastamento e isolamento
dos DM. Os
DM nâo podem continuar a ser "aprisionados" e "oprimidos" ; como
cidadãos que
são, têm os mesmos direitos e devem ter acesso às mesmas
oportunidades.
A escola e a sociedade, não podem continuar a "manufaturar a
loucura" e a
inadaptação social. A DM é um mito, cuja funçâo fundamental é
encobrir o conflito
moral e soáal das relações entre as pessoas.
Mais profundamente, como defendem Ullmann e Krasner, teremos de
diferenciar as etiologias da DM em: orgânicas e psicodinãmicas. Umas
relacionadas com
problemas bioquímicos (Kety, 1959), outras com problemas genéticos
(Kallman,
1953). Outras ainda, e essencialmente, com problemas sociais e
culturais.
O "stress" contínuo da vida competitiva atual e a luta desenfreada e
inconseqiiente pelo poder e pelas "colocações", constituem pressôes
que estão na base dos
padrões de realização e afirmação social. Padrôes que são
reproduzidos e transmitidos ao abrigo de códigos de adaptaçâo
discrepantes, predeterminantes, e mesmo até,
desumanizados.
A DM ocorre mais vezes nas classes sociais desfavorecidas do que nas
classes
favorecidas, como provaram lapidarmente os estudos de Masland. Por
outro lado, a
DM está igualmente associada a complicações de gestação (Mac Maun
e Sowa,1961)
e a acidentes neonatais e perinatais mais freqnentes nas
classe5pobres(Baird,1960).
A DM depende, segundo o estudo epidemiológico e etiológico de Illsey
e Fairweater,1965, de: condiçôes de desenvolvimento, condições
sócioconômicas, condições de higiene, condições patológicas
familiares, condição sócio-cultural da mâe,
etc. Como acabamos de ver, a incidéncia dos fatores sociais é
marcante.
47
Educacionalmente e socialmente, cabe ao adulto a criação de um
envolvimento estimulador adequado, que permita a edificação do
desenvolvimento psicobiológico harmonioso caracterizado por suporte
afetivo, condições de desenvolvimento
emocional, lúdico e motor, facilidades de exploraçâo do meio físico e
social, relaçâo
e interação consistente entre o adulto e a criança para a maturaçâo da
linguagem e
para a apropriaçâo das aquisições de socialização.
Os fatores biológicos e sociológicos assumem uma importâneia
dialética, no
entanto segundo Masland,1958, Penrose, 1954, Knobloch e
Pasamanick, 1962, as
aberrações cromossômicas e genéticas contribuem apenas com uma
pequena percentagem para os casos da DM, comparadas com outros
fatores biológicos, sociais e envolvimentais, antes e depois do
nascimento. Segundo Apgar, existem cerca de 200
causas diferentes da DM, e dentro delas, a percentagem pesa para o
lado dos fatores
exógenos.
As condições sócio-culturais e a qualidade de vida influenciam
profundamente
as funções psicobiológicas, que na auséncia de uma lesão cerebral, de
deficincias
hereditárias ou de lesões perinatais, participam significativamente nos
níveis de adaptaçâo social.
Num estudo de James Spence que abrangeu 1000 familias; chegou-se
à conclusâo que muitas das desordens sâo expressâo do envolvimento
familiar. Dentro delas
destacou as seguíntes:1 - encontram-se mais DM em familias
numerosas; 2 - verifica-se que a fecundidade é mais elevada nos
grupos sociais desfavorecidos; 3 constata-se a tendência para os filhos
de mães idosas serem mais desfavorecidos
intelectualmente ; 4 - observa-se que os filhos mais novos de uma
familia numerosa
tem tendência mais acentuada de DM, etc.
O reflexo dos fatores envolvimentais, como a miséria, a pobreza e o
analfabetismo, é extremamente relevante, nomeadamente no que
concerne às atitudes da
maioria das pessoas. Em vários estudos de atitudes face à DM
constatou-se que os
comportamentos dos deficientes irritam, incomodam, perturbam a
normalidade soáal .
É sintomático que a observãncia da relatividade cultural que envolve o
problema esconde fatores éticos difíceis de objetivar mas que não
deixam de se ver em
inúmeras disposições legais.
O estudo da DM exige a análise da constelação de imensos fatores,
nomeadamente: ecológicos, sócio-politicos, sócio--profissionais, sócio-
famiares, médico-sociais (assistência ao parto), nutricionais,
higiênicos, migracionais (desqualificação
sócio-profissional dos meios rurais), industriais (intolerância aos DM
nos meios urbanos), laborais, vocacionais e escolares.
A desigualdade de oportunidades deve ser incialmente combatida,
como medida de prevenção. Sabe-se que o desenvolvimento
intelectual de críanças de origem
social desfavorável em comparação com crianças de origem social
favorável é muito
menor no infcio do que no fim da escolaridade primária. Aqui a escola
e as estruturas materno-infantis, deverão equipar-se para compensar
as diferenças sociais,
como meio de consolidação da democratizaçâo social, cultural e
econõmica.
A prevenção e o aligeiramento das diferenças sociais não podem ser
negligenciadas,

48
pois não se pode esquecer que desde o nascimento até à entrada
para a escola, se
dâo as mais significativas transformações psicobiológicas. Nos
primeiros anos, o de senvolvimento requer condições adequadas de
estimulação e segurança, que, uma
vez não satisfeitas, vão interferir no desenvolvimento cognitivo da
criança.
Ambientes sócio-familiares que não satisfaçam funções de imitação,
de inte ração lingnística (ou melhor, interação pergunta-resposta que
origina a discrimina ção, a compreensão auditiva e a expressão verbal,
base segundo Hess, 1965, da ex periência colaborativa entre a mãe e
o filho), podem pôr em risco o desenvolvi mento inteléctual. Martin
Deutsch, 1963, Bernstein,1965 e 1979, provaram que a
aquisição da linguagem impõe um investimento afetivo e um
investimento de tempo
específicos, que permitam a ocorrência de sistemas de
encorajamento, facilitação,
correçâo, etc. A linguagem que as crianças de origem social baixa
utilizam, é carac terizada por padrões de linguagem pouco complexos
e normalmente agramaticais,
cujo reflexo se faz sentir em todo o desenvolvimento cognitivo.
O problema da DM nâo se resolve nem com piedade e paternalismos
provin cianos, nem com medos e autopunições irracionais. A DM não é
uma doença mas
sim uma condição, que em termos humanos deve ser respeitada a
todos os níveis.
Medidas políticas são urgentes para lançar mão a atitudes de
prevenção e a proces sos de planificação, sócio-cultural e médico-
social, para, efetivamente, desencadear
condições do desenvolvimento social integrado.
A percentagem de mortalidade infantil; de prematuridade; de doenças
epidê micas e infecciosas; de bronquite, pneumonia e tuberculose; de
doenças reumáticas
de úlceras e cancro no estômago, etc., são mais freqentes nas classes
sociais desfa vorecidas, como constataram Susser e Watson,1962, e é
evidente que aquelas con dições, que originam a maior incidência
daquelas doenças, também se refletem no
potencial intelectual das populaçôes.
Outras variáveis são importantes. A raça e os grupos étnicos acusam
outros
índices susceptíveis de reflexão. Os negros dos Estados Unidos da
América do Nor e da África do Sul, comparados com os brancos, têm
medidas de saúde mais baixas. Grupos minoritários (porto-riquenhos,
mexicanos, índios, etc.) têm taxas mais
elevadas de mortalidade infantil. Haverá alguma correlação destes
aspectos com a
problemática da DM?
Richardson avança com outras variáveis importantes relacionadas
com a DM:
1- elevada paridade ;
2 - superpopulação;
3 - concepção pré-nupcial;
4 - ilegitimidade;
5 - higiene deficitária;
6 - lares desintegrados;
7 - empregos desumanos;
8 - abandono afetivo;
9 - privação de estimulaçâo;
10 - patologia familiar (quer orgãnica, quer social);
11- rubéola, diabetes, toxemia, radiação, incompatibilidade de Rh;

49
12 - "tabus", "mitos", "preconceitos", etc.
Brigdes e Coler, 1971, colocam, dentro desta linha de simples
enumeração, ou tros fatores familiares que afetam o nível de saúde e
de inteligência das crianças, e
obviamente se refletem ao nível da DM :
1- ausência de cuidados maternais;
2 - más condiçôes estruturais de habitação (espaço rudimentar,
ausência de
espaços de exploraçâo, de higiene, etc.);
3 - fraco e deficiente envolvimento humano ;
4 - relações interafamfliares malogradas;
5 - pouco tempo de interaçâo pessoal mãe-filho, adulto-criança;
6 - fraco índice nutricional;
I 7 - arranjos arbitrários dos quartos de dormir ("sleeping
arrangements"
Dogmas sociais e religiosos, sistemas de castas, níveis de aspiraçâo
(Oscar Le wis - "Children of Sanchez"), efeitos da pós-industrialização
ou da pobreza da re gião (Candill, 1961), isolamentos geográfcos,
meios suburbanos superpovoados,
I grandes taxas de desemprego, insegurança econõmica crônica,
ostracismo social, bai xo nível de alfabetização, auséncia de
oportunidades culturais, inexistência ou crise
de modelos, etc., sâo outros fatores que repercutem na DM.
A va__riável class sociulgstá, como nâo podia deixar de ser, altamente
relacio nada com problemas de DM, e também com problemas de
dificuldades de aprendi zagem, abandono da escola, desordens
psiquiátricas e com a delinqiiência juvenil.
Negar estes aspectos é assegurar um simplismo e um obscurantismo
que urge des mistificar. Não esquecendo, claro, a ocupação do pai, o
salário famflia e o nível de
instruçâo dos pais.
Zazzo constatou que o nível médio de inteligência se eleva com o
estatuto só cio-econômico, o que explica o maior "recrutamento" de
DM nos meios sociais
mais desfavorecidos. Gilly e Vigier mostraram que em todos os
estatutos sócioco nômicos se encontram todos os níveis de
inteligência, só que a proporção varia: en contram-se QIs mais
elevados nos altos estatutos e encontram-se QIs mais baixos
nos baixos estatutos sociais. Apgar e Beck, por outro lado, noutra
investigação, en contraram a DM moderada em maior número em
famflias pobres e com baixo nível
de instruçâo, enquanto encontraram
distribuídas mais equilibradamente por todos
os grupos sociais as formas mais severas de DM.
Esta panorâmica inconclusa da DM mostra claramente a relatividade
cultural
do problema e a dialétiea entre os fatores biológicos e hereditários e
os fatores so ciais e envolvimentais.0 esforço em termos educacionais,
deve centrar-se numa in tegração dos DM nos envolvimentos menos
restritivos em paralelo com uma luta
contra a pobreza e contra a desigualdade de oportunidades, que
deverâo ser da res ponsabilidade dos serviços públicos.
I Como iniciar a intervenção? Como vamos combater a lógica da
homogenei dade e como vamos facilitar a adaptaçâo a uma sociedade
heterogênea, que cada
vez mais tem de aceitar a variedade e a atipicidade humanas? Que
fazer pára que
i
os DM possam crescer ao lado dos outros .
50
Em seguida e apenas dentro do ãmbito da minha especialidade,
tentarei equacionar algumas medidas de intervenção essencialmente
de ordem educacional.

3 - INTERVENÇÃO NA DEFICIENCIA MENTAL (DM)

3.1 - Prevenção da DNI

Segundo Bartram (1974), é possível reduzir em 50% a incidéncia da


DM se for
aplicado o conhecimento atualmente disponível.
Desde a educação sanitária que cobre os problemas relacionados com
a saúde
das populações, bem como com o risco de mães muito jovens ou com
idade superior
a quarenta anos, passando pelas medidas do aconselhamento
genético, do diagnóstico pré-natal, e pelo planejamento familiar, como
também pelo combate ao analfabetismo funcional, até às medidas de
vacinação (rubéola) e identificação precoce (desordens genéticas e
metabólicas como a fenilcetonúria, para além da detecção de
galactosemias, de anemias, etc.) incluindo ainda a prevenção de
problemas resultantes
de malnutrição, radiações, envenenamentos, fator Rh, imunizações,
acidentes, infecções intra-uterinas, "abusos de crianças", etc., tudo são
medidas exeqníveis num plano de cobertura médica integrada. Dentro
desta linha, não escapa uma nova atitude
face ao aborto e à amniocentese, enquadrados necessariamente por
uma luta de direitos humanos, de bemstar social e de defesa da
qualidade de vida.
Um pouco de prevenção vale muis do que muita terapia. Com efeito a
aplicação e a implementação de medidas preventivas com ampla
cobertura médico-social
de toda a populaçâo sem quaisquer segregações ou discriminações,
pode aligeirar e
reduzir significativamente a incidência da DM.
A luta contra a ignorância é obviamente essencial a todos os níveis.
Ninguém
se pode esconder sutilmente em manipulações que passam pela
exploração e abuso
da ignorância das comunidades. A prevenção da DM passa pela
satisfação das necessidades básicas sociais e pela manutenção de
ações de informaçâo e formação dos diferentes grupos sociais,
atendendo essencialmente aos mais desfavorecidos onde a
incidência da DM ocorre com mais freqnência, dadas as suas condições
de vida.
Toda a comunidade deve estar envolvida na prevenção da DM, visto
estar em
causa a sua própria integridade e natureza. O potencial de uma
nação não pode negligenciar medidas preventivas de rotina que se
projetam num serviço de saúde integrado, coordenado e
demografcamente proporcionado. Cabe aos centros de saúde
grande parte da responsabilidade de dinamizar sistematicamente tais
ações preventivas mínimas.
Outro setor da prevenção cabe à inormação e aos seus órgãos. A
mudança de
atitudes e de valores que envolvem o conceito de deficiência
compreende em muitos
aspectos: resistências, objeções, superstições e escrúpulos, muitas
vezes resultantes
da falta de esclarecimento das populações. Os jornais, a rádio e a
televisão tém grande responsabilidade neste processo. A elaboração
de meios audiovisuais didáticos
como diaporamas, vídeos, histórias em quadrinhos, panfletos
lexicovisuais ou filmes

51
esclarecedores e comentados por agentes de saúde pública
coadjuvados com professores ou animadores, poderiam ser outras das
medidas a criar. Equipes e brigadas,
poderiam cobrir, em itinerância, centros culturais, casas do povo,
sindicatos, clubes
desportivos, centros paroquiais, escolas, centros de alfabetização,
locais de trabalho,
municípios, etc.
A mudança de atitudes e de condutas face à DM implica uma
reconceptualização e um reexame dos preconceitos sociais, que
devem ser investigados e conhecidos. Tais medidas de prevenção,
também necessárias e urgentes, devem ser coordenadas a nível de
serviços e de técnicos, adotando, no concreto, processos de anti-
segregação que combatam atitudes sociais estereotipadas,
obstrucionistas e cada vez
mais obsoletas numa sociedade justa e humanizada.
A prevenção combate-se com a investigação e com a aplicação de
medidas médico-sociais e sócio-culturais elementarmente planificadas,
controladas e avaliaas
nas próximas gerações. As atuais gerações de deficientes requerem
outras intervenções que se deverâo guiar pelo princípio da exclusão-
zero, quer na educação, quer
no trabalho e na ocupação dos tempos de lazer.

3.2 - Identificaçâo precoce da DM


A identificação precoce sistemática é uma condição imprescindível da
intervenção, não sb porque evita problemas futuros como tende a
eliminar condições
que agravam o desenvolvimento.
A identificação precoce necessita ser implementada nos centros de
saúde, o
que pressupõe uma sensibilização aos problemas de desenvolvimento
global da criança. A detecção precoce não pode ser banalizada ou
negligenciada. De acordo com
investigações conduzidas, conhecem-se hoje sinais de risco e de
advertência em vários aspectos do comportamento da criança, quer no
domínio das funções receptivas, quer integrativas e expressivas.
A identificação nos primeiros tempos da maturação pode permitir a
prescrição de programas de estimulação, de reabilitaçâo, de
desenvolvimento e de reforço,
que devidamente e sistematicamente orientados poderâo salvaguardar
a integridade
do potencial de aprendizagem. Desta forma a maximização do
potencial é variável,
na medida em que está em jogo uma maior plasticidade adaptativa
das estruturas e
funções do desenvolvimento humano.
Por outro lado a identificação precoce constitui, ao contrário do que
muita
gente advoga ou ignora, uma redução dos custos ao nível familiar e
público. Tratase de uma alternativa para os países de fracos recursos
ou de recursos inadequadamente geridos, caso eontrário as despesas
crescem em espiral.
A identificação precoce permite ainda o conhecimento, o controle e a
facilitação de fatores de desenvolvimento, quer motores, quer
lingnísticos, perceptivos,
cognitivos e sócio-emocionais.
A identificação precoce visa tirar proveito da fase de aceleração da
mielinização que ocorre nos primeiros momentos do desenvolvimento
humano, segundo uma
hierarquia de operadores neuronais e de conexões intra e
interneurossensoriais.

52
A não intervenção em períodos sensíveis, fundamentalmente em
crianças
em risco, pode acumular efeitos mais tarde irrecuperáveis - daí a sua
premência.
A identificação precoce (screening) nâo é um diagnóstico, nem com
ele deve
ser confundida. Este exige um estudo aprofundado e rigoroso
normalmente prati cado com pessoal especializado e com recursos
sofisticados e dispendiosos. Aquela
exige uma observação cuidada e criteriosa, normalmente realizada
com pessoal não
especializado e com recursos econômicos mais eficazes. A
identificação deve ser pra ticada ao nível das massas e dos grandes
grupos, o diagnóstico centra-se a um nível
mais restrito.
A identificação precoce visa ou deve visar uma intervenção precoce.
Não basta
identificar e etiquetar, é necessário prescrever e intervir rápida e
eficientemente, daí
a urgéncia de Programas Precoces de Facilitação do Desenvolvimento.
A identificação precoce representa em certa medida uma
reinterpretação dos
instrumentos de avaliação e de categorização, que em muitas práticas
resvalam para
instrumentos de seleção e de segregação. A identificaçâo precoce não
pode ser mais
, uma forma de rotulação que implica com o problema das
expectativas interindivi duais e sociais, que significativamente
interferem na dialética da facilitação-inibição
do desenvolvimento.
Através da aplicação de medidas de identificação, despístagem e
detecção che gamos a escalas de desenvolvimento globais que
permitem obter perfis intra-individu ais, perfis esses mais
concomitantes com ações de intervenção educacional ou tera péutica.
Inúmeras escalas são hoje adotadas em centros de saúde, creches,
jardins de
infância e que no âmbito da DM são mais cruciais como é óbvio.
Dentro dessas esco las conhecem-se e aplicam-se as seguintes: Índice
de Apgar, Escalas de Desenvolvi mento de Stycar (Sheridan), Escala
Neonatal de Brazelton, Exame Neurológico de
Preeht, Teste PKU (fenilcetonúria), Escalas Preditivas de
Desenvolvimento de Grif fiths, etc.
Cabe aos obstetras e aos pediatras o controle dos fatores pré, peri e
neonatais,
não exclusivamente orgânicos e vitais, mas também sensório-
motores, perceptivo motores, lingísticos, psieomotores, cognitivos e
sócio-emocionais, naturalmente
coadjuvados mais tarde, com psicólogos do
desenvolvimento (ou psicobiólogos) e
outros técnicos particularmente envolvidos no processo do
desenvolvimento huma no precoce.
Os estudos de desenvolvimento humano, são unânimes em considerar
certos
períodos optimais de maturação, preferencialmente situados nos
primeiros anos de
vida. As privações e as restrições nos primeiros momentos podem
estar associadas a
déficits evolutivos irreversíveis e a distorções funcionais e estruturais.
Aqui mais u ma vez se evidencia a importância da identificação
precoce, que claramente permite
situar o perfil apropríado e harmonioso dos comportamentos que
caracterizam as
primeiras fases de desenvolvimento.
As observações logo após o nascimento, na primeira semana, no
primeiro mês
e no primeiro ano são de uma importãncia vital para a detecção de
sinais de risco.
A seqnência do desenvolvimento humano é essencial para a
compreensão da
metamorfose do ser humano normal ou atípico.

53
De fato, se a seqnência do desenvolvimento é indispensável para o
conhecimento da evoluçâo do ser humano, ela é porém imprescindível
e fundamental para
quem trabalha com deficientes mentais dependentes e
multideficientes.
A precisâo da avaliação neonatal e a detecção de atrasos de
desenvolvimento,
constituem hoje instrumentos essenciais de prevenção da DM. Não se
devem alimentar atitudes negligentes como por exemplo : "passa com
o tempo" ; "não é nada, cada um desenvolve-se à sua maneira" ; "Não
se preocupe" ; "deixe lá que a criança logo aprenderá" ou "é preciso
dar tempo ao tempo".
Quanto mais precisa e eficaz for a identificação, tanto mais perfeita
pode ser a
intervenção. As imperfeiçôes numa, tendem a prejudicar a outra, daí a
relação dialética e o cuidado de investigar os dois parâmetros
reciprocamente dependentes, pois
só assim podemos maximizar as oportunidades de desenvolvimento.
A educação de uma eriança DM começa após o nascimento. Não se
pode aguardar 5 a 6 anos para se encaminhar e orientar uma criança
defíciente. Não podemos
perder tempo. É preciso ver, identificar e intervir. Neste aspecto sou
dos que acreditam que é melhor fazer alguma coisa do que não fazer
nada. No campo da Educação
Especial nâo há tempo a perder desde o nascimento.
A rotina rigorosa dos processos de observação e avaliação é urgente
para adotar uma prevenção da DM. Por outro lado, a continuidade da
avaliação e os estudos
longitudinais (follow-ups) dos casos em risco, que são 5% a 10% dos
nascimentos,
exigem um aprofundamento dos instrumentos de identificação,
transformando-os
então em obsrvações mais sutis, especializadas e permanentes, ao
contrário de observações ou avaliações meramente episódicas, com
todos os perigos que tais condições evocam .
A identifieaçâo precoce é uma face da "moeda", enquanto a outra
face se
consubstancia na intervenção precoce compensatória, pois desta
forma mais facilmente se podem promover oportunidades e situações
de crescimento e desenvolvimento harmonioso.
No âmbito da intervenção precoce os instrumentos não são férteis e
as práticas pouco freqiientes. Neste domínio continuamos à procura de
respostas, que naturalmente só poderão ser materializadas na base da
investigação multidisciplinar.
3 .3 - Papel dos pais
Em inúmeros estudos se tem evocado o papel dos pais como um dos
aspectos
cruciais da integraçâo de crianças deficientes: Os estudos têm sido
ricos em sugestões, mas a implementação concreta e objetiva de
medidas preventivas indispensáveis está muito longe de ser abordada.
Há que envolver os pais no rocesso de integração, visto que sâo os
primeiros
agerites da intervenção educacional. É recomendável que os pais
sejam vistos como
co-terapeutas, como primeiros educadores por excelência. A sua ação,
obviamente
coadjuvada por educadores e por especialistas, em equipes
multidisciplinares, deve
constituir um dos primeiros objetivos de um programa de integraçâo. O
esclarecimento, as informaçôes, as atitudes e inclusivamente a
demonstração prática de meios de reabilitação, podem constituir um
primeiro alvo a atinr neste capítulo. A

54
falta de "preparação" ou de "cultura" (?) não podem ser desculpas
para não integrar os pais num programa precoce de integração.
Evitar as tradicionais atitudes de Censura, Compaixão, Conformismos,
de Culpabilização (os "es") e outras mais complexas, como a
indignação, a imobilização
ou o conformismo determinista e destrutivo, através da promoção e
animação de
medidas de consciencialização realista, são meios de combate a
atitudes de resignação e de inércia que urge implementar nos centros
de saúde e em campanhas de
informação e de prevenção nas unidades de saúde e de
desenvolvimento.
Sabe-se que a aceitação deste problema é lenta e demorada,
implicando por isso mesmo medidas perseverantes de esclarecimento
e não apenas medidas intermitentes ou episódicas.
Em muitos e variadíssimos casos, os pais conhecem profundamente
as necessidades dos seus filhos, mesmo sem terem formação técnico-
pedagógica. É preciso
ouvi-los e compreendê-los. A sua consulta e contato constantes terão
de ser características indispensáveis das prioridades programáticas de
integração.

Raramente os defcientes mentais recebem o que necessitam. Até


surgir o
milagre da cura, a educação continua e continuará a ser a primeira
terapia. Por
aqui podemos reconhecer a relevância da intervenção dos pais, o que
por si só justificaria a criação de uma Escola de Pais de Crianças
Deficientes, para além de espaços
e tempos nos mass-média. Em nenhuma circunstância se pode
desencorajar a participação dos pais.
Aqui parece-me conveniente eliminar as concepções erradas sobre a
vida familiar que se vêem exploradas em demasia, em muitos
relatórios médico.psicopedagógicos, com explicações conclusivas e
acriticamente envolvimentalistas, sobre os
problemas familiares das crianças.
Recomenda-se que cada vez mais os professores saibam lidar com os
problemas familiares e com problemas de puericultura e de
desenvolvimento infantil. A
formação neste âmbito parece-nos inevitável. Neste campo da
educação os professores têm que lidar mais freqentemente com
crianças que não se controlam higienicamente, não se vestem, não
comem independentemente, etc.
Disseminar aos pais a informação disponível é outro dos aspectos a
encarar,
para além de estimular a investigação em programas familiares piloto
rigorosamente avaliados quer em aspectos afetivos quer criativos e
multissensoriais.
A hostilidade entre pais e técnicos é prejudicial para as crianças. Os
adultos
deverão dialogar, cabendo aos técnicos a compreensão pelos
problemas dos pais.
Os pais querem ser ouvidos pelos técnicos no que diz respeito às
prioridades da
eriança e quanto à planificação do seu futuro. Não basta equacionar a
educação de
crianças deficientes, é necessário planificar a idade adulta e até
mesmo a terceira
idade. Enquanto os pais vivem, esse problema, com mais ou menos
sacrifício, é
assumido pelos pais, mas depois como será? Quem tranqniliza os pais
face a este
problema? É lícito portanto, que os pais em conjunto com técnicos
planifiquem
o futuro dos seus filhos, claro está, com a cobertura das
responsabilidades que aqui
55
cabem infalivelmente às autoridades, nomeadamente no que toca a
uma política
de segurança social específica (subsídios, pensões, cuidados médico-
sociais, etc).
Os pais estão prontos a aceitar extra-responsabilidades. É preciso
aproveitá-las
convenientemente e lucidamente. Não podemos esquecer que quer
em Portugal,
quer noutros países, tem cabido à Associação de Pais, os primeiros
esforços na cria ção de serviços e de legislação adequada. Mesmo até
no plano pedagógico, verifica mos que muitos pais estâo mais
conscientes das necessidades específicas dos seus
flhos do que muitos técnicos formados à pressa.
É vasto e díferenciado o papel dos pais. O seu apoio e estimulação
para além
da sua função, exigem da parte do Estado, a facilitação de programas
de informa ço, formação e intervenção, na medida em que os
resultados de investigações levá dos a efeito, provam a importância e
a relevância das condições famfliares no pro cesso do desenvolvimento
integral da criança deficiente mental.

3 .4 - Ct.trriculos e programas de intervenção pedagógica

Em muitos manuais e dicionários se encontram afrmações


desencorajadoras
sobre a educação das crianças DM. Por exemplo, num dicionário de
medicina fran cês de 1940 encontramos a seguinte frase : "é inútil
combater a idiotia". Noutros es tudos vamos encontrar igualmente
associações abusivas como a seguinte: "Os DM
são parasitas e predatórios. Eles constituem uma ameaça. Os do sexo
masculino ten dem para a criminalidade. Os do sexo feminino tendem
para a imoralidade."
Educacional e socialmente é preciso acreditar nas possibilidades dos
DM. Não
; os devemos excluir das ações sociais triviais. A lei não pode
perpetuar a sua situaçâo
humilhante. Os DM podem adquirir aquisições muito complexas. Muito
há a fazer
no ãmbito da ciência do ensino.
Toda a criança DM pode aprender.
A aprendizagem ao contrário do que pensam muitos responsáveis,
não depen de só das condições internas inerentes ao indivíduo que
aprende, ela constitui o co rolário do equilíbrio de tais condições
internas (de aprendizagem) com as condições
externas (de ensino), inerentes ao indivíduo que ensina. Como Piaget
nos ajuda a
compreender, a adaptação a situações exige um equilíbrio
e uma organização entre
os processos de assimilação (do exterior para o interior) e de
acomodação (do inte rior para o exterior).
A aprendizagem seqencializada, baseada em avaliações específicas
individua lizadas e em programações curriculares na base dos
princípios científicos do desen volvimento, pode fazer autênticos
milagres. A implementação sistemática de proces sos de modificação
de comportamento encadeados por aproximações sucessivas de
dificuldade e a aplicação de teorias de aprendizagem humana (Hull,
Guthrie, Hebb,
Anokhine, Skinner, etc.), bem como a adoção da análise de tarefas, e
de objetivos
baseados de acordo com o potencial de aprendizagem do educando
podem produ zir efeitos imprevisíveis em termos de aprendizagem. A
aprendizagem é o reflexo do
ensino. A qualidade de uma é o produto do outro. A otimização da
aprendizagem
subentende a otimização dos recursos humanos e didáticos do ensino.

56
Os currículos a criar terão de assentar em teorias do desenvolvimento
(Sheridan, Piaget, Wallon, Myklebust, Khepart, Beuton, Ausubel, etc.) e
não em especulações filosóficas. O currículo, não podendo ser um livro
de "receitas", deve conter
as bases científicas do desenvolvimento, não esquecendo, como Itard,
a importância
dos períodos críticos.
O conhecimento detalhado e pormenorizado das seqnências de
desenvolvimento em várias áreas é imprescindível. Vejamos a título
informativo as áreas de
desenvolvimento mais importantes, segundo vários autores:
1 - Sheridan
Aquisições motoras globais
Aquisições visomotoras
Aquisições auditivo-verbais
Aquisições sociais
2 - Gunzburg
Auto-suficiência
Comunicação
Ocupação
Socialização
3 - Myklebust
Comportamento pessoal-social
Coordenação
Orientação
Compreensão auditiva
Linguagem falada
A intervenção precoce nestas áreas do desenvolvimento é uma forma
de prevenção. As situações a criar e os materiais a desenvolver podem
constituir uma ajuda
importante, facilitando aos DM a aquisição de comportamentos
funcionais e adaptativos.
Na intervenção várias fases poderão ser respeitadas:
1- Identificação
2 - Implementação do currículo
3 - Avaliação do progresso
4 - Adoção do sistema de reforços
5 - Planificação das tarefas
6 - Seqnencialização dos objetivos
7 - Avaliação do programa total
Tradicionalmente em pedagogia e muito principalmente em educação
especial, quando o educando não aprende é considerado incapaz,
indiferente ou desmotivado. A minha perspectiva é pensar se o
educando não aprendeu é porque algo de
errado se passou ou faltou à situaÇão de ensino, conceito este onde se
fundamenta a
dispedagogia.
57
A orientaçâo pedagógica atualizada inclina-se para a adoçâo da
análise de tare fas (task analysis), baseada nos seguintes princípios:
1- inventário dos comportamentos adaptativos e intra-individuais;
2 - subdivisão das situações de aprendizagem nos seus componentes;
3 - organização seqencial das tarefas;
4 - aproximação sucessiva dos objetivos;
5 - especificação de comportamentos;
6 - arranjo por ordem de complexidade ;
7 - estruturação de subtarefas até atingir o comportamento final,
evitando o
insucesso. As situações terão de ser construídas de degrau em degrau
até atingir o
comportamento desejado, isto é, o acesso à aprendizagem.
A análise de tarefas surge como uma metodologia de intervenção
válida para
as situações ideais de aprendizagem e para as situações de insucesso,
só que aqui se
torna necessário identificar o mais depressa possível onde se operou o
comporta mento desviante da curva de aprendizagem normal. A
identificação dos comporta mentos adaptativos (as tais condições
interiores) subentende um processo de obser vação pedagógica
(diagnostic teaching) que nos leva facilmente a um perfil intra-in
dividual com áreas fortes e fracas. A partir deste perfil, rapidamente se
podem ado tar os principins da análise de tarefas, isto é : faseamento
de objetivos, seqiiencializa COMPLEXIDADE DAS TAREFAS
(Estnxturação das tarefas. Tomo em consideração as condições
extemas ínerentes ao educador.) Objetivo
8h
7 Fíg. - ANALISE DE TAREFAS
Aquisições Numa sítuação ideal em que o educando
segue com sucesso o currículo. B
complexas
6f

5
Aquísições I e
compostas Fases
4d
3c
Níveis
2I
Aquisições b

Nfvel 1 2 3 4 5
678
íntra-índividual SEQZlNCIA NA APRENDIZAGEM
dt aptiddes (Nó de aulas - toma em consideração
as condições intemas inerentes ao e ducando.)
58
COMPLEXIDADE DAS TAREFAS

Aquisições
complexas
Aquisições
compostas

Aquisições
simples

Fig. - ANALISE DE TAREFAS SEQllÉNCIA DA APRENDIZAGEM


Numa situação em que o educando
segue com insucesso o cunículo.

ção das tarefas; estruturação das subtarefas até atingir a mudança de


comportamen to etc., com base nestes princípios, poder-se-á criar um
programa educacional indi vidualizado (PEI) através de situações que
possam permanentemente levar o educan do ao sucesso, condição
motivacional imprescindível ao êxito e à eficacidade do
programa.
Evitar tanto quanto possível o insucesso ao educando. Embora seja
inevitável,
o problema pode ser superado com um currículo mais lento, mais
simples e mais es truturado. Pode-se com base na análise de tarefas:1)
"olhar para trás"; 2) perceber
o problema; 3) construir novas seqnências; 4) subdividir a tarefa
subtraindo-lhe
complexidade, etc.
O curriculo total em DM em todas as suas áreas: auto-sufieiência e
indepen dência, comunicação, motricidade global, linguagem falada,
discriminação percepti va visual e auditiva, psicomotricidade, jogo,
aquisições cognitivas, leitura, escrita,
cálculo, artes e ofícios, aquisições sociais (relaçôes humanas ou
responsabilidade cí vica), etc., ter-se-á que orientar na linha da análise
de tarefas, pela simples razão do
insucesso gerar frustração, confusão, desinteresse,
desvalorização, etc.
A análise de tarefas é um sistema de observação e de avaliação de
acordo com
o desenvolvimento do educando, evitando colocá-lo em tarefas
demasiado difíceis
(frustração) ou demasiado fáceis (desinteresse).

59
Qualquer currículo terá que respeitar o nível de aptidão individual de
cada
educando, ou melhor, terá que se adequar ao seu perfil intra-
individual, pois dessa
forma os objetivos a atingir partirão de uma base concreta e não
abstrata ou arbitrária.
O perfil evolutivo global que resulta deste sistema procura atingir:1)
uma visão global e evolutiva do educando e do currículo ; 2) uma base
do progresso ; 3)
uma ajuda para a planificação de atividades; 4) uma íntervenção
pedagógica que respeite o perfil psicológico do educando, impedindo
assim a dispedagogia; 5) uma
mais adequada consciencialização das necessidades das crianças, etc.
Dos perfis evolutivos globais podemos chegar aos perfs evolutivos
específicos das várias áreas do
currículo e assim conhecer, controlar, e transformar a aprendizagem
da criança DM.
De uma forma pragmática, podemos reduzir os objetivos da
intervenção pedagógica na DM aos seguintes parâmetros:
1 - Facilitar as aquisições cooperativas e interativas, daí a importância
da dinãmica sócío-pedagógica (relações entre a instrução grupal e a
programação individual);
2) Facilitar a habituação com mais tempo investido nas atividades e
com menos transições entre elas;
3) Introduzir mais tarefas funcionais do que artificiais (currículo
natural, isto
é, do concreto);
4) Variar as atividades de uma forma sistemática;
5) Proporcionar aprendizagem extracurricular e extra-escolar (garantir
amplos contatos com o meio);
6) Selecionar atividades favorecidas, não esquecendo o grande e
significativo
papel do jogo ;
7) Clarificar os objetivos imediatos e mediatos;
8) Proporcionar o acesso constante ao sucesso;
9) Adotar a intervenção precoce, dado saber-se que as crianças
aprendem mais
fácil e rapidamente nos primeiros momentos de desenvolvimento
(importância da
identificação precoce e da educação pré-primária);
10) Criar formas de programação educacional individualizada com
registros e
revisões diárias das atividades desenvolvidas;
1 I ) Implementar programas de coordenação entre a familia e a
escola, entre
os pais e os professores;
12) Mínimizar o comportamento de dependência e aumentar o poder
de iniciativa e sentimento de integridade.
Por esta listagem vemos bem quão longe nos encontramos de
proporcionar
aos DM condições de aprendizagem. Os DNlpodem aprender mais do
que se pensava
e pensa, desde que recebam uma intervenção apropriada e
sistemática num envolvimento o menos restrito possivel.
Um bom programa educacional faz no concreto a grande prevenção
dos efeitos secundários da DM. Pode combater a institucionalizaçâo, o
caos familiar, a desintegração e a marginalização do trabalho e do
tempo livre.
Em esquema :

60
134
Avaliação do
CURRÍCULO - de Formulação de Aquisíção de
TOTAL aptidões objetivos independência
inua-individuais
Avaliação da Perfil das Aptiddes Informação
eficácia da inter- áreas fortes Reforços e Recursos
venção pedagógica e fracas

Determinar as necessidades Previsão e


específicas das crianças racionalização
i D.M. de hipóteses

- INTERVENGAO PEDAGbGICA
Para se atingir resultados mínimos, não podemos esquecer que a
variável mais
significativa da intervenção pedagógica é o professor. O professor no
campo da DM
tem que exercer funções de coorderiador interdisciplinar; gestor de
recursos huma nos e materiais; organizador científico de estações de
aprendizagem; criador, pródu tor e disseminador de currículos, de
programas, de equipamento, de material, de
dispositivos tecnológicos, etc.
De fato, o professor neste campo, e no da Educaçâo Especial em
geral, terá
que assumir a função de um sintetizador de informaÇão, para
incorporizar a infor mação de médicos, psicólogos, terapeutas e
especialistas, etc., em estratégias educa cionais efetivas. A interação
produtiva com especialistas é fundamental. O respeito
e a acessibilidade mútua entre especialistas e professores é urgente,
as perguntas e as
simplificações léxicas terão que circular para bem das crianças DM.
A formação dos professores, ponto quente entre nós, não pode
continuar na
, mão de curiosos que nunca tiveram prática com DM. As especulações
histórico-filo sóficas deverão dar lugar a experiências e a
demonstrações práticas com casos. As
unidades de conteúdo terão de ser menos generalistas e
envolvimentistas. Face às
correntes mais atualizadas de formação de professores, recomenda-se
a experiência
de casos com recurso a análises críticas resultantes de observações e
de reflexões nos
seguintes domínios: Teorias do Comportamento (Epigênese da
identidade - Erik son; Mudança de comportamento - Bandura; etc);
Modelos de Desenvolvimento
(Piaget, Guilford, Kephart, Sheridan, Wallon, Frostig, Luria, etc.);Análise
de Tare fas, Desenvolvimento de Curriculos (percepção Auditiva e
Visual, Pré-aptidões da
leitura, da escrita e da matemática, etc.); Obserlaç'ão e
CaracterizaÇão Psieopedagó gica; Sistemas de registro; Análise,
Frogramaão e Controle do Ensino, etc.

61
Tudo isto só é possfvel, como é óbvio, com uma formaçâo
universitária, dado
que os DM, por razôes específicas, exigem maior competência
científica ou pedagógiea dos seus professores.

3 .5 - Desinstitucionalização
A tendência internacional aponta para uma inclusão progressiva nas
escolas
públicas. Estas são o local lógico para começar a servir as crianças DM.
A lei terá de ser clara quanto à criação da igualdade de oportunidade
quer no
âmbito familiar, quer escolar, laboral e social.
Os programas das escolas públicas terão de aceitar a
heterogeneidade das crianças. Há que criar novos currículos, novas
atitudes, novas facilidades, novos equipamentos, novos materiais
didáticos, novas redes de transporte, etc.
Sabe-se através de estudos longitudinais estrangeiros, que a escola
pública é
mais benéfica para os DM.
A escola pública é o local ideal para todas as crianças. A escola
pública deve
merecer mais apoio ofcial, terá que ser mais atrativa e agradável, mais
bem equipada e inovadora. Há que ver as alternativas adequadas.
Desde o desenvolvimento e a
planifcaçâo dos currículos até à criação de equipes pedagógicas locais
e regionais,
para além da assistência técnica às escolas regulares muito se terá de
fazer no futuro
para integrar todos os deficientes.
A remodelação administrativa, a criaçâo de centros de recursos, a
mudança de
atitudes, a cooperação planificada de especialistas, o apoio da
Universidade, a organização institucional da escola,a redefiniçâo de
funçôese de responsabilidades,etc.,
são em si medidas de desinstitucionalizaçâo da deficiência que urge
criar no sistema educacional. É nos ambientes menos restritivos, e
como tal, nas escolas públicas,
que se encontram as condições favoráveis a um desenvolvimento
harmonioso a que
todas as crianças, deficientes ou não, têm direito.
Tanto quanto possível teremos de evítar as colocaçôes institucionais,
devendo
aliás travar as admissões. Há que devolver à sociedade o maior
número de cidadãos
restituindo os individuos à comunidade normal. Trata-se de um direito
humano.
Nunca mais se desenvolvem programas de integração se os DM
continuarem esquecidos, isolados e "protegidos".
Os defcientes deveriam ter aliás o direito de prioridade, daí a
necessidade de
aumentar os cuidados àqueles que mais necessitam, através de
medidas de "integração máxima possível", a iniciar obviamente na
escola pré-primária e primária. Está em causa a dignidade humana, daí
a premência de açôes de desinstitucionalização,
aumentando a qualidade de vida, a saúde, a educação ao nível local,
dando às comunidades um papel inovador e transformador no sentido
cultural mais amplo. A falência das instituições é inevitável, é
simplesmente uma questão de tempo...
Há que acabar com a exclusão dos DM, porque no fundo, as práticas
segregacionistas revelam uma atítude lamentável de ignorância sobre
o verdadeiro potencial humano dos DM.
Surge um novo desafo, é preciso reexaminar o mental na deficiência
mental.

62
A palavra de ordem é a otimização da normalização dos DM. Há que
garantir
ao DM a vivência e a convivência, bem como o trabalho e o tempo livre
compatíveis
com o seu potencial de aprendizagem.
O DM é um cidadâo de todo o respeito, é um cidadão de primeira. Os
DM fazem parte da infinita variedade da raça humana.
O deficiente é gente. A sua educaçâo é uma parte do sistema
educacional, e
nâo uma ação à parte dele. Os DM têm o pleno direito de viver, jogar e
aprender
com os outros. A educação dos não deficientes e dos deficientes deve
ser feita em
conjunto e não à parte.
É preciso de uma vez para sempre acabar com a situação humilhante
e desumana de impor normas de rendimento através das quais uns
são selecionados e outros sâo rejeitados... Em termos de educaçâo
ninguém pode ser excluído ou marginalizado.
O DM tem um desenvolvimento cognitivo. O desenvolvimento mental
e não o
atraso mental é em si a finalidade própría de qualquer sistema
educacional. Teremos
que evoluir da semidependência à semi-independência.
O pensamento a adotar face aos DM terá que ter um alicerce
educacional. Já
muito se evoluiu desde o interesse pelas causas até à descrição dos
diferentes tipos
de DM. A questão de futuro é a educabilidade máxima do potencial
intelectual de
todo o cidadão, que por definição só o é quando integrado social e
humanamente.

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64
4

A modificabilidade conitiva na

educaão especial e na reabilitação


O enfoque da minha exposição visa, em primeira instância, defender o
dúeito
à educação e à reabilitação, que cabe a todos os seres humanos
deficientes sem exceção.
Sabemos que muitos obstáculos terão de ser superados se nos
propusermos a
pôr fim ao incrível isolamento com que muitos especialistas tém
trabalhado no passado nestes domínios. Médicos, psicólogos,
sociólogos, educadores, terapeutas, investigadores, políticos, ete.,
terão de desenvolver esforços no futuro, com a finalidade de
materializar e implementar uma ampla e dinâmica
interdisciplinaridade, nâo
só para compreender a diversidade e a variedade humanas, como
também para educar, reabilitar e integrar todos os que apresentem ou
revelem necessidades diferentes.
Educação e reabilitação é tudo o que permite ao indivíduo aprender e
reaprender novas aquisições, novas competências e novas atitudes.
Tudo o que o possa
ajudar a crescer, desenvolver e readaptar. Sem educação e
reabilitaçáo, os deficientes nâo poderão atingir uma vida de valor e de
significado humano. Programas educacionais e reabilitativos adaptados
fazem a diferença, entre uma vida gratificante e
qualquer coisa muito inferior àquilo que possamos pensar que a vida é,
ou deva ser.
As sociedades civilizadas não se podem contentar em dar assistência
aos deficientes, pois assiste-Ihes o direito fundamental de optimizarem
e maimizarem os
seus potenciais habilitativos e cognitivos Se os serviços educacionais e
reabilitativos
falharem nesta obrigação social, cada vez mais se deficientarão os
deficientes, impedindo-os de contribuírem ativa e produtivamente para
a vida da comunidade onde
devem estar inseridos.
65
A presença de uma deficiência, de uma dificuldade ou de uma
desordem,
qualquer que seja a sua severidade, nâo deve alterar a necessidade de
respeitar a dignidade e a valorosidade humanas dos deficientes.
Educá-los e reabilitá-los, é uma luta pelos direitos humanos, que se
deve impulsionar com abnegação e determinação. A abordagem
ambivalente e passiva do
passado, temos de contrapor uma abordagem ativa e transformadora
no futuro. A
deficiência não é uma condiçâo fxa, inalterável ou imutável.
O indivíduo defciente está aberto à modificabilidade do potencial
habilitativo e cognitivo.
Yejamos em sinopse histórica como foram atendidos os deftcientes, e
como
foi perspectivada a noção de inteligência e de cogniÇão, através dos
tempos.

1- Preformismo

No Homem primitivo, o deficiente foi visto com superstição e


malígnidade.
Em Atenas, os deficientes eram abandonados em locais
desconhecidos, para aí ficarem sujeitos à implacável determinação da
luta pela sobrevivência. Esparta, aplicou
aos deficientes o processo de seleção mais desumano e arbitrário que
há memóría.
Os Ronzanos, mais tolerantes, adotam os deficientes para os exibirem
em festividades suntuosas. O C5'istianismo, encarou-os com piedade e
compaixão (1).
Durante este período a noção de inteligência foi encarada dentro da
concepção preformista.
A inteligência foi entendida como preformada, tirando ao meio
qualquer influência no seu desenvolvimento. A inteligência na criança
foi vista como uma miniinteligência adulta e divinamente predestinada
(28). Os principais proponentes desta concepção foram Pfatão e
Aristóteles. O primeiro advogava que a inteligência era
reservada aos flhos das familias superiores. O segundo defendeu que o
centro da inteligência estava no coraçâo e nâo no cérebro.
Em plena Idade Média, os deficientes ora sâo encarados como
"crianças de
Deus" ou como "bobos da Corte", ora são perseguidos, esconjurados
ou apedrejados por serem portadores de possessôes demoníacas. A
Arte desta época foi pródiga
em representar e ilustrar tais atitudes (1).
Na Reforma, a negligência pelos deficientes foi marcante. Lutero e
Calvino,
referem-se aos deficientes mentais como indivíduos possuídos
por Satanás.
Efetivamente, só no século XVII as organizações religiosas de Sâo
Vicente de
Paulo e das Irmãs da Caridade iniciam a assistência aos deficientes.
Atitude diferente, contudo, vem da cultura oriental, onde Confúcio,
talvez
pela primeira vez, reclama a responsabilidade da sociedade "para
tratar dos que não
podiam fazê-lo pelos seus próprios meios".

2 - Predeterminismo

Durante séculos a concepção preformista da inteligênáa prevaleceu


como dominante. Com Rousseau (1712-1778), esta concepção de
inteligência passa a ser

66
substituída pelo predeterminismo, concepção que se perpetua até aos
princípios do
nosso sbculo, fundamentalmente com as idéias pedagógicas de
Pestalozzi (1746 1827) e de Froebel (1782-1852).
A noção de cognição 6 então perspectivada já em termos qualitativos,
reco nhecendo aqui o papel do meio, mas apenas numa dimensão
negativa e neutral 2 ,
31
A inteligência da criança foi aqui entendida como diferente da
inteligência do
adulto, mas dela exclusivamente dependente em termos de inatismo.
As concepções naturalistas e genéticas da inteligência, emergem
deste prede terminismo extremista.
Pensadores como Kant, Erasmo, Spinoza e Descartes referem-se à
inteligência,
(ou melhor, ao "espírito" e à mente") como um sentido interior e
oculto, bem co mo um desiderato de Deus, chegando o último destes
filósofos a localizá-la na glãn dula pineal 5 . Na Renascença, Leonardo
da Vinci localiza a inteligência nos três
ventrículos cerebrais 24.
A inteligência foi assim perspectivada como pré-programada e auto-
regulada
endogenamente, mais tarde traduzida em termos de maturação
biológica indepen dente. A controvérsia desta posição reducionista,
mantém-se ainda nos nossos dias,
influenciando obviamente o pensamento humano nas últimas
décadas, pois autores
como Carmichael 6 Mussen 2 6 e Gesell 1 defenderam tais idéias 12 .
Outros porém foram mais longe, como Jensen 20,21 e Hernstein ls,19,
que
defendem que as características intelectuais do indivíduo dependem
quase exclusi vamente da estrutura genética herdada. A Inteligência
foi definida, então, como ge nótipo.
Continuando este resumo histórico, deve-se ao espanhol Pedro Ponce
de Leon
(1520-1584) a críação da primeira instituição para deflcientes
auditivos. Em Paris,
Valentim Hauy (1745-1822) abre a primeira escola de cegos.
Em 1799 descobre-se em Aviron uma criança-lobo adotada com o
nome de
Vitor e trazida para Paris por Philippe Pinel (1742-1826), que a
diagnosticou como
idiota, termo este, de origem grega, que quer dizer simplesmente
peculiar e diferen te 1, (termo mais tarde também utilizado por Binet4
e por outros autores, para já
designar crianças com o quociente intelectual mais
baixo).
3 - Envolvimentalismo

Com Vitor, nasce talvez, a primeira tentativa para educar e


modificabilizar o
potencial cognitivo, devendo-se a Jean Gasparltard (1775-1838) o
primeiro esforço
e estudo sistemático de reabilitação de uma criança subnormal31.
Itard convenceu se que o problema do Vitor se consubstanciava na
falta de uma estimulaçâo senso rial na sua infáncia, defendendo assim,
uma concepÇâo envolvimentalista da inteli gência2 s
0 envolvimentalismo representa uma concepção oposta ao
predeterminismo.
Basicamente respondeu a um extremismo com outro extremismo.
Nesta concepção

67
' a hereditariedade e os fatores biológicos pré-estruturados do sistema
nervoso são mi nimizados em relação aos fatores do meio, aqui
supervalorizados. Trata-se de uma
perspectiva nascida do pensamento de Locke (1632-1704J, que surge
como defen sor da fllosofia da "tábua rasa " Esta corrente nasceu da
idéia errada que o cérebro
humano no nascimento está em braneo, ignorando-se a importância
da embriogêne se e a sistemogênese. Nesta concepção os fatores
siTuacionais e extrabiológicos são
reforçados. O envolvimento é o fator predominante no
desenvolvimento da inteli gência. O que conta é a herança social e
cultural. A inteligência não é mais do que o
produto do meio. Estamos no envolvimentalismo utópico e ortodoxo,
entramos no
Humanismo Pedagógico, no Determinismo Cultural e no Behaviorismo.
Itard, ajuda-nos a compreender as limitações desta concepção.
Desenvolvendo
um extenso programa de estimulação sensorial, aquele médico-
pedagogo pensou que
seria possível, aos doze anos, ensinar o Vitor a falar, a ler e a escrever.
Com grande
desânimo seu, tal não foi possível, independentemente do seu
trabalho ter sido re conhecido pela Academia Francesa das Ciências,
por efetivamente se ter verificado
na criança grandes modifcações de comportamento sócio-emocional :
exibia condu, tas sociais de auto-suficiência, seguia direções verbais,
compreendia o significado de
algumas palavras concretas, discriminava e manipulava objetos,
identificava letras,
mas não falava, não lia nem escrevia 1.
Itard enganou-se, pois estava ainda longe da compreensão da
inteligêncin sim bólicaz z ,z 3 aquela que é necessária para falar, ler e
escrever.
O acesso ao simbolo, não depende só da exposição a condições
exteriores ou
a estímulos, como aquele autor supôs9,1o. Por isso, a estimulação
sensorial com pensatória, em qualquer período do desenvolvimento
não basta para o integrar e
utilizar.
A inteligência simbólica resulta da transformação da informaçâo,
integrada e
reorganizada em períodos precisos do desenvolvimento 15 ,16 . Aos
doze anos Vitor
de Aviron já nâo dispunha de interconexôes sinápticas livres, pois
sabe-se hoje que
as interconexões sinápticas terminam o seu crescimento intra e
interneurossensorial
por volta dos dez anos3 . Com Vitor, e obvíamente com muitos outros
Vitores pri vados de "imprinting social" apercebemo-nos gue a
inteligência humana não depen de só de condições do envolvimento,
pois ela encerra igualmente uma pré-estrutura
interna, uma filogênese e uma ontogênese mui'to complexasl3,16.
Está provavel mente aqui o segredo ou o êxito do novo movimento da
Educação Especial e da
Reabilitaçâo, isto é, a importância da Identificação e da Intervençâo
Precocesl4.
Voltando à nossa resenha históríca da cognição, a Itard segue-se o seu
discí pulo, Eduard Seguin (1812-1880), que desenvolveu as idéias do
seu mestre e de ou tro vulto muito importante, Jean Esquirol (1772-
1840), grande estudioso das desor dens emocionais e intelectuais, e
talvez o primeiro autor a distingui-las e a diferen ciá-las.
Seguin desenvolve, na França e maís tarde nos Estados Unidos, o seu
conheci do e divulgado método fisiológico de tratamento e o seu treino
sensório-motor que
se tornaram métodos clássicos de intervenção em muitas escolas e
instituições de
68
deficientes mentais, só continuados posteriormente pela escola
sensorial de Montessori.
Os defcientes vistos como "não desejados" e "nada atraentes
fisicamente",
viveram encerrados, durante quase todo o século XIX em instituições-
prisão, autênticos "ghetos", "depósitos" e "reservas" de segregados.
De 1900 à década de 70, o movimento da escola pública cria as
famigeradas
classes de ` ánormais ", fase que se inicia com a categorização e
classificação dos deficientes mentais que resultam da aplicação da
famosa Escala Métrica de Inteligência
criada por Binet e Simon em 19054.
É destes autores, e muito dos seus continuadores, a concludente
afirmaçâo:
"a Inteligência é aquilo que mede a nossa escala ' :
Independentemente do avanço científico desta proposta, os testes de
inteligência redundaram em predições prefecionistas imutáveis e
estáticas, com frágil reflexo no desenvolvimento do potencial cognitivo
das crianças defcientes e na organização e administração da Educação
Especial e da Reabilitação9.
A categorização emergida do Quociente Intelectual (QI tornou-se
irrelevante
em termos educacionais, não especificando nem as estruturas
cognitivas (esquemas
de ação, imagem, símbolos, conceitos e regras), nem os processos
cognitivos (percepçâo, memória, compreensão, formulação,
rechamada, planificação, regulaçâo e
implementação da informação integrada), que lhe dão significação2 2 .
Porque se chegou a um resultado, assumiu-se encantatoriamente que
se media
numa entidade constante e infalível e perdeu-se progressivamente,
toda a pertinência da informação educacional e reabilitacional 11.
4 - Interacionismo

Continuou-se durante este período conseqnentemente com a criação


de instituições especializadas para deficientes visuais, auditivos e
mentais, envolvimentos
estes, que muito lentamente, se têm vindo a tornar cada vez menos
restritivos. Porém, as seqnelas catastróficas das duas Guerras
Nlundiais criam novos movimentos e
novaseoncepções34.
Surge então o limiar de uma nova concepção da inteligência: O
interacionismo. Aqui a hereditariedade não se opõe ao meio, os fatores
biológicos são condição
vital e influenciam-se mutuamente com os fatores sociais33. Ambos
interagem entre
si. A evolução duns fatores é a evolução doutros, entre eles não há
uma relação de
dependência. A inteligência lida com o biológico e com o social, como
se fossem
uma unidade na mesma dialética que o fator da nutrição. Novas
concepções sobre a
inteligência nascem. Pavlov25, Freuds Wallon33, Leontiev25,
Vygotsky32, Ausube?2, Cattell, Piaget2, Fuerestein9,loe muitos outros
trazem uma nova esperança
aos deficientes. A inteligência e a cognição são vistas como o produto
acumulado e
modificabilizado de inter-relações entre a hereditariedade e o meio.

69
I Independentemente deste movimento inovador, o avanço da
psicometria e da
categorização da deficiência foi-se instalando e requintando, com a
democratização
do ensino culminando na criação de uma nova categoria, as
Dificuldades de Apren dizagem, à qual se associa o Insucesso Escolar,
com inevitáveis conseqnéncias no sis tema escolar e no sistema sócio-
cultural e sócio-econômico.
As classes especiais e as classes de apoio entram no palco das
alternativas edu cacionais. Maís recentemente a era da Integração lutá
pela Interação (não deficiente deficiente) e pela Individualização,
criando programas educacionais e reabilitativos,
criando um novo desafio ao Sistema de Ensino, e obviamente, um
novo conceito de
inteligência 1.

5 - Modificabilidade cognitiva

À política "longe da vista, longe do coração" vem progressivamente


contra por-se uma política "perto da vista, perto do coração" 1.
Os exemplos de Helen Keller, Edison, Einstein e de muitos outros seres
hu manos repetem-se e estimulam a comunidade científica. O Ensino
Especial é um in dicador fidedígno das sociedades desenvolvidas . . .
A diversídade cultural e social começa a lançar uma nova filosofia
educacional
e reabilitacional para os deficientes. Da homogeneidade ortodoxa, a
Humanidade
vai aceitando uma heterogeneidade tolerante. A semelhança
indiferenciada dá lugar
à semelhança diferenciadal .
A uniformidade cultural e a normalidade ideal, verdadeiros dogmas
seletivos
e reprodutivos, só podem ter paralelo em conceitos de inteligência
rígidos e cristali zados5 . Tais conceitos passam a ser cada vez mais
questionados.
O futuro da Educaçâo Especial e da Reabilitação passa a ser a
restituição da
criança e do adulto às situações de normalização, quer na escola, quer
no traba o 1 i
Para avançarmos neste objetivo temos que ter outra perspectiva do
potencial
cognitivo dos deficientes.
A modificabilidade cognitiva surge no horizonte9. A experiência
precoce, a
funçâo aditiva informadora, formadora e transformadora do córtex
humano é de masiado rica para se perder. A não ser em
condições muito severas, onde entram fa tores defectológicos
genéticos e orgânicos, (onde só as medidas de prevenção se jus
tificam) o deficiente está aberto à modificabilidade cognitiva em vários
estádios do
seu desenvolvimento, fundamentalmente nas mais precoces.
Temos que aceitar que é possível mudar a estrutura cognitiva do
deficiente.
Por definição, não há nem pode haver deficientes ineducáveisl4. Por
efeitos da edu cação e da reabilitação precoces, podemos transformar
o defciente num ser autôno mo, independente e capaz de
aprendizagem e elaboraFão ideacional.
Aprender a aprender é possível também nos deficientes. Por mais
condições
adversas que se levantem, o organismo humano é um sistema aberto
e sistêmieo e
como tal, a inteligência só pode ser concebída como um processo
interacional, flexí vel, plástico, dinâmico e auto-reguladol o.

70
As estruturas constitutivas da cognição para Piaget iniciam-se por
ações concretas (inteligência sensório-motora); desenvolvem-se lógica
e representacionalmente
(inteligência operacional) e transformam-se em abstrações
(inteligência formal)z .
Quanto a nós a inteligência é o maior atributo humano, é o ponto
fulcral da
aprendizagem e da adaptação psicossocial. Se desejamos
efetivamente maximizar e
modificabilizar o potencial cognitivo dos deficientes, não podemos
deixar de estudar tal atributo, não podemos deixar de pensar no
pensar.
Independentemente dos grandes méritos dos contributos de Binet4,
Terman3o, Spearman29, Wechsler3ó e tantos outros, pouco se avançou
na intervenção
terapêutica e psicopedagógica, quer na Educação Especial quer na
Reabilitação.
Concordamos com Fuerestein 1 o quando afirma que o estudo da
cognição e
da sua modificabilidade tem sido subestimado pela relevância de três
linhas de pensnmento que têm tido grande influência na psicologia e
na educação contemporâneas.
São elas a Psicanálise, o Behaviorismo e a Psicometria.
A Psicanálise defende a idéia de que a inteligência, e como tal o
comportamento, é largamente determinada por fatores não
intelectuais, fatores esses inconscientes e de raiz emocional. Para
muitos autores desta linha como Freud, Adler e
Jung, a cognitividade resulta de processos emocionais e irracionais
baseados no princípio do prazer. A ênfase durante muitos anos foi
posta na preponderância dos processos emocionais, à custa da
minimização dos fatores cognitivos, em vez de se reconhecer que as
dificuldades cognitivas e as emocionais produzem efeitos mútuos
e concomitantes. Pretendeu-se entrar por análise interior na
organização funcional
do pensamento ("black box"; "espírito", "mente", etc.,) por uma via
unidimensional de verbalização, verbalização essa, a que muitos
deficientes não têm acesso. O
acento tônico foi colocado nos fatores emocionais e na
modificabilidade, enquanto
os fatores cognitivos foram negligenciados, não reconhecendo
inexplicavelmente
aqui que estes podem também ser sujeitos à modificabilidade. A
influência desta
corrente de pensamento na educação foi e continua a ser muito
grande, especialmente no ensino pré-primario e primário, e
naturalmente também no ensino especial.
O "Behwiorásmo" (do inglês "behavior" que significa,
comportamento),
emerge como reação ao excesso de introspecçâo da psicanálise. Como
corrente de
pensamento, representa para a psicologia o expoente máximo das
concepçôes envolvimentalistas.
Só os comportamentos diretamente demonstráveis foram
reconhecidos como
tendo valor científico.
John Watson (1925) é o seu grande impulsionador. Dele é conhecida a
seguinte afumação: "Deêm-me doze crianças saudáveis, bem
desenvolvidas e eu lhes garanto, que com o meu envolvimento
específico posso tornar qualquer uma delas, ao
acaso, num especialista: médico, advogado, artista, comerciante,
ladrão, etc., independentemente dos seus talentos, peculiaridades,
tendências, capacidades, vocações
ou raça dos seus progenitores" 3 5 .
A função cognitiva foi assim, concebida como resultado de
associações e conexões entre estfmulos controláveis, como únicas
fontes de informação, e respostas

71
observáveis e mensuráveis. O enfoque desta corrente, e no fundo de
inúmeras teorias de aprendizagem, como as de Thorndike, Hull,
Guthrie, Tolman, Lewin, Skinner e muitos outros, foi centrada nos
produtos da cognição em vez de reconhecer e
de atuar ou intervir, ao nível dos processos que governam e
estruturam a natureza
das respostasl z. Como o ser humano pensa ou raciocina não
interessou saber a esta
corrente de pensamento. O comportamento humano, para o
"behaviorismo", era
apenas o produto do principio de associaÇâo, entre estímulos e
respostas. Como conseqnência, e durante muito tempo, os resultados
da psicologia experimental daqui decorrentes, foram irrelevantes para
a educação e para a reabilitaçâo, justificando-se
aqui, como de novo afirma Fueresteinl o, a aceitação da teoria
psicanalítica por parte dos educadores.
Mais recentemente os modernos behavioristas avançam com uma
corrente
muito importante, a modificação de comportamento, idéia esta que
surge com as
teorias de reforço, com a aprendizagem programada e com os
computadores de ensino, mas que persiste em evitar o estudo das
operações mentais que presidem à programação de qualquer conceito
ou aquisiçâo (Skill).
Por último, a Psicometria, a terceira força a contríbuir para a limitada
compreensão da modíficabilidade cognitiva, dando origem à testologia
na psicologia e
na educação.
A psicometria centrou-se na predição e na quocientização do potencial
intelectual. Com os avanços estatísticos o QI torna-se imutável,
infalível e constante. Ao
medir o nível de realizaçâo (performance), o QI baseia-se
fúndamentalmente nas
características mentais, que são mais constantes no desenvolvimento.
Nâo vale a pena aqui ilustrar o tremendo impacto que teve o QI na
educação e na reabilitação. A
educabilidade e a treinabilidade do potencial intelectual porém,
ficaram cada vez
mais estagnadas. A pura descrição quantitativa de provas com forte
componente sócio-cultural, transformou o QI num regulador do sistema
escolar e ocupacional e
num indicador da competição e hierarquizaÇão social. Daqui se
atingem as meritocracias intelectuais e se justifcam vários "status quo"
sociais.
Os testes de inteligência evoluíram reassegurando a sua perfeição, só
que nâo
se tornaram tão úteis à educação e à reabilitação como se
esperava. Em certa medida o QI não curou nem cura a "doença" que
se supôs, na sua origem, vir a tratar.
O QI como instrumento psicopedagógico ainda nâo dá soluções
satisfatórias
para compreender a função cognitiva, embora apresente um grande
potencial para
essa finalidade. Como preditor absoluto é suspeito, porque assume
pela dependência de normas etárias (idade mental) que os sujeitos
observados tiveram idénticas
oportunidades, o que é difícil de provar.
Como podemos ultrapassar este problema da modificabilidade
cognitiva e da
mutabilidade da inteligência? Como podemos vir a ter uma maior
esperança no futuro dos deficientes, que poderão ser nossos fzlhos ou
nossos familiares?
Quatro estratégias fundamentais, quero propor, para terminar esta já
longa exposição.
ló) llludar a perspectiva passiva e negativa da educação e reabilitação
dos
deficientes. Lutar pelos direitos humanos, pelo aumento da educabili
72
dade individual e pelo aumento da produção social, é uma experiéncia
ativa e positiva.
2ó) lvludar os objetivos educacionais e reabilitativos através de novos
progra mas e curriculos de intervençâo e de facilitaçâo.
3ó) ltludar os meios de prevenção, identificação precoce e de
diagnóstico,
visando a modificabilidade cognitiva e habilitativa do individuo defi
cien te.
4ó) tLludar as instituiçôes implementando progressivamente a
integração dos
deficientes, restituindo-os à comunidade.
De fato, cada vez há mais necessidade de lutar contra a tradicional
exclusão
dos deficientes.
Eles devem estar cada vez mais perto da nossa visão, do nosso
coração e da
nossa eogniçâo.

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74
5

EducaÇão, educaÇão

especial e integraÇão
O contexto da Fducação Especial (EE), relaciona-se naturalmente com
o problema do sistema escolar e da organização administrativa da
educação em geral.
Trata-se de um problema de justiça e não de privilégio, a criação da
EE. A
Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu artigo 26, é
bastante explícita:
"Todos têm direito à educação. "3
A criação a nível interministerial de um órgão coordenador da EE
justifica-se
há muito tempo e é urgente neste momento, a fim de iniciar o
levantamento e a
caracterizaçâo da EE.
Só caracterizando e conhecendo a realidade da EE se pode
posteriormente
controlar e transformar um universo tão complexo, o que está muito
longe entre
nós, pois sem investigação não se prevê quando, nem como, se sairá
da inércia ou
das tentativas isoladasjá muito características.
Ações de vária ordem deviam caber a um tal organismo (Instituto de
Reabilitação e de Educação Especial - IREE); por exemplo: identificação
precoce, despistagem, "screening", avaliação, diagnóstico,
investigaçâo em "crianças em risco"2 ou
em "crianças deficientes", etc. Tais açôes deveriam iniciar-se nas
próprias escolas
regulares, através de uma planificação e de uma organização
baseadas em esquemas
de regionalização e apoiadas por equipes médico-psicopedagógicas
móveis e itinerantes.
Daqui deveriam partir outras ações complementares e mais
específicas, coordenando médicos e psicólo os escolares, que
lamentavelmente não são ainda parte
integrante do sistema eseolar e que obviamente condicionam uma
perspeetiva preventiva que controle a neurotização do sistema escolar.

75
Os processos edu ó icos4 (ou a caderneta escolar individual) poderiam
acompanhar a criança e a evolução da sua aprendizagem, envolvendo
relatórios de
médicos, de psicólogos, de professores ou de outros especialistas,
quando necessário.
Nos processos, podia constar a história clínica e familiar da criança
através de
uma anamnese científicamente elaborada, registrando ainda as
condições pré- e pósconcepcionais; pré-, peri-, neo- e pós-natais;
fatores de desenvolvimento motor, lingiiístico, emocional e cognitivo;
doenças, carências assinaladas; composição familiar; resultados de
testes; relatórios dos professores; efeitos das várias intervenções
pedagógicas, etc.
A criaçâo progressiva de centros re ionaás de obsera ão e orienta ão
médic psicopedaóicá não pode tardar, pois estas ações só podem ser
levadas à prátiea
com uma política de descentralização e de desenvolvimento
educacional local. A ligação destas estruturas com os serviços de
saúde (centros, hospitais, equipes itinerantes, etc.) seria outra das
preocupações do IREE.
Não se pode dizer que este problema se resolva apenas com a
aplicação dos
conhecimentos da Medicina. A população de crianças deficientes é
cada vez mais reduzida, por haver melhor controle de fatores
biomédicos, aconselhamento genético,
planejamento familiar, terapêutica, detecçâo de problemas
metabólicos, controle de
fatores da mãe, etc. Mas, por outro lado, a populaçâo de crianças
vulneráveis e com
dificuldades de aprendizagem tende a aumentar (lesões mínimas do
cérebro, disfunções cerebrais mínimas, prematuridade, carências
afetivas, relações famíliares perturbadas, afastamento da mâe por
razões de emprego, etc.).
Por outro lado, só dentro de uma estrutura coordenadora, como o
IREE,
objetivamente descentralizada e associada a centros e serviços
educacionais, como
os que se adotam em vários países (Child Guidance4, etc.), se podem
levar a efeito
estudos longitudinais (follow-ups, estudos-piloto, etc.), estudos de
apoio psicopedagógico, estudos epidemiológicos, etc. Na realidade, só
com resultados e avaliações se podem adotar medidas de intervençâo
e de planifcação a vários níveis.
Os serviços médico-psicopedagógicos devem preocupar-se com ações
de prevenção, formação e investigação, ocupando-se do seguimento
das crianças entre os
dois e os cinco anos, visto provar-se ser este o período em
que diminui a vigilância
médica e em que aumentam os fatores que interferem
significativamente com o desenvolvimento e com o potencial de
aprendizagem (desenvolvimento das aquisições
motoras, psicomotoras, perceptivas, de linguagem, de socialização,
etc.).
A detecção de crianças com necessidades especiais por meio de
formas simples e econômicas, o aconselhamento aos pais, a orientação
de centros e infantários,
a criação do ensino pré-primário, são já de si ações suficientemente
complexas e urgentes, que justificam a criaçâo de Centros Médico-
Psicopedagógicos regionais, que
poderiam deconer de estruturas já críadas, como as Cooperativas para
a Educação e
Reeducação de Crianças Inadaptadas e as Associações de Pais.
As autoridades locais e regionais poderiam proceder a estas ações
com pessoal
multifacetado, mas que, direta ou indiretamente distribuíssem a sua
intervenção pelos dois campos, o da Saúde e o da Educação.
76
Toda a criança escolarizável deveria ser obsservada antes, durante e
depois de
qualquer das fases de aprendizagem, quer no ensino pré-primário quer
no ensino básico. Ao não apoiar estas ações, a escola tende a segregar
15% das crianças (números estes ingleses - os portugueses ainda não
se conhecem?...). Esta situação está em
contradição com os objetivos de um país em desenvolvimento cujo
objetivo é o de
reduzir a zero a percentagem de analfabetos e de incultos.
As medidas que decorrem da definição e da classifcação científcas da
deficiência não podem desintegrar-se das medidas educacionais que
lhes devem ser concomitantes. Dentro destas, devemos considerar: (I)
integração dos pais desde os primeiros momentos - daí a importãncia
do apoio e do esclarecimento aos mesmos;
(2) preocupaçâo do diagnóstico com o perfil de aprendizagem da
criança e não com
um rótulo, para além de apontar as suas características efetivas e
relacionais e reduzir
as interpretações testelógicas; (3) investigação de todos os aspectos
que causem reservas ou dúvidas por equipes mais sofisticadas (dever-
se-á estimular em Portugal a
criação de equipes multidisciplinares e a criação de ramos de
conhecimento relacionados com a neuropsicopatologia da
aprendizagem, tais como: problemas de descodificação e codificação
visual, auditiva e tátil-cinestésica, problemas de afasia na criança,
estudopilotos de desenvolvimento do vocabulário básico, estudos de
maturação psicobiológica e cognitiva, estudos sociológicos atinentes à
saúde e à educação, etc.); (4) atençâo aos fatores de planejamento
familiar, especialmente das familias com grandes fratrias, promovendo
o controle neonatal, aconselhando os futuros pais, criando currículos
sobre problemas de saúde no ensino secundário, aumentando o tempo
de radiodifusâo de imagem e de expressão escrita nos mass-media
com informação sobre os problemas familiares, etc.
Na mesma linha, poder-se-ia pensar, de acordo com as definições e
classificações que colocam os problemas de deficiência e das
dificuldades de aprendizagem,
nos diferentes níveis que devem comportar os Serviços de Educação
Especiat. Neste
aspecto, vários modelos têm sido apresentados e, dentre eles,
poderemos sugerir o
da página seguinte3 (fig. 6).
Em todos estes centros se deveriam articular os serviços educacionais
com os
não educacionais e em todos eles se poderiam desenvolver
currículos bem estruturados, a fim de obter níveis educacionais e pré-
profissionais determinados. O sistema a desenvolver na política de
ensino deve colocar em estreita ligação o ensino
especial com o ensino oficial regular, tornando este mais flexível; de
acordo com
as necessidades especiais de algumas crianças, adaptando-se às
condições de uma
sociedade mais justa.
Os objetivos educacionais podem ser os mesmos, para facilitar a
circulação
entre o ensino regular e o ensino especial, consoante os diferentes
períodos de tempo exigidos pelas necessidades de crescimento da
criança defciente. A integração
tem de ser sinônimo de oportunidade educacíonal, acomodando os
meios e as condições do ensino regular, pois o tempo a ficar de fora
deve ser o mínimo possível.
Cabe assim ao sistema educacional a redução considerável de
problemas, pois
caso contrárío a sua rigidez seletiva pode ser criticada por auséncia de
direitos humanos.

77
Por ouho lado, as avaliações do aluno e do professor (dispedagogIa) e
as avaliações das classes e dos currículos são necessárias, e estas só
avançam com a proteção a estudos de investigação pedagógica, que
tardam a ser realizados em Portugal.

Il Ì Prevencão da deficiência % Classiftcação


Nfvel 2 Para deficientes visuais
Inteação nas Esc. Regulares auditivos e alguns
defcientes motores.
Nfvel 3
Dificuldades de aprendizagem
e de comunícação e
probkmas emocionais.

Nfvel 4
Deficiência mental
educável.
Nfvel 5
Escola espeáal Defciência mental
Pm Tnmnn nlenn treinável.

Problemas temporários
Nível 6 Domicffio ; (convalescença, doenças
crônicas, etc .)
Nfvel 7 Educação nos hospitais
Semi-intematos Deficiência mental dependente
Escolas residenciais Doenças crônicas permanentes.
Assistência total
Cada vez mais, a escola é obrigada a ter conheeimento
individualizado dos
seus alunos (daí a caderneta educacional)4 e dos seus grupos, para
além da percepção dos vários e importantes fatores familiares e
ecológicos. A escola deixará de ser
veículo de sociopatia na razão direta da sua organização institucional e
científica.
Precisamos estudar os efeitos e a eficiência dos sistemas de reforço,
de prêmio, de castigo, de notas, de currículos, de programas, de
exames, de disciplina, etc.,
pois só daí se pode pensar em modificar a organização escolar. As
propostas de inúmeros pedagogos deveriam ser ínvestigadas
criticamente. Não é impondo metodologias sem serem avaliadas
rigorosamente, quer sejam de Montessori, Decroly, Makarenko,
Claparède, Suchodolsky, Ferrière Freinet, Rogers, Neill, Bethelheim,
Snyders, Illich, Paulo Freire, Mendel, Bloom, Piaget ou de outros (por
mais brilhantes
que sejam e por mais continuadores que tenham), que vamos
ultrapassar os problemas melindrosos do nosso sistema educacional.
A escola e os seus gestores pedagógicos deverão ficar alertados com
a análise
destes problemas. É urgente ter terapeutas da fala no ensino pré-
primário e no primário. É fundamental ter professores de ensino
especial integrados no ensino primário e no ensino secundário para
facilitar a integração. E igualmente urgente ter
psicólogos escolares. Um psicólogo por 2000 alunos podia ser uma
medida esclarecida no nosso país, não só para ações de itineráncia, de
díagnóstico, prevençâo e
78
orientaço educacional e vocacional, como também para estar
integrado no corpo
docente para ações de docênáa e coordenaçáo, abordando ainda
problemas rela' cionados com a droga, a saúde mental, a psicologia, a
avaliação dos alunos e de
mótodos pedagógicos, etc.
Dentro da estrutura da escola, os processos de avaliação devem
permitir ao
professor a noção de fatores psicossociais da classe e a noção de
fatores neuropsico lógicos da aprendizagem3, enquanto a observação
especializada podia ser do domí nio dos Centros Médico-
Psicopedagógicos Regionais ou Centraís.
O professor, quer do ensino primário quer do secundário, terá que
poder
observar a classe e controlar as variáveis intra-individuais do aluno
nos domínios fun damentais da leitura, da escrita e do cálculo. Os
lieenciados em Letras e os licencia dos em Ciências que se vão dedicar
ao professorado deverão equacionar cuidadosa mente processos de
diagnóstico educacional. Uma Universidade Aberta ou uma Uni
versidade Peripatética4 são outras necessidades urgentes a criar para
compensar o
atraso latente do nosso sistema educacional, particularmente
naqueles domínios
: pedagógico-científicos.
No caso de a criança não satisfazer as exigênáas das escolas
regulares, então,
outros níveis devem surgir, como por exemplo a avaliação
multidisciplinar ou o
estudo longitudinal (follow-up)4, integrando sempre educadores e
professores. Só
mantendo uma coordenação destas ações se podem elimínar os
tradicionais proces sos de tentativas e erros, baseados na
espontaneidade e na arbitrariedade. O díagnósG tico e as intervenções
devem ser rigorosamente avaliados, pois assim poder-se-á saber
se os mesmos têm sido ou não adequados e efcientes, e se os
processos de seleção e
de obseraçâo obedecem ou não a critérios fundamentados.
Nenhuma criança eom problemas deveria ser colocada em "classes
especiais"
ou passar de níveis ou de fases sem ser avaliada por uma equipe
multidisciplinar e
multiprofissional. Esta medida não se segue em Portugal, colocando
em causa pro blemas educacionais contraproducentes e
institucionalizando a deficiência com as
"classes de anormais" (designação esta lamentavelmente ainda em
voga entre nós)
- situação proibitiva que muitas vezes é alimentada pelos próprios
professores, que
se encontram freqiientemente confusos e pouco informados sobre tais
problemas.
A escola e os seus agentes têm sido responsáveis por medidas
seletivas que não se
justifcam no plano humano, nem se fundamentam em dados
investigados e com provados.
Há que facultar aos pais o acesso aos critérios3, defendendo os
interesses dos
seus filhos, recorrendo, se for caso disso, às autoridades quando a
decisão dos servi ços educacionais não for correta nem fundamentada.
O critério médico, por um lado, ou o critério do QI, por outro, não
podem ser
absolutizados. Outros critérios e processos terão de ser considerados,
quando está
em causa a decisão de colocar uma criança na classe especial ou na
de apoio. Outro
problema se tem de colocar. Qual o tipo de formação que é exigido
para as duas
classes (apoio ou especial) e qual a dimensão da suas funções e das
suas intervenções
pedagógicas?
79
Não pode ser o fracasso da comunicação entre médicos, psicólogos,
professores e assistentes sociais ou outros, que justífica a
marginalização da criança. A linguagem comum entre vários técnicos
não pode ficar numa confidencialidade hierarquizada ou dominante,
entre uns e outros. A carência do diálogo científico nâo pode causar
vítimas. É necessário trocar e investigar pontos de vista, a fim de se
proporcionar uma melhor compreensão das necessidades especíais de
uma criança especial.
Só uma informaçâo aberta pode garantir o melhor encaminhamento
das crianças. Os pais terão de ser consultados, antes que qualquer
informação acerca dos seus
filhos seja divulgada.
Urge estabelecer neste domínio da Educação uma formação
interdisciplinar
(quer inicial, quer em serviço) baseada na investigação não só para
médicos escolares como para psicólogos escolares ou professores.
Em termos de formação a quem caberá esta funçâo? Às
Universidades? Às Escolas Superiores de Educação?
A coordenação destes esforços só poderá alcançar resultados quando
os Serviços de Saúde se relacíonarem com as Direções Escolares a
nível local e nacional, e
aqui estará a chave do êxito da integração.
A tendência ínternacional aponta para a integração4 de crianças
deficientes
em escolas normais. A grande convicção do futuro é que as crianças
deficientes tenham as mesmas oportunidades que as crianças não
deficientes, pois cabem-lhes as
mesmas e legítimas aspirações de realizaçâo pessoal e de participaçâo
e transformação socíal.
A integraçâo das crianças deficientes tem de aumentar de ano para
ano. Todas
as crianças deficientes poderão ser educadas em escolas normais,
naturalmente sujeitas a determinadas qualificações e avaliações.
Devemos superar os debates técnicos entre as vantagens e os
inconvenientes
da integração e concentrar os esforços nas exigências práticas que o
problema coloca4.
As formas de integração devem ser de vária ordem: (1) criação da EE
no local
da Educação Normal (unidades de educação especial - UEE) dentro das
escolas já
existentes; (2) integrar os deficientes na comunidade dos não-
deficientes. Almoçam, brincam e realizam atividades curriculares e
circum-escolares em conjunto
(música, trabalhos manuais, educação pelo movimento, educação
visual, etc.). Esta
integração deve ser feita o mais cedo possível, porque as crianças
deftcientes são
mais rapidamente aceitas quando são mais jovens ; (3) integração
total, quando a criança defciente está integrada no currículo normal
em tempo parcial ou em tempo
pleno.
A integração é o combate maís adequado à institucionalização de
defciência e
ao ceticismo e pessimismo educacional. A integração implica sempre
um benefício
imediato educacional e social para a criança deficiente. A integraçâo
na comunidade
passa pela integração no sistema educacional. Separar ficamente
escolas normais
de escolas especiais é uma aberraçâo que se deve eliminar.
80
A integraçâo não se consegue por leis escolares nem por
espontaneidade social.
Ela deve ser pensada a nível social antes e depois da escola. Antes,
através de ações
domiciliárias eficazes. Depois, por uma política de emprego e de
integração social.
Com facilidades especiais muitas crianças podem integrar-se em
classes normais: rampas, espaços, material didático, inovação
tecnológica e pedagógica, meios
audiovisuais, centros de recursos, apoio de professores especializados,
etc.
A integraçâo implica naturalmente uma seleção de crianças com
potencial de
aprendizagem normal e com maturidade sócio-emocional mínima4.
Não se pode
"encher" uma escola com crianças deficientes de uma forma
puramente circunstancial. Os arranjos devem ser compatíveis com as
necessidades das crianças não deficientes, não esquecendo a criação
de currículos e métodos pedagógicos adequados,
para além de professores qualificados. Algumas crianças precisam de
apoio em centros de recursos (ateliers, cantos de leitura, estações de
aprendizagem, etc.) bem planificados e com fichários de aprendizagem
progressivos em alternância com as classes
regulares, na medida em que a participação nelas é sempre benéfica
para as crianças.
Em nenhuma circunstância, no caso das crianças DA, se pode aceitar a
total exclusão das classes regulares antes de se terem esgotado todas
as possibilidades de favorecer aintegração.
Encorajar a integraçâo nâo é suficiente; é preciso uma planificação.
Prever as
acomodações, os equipamentos, os espaços, os materiais, os recursos,
etc., tem de
constituir uma condição básica para a sua efetivação, chamando para
colaborar todos os professores e perspectivando todas as atividades
eseolares e extra-escolares.
Antes de a integração se operar, é necessário que se estabeleça um
consenso de todos os professores, e não só de alguns, explorando em
conjunto e em todos os seus
limites todo o plano de integração.
As autoridades terão de estudar se as escolas regulares estão em
condições de
garantir a integração, e ver se pode.Z proporcionar o apoio
indispensável, bem eomo
os arranjos estruturais que se tem de criar.
A integração a estudar, e que poderia ser da responsabilidade do
MEIC, envolve a equação de problemas de acomodação de recursos e
de pessoal habilitado . Porque é dispendiosa, a integração deve ser
planificada de acordo
com as necessidades
emocionais, cognitivas, psicomotoras e sociais.
Ãs escolas es eciais só devem existir quando as crianças revelam
deficiências
severas e comp exas, quer no aspecto sensorial, quer no intelectual e
motor, ou então no caso de comportamentos e desordens emocionais
extremas. Em qualquer dos
casos, nunca se deve pensar no isolamento institucional. A ligação da
escola especial
à escola normal é indispensável. As novas escolas especiais devem ser
construídas na
proximidade das escolas regulares. Não é isto exatamente o que se
pensa e faz em
Portugal. As Cooperativas para Educação e Reeducação de Crianças
Inadaptadas e
as Associações de Pais de Crianças Deficientes devem surgir no futuro
junto das estruturas escolares já existentes, para se benefciarem não
só dos recursos como dos
materiais e dos professores. Só assim se reduz o isolamento e as
despesas públieas, e
se provoca o convívio entre as crianças defcientes e as não deficientes,
facilitando
por acréscimo o diálogo cientffico-pedagógico entre os professores.

81
A criaçâo de técnicos peripatóticos e especialistas de itinerânciaa
deve ser pen sada em vários níveis e zonas, integrando a investigaçâo,
a formaçâo em exercício, a
criaçâo de material didático, a construçâo de métodos pedagógicos
inovadores, etc.
Estes, pois, os fatores necessários ao progresso científico da
educaçâo, que por isso
poderiam constituir as bases das futuras Escolas Superiores de
Educação e das ur gentes Faculdades de Ciências da Educação.
A integraçâo no sentido que temos vindo a abordar implica a
utilização dos
recursos de toda a sociedade no sentido de desenvolver e reabilitar as
crianças defi cientes, para que sejam adultos felizes e independentes.
Outra área que urge ser estudada inclui a dos deficientes e
delinqiientes ado lescentes. No primeíro caso, as oficinas protegidas e
as cooperativas de trabalho fei tas na base de parãmetros pedagógicos
e não produtivos podem ser instituídas regio nalmente. No segundo
caso, as escolas chamadas de "eorreçâo", as prisões, as peni
tenáárias, os campos de trabalho, etc., onde se pratica a pedagogia
punitiva do "o Iho por olho" ou "do pagamento de uma dívida à
sociedade"1, deverão merecer
uma reflexâo educacional, dependendo de médicos, juízes e
educadores a criação de
outros meios de reintegração pessoal e social.
Noutro aspecto, o ensino especial particular tem de merecer atençâo
através
da criação da regulamentação adequada e de análises criteriosas,
evitando especula ções lucrativas chocantes ou "instituições depósito".
Os hospitais, por outro lado, e
no caso de crianças com doenças ctônicas, têm de criar condições
educacionais, tu torais ou itinerantes. Os orfanatos e instituições
similares devem fávorecer amplos
contatos com o mundo exterior e com escolas da zona, realizando o
intercâmbio de
atividades e de professores.
A concluir este aspecto, nâo podemos deixar de referir a importância
da for mação pré-profissional e pré-industrial, criando multinelações
entre os serviços de
educação, saúde e trabalho. A orientação vocacional é importante e
necessita de ser
bem equacionada para o adolescente deficiente. Aliás, nos casos
"treináveis" ou nos
"multideficientes", os problemas terão de ser estudados em termos de
condições
funcionais exigidas por várias ocupações profissionais4, quer na
indústria quer nos
serviços.
A terapia ocupacional deve ter por preocupaçâo o estudo
de ocupações pro fissionais adequadas às integridades e às
dificuldades dos deficientes. Em Portugal,
quase nada se desenvolveu, e muito pouca investigação se fez nos
domínios da ergo nometria desviante e nâo desviante e na cinesiologia
aplicada ao trabalho. As escolas
especiais nâo podem descurar este aspecto tão significativo para a
integraçâo do de ficiente no mundo do trabalho. A formação de
especialístas neste aspecto da orien tação de carreiras profissionais é
importante, a não ser que este campo seja ocupado
pelo psicólogo, o que nos parece possível e viável, se for percebido
que este tem um
papel fundamental na E.E.
A educação pós-escolar (educação de adultos deficientes) deve ser
mantida,
a fim de evitar problemas familiares e sociais. Depois de acabarem a
escola, os defi cientes nâo podem ficar de novo em casa. As
autoridades deverâo criar oficinas pro tegidas ou postos de emprego,
regularizando o direito ao trabalho do indivíduo defi
82
ciente. Cabe aqui adequar a capacidade de produção às suas
limitaçôes, pois muitos
empregos estão abaixo das suas possibilidades, como é o caso dos
deficientes men tais treináveis, que poderiam ser colocados em postos
de trabalhos menos alienan tes.
Cada distrito poderia assegurar uma unidade de produção
multifncetada4 para
os casos mais severos. Nos outros casos, todos os locais de trabalho
deveriam pro porcionar uma percentagem mínima de empregos.
Os locais públicos4 e os espaços culturais e recreativos (teatros,
cinemas, mu seus, centros, etc.) terão, no futuro, de ser
dimensionados a pensar nos deficientes.
A Universidade4 e as Escolas de Ensino Superior Curto deverão
permitir a in tegração de deficientes supradotados, pensando nos
acessos, nos apoios informáti cos especiais (audiotecas, videotecas,
etc.) e noutros apoios específicos.
BIBLIOGRAFIA
1- ARMSTRONG, J.R. Taxonomies in special education. In: The Third
review of special
education. Nova lorque, Ed. Grune and Stratton,1976.
2 - BAIRRÃO, J. e colaboradores. Crianças em risco. Lisboa, Ed. Centro
de Observação e
Orientação Médico-Pedagógico - COOMP,1978.
3 - COUNCIL OF EXCEPTIONAL CHILDREN - CEC. Documentação sobre
o 1 ó Congresso
Mundial sobre o Futuro da Educação Especial. Stirfing,1978.
4 - WARNOCK REPORT. Síntese recolhida no Congresso Mundial sobre
Educação Especial.
83
6

Interação como

filosofia educacional

No passado a sociedade desenvolveu quase sempre obstáculos à


integração das
pessoas deficientes.
Receios, medos, superstições, frustrações, exclusões, separações,
etc., preenchem lamentavelmente vários exemplos históricos que vão
desde Esparta à Idade
Média.
A atitude desenvolvida até então, marcada por princípios e valores
sócio-culturais, caracterizava-se por excluir os deficientes do seio da
sociedade. Em suma,
"longe da vista e longe do pensamento "
O ideal platônico foi ao ponto de afrmar o seguinte : "as mulheres dos
nossos
militares são pertença da comunidade assim como os seus filhos, e
nenhum pai conhecerá o seu filho e nenhuma criança os seus pais.
Funcionários preparados tomarão conta dos filhos dos bons pais,
colocando-os em certas enfermarias de educação ,
mas os filhos dos inferiores, ou dos melhores quando surjam
deficientes ou deformados, serão postos fora nunz lugar misterioso e
desconhecido onde deverão permanecer ".
Esta afirmação, simplesmente repugnante sob o ponto de vista ético e
humano, ainda surge nos nossos dias, na mente de responsáveis pelas
políticas de educação, habitação, recreação, transportes, emprego,
etc. A ilustrar a situação bastará
caracterizar a luta que se tem travado entre nós, em prol da
Integraçâo pdena e total
dos deficientes.
A Integraçâo é uma preocupação humana, a necessitar, antes do mais
de respostas humanizadas que obviamente se refletem e refletirão no
presente e no futuro
de seres humanos. Seres humanos que índependentemente das suas
condições e potenciais, tém direito às mesmas oportunidades de
inserçâo, inclusão e realização psicossocial.
84
A política da segregação, da separação ou da exelusão é anti-humana
na me dida em que a condição de ser "deficiente" é inequivocamente
uma probabilidade
da condição de "náo deficiente". I7e certa forma, todos os seres
humanos eontêm a
" gênese da defieiência, motivo pelo qual a polítiea do futuro, em
termos de Integra ção, se deverá orientar no sentido da anti-rejeição,
ou seja, terá de adotar uma polí tica de Integração onde a rejeição e a
exelusão sejam iguais a zero.
São urgentes, pois, não só novas atitudes, mas também novas formas
de inter venção. Não basta atuar ao nível das atitudes, é fundamental
intervír ao nível das
condutas. São precisas mais ações que intenções, mais interações que
manifestações
altruístas e caritativas.
Quando falamos de Integraçâo, no fundo queremos dizer interação,
isto é, in teração entre os "deficientes" e os "não-deficientes" Só
quando se atinge uma inte ráçãò corìstánte entre os "deficientes" e os
"não-deficientes" se pode falar numa
política educacional de Integração. Nenhuma razão humana e
científica pode afir mar que a melhor educação dos deficientes passa
pela sua separação dos "nâo-defi cientes".
O combate à separação, em termos educacionais, é em certa medida
a primei ra fase de uma política de Integração, pois não basta garantir
um sistema de ensino
exelusivo, dito especial, apenas porque é físiea e humanamente
separado do ensino
dito regular. Aceita-se já que os deficientes sejam educados e para
chegar aqui, mui ta luta pelos direitos humanos foi, é e será necessário
cada vez mais implementar.
Todavia essa educaçâo não poderá eontinuar a ser à parte da
educação regular ou
normal. Educar em "ghettos" ou em envolvimentos isolados, (vulgo
"classes espe ciais"), é, numa certa dimensão deseducar, na medida
em que se assume que os def cientes não têm hipóteses de aprender.
Não se deve educar os deficientes adotando a politica "longe da vista
longe do
coração " O futuro da Integração, como filosofa educacional,
preconiza, em nosso
entender, a ação contrária, isto é, `perto da vista e perto do coração"
A Integração compreende um valor constítucional que em si deve
eonsubstan' " ciar a aceitação da diferença humana. Mais, esse valor
constitucional terá de respei tar a diversidade cultural e social e, em
paralelo, a
unidade da pessoa humana.
Nenhum Sistema de Ensino poderá "impor" uma homogeneidade ou
normali dade ideal Este "apuramento de competências" foi e é
preocupação de regimes alie nados e fascizantes. A estandardização
do "rendimento", da "eficácia", da "preci são", do "aproveitamento" ou
do "programa único", não é compatível com uma
política de Integração plena.
j Para tornar possível uma política de Integração (I) é fundamental que
se alar guem as oportunidades educacionais. Os pro_ ramas e os
currículos terãn de sr ne ! cessariamente diferentes, porque adaptados
às necessidades educacionais específicas
;; das crianças defcientes. A filosofia e o fundamento científico que
terão de presidir
à elaboração do desenho (design) curricular deverão respeitar os
estilos e os biorrit mos preferenciais de cada criança, isto é, deverâo
adotar uma filosofa centrada na
' semelhança diferenciada e nâo na semelhança indiferenciada que
tem caracterizado
" os programas escolares vigentes.

85
A Integração não pode continuar a basear a sua ação em boas
intenções que
inúmeras vezes escondem atitudes de caridade, resignação e
comiseração. A Integra ção subentende uma ação em prol de direitos
humanos e cívicos, tendente a modifi car a essência e estrutura da
própria Escola.
A Escola terá de adaptar-se a todas as crianças, ou melhor, à
variedade humana.
Como instituíção social, não poderá continuar a agir no sentido
inverso, rejeitando,
escorraçando ou segregando "aqueles que não aprendem como os
outros", sob pena
de se negar a si própria. Não se pode continuar a defender que tem de
ser a criança a
adaptar-se as exigências escolares, mas sim o contrário.
Efetivamente, a Escola, ou
melhor, o Sistema de Ensino, nâo pode persistir exeluindo
sistematicamente as
crianças deftcientes, estignzatizando-as com a desgraça, rotulando-as
com uma doen ça incurável ou marcando-as com um sinal de
inferioridade permzente.
As estruturas educacionais não podem assemelhar-se a "reservas" ou
"ghet tos" ou seja, a "classes especiais", ou a "instituições especiais".
O futuro de tais es truturas deverá orientar-se na edificação de
envolvimentos educacionais o menos
restritivos possivel. A escola, na perspectiva da Integraçâo, tenderá a
adotar, portan to, a flosofia da heterogeneidade.
Fazer das"classes espeeiais" o "depósito dos incompetentes" ou o
"circo dos
tontinhos", é a prova nítida da incompetência do próprio Sistema de
Ensíno que
baseia os seus mecanismos seletivos e reprodutivos, no mito da
uniformidade cultu ral. Quanto a nós, as "classes especiais" são uma
burla, apenas são mais numerosas
que eficazes.
O Sistema de Ensino terá de equacionar o deficiente como um ser
humano
possuidor de um potencial de aprendizagem, de um perfil intra-
indivídual e de um
repertório de comportamentos, que têm de ser maximizados e
otimizados pelo pró prio processo educacional.
A criança deficiente é intrinsecamente uma criança cuja natureza
deve ser res peitada. O conjunto das suas características de
aprendizagem deve ser, criteriosa e
profundamente estudado, a fim de adequar o ensino às suas
eapacidades potenciais.
De fato, nâo podemos esquecer que todos os indivíduos deficientes ou
nâo, são su pradotados médios ou subdotados, consoante as tarefas
que lhes são propostas. Daí
que muitas tarefas sejam desempenhadas e realizada-s pelos
defeientes de uma for ma superior, mesmo quando comparados
interpessoalmente com os não deficientes.
A Integraçâo, portanto, visa aumaviagemde retorno, isto é, pretende
restituir
à criança defieiente a "classe regular". "Classe regular"
necessariamente com apoios
e recursos, programas integrados, processos de avaliaçâo, professores
eom novas atitu des e eompetências, etc.
Teremos de aceitar, dentro de uma Filosofia Educacional, que
nenhuma crian ça deficiente pode ser considerada ineducável (salvo
uma percentagem reduzida).
Por isso, o melhor lugar para a eduear é o local onde todas as outras
crianças apren dem. Na "classe regular" não só se aprende sem
estigma, como provavelmente por
esta razão se aprenderá melhor, desde que, obvíamente, a Integraçâo
envolva um no vo sistema organízacional.
Tal sistema terá de romper com as fronteiras da educação regular e da
educa ção especial, não só em termos conceptuais, como em termos
humanísticos.
86
/ A "classe regular" e a "escola regular" tero dg al dir as oortuni dades
de aprendizagem a todas as crianças incluin.Q as eficigntes._ Sósim
sepode
; ,I; mtegrar um maior número de crianças. Novos programas, novos
currículos, novas
funçôes para os professores das classes regulares, novos conteúdos
na sua formação,
novos suportes, novos processos de colaboração entre técnicos, etc.,
são alguns dos
setores de desenvolvimento educacional, que o conceito de
Integração arrasta consi go.
A "escola regular" necessita ser mais inclusiva, provocando e
"negoeiando"
no seu seio, arranjos de inclusão progressiva até à inclusão total,
mesmo que sejam
necessários 10 ou 20 anos.
A escola regular deve encorajar a apreciação e o respeito pelas
diferenças entre
as crianças, acomodá-las no seu processo e servi-las o melhor
possível.
A Integração é em si um movimento de inovação do Sistema de
Ensino. Enca rá-la apenas como uma desculpabilizaçâo sócio-
pedagógica é pouco. A Integração é
efetivamente um degrau de todo o processo de inovaçâo educacional
que urge edi fícar. Porque visa a um alargamento de oportunidades e a
uma maior capacidade de a comodação de crianças com necessidades
especiais, a Integração deverá implemen tar-se quando tais recursos
pedagógicos sâo possíveis e exeqníveis.
De certa forma, a Integração desde que encarada nesta perspectiva
de inova ção, constitui uma arte e uma ciência da individualizaçâo do
ensino.
A adaptação do ensino ao educando, ou melhor, à sua aprendizagem,
embora
tenha sido, desde há muito, o "slogan" dos educadores, está ainda
longe de ser apli cada nas nossas escolas.
Quintiliano (35-95 d.C.), célebre orador romano,já sobre este assunto
afirma va: "os aprendizes têm características diferentes, da mesma
forma, os professores
deverão adequar os seus métodos de ensino".
Em analogia, também a finalidade inicial do teste de Inteligência de
Binet
(1905), visava àeducabifidade máxima do sujeito observado, isto é,
pretendia-se
com o test ìdentificar os estudantes que precisassem de diferentes
processos de ins trução. Infelizmente o teste desenvolveu-se como um
sistema classificativo e não co mo sistema educacional adaptativo.
Numa perspectiva de Integração os testes psico lógicos deverão ser
encarados eomo pontos de partida de uma nova orientação peda
gógica, pretendendo fundamentalmente o sucesso na aprendizagem
do sujeito em
causa. Nos nossos dias, os modelos pedagógicos da "análise de
tarefas" ("task analy sis") e do "diagnóstico educacional" ("diagnostie
teaching") estão superando a ir relevância prescritiva que é
característica de muitos testes e avaliações, adotados
acriticamente no Ensino Especial.
A investigação pedagógica já demonstrou que a resposta à instrução é
dife rente de criança para criança e de professor para professor, pois
não se deve esque cer, que os professores são igualmente tâo
diferentes eomo os seus educandos. Pe rante certas condiçôes de
ensino não surgem problemas, enquanto que perante ou tras as
dificuldades de aprendizagem proliferam, sem que esteja em causa a
própria
criança. O processo ensino-aprendizagem é muito mais complexo do
que parece à
primeira vista. Estamos ainda longe de saber quais são os princípios
psicopedagógi
87
cos que governam as condições exteriores - (ensino) - e as condições
interiores (aprendizagem - do processo. A investigaçâo neste domínio é
urgente, na medida
em que pode facilitar a utilização de processos de individualização,
bem como dos
processos de Integraçâo .
Perante métodos de recitação à base da memória, muitas crianças
sentem-se
frustradas na aprendizagem. Perante métodos dedutivos e criativos à
base da organizaçâo de dados, outras erianças sentem-se igualmente
inadaptadas. Não se pode,
portanto, continuar a aguardar que sejam os alunos a adaptarem-se às
exigências
das tarefas ou dos métodos escolares. Pelo contrário - e aqui se
subentende o papel inovador da Integraçâo - a Escola e os seus
agentes deverão realizar esforços para adaptar as tarefas escolares ao
nível básico adaptativo evidenciado pelos educandos. Os mesmos
métodos podem levar a resultados pedagógicos díferentes, razâo pe1
qual, em termos de Integração, se deve atender prioritariamente à
criança e só
posteriormente ao método ou métodos que no momento pareçam mais
adequados. Nunca devemos esquecer que quando melhoramos a
instrução para uma criança
também a pioramos para outras.
A individualização, como sinônimo de um processo de Integraçâo,
reúne simultaneamente novas atitudes, novos processos de instrução
e novos processos de
interação e reforço. Novas atitudes que permitam solucionar o
problema, visto que
há sempre uma via de superação; aqui as expèctativas deverão ser
necessaríamente
positivas. Novos processos de instrução, porque se deverá ter em
conta a apresentação dos estímulos e a modelação da informaçâo que
se deseja ver tratada e transformada pelo educando. Novos processos
de interação e de reforço no sentido de encorajar, apoiar e valorizar o
esforço do educando, mantendo os seus processos motivacionais
imprescindíveis ao sucesso na aprendizagem.
Numa palavra o segredo da aprendizagem para algumas crianças é
descer o nt=
vel de exigência da instrução e não esperar que o seu nivel de
realizaçâo suba.
Nas novas escolas os programas e as estruturas do ensino deverão
permitir que
umas crianças evoluam lentamente e outras rapidamente, sem que
recebam estigmas
ou rótulos de inferioridade ou superioridade.
Os educandos que aprendem com facilidade, adaptam-se melhor a
modelos de
instrução signifcativos. Pelo contrário os educandos que aprendem
com dificuldade, aprendem melhor com modelos mais sistematizados
(Orton, Mckaye e Rainey 1964).
A instrução individualizada, condição essencial do processo de
Integração, exige mais esforços do Sistema de Ensino e dos próprios
professores. É necessário
mais rigor na planificação das tarefas e das aquísições, ordenando
progressivamente
e seqnencializando híerarquicamente, por graus de díficuldade, as
várias unidades e
subunidades que compõem os vários programas. Mais flexibilidade nos
programas,
recorrendo a simplificações de tarefas em subtarefas e utilizando maior
número de
processos de transferência de aprendizagem utilizando fchas de
trabalho e programas de facilitação mais adequadas e estruturadas.
Não se pode avançar nos programas sem se ter um mínimo de
preocupação
pelos níveis de compreensão revelados pelos educandos. A
individualizaçâo e como

88
tal a Integração, terão conseqiientemente de caracterizar e controlar
mais eficazmente o processo ensino-aprendizagem.A Integração é,
portanto, uma fzlosofa e- .
ducacional que encerra um dinamismo e um processo pedagógico,
muito próprios.
A Integração é uma alternativa genuína aos programas escolares
tradicionais, muitos
deles elaborados sem fundamentos ou preocupações científico-
pedagógicos.
A Integração, vista nesta perspectiva, reúne múltiplas atitudes que
começam
pelo respeito às variáveis de personalidade de cada educando, para
além de considerar o seu estilo de aprendizagem. Preocupa-se mais
com estes aspectos do que com o
resultado ou o quociente obtido nos exames ou nos testes.
A Integração pretende no fundo, como arte da individualização do
ensino,
contornar as dificuldades, ou melhor, compensar as áreas fracas do
educando. Constrói atitudes e destrói (outras) inatitudes. Otimiza áreas
fortes e aligeira e compensa
áreas fracas, ou seja, pretende iniciar e reiniciar a intervenção
pedagógica pela capitalização das áreas fortes do educando. Pretende
por conseguinte, utilizar as capacidades que as crianças (deficientes
ou não) já possuem, ou que já demonstram, maximizando sem
hesitação os seus atributos e competências. Se aumentarmos o capital
das áreas fortes das crianças também se alargam os seus processos de
informação
e, por essa via, se podem então abordar as áreas fracas.
Em resum: falar em Integração é falar em novas alternativas e em
novas vias
isto é,falar emdesenvolvimento educacional e em progresso científico-
pedagógíco.
A Integração, como filosofia educacional, envolve a adoção de
arranjos específicos para mudar: sistemas de ensino, sistemas de
avaliação, sistemas de classificação, programas, atividades, etc. Para
se atingir este processo, naturalmente que a
Integração se terá de basear em estudos e eminvestigações que
permitam objetivamente suportar e avahar a validade dos esforços e
dus ações de integraão.
Para se evoluir dos "centros isolados e residenciais" para a "classe
regular", o
Sistema de Ensíno terá de inovar-se substancialmente, ultrapassando a
dicotomia
das crianças não deficientes (cerca de 90 por cento) e das crianças
deficientes (cerca
de 10 por cento). Nao se poderá continuar a assumir que estes dois
tipos de crianças
sâo diferentes na sua natureza e distintos na sua aprendizagem. É
falso e displicente
supor que as crianças defcientes não dispõem da capacidade de
aprendizagem. Ne-
las a disposição é outra, mais lenta e diferente, mas isso não quer
dizer que tal condição esteja extinta ou ausente. r
A Integração, encarada nesta ótica, submete-nos para um grande
desafio, desafio que se coloca ao Sistema de Ensino em geral e ao
Sistema de Formação de Professores em especial.
Nâo nos vamos aqui debruçar sobre a Formaçâo de Professores, tema
de que
tratamos em outros capítulos. Vo entanto é urgente preparar os
professores (todos
os professores sem exceção) para aceitarem as diferenças individuais
das crianças deficientes. Prepará-los para enfrentarem as suas
necessidades individuais e peculiaridades, e prepará-los para
abandonar os tradicionais "medos", é urgentíssimo, equipando-os com
recursos educacionais inovadores e com modelos pedagógicos
experimentais.
89
As crianças deficientes não são uma ameaça às crianças não
deficientes, só
porque se pensa que os professores tém de Ihes dar mais atenção. As
crianças deficientes sâo diferentes mas fazem parte da população
escolar, na medida em que se
deseja que elas sejam tratadas da mesma forma, em termos
educacionais. Nâo é enclausurando-as em classes especiais isoladas
que se proporcionam as mesmas oportunidades às crianças
deficientes, tornando-as em "dinossauros culturais", passo a
expressão .
Como é sabido, mantendo as crianças deficíentes fora das classes
regulares elas
serão ignoradas. Nas "classes especiais" as crianças defícíentes são
puramente encarceradas e presas em "lugar seguro", isto é, são
isoladas fora do quotidiano escolar e
social o que, em si, constitui uma descarada negligéncia e uma
desumana rejeiçâo.
É esta filosofia que se deseja inverter com o movimento da Integração.
Só combatendo a atual Educação Especial pela Integração, que aqui
propomos, se poderá superar os orçamentos insuficientes, a
desqualificação dos professores, a pobreza das instalações quase
sempre mal apetrechadas e equipadás, a falta de
materiais didáticos e a arbitrariedade dos processos de diagnóstico
que á caracteriz_ a.
A Educaçâo Especial deverá dar lugar à Integração através de um
processo de
inclusão progressiva, motivo suficiente que exige a realização de
esforços maciços e
intensivos com os próprios professores do Ensino Regular.
Primeiro na sua formação, depois fornecendo-lhe apoios materiais e
logísticos,
meios de avaliação das críanças e dos objetivos pedagógicos
específicos, meíos para
avaliar a eficiência dos programas, etc. Para que a Integração se
edifique é necessário
munir os professores do Ensino Regular com novas atitudes, com
novas aquisições e
novas competências. Fazer a Integração esquecendo os professores do
Ensino Regular poderia ser desastroso em nosso entender. Os seus
medos e superstições poderão
transformar-se em obstáculos inamovíveis que impedirão o avanço do
movimento
de Integração.
A Integração só terá sucesso se todo o sistema de Ensino mudar. Ter-
se-á de
criar serviços adequados, ultrapassar a pobreza do equipamento
escolar, superar processos arbitrários de diagnóstico e de classificação,
intensificar a inovação dos processos de formação dos professores, etc.
Se a Integração for uma realidade, adotando um processo de
mudança as
"classes especiais" desaparecerão, e a segregação e a discriminação
pertencerão à história.
A Integração é conseqrientemente imperativa, pois passa pelo
reconhecimento
efetivo de que toda a criança é especial. Perante a lei, a criança
(deficiente ou nâodeficiente) requer proteção e respeito pelas suas
necessidades; por isso o Sistema de
Ensino, deverá garantir programas mais adequados, mais integrados
ou seja, mais
normalizados.
O Sistema de Ensino tem de dar lugar à qualidade de ensino, não
tanto à
quantidade de ensino. Qs programas mais integrados e
individualizados, não são um
luxo, são uma necessidade do movimento de Integraçâo.
A Integração é um desafio à capacidade criativa dos professores e dos
tócnicos
de eduoagão. Para se iniciar um movimento de Integração é necessário
haver um sen
90
timento profundo de que é possível. Hellen Keller é só um exemplo.
Precisamos de
muitos mais.
Se não há nenhuma razão para segregar os seres humanos à base da
idade, do
sexo, da religiâo ou da cor da pele, também o não deve haver à base
da capacidade
de aprendizagem. Naõ há nenhum direito humano que o justifique.
As crianças deficientes, mais tarde adultos deficientes, não podem
continuar a
sofrer as conseqiiências da separação e da segregação. Por isso a sua
educação deve
ser pensada, daqui para o futuro em termos de Integração.
Não devemos remover as crianças deficientes das classes regulares.
Só as movemos para envolvimentos isolados ("instituições", "classes
especiais", etc.) quando o
Sistema de Ensino é insuficiente e insatisfatório.
I?izer que defcientes devem ser educados com os não-deficientes, não
éo
mesmo que dizer que devem ser educados da mesma maneira. Não
basta conferir a
igualdade de oportunidades. É urgente reduzir a separação.
O fatalismo das "classes especiais" deve dar lugar a alternativas mais
interessantes e pedagógicas. A infalibilidade do encammhamento, -
aqui entendido no
mau caminho - deve dar lugar a novos modelos de organização que
facilitem a normalização .
Os modelos prussianos com programas únicos de homogeneidade
cognitiva deverão ser banidos das escolas do futuro, que deverão
exatamente refletir estilos de
vida mais diversos e valores mais heterogéneos.
A Educação Especial, em suma, não pode ser uma Educação Desigual
encarada à parte da Educação Regular. Continuar na proliferação de
serviços, de estruturas, de equipamentos, de professores só torna a
Educaçâo Especial mais burocrática
e dispendiosa. Ao contrário, o movimento da Integração que temos
vindo a abordar,
resultaria num reforço das facilidades educacionais existentes que
obviamente surgiriam mais positivas para toda a população escolar. A
soluçãó do problema,ór ma;s
que custe a muitos responsáveis, está na escola regular, visando a
sistemas educacionais inclusivos.
A educação alternativa é dentro da escola e não fora dela. Nesta base
a organização escolar dinamizar-se-ia, permitindo-lhe dar resposta às
necessidades das crianças deficientes. A Eseola poderia fornecer mais
objetivos comportamentais, mais
instruções programadas, mais processos de gestão motivacional,
mais eurrículos adequados, mais materiais didáticos, mais ajudas
pedagógicas, mais processos de identificação precoce, mais e
melhores meios de avaliação das necessidades educacionais
das crianças, ete.
Embora muitos professores sejam cétieos e resistentes à Integraçâo
de crianças
deficientes ou diferentes, porque esperam que elas falhem mais
freqiientemente
(selffullfilling propheey) e para além da organização tradicional das
escolas por
classes ou turmas, dificultar a Integração, todos os esforços deverão
ser desenvolvidos com perseverança naquele sentido,
independentemente de ser preciso muito
tempo para o alcançar. Alguns países, como a Suécia, levaram 10 anos
de prolongados esforços, outros continuam há dezenas de anos a
desenvolver iniciativas e alternativas de Integração, como a Inglaterra
e os Estados Unidos. O processo da Integra
91
çâo nâo é fácil nem simples, só que nâo convém, quanto a nós, perder
mais tempo
com ações de Integração tímidas e irrelevantes.

Dexnwlvimento da Otganizaçgo Escolar Análix dc 9stemas


Processos de inovação educacional AnáHse de interaçdes entre
técnicos
lrocessos de ensino Eficácia fmanceúa AnáGse de tarefas escolares
Instrução apoiada por modetos Avaliação Psicoeducacional
de investigação Análise de Comportamentos
INTEGRAÇÃO
Novos materiais didáticoe Novas atitudes
PIocessoe de diagnósLco pedagógieo Novos proceuos de intervenção
e informal Desenvolvimento de equipamento Novas interações prof:
aluno e
Processos de informação escolar e prof: prof.
Desenvolnmento de audiovisuais Novos currículos por módulos
Modelos de aprendizagem contínua
Instrução individuatizada
A INTEGRACAO LEVA NECESSAAIAMENTE A RENOVAÇdO TOTAL DO
SISTEMA DE ENSINO
A_Integraçâo, como filosofia educacional, não se defende
ideologicamente.
Trata-se de um realismo social, e de uma justiça social a que o
Sistema de Ensino
não pode continuar alheio, sob pena de se anquilosar, quando o que
se pretende é
que ele produza avanços substanciais em vários campos de atividade
humana.
Com a Integração o Sistema de Ensino servirá a toda a população
escolar, in troduzirá modifieações no seu seio, reexaminará os valores
e os objetivos da educa ção, proporcionando mais sucesso a mais
crianças, avaliará e perseverará semelhan ças e diferenças dos
diversos valores culturais, etc.
A Integração não pode avançar com a imobilidade do sistema
educacional
nem com soluções ou ações simplistas. Incorporalizando a Integração
no processo
da educação regular, expandem-se os horizontes do seu sistema, isto
é, a educação
pública gratuita torna-se conseqentemente mais universal.
Em complemento, a Integraçáo reclama o díreito de todas as crianças
serem
aceitas pela Escola Pública, não obstante o aspecto atípico ou
desviante que apre sentam em termos de aparência, capaeidade ou
comportamento.
A Integração implica uma mudança drástica do Sistema de Ensino.
Vejamos
superfcialmente alguns dos seus parâmetros (ver quadro).
No passado a Educação Especial e toda a sua superestrutura,
apontava o dedo
de acusação para a criança deficiente. No futuro, provavelmente,
teremos de apon tar para o Sistema de Ensino. Novas soluções para
novos problemas deverão torná-lo
mais plástico e autocorretivo, a fir. de garantír a inclusão progressiva
da Educação
Especial na Educação Regular.
A Integração deve, quanto a nós, tornar-se um instrumento de
facilitação para
a mudança educacional, permitindo que a eseola normal seja o local
legítimo para
satisfazer as necessidades educacionais das crianças que são
diferentes. Novas estra tégias e novos modelos integrados de
inovação, deverâo compreender a nova alterna tiva, compensando os
efeitos de condições sociais frustradas e desfavorecidas; e com
batendo as categorizações e as rotulações inconseqnentes no plano
educacional.

92
A Integração refletirá nesta medida, inclusivamente uma medida e
uma ftlo sofia democrática de igualdade de acesso a serviços, recursos
e instituições. Como
processo antidiscriminativo, a Integração visa programar para cada
eriança, objetivos
pedagógicos concomitantes com as suas necessidades e desejos,
eliminando rótulos e
individualizando os seus problemas. É, em última análise, uma
transição para novas
funções, novas estratégias, novos serviços, novos recursos, etc.
A Integração é, em suma, educar as crianças deficientes nas classes
dos nâo de frcientes. Para isso necessita individualizar programas,
formar professores, aplicar
novos processos, sistematizar os recursos, planificar as ações, avaliar
as intervenções,
etc.
A Integração é um todo. Parte do conceito de crianças especiais para o
concei to de situações especiais, criando novas prioridades de
formação, de prática pedagó gica e de investigação. Para além destes
vetores de desenvolvimento, a Integração de ve estar atenta aos
estudos de organízação e modificação de comportamento, de de
senvolvimento humano, de análise de sistemas de desenho curricular,
de atitudes
, dos professores, de atitudes dos pais e companheiros, de modelos de
sucesso escolar,
etc.

A Integração exige um sistema aberto de suporte, que forneça


permanente mente o contributo de especialistas, apoiados em
recursos e estratégias de instrução
acrescidas de práticas pedagógicas eficazes. Estes contatos poderão
ocorrer em ser viços especiais, mas só por curtos períodos de tempo e
só quando absolutamente
necessário, restituindo e remetendo a continuidade das intervenções à
própria Es cola Regular.
Finalizando, a Integração como filosofia educacional tem que :
a) Mudar o sistema de encaminhamento, a gestão dos currículos, as
estratégias
de instrução, as funções dos profissionais intervenientes, as variáveis
de envolvimen to sócio-pedagógico, etc.
b) Criar programas de prevençâo, de intervenção de reeducaçâo, de
formação
de investigadores, etc.
c) Alterar processos de diagnóstico, de identificação precoce, de
prescrição,
etc.
d) Reforçar o processo contínuo, os programas de
sucesso e precisão e eficá cia de programas individualizados de ensino,
etc.
De uma atitude "longe da vista, longe do coraÇão ", a Integração,
como filoso fia educacional e social, vai exigir que os deficientes
passem a estar cada vez mais
perto da vista e perto do coração.
A mudança é urgente, possível e humanamente necessária.
BIBLIOGRAFIA
1- Actas do I Encontro Nacional de Educação Especial. Lisboa, Ed. Soc.
Port. Estudo da
Def. Mental,1979.
2 - Early Meásures against Handicaps in children. Denmark, Ed.
Ministry of Education,1979.
3 - Enseignement Spécial. Bruxelles, Ministère de 1'Éducation
Nationale Belge,1981.

93
4 - FONSECA, V. Reflexões sobre Educação Especial em Portugal.
Lisboa, Ed. Moraes,1979.
5 - GAGN, R. M. Learning and individual differences. Ohio, Ed. Merrill
Columbus,1967.
6 - GUILHOOL, T. Changing Public Policies - Rooty and Forces. Reston,
Ed. CEC,1975.
7 - KAMIN, L. J. The Science and politics oflQ. Potomac, Md. Lawrence
Earlbaum,1974.
8 - MARTIN, E. Integration of the Handicapped Child into Regular
Schools. Reston, Ed.
CEC,1975.
9 - MEEHL, N. The future ofchilden: categories, labels and their
consequences. S. Francisco,
Ed. Jossey Ban,1975.
10 - REYNOLDS, M. Mainstreaning Origins and Implications. Reston, Ed.
CEC,1979.
11- SNOW, R. Consequences for Instruction: the state of Art
oflndividuadizing. Reston, Ed.
CEC,1975.

94
Envolvimento dos pais e

educação pré-primária

O apoio educacional às crianças deficientes deve iniciar-se o mais


precocemente possível. De fato, a educação de uma criança com
síndrome de Down não pode
começar aos 6 anos de idade. A estimulação e a intervenção precoces
devem iniciarse a partir dos primeiros momentos de vida.
Para a maioria dos deficientes, a intervenção precoce tem de se
perspectivar
antes da idade de dois anosó . As autoridades locais poderâo criar
condiçôes suficientes para atender a estas crianças, e mais uma vez se
equaciona a articulaçâo urgente e necessária entre os serviços da
Saúde e da Educação.
Nos primeiros anos os pais devem ser envolvidos na intervençâo com
os seus
fhos defcientes, e não só os educadores ou as enfermeiras de saúde
públicab (visitadoras). Os serviços e os seus agentes podem permitir,
nos casos em que se torne
possível, que sejam os pais os primeiros a criar estimulações e outras
condiçôes de
aprendizagem básicas. Aqui cabe aos Centros de Saúde uma função de
formação da
população que é importante dimensionar através de pequenos
panfletos lexicovisuais, diaporamas, documentaçôes, ftlmes didáticos,
etc.
Os mesmos centros assumiriam outra função importante, que seria a
de acompanhar e seguir os pais, não só em termos psicoterapêuticos
como em programas
de desnvolvimento precoce para os seus flhos.
Exatamente porque nenhuma famrlia espera uma criança deficiente é
que se
tem de formular um apoio psicoterapêutico. O choque, a surpresa
humilhante e culpabilizadora, pode implicar um conjunto de atitudes
afetivas que em nada favorecem o desenvolvimento da criança. A
revolta pessoal, as lamentaçôes prolongadas, as
autopunições divinas e os prantos frustracionais podem ser reduzidos
e transformados em atitudes positivas e abertas, proporcionando à
criança um envolvimento afetivo e emocional ajustado.

95
É neste sentido que a ação dos pais, tão importante e significativa
desde os
primeiros momentos da vida, merece o seguimento psicoterapêutico
preventivo. A
depressão, o isolamento, a culpabilização e a autocrítica desesperada
arrefecem e
inibem as atitúdes de abertura e aceitação de que a criança deficiente
precisa para
o seu desenvolvimento. O protecionismo deve dar lugar às funções de
independência. A desorganização da rotina familiar tem de dar lugar a
um sentido de vida
mais significativo e realizador. A insatisfação com os serviços tem de
dar lugar à
confiança nos serviços medicossociais e escolares. Daí o apoio
indispensável dos
Centros de Saúde neste domínio.
Os pais5 terão de ser preparados para os problemas de higiene
corporal, de
disciplina, de isolamento, de insegurança, de recreação (férías), de
espaço habitacional, de estimulaçâo, de mobilidade, de aprendizagem,
etc. Neste aspecto, o apoio
aos pais deve transcender a mera observação médica.
A expansão de infantários e de creches em tempo pleno, para todas
as crianças (defcientes ou nâo), é outro dos problemas nacionais a
integrar na estrutura
educacional e sanitária, com prioridade do meio rural em relação ao
urbano e dos
meios desfavorecidos, através, se for caso disso, de simples meios
econômicos: préfabricados, ônibus, carruagens e carros elétricos
velhos, etc. Os infantários, não
sendo dormitórios nem espaços frios, necessitam ser regulamentados.
O seu pessoal necessita ser sensibilizado para os problemas de
identifícação precoce e de
desenvolvimento (motricidade, percepção, linguagem, socialização,
etc.). As atividades de estimulação auditiva e visual devem ser mais
sistematizadas. O diálogo e a facilitação da linguagem deviam ser
previstas em termos semãnticos e sintáticos. As
atividades sensoriais e lúdicas mais planificadas, etc. A integração dos
deficientes
poderia começar nos infantários. Aqui sugere-se : por cada educadora
(ou enfermeira), uma criança deficiente para dez não deficientesó.
Por outro lado, os pais queixam-se da forma pouco clara e explícita
com que
são informados acerca da deficiência dos seus filhos6 . A informação
inadequada e
confusa - muitas vezes por banalidade dos sinais ou por atitudes de
"deixar andar"
ou de "logo se vê", muito características nalguns médicos e psicólogos,
e também
em alguns educadores e pais - peca por falta de orientaçâo e
precisão diagnóstica.
Os pais e os serviços precisam saber onde se encontram facilidades
para as
suas crianças. As Cooperativas para Educação e Reeducaçâo de
Crianças Inadaptadas - CERCIS e as Assocíações de Pais,
independentemente do grande esforço que
têm desenvolvido, não podem ser abandonadas a atitudes caritativas.
É preciso
apoiá-las a nível local e equipá-las adequadamente, fazendo delas
extensões dos
Centros de Saúde ou dos Centros e Recursos Médico-Psicopedagógicos,
podendo
eles inclusivamente prestar outros serviços à comunidade.
As autoridades competentes devem preparar boletins informativos
acerca das
facilidades locaís, divulgando-as a nível regional.
As famflias reconhecem que é difícil recolher informação de
especialistas. Por
outro lado, muitos profissionais ligados à E.E. (médicos, enfermeiros,
psicólogos,
educadores, professores, etc.) carecem de um conhecimento mais
aprofundado no
96
domfnio da deficiéncia, quer no que respeita ao diagnóstico e
prevenção, quer à sua
orientaçáo e intervenção.
Nos primeiros anos o apoio regWar aos pais poderá ser pensado em
termos de
enfermeiras de saúde pública. Quando a criança se encontra em idade
escolar, essa
função deverá pertencer ao professor do ensino especial, assumindo
este o papel de
mediador entre os pais e os serviços. Pais e serviços necessitam estar
em perma nente contato, a fim de comunicarem novas informações,
promover sessões de for mação, preparar entrevistas e exames
complementares, descompensar o "stress fami liar", planificar o futuro,
etc.
" Os serviçosó poderiam preocupar-se em desenvolver as seguintes
ações:
I - realização de visitas domiciliárias;
2 - organização de equipes itinerantes ou peripatéticas;
3 - criaçâo de ludotecas ambWantes ;
" 4 - organização de sessões de demonstração (workshops) sobre
métodos de
estimulação, de aprendizagem de atividades da vida quotidiana, etc.;
5 - organização de equipes de voluntários, de adolescentes ou adWtos
dis poníveis para atividades lúdicas, visitas, contatos com os pais, etc.;
6 - criação de associações de profissionais e promoção de ações de
forma ção e de investigação;
7 - criação de associações com o apoio público ; etc.
Outro problema que cabe neste setor é o da educaÇão pré-primária,
setor aliás
pouco considerado entre nós e ainda longe de ser uma realidade para
todas as crian ças portuguesas, deficientes ou não. A educação pré-
primária é um elemento essen cial da democratização escolar. Como
tal, não pode continuar a debater-se nos gabi netes. Os direitos das
crianças e o desenvolvimento do potencial de uma nação não
podem (ou não deviam) perder tempo.
A educação pré-primária deverá ter' :
lj objetivos sociais (desenvolver diversas formas de socíabilização,
compen sando as diferentes formas de segregaçâo social, isto é,
constituir um instrumento de
combate às diversas situações de injustiça social);
2) objetivos educacionais (compensar as diferenças de nível
lingriístico ; prepa rar as condições de aprendizagem para as tarefas
escolares da primária ; estimWar os
processos de informação sensorial: audição, visão, tátil-ánestésico,
olfativo, gusta tivo, etc. ; desenvolver a linguagem falada receptiva e
expressiva; promover o desen volvimento perceptivo-visual e
perceptivo-auditivo ; estimular o desenvolvimento psi comotor e
simbólico, o desenvolvimento emocional, as explorações criativas,
imagi nativas, inventivas e expressivas no domínio musical, artístico,
corporal e verbal, a
aprendizagem da pintura, do desenho, do grafismo; estimular a
identificação lúdica
e a recitação das letras do alfabeto com combinações silábicas e suas
derivações;
proporcionar experiências lógieo-manipulativas, etc.)
3) objetivos preventivos e evolutivos (desenvolver a identifieação de
sinais de
imaturidade no plano motor, psicomotor, perceptivo-auditivo,
perceptivo-visual, vi somotor, articWatório, etc., que possam
comprometer a evolução escolar ulterior;
desenvolver a autonomia social-pessoal, promover o desenvolvimento
motor, afeti
97
vo, intelectual e social, atividades de compensação e de facilitação da
linguagem, envolvimento dos pais, etc.).
Uma orientação pedagógica do tipo Bon Départ2 (França, Dinamarca,
Suíça,
etc.) ou Headstart5 (Estados Unidos) é necessária para o nosso país.
Devem-se criar
programas compEnsadores, destinados a reduzir as diferencíações
sócio-econômicas
e sócio-culturais e dar as mesmas oportunidades de êxito na escola
primária a todas
as crianças. Metodologias baseadas em Montessori, Decroly, Froebel,
Deweyl Isaacs,
Wallon, Piaget, Erikson, ou na Opera Classroom, necessitam ser
experimentadas,
avaliadas e divulgadas em Portugal.
Um dos prímeiros díreitos da criança é o direito ao infantário e às
escolas préprimárias. As autoridades têm, pois, o dever de
proporcionar as mesmas possibilidades de desenvolvimento e as
mesmas oportunidades de triunfo e realização na vida,
combatendo em termos culturais a persistência de privilégios logo à
partida.
Sem o ensino pré-primário preventivo a nivel nacional, a escola
primária contínuará a legitimar as diferenças sócio-econômicas e
sócio-culturais entre zonas e
grupos socíais.
Assim como a escola pré-primária é indissociável da escola primária,
também
aquela tem de ser indissociável da rede de infantários, pois só dentro
de um sistema
integrado e coordenado de estruturas educacionais (desde os
primeiros anos até aos
cinco anos) se pode perspectivar a educação e a integração das
crianças deficientes.
A escola pré-primária não pode ser um fator desigual de
desenvolvimento nem
um novo fator de segregaçâo socíal3.
BIBLIOGRAFIA
1- DEWEY, J. Vida e educação. Lisboa, Ed. Melhoramentos,1968.
2 - LAMPREIA, R. Apficação do "Bon Départ". Lisboa, Fundação
Calouste Gulbenkian,
1970.
3 - MIALARET G. La educaáón preescolar en el mundo. UNESCO 1976.
4 - SHAKESPEARE, R. 'The psychology of handicap. Londres, Ed.
Mcthuen,1975.
5 - SMTTfi, R. M. e NEISSWORTH, J. T. 'fhe exceptional CHILD: a
functional approach. No va Iorque Ed. McGraw-Hill Book Co,1975.
6 - WARNOCK REPORT. Síntese recolhida no Congresso Mundial sobre
Educação Espeáal.
7 - WEDELL, K. e RAYBOULD, E.C. Early identíficatíon of educationally
"art risk" chil dren. Educational review.

98
FormaÇão e investiaÇão

Em Portugal devem ser tomadas medidas drásticas para elevar o nível


da formação dos professores da Educação Especial - EE, culminando
com licenciatura e
favorecendo e estimulando a investigação2 .
A EE entre nós é um campo onde pairam afirmações sem
comprovação factual e onde se atua na base de preconceitos e de
empirismos. A EE não pode continuar a ser o refúgio dos professores
menos qualificados, a única alternativa profissional por estar mais
perto de casa ou uma opção profissional por razões de caridade
e de compaixão. Para a EE deverão ser recrutados os professores e os
técnicos mais
competentes científica e pedagogicamente, na medida em que lhes
vão ser exigidas
capacidades para dar respostas a complexas necessidades,
nomeadamente as seguintesl : (1) diagnóstico; (2) planejamento
curricular; (3) metodologia pedagógica; (4)
competência técnica na utilização de vários processos de informação;
(5) administração; (6) consulta, que lida com problemas educacionais,
ocupacionais, vocacionais, sociais e pessoais; (7) envolvimento pessoal
e tolerãncia; (8) relações públicas,
a fim de trabalhar em grupo com as autoridades, serviços e atender os
pais, etc.
O professor da EE tem como funções profissionais um campo muito
vastol ,2 :
sessões de informação e de formação de outros professores;
orientação e observação; intervenção pedagbgiea com crianças
deficientes; responsabilidade de casos e de
pequenos grupos ; ações de apoio e encaminhamento ; projetos
experimentais ; investigação regional; planificação de ações de
identificaçâo precoce, etc. Por aqui se prova que o campo da EE não é
fácil e exige uma intervenção competente e responsável; daí a
necessidade de um certificado de pós-graduação a nível de
licenciatura.
Para já, e a nível de sensibilização, dever-se-ia criar uma unidade de
EE em
todas as Escolas de Magistério (futuras Escolas Superiores de
Educação), que podia

99
ser ministrada pelos professores já formados pelo Instituto Antônio
Aurélio da Costa Ferreira (IAACF). Dentro dessa unidade, todos os
professores primários poderiam ser sensibilizados para a Problemática
e Prevenção da Deficiência e para as Dificuldades de Aprendizagem.
Os professores primários devem ser alertados para os sinais que
possam pers=
pectivar uma necessidade educacional especial e perceber a
importãncia dos mesmos
no desenrolar do processo de aprendizagem, naturalmente apoiados
por dados de
investigação. Ao mesmo tempo, os professores deverâo conhecer os
serviços a nível
local, regional e nacional, lidando com os pais e orientando-os em caso
de necessidade .
A formação inicial dos professores primários pode ter créditos de EE,
que deverão ser completados em termos de pós-graduaçâo e após 3
anos de prática de ensino. Instalar progressivamente unidades de EE
junto das escolas de formação de professores é uma medida Que se
recomenda.
São urgentes cursos de sensibilização com uma semana de duração,
nas férias
do Natal, da Páscoa e do Verâo2 .
Daqui poderia partir um sistema de créditos que, acumulados,
proporcionariam a criação de um certificadoz, sem o qual ninguém
deveria trabalhar na EE
quer a nível oficial, quer a nível particular. A criação de um grupo de
professores
itinerantes a nível nacional e coordenado pelos serviços competentes,
a fim de eliminar autodidatismos inconseqentes, poderia dar resposta
a esta primeira fase, tornada depois extensiva a todos os professores
que atualmente trabalham nas CERCIS,
nas Associaçôes de Pais de Crianças Deficientes, nas classes de apoio,
nas classes especiais, nos estabelecimentos particulares, nos centros
do MAS, etc., diminuindo assim a percentagem dos que trabalham na
EE sem qualificaçâo. A mesma sensibilização poderia ser pensada para
os professores em exercício e para os professores em
formaçâo inicial, criando unidades ao nível das vinte e tal escolas de
magistério existentes ou utilizando a televisão para o efeito,
aumentando a urgência de uma Universidade Aberta. Desse núcleo
podiam partir outras ações de formação, apoio e investigação,
estimulando a especialização a nível local.
Os professores de Trabalhos Manuais, de Educação Física, de Música,
de Atividades da Vida Quotidiana, de Educação Visual, e as
Educadoras em geral, deveriam ter uma qualificação pedagógica
adicional2 a ser conferida pelo IAACF (ou
simílares), abrindo-se este a mais técnicos e a agentes que intervêm
na EE com cursos e módulos curriculares diferentes do curso principal
de formação de professores
da EE.
Esta qualificação adicional deveria ser pensada a níveis mais elevados
para o
caso de médicos (escolares), de psícólogos (escolares), de assistentes
sociais (de intervenção do MAS), de advogados (ligados aos problemas
da delinqnência), de terapeutas (da fala, ocupacionais, fisioterapeutas,
psicoterapeutas, etc.) que trabalhassem nas estruturas da EE, etc. Esta
ação, obviamente concentrada nas Universidades
ou nos Institutos Universitários, deveria abrir espaço à EE no campo
das Ciências de
Educação, institucionalizando cursos de pós-graduaçâo, mestrado e
doutorado, como garantia de uma investigação suportada por teses e
dissertaçôes de nível superior
e universitário.
100
Professores defcientes visuais, auditivos ou motores podiam dar um
grande
contributo à formação de professores e na educação de crianças
defcientes, estimulando ofcialmente a sua atividade pedagógica e
científica. Ninguém pode ser classifcado medicamente como inválido
para ensinar, para mais com a atual tecnologia.
Há que explorar este fzlão, quer para o problema da integração, quer
ainda para os
benefícios que, conseqnentemente, resultariam para a educação de
crianças defcientes.
A formação de Professores de Educação Especial e as múltiplas ações
que temos vindo a analisar justificam a substituição do IAACF pela
designação de Instituto Superior de Educaão Especial ISEE),
epistemológica e cientificamente mais correta do que a sua integração
nas futuras Escolas Superiores de Educação, não esquecendo que
caberá a ele sempre aformação pós graduaç'ão dos professores. A
integração a fazer seria a nível universitário, e não àquele que está a
ser pensado entre
nós.
A perspectiva de formação de professores de EE não pode ser
exclusivamente
centrada numa visão pedagógica ou ortopedagógica; ela não pode
reduzir a importância dos fatores: sócio-culturais (envolvimento
familiar, habitação, nível econômico, nutriçâo, fatores subculturais,
facilidades educacionais, expectativas dos professores, currículos,
material didático, etc.); neurobiológicos (organização intrínseca
do sistema nervoso, que preside às funções da atenção, percepção e
conceptualização, deficiências sensoriais auditivas, visuais e tátil-
cinestésicas, biologia da linguagem, problemas motores, problemas de
comunicação, problemas somáticos, etc.) e
psicoemocionais (privação sensorial, interação mãe-filho, padrões
perceptivos e
adaptativos, desenvolvimento motor, perceptivo, psicomotor,
lingiiístico, cognitivo,
emocional e social, etc.). (Ver fg. 7). A partir das relações entre estes
fatores, poder-se-á construú, não só o currículo de formação, como
também o próprio mosaico de investigação da EE em Portugal.
O currículo de formação poderia necessariamente enquadrar todos os
problemas inerentes à EE, antes de equacionar qualquer
especializaçâo. A criação de módulos interdisciplinares é fundamental,
a fim de se abordarem os problemas do desenvolvimento (normal e
patológico) e da neuropsicologia e
neuropsicopatologia da
aprendizagem, quer na criança não deficiente quer na criança
deficiente. Enquanto
não for garantido este tipo de formação clinico-pedagógica, a formação
dita "especial" confunde-se com uma formação que devia ser "geral".
As crianças defcientes
têm necessidades especiais e aprendem de maneiras diferentes, daí
que os professores necessitem saber estimular o sistema nervoso
central, meio através do qual a
criança aprende .
Aformação cientifico-pedagógica dos professores de EE' deve ter em
conta
as seguintes áreas: Teorias do Comportamento, Teorias da
Aprendizagem, Neurobiologia da Aprendizagem, Processamento da
Informaçâo, Diagnóstico, Psicopedagogia
da I,eitura, da Escrita e do Cálculo, Psicologia do Desenvolvimento,
Desenvolvimento de Currículos, Planifcação Educacional
Individualizada ou para Pequenos Grupos, Epistemologia Genética
(Piaget), Teoria das Personalidades (Erikson, etc.), Psicologia
Diferencial e Psicometria; Metodologia da Investigação,
Psicolingnística,

101
Auto-Aprendizagem; Problemas Sociais da Juventude; Etiologia;
Defectologia Humana, etc.
NEURO- I SÓCIO-
BI OLbGICOS CULTURAIS

. Org. neurolóca . Envolvimento


-. afetivo
mtrínseca: Nfvel sócio-econômico
atenção-percepção Nutrição
-conceptuafização Meio
urbano-rural
Fatores aferentes e . Subcultura
eferentes (input-output) . Facifidades de
Processo de Z. desenvulvimento
informação (V-A-C)
Z . Esfimulação precoce
Disfunções da . Serviços
finguagem A .-- médico-sociais
Deficiências . Estatuto dos pais
somáticas Expectativas

PSICOEMOCIONAIS JI
. Priva ão sensorial
. Interações mãe-filho
(insuficiência, distorção, discontinuidade
. Desenvolvimento perceptivo
. Padrões de adaptação
. Capacidades cognitivas
Ansiedade "Self-concept
. Des. personafidade

Nota: V - visão
A - audição
C - tátil-cinestésico

A formaçâo de professores de EE nâo progredirá sem a criaçâo do


grau de licenciado em Cências de Educação nas Universidades ou nos
Institutos Universitários Portugueses. Dado que se trata de uma pós-
graduaçâo, da mesma forma o fundamento cientffico e a prática
pedagóca o deveria ser, visto que, sem um apoio na
investigaçâo, não vemos como seja possível avançar na EE. A
designaçâo mais adequada, aliás já adotada noutros países, seria a de
psicoeducadoras' e a sua intervenção poderia ser pensada em
agências sociais, em serviços médico-sociais, hospitais,
caixas de previdência, escolas oficiais e particulares, etc.
Em qualquer dos modelos de formação que se adotem, se
modit`iquem e se
avaliem, nenhum deles poderá resolver os problemas da EE sem o
apoio indispensável da investigação. A formaçâo deveria ser norteada
por um primeiro bloco através
de uma experiência prática na áase de um pré-estágio de formação no
primeiro ano
102
(estudo de classes, de pequenos grupos, de casos; diagnóstico;
orientação e intervenção supervisionada; intervenção domiciliária, com
crianças deficientes e seus pais;
avaliação das expectativas dos professores e dos pais; aspectos
pedagógicos, psicológicos e sociológicos do campo, através de um
amplo contato e convívio com deficientes, etc.) e por uma investigação
formativa e especializada no segundo ano (estudo do diagnóstico
diferencial; metodologia pedagógica; seqencializaçâo da
aprendizagem; planificação, aplicação e criação de métodos e de
materiais; metodologia
de investigação; estatística; orientaçâo vocacional como módulos de
tronco comum
e com opção por uma das seguintes especializações: Deficiência
Auditiva, Defciência Visual, Deficiências de Comunicação, Defciência
Mental, Deficiência Motora,
Deficiência Emocional e Dificuldades de Aprendizagem).
O segundo bloco fcaria concluído com a licenciatura, ou seja, a pós-
graduação, devendo ser seguida de um estágio prático e profissional
de um ano, da responsabididade de um coordenador já em exercício,
culminando com a apresentaçâo e
debate de um relatório e de uma monografia. Para obter a licenciatura,
os candidatos teriam de ter antes do curso pelo menos 3 anos de
experiência profissional, adicionados com mais 3 de formação.
O terceiro bloco de formação, já do âmbito das Ciências de Educação,
devia
ser concedido após dois anos de experiéncia profissional,
acompanhada de módulos
ou créditos de formação em exercício, virados fundamentalmente para
a investigação, preparando o doutoramento em Ciências de Educação
no domínio da EE. Para
este efeito seriam necessários cerca de 8 anos de experiência em
formação e em intervenção. Nos países da Europa, nomeadamente na
Holanda, na Noruega e na A1emanha Federal, os modelos são mais ou
menos idênticos aos que apresentamos, e,
de fato, quer a formação, quer a investigação em EE, têm avançado
substancialmente naqueles países. Persistir nos modelos franceses não
vai imprimir o desenvolvimento necessário neste campo, daí o nosso
alerta.
A criação de Escolas Superiores de Educação, do chamado Ensino
Superior de
Curta Duração, se não tiverem um sistema aberto e progressivo no
sentido de formação científica (na via do doutoramento), poderá
liquidar o avanço na investigação
e na intervenção em Ciências de Educação. O que seria da
investigação em Biologia,
em Medicina, em Matemática, se não se estimulasse nas Universidades
o estudo para
o doutoramento? Obviamente, os avanços nas Ciências de Educação
dependerão das
mesmas condições de crescimento. Será que os responsáveis já
equacionaram o problema? Ou será que a Educação tenderá a
permanecer na cauda da investigação, e,
por causa disso, ficará sempre condenada a ser reinada por místicas
formulações
teóricas, livrescas e encantatórias . . .
Na linha que indicamos acima, os doutorados poderiam assumir papel
na investigação e na formação, ao mesmo tempo que penetrariam na
prática profissional
através de: ações de orientaçâo e direção escolar e vocacional;
responsabilidade por
Centros de Recursos e de Diagnóstico Psicopedagógico ; formação de
professores primários, etc. Podiam assumir igualmente funções de
professores e investigadores itinerantes ou fixos a nível local e distrital.
Só com estas medidas, e muitas outras, se
pode valorizar a investigação em Ciências de Educação e a formaço
científico-pedagógica dos professores de todos os âmbitos e níveis.
103
O problema da EE não pode permanecer em atitudes e valores que
fazem
lembrar a história dos três cegos a quem foram pedidas descrições de
um elefante . O
primeiro, sentíu uma perna e disse que era o tronco de uma árvore. O
segundo, sentiu a barriga e disse que era um barril. O terceiro, sentiu o
rabo e descreveu o elefante como uma corda. Pior ainda, a EE não
pode continuar a repousar em "experiências feitas" e em "jogos de
importância". necessário estimular e encorajar a investigação, caso
contrário estaremos metidos na história do bêbado que, regresssando
a
casa numa noite muito escura, procurava as chaves perdidas por baixo
de um candeeiro. Uma pessoa, ao passar, perguntou-lhe: "que procura
senhor?" O bêbado respondeu: "Perdi as minhas chaves." A pessoa de
novo: "Tem certeza de que as perdeu debaixo do candeeiro?" O bêbado
retorquiu: "Não, não foi aqui, foi ali na escuridão, mas é mais fácil
procurá-las aqui "
A EE é um campo complicado que não pode ser tratado em termos de
métodos pedagógicos. Muitos dos problemas da EE nâo podem ser só
solucionados pela
educação ou pela pedagogia' . Não se pode continuar a ver os
problemas de cabeça
para baixo, exatamente porque se centram as questôes na criança
deficiente. A problemática da EE não pode ser estudada só no sistema
educacional ou só nas dificuldades da criança ou no seu envolvimento
familiar. A análise da situaçâo precisa
passar pelos problemas sociais e pelo tipo de vida que se preserva.
Não serão talvez a
sociedade e a escola que estão deficientes?'
A EE deve encarar a criança como um todo, em que não só as
matérias escolares contam. Sabemos que toda a educaçâo deveria ser
assim dimensionada; só que o
peso da inércia aqui se complica a vários níveis. Não se pode esquecer
que cabe à escola a responsabilidade do desenvolvimento social e
emocional da criança. Será que
a formação dos professores entre nós tem equacionado o problema?
Provavelmente,
não. A escola tem estado maís concentrada nos problemas
metodológicos e técnicos
que põem sobretudo em jogo as áreasfracas da criança. A EE, ao
contrário, tem de
se concentrar nas áreas fortes da criança, e explorá-las sem limites. Os
recursos,
aqui, são as crianças deficientes, vistas nâo como objetos mas como
sujeitos. A EE
começa pelo perfil de capacidades e integridades da criança. Interessa
analisar aquilo que a criança pode fazer, e a partir daí construir
situações que garantam passo a
passo e de sucesso em sucesso, o esforço das suas possibilidades
criativas.
A palavra de ordem é diminuir a diferença entre a educaçâo regular e
a educação especial. Mais: nos nossos dias toda a educação deve ser
especial porque lida
com crianças especiais. Toda a criança é especial e única. Toda a
criança aprende de
uma forma especial, exigindo também professores especiais. Numa
palavra, a educação especial não se justifica. Toda a educação deve
ser especial por se dirigir a seres
peculiares e originais, quer sejam deficientes ou não. Mesmo os mais
deficientes devem ser integrados nas escolas regulares. No futuro, as
escolas deverão dispor de
centros de recursos. Por cada conjunto de pelo menos 3 em 4 escolas
regulares, dever-se-ia pensar numa unidade de EE com um professor
de EE, dito "especial" só
porque atende crianças e apóia os professores num esforço conjunto,
que visa à integração de crianças que se desviam das outras por
determinadas características.
104
O professor de EE pode ser um coordenador de um grupo de
professores regulares2 pois nessa medida se deve pensar na sua
formação, exatamente porque nela
se justifica o processo mais geral da integração. Todos os professores
"regulares"
ou "especiais" deverão ser envolvidos na educação de crianças
(deficientes ou não).
Devem conhecer de alguma forma as características de
comportamento e compreender as suas dificuldades. Todo o professor
deve estar equipado para, na situação
de classe regular, atender as necessidades educacionais especiais de
qualquer criança.
No futuro, o recurso ao especialista deve compensar-se no sentido de
uma formação especial para todos os professores em geral. O
professor de EE não pode continuar isolado nas classes especiais e no
apoio ; cabe-Ihe a cooperação com o professor das classes regularesl
intervindo quer a nível das classes, quer a nível de pequenos grupos,
ou, ainda, por meio de planos educacionais individualizados.
Só podemos caminhar nesta direção através de investigação e da
formação a
nível superior. Não é preciso inventar novos professores, nem novos
especialistas;
é preciso, sim, valorizar os professores já existentes com medidas
adequadas que colocam a urgência de uma Faculdade de Ciências de
Educação. Nesta faculdade dever-se-ia pensar: nos problemas de
formação dos formadores; na formaçâo em exercício; nas reciclagens;
na elaboração coordenada e científca dos programas e currículos
temáticos de todos os graus de ensino (infantil, pré-primário, básico,
secundário, especial, vocacional, pré-profissional, etc.); rla formação
dos médicos e dos psicólogos escolares; nos problemas de observação,
avaliação, identificação e diagnóstico educacionais; na coordenação da
investigação pedagógica local, distrital e nacional; na criação de
centros de recursos e de material pedagógico; nos problemas de
administração escolar; na história da educação; na filosofa da
educaçâo; na tecnologia educativa; na educação e prevenção sanitária
(formação de professores para os
problemas da droga, do alcoolismo, da higiene mental, da
delinqnência, etc.); na alfabetização; na educaçâo permanente; na
animação sócio-cultural, etc. Parece-nos
que com estes dados se justifica a criação de Faculdades de Ciéncias
de Educaçâo
no nosso país, caso contrário o potencial humano corre riscos de ser
mal preparado
para as necessárias transformações da sociedade portuguesa.
Como noutros aspectos e domínios da atividade humana, as Ciências
de Educação só poderão progredir eficazmente e inovarem-se se forem
baseadas na investigação. E não nos parece possível que ela se
desenvolva nas atuais estruturas de formação de professores.
A formação dos professores tem de ser alicerçada numa informação
coerente,
numa experiéncia prática e numa procura científca, rigorosa e
metodologicamente
dimensionada. Só dentro destas coordenadas pode nascer a
compreensão das práticas educacionais e a superação dos tradícionais
empirismos. Esta tarefa, como é óbvio, supõe implicitamente um
conhecimento sério das leis e dos princípios derivados
da investigação.
BIBLIOGRAFIA
1- COUNClL OF EXCEPTIONAL CHILDREN - CEC. Documentação sobre o
lá Congresso
Mundial sobre o Futuro da Educação Especial. Stirling,1978.
2 - WARNOCK REPORT. Síntese recolhida no Congresso Mundial sobre
Educação Especial.

105
9
Princípios e conteúdos da

formação dos professores

do ensino especial

Ao abordarmos esta temática, pretendemos apenas apresentar um


modelo de
! Formação dinâmico e sistêmico, porém necessariamente inconcluso,
que resultou da
nossa experiência como professor no Instituto Antônio Aurélio da Costa
Ferreira IAACF, nos anos de 1977, 78 e 79.
I. Principios e necessidades gerais sobre a formação
de professores do ensino especial

Defendemos à partida que toda a formação do professorado se deve


orientar
para uma permanente interação e reciprocidade entre a formação
inicial e a formação em exercício. Estabelecer um sistema, ou um
modelo de formação, com caráter
de permanente atualização é, para nós, de importância vital quer no
plano científico, quer no plano pedagógico.
A formação permanente deve, em suma, caracterizar a formação em
exercício. Nesta linha, a formaçâo não pode, em nenhuma circunstncia,
ser circunscrita a
um período de tempo. Entre a formação inicial (pré-serviço) e a
formação permanente (em serviço), ter-se-ão de estabelecer, sistemas
de levantamento de necessidades e sistemas de disseminação de
recursos e conhecimentos.
Os sistemas de levantamento de necessidades, deverão partú das
escolas propriamente ditas e dos seus professores para os centros de
formação. Ao contrário, os
sistemas de disseminação de recursos e conhecúnentos deverão partir
dos centros de
formação para as escolas, mantendo, em conseqiiência, uma
constante interação e
colaboração.
106
Ess SIstemas de levantamento Centros de
Professores de necessidades Formação
(sistemas de suporte)
Sistemas de disseminação
de recursos e conhecimentos Educação Regular
Educação Regular (mastérios, etc.)
Educação Especial Educação Especial
(I.A.A.C.F., etc.)
Dentro de um sistema de interação como este, obviamente que se
terão de
criar sistemas de suporte, nâo só dentro das escolas como entre os
diversos Centros
de Formação. Dentro das escolas, a coordenação de Serviços de
Educação Regular
e da Educação Especial, bem como o incentivo de modelos
colaborantes dos respectivos professores, deverá ser a orientaçâo
futura do sistema de Ensino, visando não
só à meta da Integração das crianças deficientes, como também : a
resoluçâo dos casos atípicos de aprendizagem, a estruturação de
processos de identificação, a implementação de novas estratégias de
ensino, a discussão de casos, a criação de equipes
de professores itinerantes e de professores consultores, etc. Entre os
Centros de
Formação, a avaliação e inovação de currículos, a permuta de
professores e a realização de projetos em comum, bem como, de
outros sistemas de suporte como por
exemplo: a descentralização da formação, a criação de centros de
recursos, a utilização de planos educacionais para pequenos grupos, a
implementação da individualização, a criaçâo de estruturas de
diagnóstico interdisciplinar de centros locais e regionais de observação
e prescrição, a iniciação de projetos de investigação, a realização de
cursos intensivos, etc., deveriam ser estimuladas e implementadas,
realizando
na prática toda uma mudança do Sistema de Ensino e acabando,
objetivamente,
com as fronteiras entre a Educação Regular e a Educação Especial.
Pensamos que, assim, o modelo de Formação se interligaria com um
processo
de inovação e de reforma efetiva de todo o sistema de Ensino. Com um
novo modelo de Formação de professores, a Escola passaria a dar
respostas às suas necessidades, ajustando-se a todo o tipo de casos e
produzindo, no seu seio, os seus próprios
sistemas de suporte. Esta seria, num dado sentido, a verdadeira
Educação Especial,
tomando cada criança, deficiente ou não deficiente, como um caso
especial, tendo
em atenção as suas necessidades, as suas capacidades e os seus
desejos, ou seja, o seu
perfzl intra-individual de aprendizagem.
A Formação de professores encarada como uma unidade sistêmica de
um sistema de Ensino mais global, deveria ser um meio de mudança e
de renovação. A inovação do ensino tem de ser encorajada nos Centros
de Formação e nâo nas suas estruturas administrativas. Trata-se de um
eixo de inovação, quer para o ensino ministrado nas "classes" das
escolas espalhadas pelo país, quer para a fundamentação
científico-pedagógica dos currículos de formação dos professores do
ensino regular
e do ensino especial.
107
Com base num modelo deste tipo, as pressões sociais, as motivações
e as atitudes pedagógicas, as aspirações dos professores e dos seus
grupos de animação, as necessidades dos educandos, etc., poderiam
adequar-se e ajustar-se progressivamente a
novos conteúdos e a novas formas de intervenção pedagógica.
Imprimindo um sistema obrigatório de formação permanente,
interligado necessariamente com outras alterações estruturais do
sistema de ensino, poder-se-iam
equacionar processos de caracterização, de controle e de
transformação, isto é, todo
um sistema à base de critérios científcos que visassem contribuir para
o desenvolvimento sócio-pedagógico global do sistema de Ensino. Por
esta via, os professores
atingiriam maior capacidade de resposta aos problemas urgentes e
quotidianos que
surgem na prática pedagógica, podendo mesmo antevê-los ou até
preveni-los.
Nesta perspectiva, a ligação entre a formação inicial poderia ser
mediatizada
pela vida profissional. Os professores formados com os problemas da
sua prática
profissional diária, poderiam então remeter para os Centros de
Formação as suas interrogações e reflexões, garantindo aqueles uma
inovação constante e uma ligação ,
intrínseca com a realidade. Com programas de formação permanente,
os professores
já formados, poderiam emprestar a sua experiência aos Centros de
Formaçâo, ao
mesmo tempo que se estabeleceriam processos necessários de
comunicação com os
professores recém-formados. A oportunidade capital de crítica, pela
experiência, à
formação inicial é, como sabemos, indispensável ao progresso do
ensino em geral. A
formação permanente poderia também utilizar este recurso
fundamental, o que por
si só introduziria um processo de inovação de grande utilidade para os
próprios centros de formação.
Deste modo, os professores passariam a ser agentes de formação e
não meros
recipientes. Aos professores caberia também a mudança e
desenvolvimento do seu
próprio processo de formaçâo e do seu envolvimento profissional.
Produzir-se-ia um
contínuo desenvolvimento dos atributos dos professores através de
opções de
processos de aprendizagem e formação mais independentes e
cooperantes.
Para que este processo de formação se estabelecesse seria necessário
introduzir
um sistema estruturado por créditos. Entenda-se por crédito uma
unidade de formação equivalente a 40 horas de carga horária,
perfazendo uma semana de formação
intensiva.
Tendo em consideraçâo estes princípios gerais, poder-se-ia entâo
sugerir um
sistema de formação do professor do Ensino Especial visando à
licenciatura. Licenciatura essa obtida em créditos, (hipótese - 20
créditos) e por blocos de formaçâo
(ver quadro), adquiridos em Institutos, Centros de Formação ou em
Faculdades de
Psicologia e de Ciências de Educação reconhecidas e apetrechadas
para o efeito.
Para se implementar um modelo de formação deste tipo um conjunto
de necessidades terão de ser urgentemente equacionadas. Dentro
delas, destacamos essencialmente : necessidades nacionais,
necessidades regionais, necessidades institucionais
e necessidades pessoais (i.é., dos próprios professores).
De uma forma muito esquemática, poderíamos então, listar algumas
dessas
necessidades :
108
QUADRO I
BLOCOS de FORMAÇÃO do PROF. de ED. ESPECIAL

Dois anos de experiência profissional


no Ensino Regular
INPUT (Admissão)
. Formação Inicial
(pré-serviço)
. Quafificação Pedagóca Inst. Antó Aurélio
lobloco A<onal (prof. Trab. Man.; da Costa Ferreira
Ed. Física, Educadoras, etc.) ou...

Bacharelato (BA) I
Certificado para o ensino I
espeáal I
Três anos de experiência I
profissional no E.E.

I
. Escola Superior de
. Pós-graduação Educação
2o bloco . Formação Permanente . Faculdade de Psico (Em Serviço)
logia e de Ciências
. Créditos de Educação
. Dissertação ou Monografia . Outros Centros e
Institutos Superiores
Licenciatura (LI) I
Responsabifidades de Coordenação
II

ÌI
3o bloco i Formação dos Formadores I
; Investigação ;
?Z

(Mestrado)

Doutoramento (DO)

Responsabifidades de Orientação
Formação, Diagnóstico...
109
(a) NECESSIDADES NACIONAIS

. Cursos intensivos: de fins de semana, de verâo, etc;


. Criação de Centros de Formação Permanente (base da
descentralização);
Apoio à investigação, estudos-piloto, cursos, etc;
Currículo baseado nas necessidades imediatas dos professores
(planifícação
de lições, métodos de ensino, etc.);
Treino de Formadores;
. Prof. peripatéticos ;
Relação estreita com organizações sindicais;
Responsabilidade do Governo;
. Igual importância financeira, entre formação inicial e formaçâo em
exercí cio ;
Institutos de Formaçâo Permanente ;
etc..;
(b) NECESSIDADES REGIONAIS

Apuramento ou levantamento das necessidades educacionais locais ;


Períodos curtos para formação intensiva (horário pós-laboral);
Todos os 5 anos, um período de Formaçâo obrigatório de 5 a 6
semanas;
Cursos curtos (3 dias, uma semana, etc.);
Seminários, conferências, centrados nos problemas do dia-a-dia ;
. 5 DIAS DE ESTUDO E FORMAÇÃO POR ANO EM REGIME OBRIGA
TÓRIO ;
etc.. ;
(c) NECESSIDADES INSTITUCIONAIS

Inovação de Currículos;
Enriquecimento do envolvimento;
Movimento de inovaçâo (mudar a escola por dentro);
. Dar ao prof. melhores meios para responder à complexidade dos
problemas ;
Permitir que a escola e a comunidade realizem melhor os seus
objetivos;
Criação de Centros de Recursos Pedagógicos;
. etc.. ;
(d) NECESSIDADES PESSOAIS

Auto-educação ;
Sintetizador de informação ;

110
Educação como processo e não como produto;
Prof. agente de mudança e não recipiente ;
Criação de Centros de Professores (consultores, materiais, programas,
cur rículos, visitas, convívio, etc.)
2. Perfil Pedagógico-Profissional do Prof. do Ensino Especial

O Universo da Educação Especial é deveras complexo para o


abordarmos simplisticamente, razão pela qual reservaremos para
outros trabalhos o seu tratamento
mais diferenciado. O nosso objetivo aqui é responder a questões muito
simples:1Formar quem?; 2 - Formar para onde? (onde, como, campo
pedagógico-profissional).
A resposta é fácil - formar o professor de Ensino Especial.
Rappaport e McNary (1979) apresentam as seguintes características
da personalidade do prof. de Ensino Especial:
PERFIL DO PROF. DE ED. ESPECIAL:
Características da Personalidade (Rappaport e McNary)
. Auto-respeito ;
Espontaneidade;
. Sensibilidade ;
Tolerância frustracional elevada
Inteligência ;
Estabilidade emocional ;
Energia ;
. Responsabilidade ;
Atitude positiva perante crianças defcientes;
Abertura ;
Tratam-se de simples quadros da personalidade, que nos dão já uma
visâo de
quem é que teremos de formar.
Evidentemente que este perfil de personalidade é demasiado vago
para nos
apercebermos das competências pedagógico-profissionais que o
campo da Educação
Especial requer.
De uma forma rápida, e, de acordo com a nossa experiência, podemos
diferenciar algumas competências pedagógico-profissionais do prof. do
Ensino Especial.
Quanto a nós, o prof. do Ensino Especial deveria demonstrar
capacidades:
. . Para avaliar as necessidades educacionais específicas das crianças;
. . para planificar curricularmente as seqências de aprendizagem;
para utilizar métodos pedagógicos reeducativos, reabilitativos ou com
pensatórios, bem como técnicas e materiais didáticos apropriados ao
es tilo de aprendizagem das crianças;
para usar a informação contida nas avaliações de outros profissionais
(médico, psicólogo, terapeutas, ass. sociais, consultores, especialistas,
etc.);

111
para desenvolver prescrições educacionais em termos de
comportamen to, que satisfaçam as necessidades intra-individuais
identificadas;
para selecionar técnicas e materiais, que implementem um programa
educacional individualizado ;
para criar recursos pedagógicos, geri-los e administrá-los
adequadamen te ;
para realizar avaliações contínuas (pré e pós--programa);
para efetuar relatórios evolutivos e cumulativos ;
. . para recomendar mudanças apropriadas no flm ou durante o
programa,

através de reavaliaçôes periódicas ;


para abordar e integrar os pais e outros colegas no processo e no pro
gresso educacional das crianças.
Por este quadro, estaremos talvez melhor colocados para estruturar o
campo
pedagógico-profissional do prof. do Ensino Especial. O prof. do Ensino
Especial
pode portanto assumú múltiplas funções. Funções de: consultor;
observador; coordenador ; gestor de recursos pedagógicos ;
investigador de métodos de intervenção ;
avalíador de planos educacionais individualizados ou para pequenos
grupos de crianças com diversos tipos de dificuldade ; animador de
projetos de inovação pedagógica;
conferencista, demonstrador de métodos, princípíos, técnicas e
processos pedagógicos em regime peripatético ou de itineráncia, etc.
Para se atingirem estes objetivos é necessário abordar, para além de
outros
problemas, a questão dos conteúdos de formação básica e de
formação especializada. É o que iremos apresentar em seguida.

3. Conteúdos de Formação

O modelo que propomos em esquema de duas árvores invertidas deve


ser
perspectivado em concordância com os blocos de formação já
apresentados.
A admissâo ao curso, a definir com critérios isentos, objetivos e
coneordantes
com as necessidades do país, deveria ser entendida como um dos
meios de valorização profissional da carreira do professorado. Os
professores ou educadores, que desejassem optar pela Educação
Especial, deveriam ter demonstrado as suas competéncias
pedagógico-profissionais no ensino regular. Em nenhuma circunstância
deveriam ser admitidos professores ou educadores etc., sem dois
anos (mínimo) de experiência no âmbito do ensino dito regular. Esta
premissa, considetada por nós essencial, é indispensável à estratégia
da inclusão progressiva do ensino especial no ensino
regular. Só com professores prestigiados no ensino regular se poderá
caminhar para
uma melhor eficácia e competência no ensino especial, daí a
relevância desta condição prévia.
A formação inicial (pré-serviço) de 2 anos, seria subdividida em 8
trimestres,
composta de um bloco de introduçâo, com cadeiras e módulos de
generalidades e de
um bloco de especlalização, já com cadeiras e módulos das diferentes
especialidades: deficiência visual, deficiência auditiva, deficiência
mental, deficiência motora,
deficiência de comunicação e deficiéncia sócio-emocional.

112
" Aformaão permanente (em serviço), incluindojá o estágio (formação
"on the
job ) deveria ser então perspectivada com base num sistema de
créditos, visando a
inovação e investigação no âmbito da Educação Especial, com a
finalidade de obter
no futuro a licenciatura em Ciências de Educação. Aqui os eandidatos
poderiam
utilizar o regime de opção, completando os créditos de acordo com as
suas disponi bilidades e interesses.

cREDIros (Ic -Is> C<


PERMANEH7
r ("EM SERVI(O"/
FORMAÇÀOPERMANENTE

NEcESSIDADES NAcIONAIS NECESSIDADES


INSTITUCIONAIS
rrr
O NECES. REGIONAIS R.E. NECES PESSOAIS
'ÌO
FORMAÇÀO G
f7 Ó
"ON THE lOB" 2
?I
CREDITOS
PoS-LABORAIS
DIFIclILDADES INTRODUÇÃO A
DE APRENDIZAGEM INVESTICAÇÃO ETIOLOGIA
7C j INCIDENCIA
TRAHALHO COM c RIANÇAS f., N P
TUTORIZAÇÀO REVENÇÃO
'' MULTIDEFICIENCIA INTEGRAÇÀO r` ~ DESENVOLVIMENTO
REONSAB.PROCRESSIVA ~Q: DV DA J DMeDMo O ~IDENOSICO PCbCE

E' INTERVEN AO PEDAG6GICA


TC INTEGRAÇÀO SOcIAL
AVALIAÇÃO INTERLIGADA
(I> DESENVOLV. cURRIcULAR
EES7RATECIASEDUCATIVAS
PAPEL DA F AMIi,IA Ì L LINGUAGEM E cO MUNICAÇAO

I
APRENDIZAGEM HUMANA TEORIA E PRATICA FNS ESPECIAL
j ~ CONFERENCIAS
Q DESENVOLVIMENTO HUMANO PROC. IDENTIFIC. CARACTERIZAÇÀO E
',r,
(x VISITAS OBSERVAÇAO zf,
JP
tjIÓ
PROBLEMATICA DA ESTÀGIO ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇAO
O
DEFICIENCIA INICIAL 1 ESPECIAL

FAM2IAS ESCOLAS

ADMISSÀO
LEGENDA
(I1- A açã Inu tigada m Inutigincá E)IpE RIENCIA NO
C - CrEditos Cicnttlicos
5 - Scmana dc Caiga H ENSINO
TC - Tmnco Comum REGULAR
DV- DcHci2na sual
DV - Dcfiáfnc á Visual
DA - Deficiéncá Audiliva
DMe - DeHcióncia Mcntal
DM - Dcfi ncia M t a FORMAÇÃO INICIAL ("PRESERVI(O"1
uN - Dcrõoa a com
RE - R,io ac E,Io
u - Iw aa u,c ", ,c"
I
113
Do ló ao 4ó trimestre, preconizar-se-ia um estágio inicial quer em
famflias,
exercendo a função de "baby sitter", quer em jardins infantis ou
escolas, exercendo
a função de vígilante ou auxiliar. De acordo com este contato direto
com o universo
dos problemas, os professores em formação, trariam para os Centros
de Formação
os dados das suas observaçôes e análises. Aí se debateriam as
questões partindo do
concreto vivido e representado, ao mesmo tempo que se planificariam
visitas a Centros especializados e a Centros-piloto, introduzindo de
imediato uma ligaçâo com a
realidade da E.E.. Conferências, "workshops", projeção de diapositivos
e filmes poderiam complementar este módulo de instruçâo.
Como cadeiras destes trimestres preconizaríamos os seguintes
conteúdos:

CONTEÚDOS DE FORMAÇÃO BÁSICA (créditos do ló ano do BA) ló e


2ó trimestres, e 3ó e 4ó trimestres

PROBLEMÁTICA DA DEFICIENCIA- Introdução à taxonomia da


Deficiência. Etiologia e Epidemiologia da deficiência. Fatores
biossociais. Fatores pré,
péri e pós-natais. Fatores atípicos do desenvolvímento intra e extra-
uterino. Incidência e Prevenção. Papel da Famia. Estimulação Precoce.
Sistema de Ensino. Sistema Vocacional. Vida Profissional. Tempo livre.
Tópicos sobre os estílos de vida.
Apresentação de casos. Visitas de Estudo. Inquéritos de atitude, etc.

ESTUDO DA ED. ESPECIAL EM TERMOS ADMINISTRATIVOS E


ORGANIZATNOS - Serviços de Educação e de Saúde. Legislação afeta à
pessoa humana.
Educação Especial comparada. Conceitos, práticas e avaliações.
Estruturas domiciliárias, estruturas pré-escolares, escolares,
vocacionais e profissionais. Fatores de seleção, processos de avaliação,
orientação escolar, etc. Finalidades da Educação Especial. Prioridades.
Estruturas administrativas locais, regionais e nacionais. Carreira
dos profissionais do setor. Educação Especial oficial e particular.
Análise sistêmica
do Universo. Estruturas de coordenação e de Supervisão. Inovação e
melhoria de
serviços. Visitas a centros, escolas, hospitais, centros de observação e
de reabilitaçâo. Trabalhos práticos, etc.

DESENVOLVIMENTO HUMANO (I e II) - Filogénese e Ontogênese.


Relações hereditariedade e meio. Desenvolvimento intra-uterino e suas
perturbaçôes:
Fatores genéticos, pré, peri e pós-natais. Fatores envolvimentais.
Desenvolvímento da Infância à Adolescência. Enfoque sobre o
desenvolvimento precoce. Processos de identificação precoce.
Introdução às escalas de desenvolvimento. Desenvolvimento e suas
Dificuldades e Atipicidades (ligeiras ou severas). Desenvolvimento
morfológico, motor, lingnístico, perceptivo, psicomotor, sócio-
emocional e cognitivo. Introdução aos principais autores do
desenvolvimento: Wallon,
Piaget, Vygostsky, Frostig, Wepman, Erickson, Freud, Ajuriaguerra,
Guilford, etc.

114
Contributos da pediatria, da psicologia, da sociologia, etc.
Apresentação de Escalas de Desenvolvimento e sua utilização
pedagógica precoce, etc.

PROCESSOS DE IDENTIFICAÇÃO, OBSERVAÇÃO, CARACTERIZAÇÃO


E DIAGNÓSTICO E ESTRATÉGIAS EDUCACIONAIS (I e II) - Exploração
de processos de observação que suportam a descrição das condições
caracterizadoras
dos diversos tipos de deficiência. Implicações para a aprendizagem,
fundamentalmente, as aquisições básicas relacionadas com os
diferentes estádios de desenvolvimento. Estratégias educacionais
concomitantes.

APRENDIZAGEM HUMANA (I e II) - Condicionalismos biopsicossociais da


Aprendizagem Humana. Condições de aprendizagem: condições
internas e externas.
Aprendizagem e comportamento. Abordagem às teorias da
aprendizagem e suas implicações educacionais específicas:
conexionistas, behavioristas, gestaltistas, teóricos
do condicionamento e do reforço. Introdução à modificação do
comportamento.
Processos de Informação: Auditivo, Visual, Tátil-cinestésico. Referência
à
atençâo e à retenção da informação.
Contribuições neurobiológicas e psiconeurológicas.
Hierarquia da Aprendizagem.
Dificuldades e Incapacidades.
Introdução ao estudo de casos. Análise de casos, etc.

TEORIA E PRÁTICA DO ENSINO ESPECIAL (I e II) - Teoria Educacional.


Dados Filosófico-históricos. Abordagem à Sociologia da Educação.
Ciência do
Ensino e dos processos de transmissão. Análise do sistema de ensino.
Processos de
ensino. Processos de comunicação verbal e não-verbal. Significação
dos processos
de comunicação prof: aluno; aluno-alunos; prof: alunos. Métodos de
ensino. Métodos de avaliação.
"Diagnostic Teaching" (Ensino diagnóstico) "Task analysis" (análise de
tarefas) "Estabelecer objetivos" sua planificação e avaliação
sistemática.
Taxonomia dos objetivos educacionais: psicomotores, afetivos e
cognitivos.
Durante os primeiros quatro trimestres (ló ano), os
professoresstudantes deveriam passar por um estágio inicúrl uma vez
por semana, ora em famz Zias com crianças deficientes como "baby
sitter", ora em escolas com intervenções supervisionadas ou
tutorizadas por professoras(es) já diplomadas. Em complemento,
dever-seiam planificar visitas, grupos de encontro, conferências,
trabalhos práticos, etc. Este
ciclo de formação deveria culminar com processos inovadores de
avaliação trimestral.
Nos restantes trimestres (do Só ao 8ó) iniciar-se-ia a
ESPECIALIZAÇ'ÃO, a
ser encarada em termos multidisciplinares, forçando sempre a
interaçâo dos problemas de aprendizagem e ensino inerentes a todas
as deficiências, introduzindo um
conjunto de cadeiras e módulos comuns a todos os prof. em formação
opcional.

115
OPÇÕES - ESPECIALIZAÇÕES
Escolha de uma deficiência para especialização

DEF. MENTAL
DEF. VISUAL . Dependentes DEF. MOTORA
. Treináveis
. Educáveis
DEF. AUDITIVA

DEF. AUDITIVA ---/ DEF. APRENDIZAGEM DEF. DA COMUNICAÇÃO


. Linguagem Falada
. Linguagem Escrita
. Linguagem Quantitativa
DEF. SbCIO-EMOCIONAIS

O conteúdo das cadeiras do TRONCO COMUM seria então o seguinte :


(Créditos do 2ó ano, BA)
TRONCO COMUM (5ó e 6ó trimestre)
DESENVOLVIMENTO CURRICULAR NO ENSINO ESPECIAL

Influência do desenvolvimento na criação de currículos. Fatores


correlaciona dos com as áreas fortes e fracas da criança. Hipóteses
explicativas. Formulação de
objetivos. Criação de tarefas e de situações-problema no Programa
Educacional Indi vidualizado. Seqenciação da Aprendizagem. Utilização
de processos sistemáticos
de modificação de comportamento. Construção de guias educacionais.
Implementa ção do currículo e sua avaliação total. Análise de tarefas e
sua complexidade. Estru turação de subtarefas. Individualização
curricular. Checklist de comportamentos.
Criação de ateliers: estimulação sensoríal, comportamento social,
imitaçâo, motrici dade global, auto-suficiência, linguagem,
psicomotricidade, etc. Planificação anual,
periódíca e por sessão. Trabalhos práticos, etc.
LINGUAGEM E COMUNICAÇÃO

Comunicação não-verbal e verbal. Hierarquia da linguagem:


linguagem inte rior, receptiva e expressiva. Natureza da comunicaçâo
humana. Iángística, psicolin gnística, neurolingnística e sócio-
lingiiística. Teorias de
aquisiçâo : nativistas e empi ristas. Códigos: aspectos sociais.
Desenvolvimento normal da linguagem. Processo re ceptivo,
integrativo e expressivo.

116
Desordens da comunicação. Diagnóstico. Intervenção.
Programas de facilitação da linguagem na Familia e na escola. Escalas
de de
senvolvimento da linguagem.
AVALIAÇÃO DA INTELIGENCIA

Abordagem à informação relevante dos testes de inteligência.


Dedução de estratégias educacionais. Introdução a Stanford-Binet.,
WISC, etc. Avaliação de crianças muito jovens. Medidas de
competência social. Testes perceptivos. Avaliação da
personalidade, etc. . .
PAPEL DA FAMILIA NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA
DEFICIENTE

Unidade familiar. Avaliação do envolvimento emocional. Atítudes dos


pais.
Famia como centro de desenvolvimento da personalidade. Famflia e
comportamento social. As relações mãe-filho, pai-filho. Papel dos
irmãos e dos avós.
Aspectos práticos relacionados com a intervenção domiciliária.
Técnicas de
entrevistas. A importância da anamnese e sua interpretação.
Quanto às especializações a serem escolhidas em regime opcional, o
5óe 6ó semestres deveriam levar a um trabalho com crianças na base
do regime de tutorização, a fm de assumirem responsabilidade
progressiva de casos nos semestres seguintes, 7ó e 8ó.
Simultaneamente com este enfoque prático, os professores em
formação deveriam em paralelo realizar um estudo longitudinal face a
cada defciência,
abordando com profundidade os seguintes aspectos por cada
deficiência: etiologia;
incidência; prevenção; desenvolvimento (motor, lingístico, perceptivo,
cognitivo e
social por cada defciência específca, na base de trabalhos práticos e
de pequenos
projetos de observação e de investigação; identifcação precoce;
formas de diagnóstico médico, psicológico, educacional); intervenções
pedagógicas específicas pré-escolares, escolares e vocacionais; e, por
último, integração social (trabalho e tempo
livre, com testemunhos de adultos deficientes).
A metodologin de formação a adotar poderia utilizar: seminários,
"workshops", conferências, "role-playing", trabalho supervisionado em
centros ou escolas,
abordagem de casos, análise de estratégias educacionais, modelos de
encaminhamento e integração escolar e social.
Cada professor em formação, deveria apresentar individualmente um
estudo
de caso onde se analisassem com critério, os aspectos médicos
(dassificação, causas,
tratamento, anatomia, fisiologia básicas, neuropsicologia específica,
etc.) e os aspectos psicológicos (dificuldades de aprendizagem
específicas, linguagem, motricidade, etc. desenvolvimento emocional,
atipicidade e desajustamento, fatores de inadaptação, necessidades
escolares específicas, etc:), e essencialmente os aspectos educacionais
(tarefas, reforços, ajudas, materiais didáticos, objetivos, etc.).

117
Os últimos trimestres, ou sejam, o 7ó e o 8ó, teriam igualmente um
Tronco
Comum, caracterizado por temas atuais como: multideficiência,
integração, dificuldades de aprendizagem, introdução à investigação
em Educaçâo, etc.
Como conteúdos poderíamos propor os seguintes :
MULTIDEFICINCIA - Etiologia. Efeitos da multideficiência nos aspectos
funcionais. Interpretação da avaliação médica, psicológica, educacional
e vocacional. Conceitos de inadaptação e de reabilitação. Planificaçâo
da intervenção. Estratégias de individualização. Equipamento.
Avaliação da criança multideficiente: deficiente visual, deficiente
auditivo, paralisa cerebral, deficientes mentais dependentes.
Programas de estimulação e reabilitação precoce. Escalas (Callier-
Azusa, Gunzburg,
1'he Down`s Syndrome Performance Inventory, etc.)
INTEGRAÇÃO - Conceitos, Modelos. Estudos comparados. Experiências
realizadas e sua avaliação. Opinião de especialistas, de pais e dos
próprios defcientes. Quem? Como? Mudanças do sistema educacional.
Prioridades. Papel dos professores. Equipamento. Importância das
variáveis de interaçâo social. Sístemas de encaminhamento. Processos
de seleção.
Classe de apoio vs. Classes especiais. Experiências e resultados.
A função de mudança da escola.
Passado, presente e futuro.
DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM

Dificuldades da linguagem interior.


Dificuldades da linguagem falada : problemas receptivos e
expressivos.
Abordagem à disnomia, disfasia e disartria.
Dificuldades da linguagem escrita : problemas receptivos e
expressivos.
Abordagem à dislexia (auditiva e visual), à dísgrafia e à disortografia.
Dificuldades da linguagem quantitativa: problemas perceptivos e
integrativos.
Abordagem à discaleulía, etc.
INTRODUÇÃO À INVESTIGAÇÃO EM EDUCAÇÃO

Metodologia das investigaçôes. Técnicas de observação e de registro.


Prática
com instrumentos correntes. Recolha, exposição e interpretação dos
dados. Estratégias de Investigação. Introdução à estatística. Avaliação
psicométrica. Da investigaçâo à prática pedagógica quotidiana, etc.
Quanto às especializaçôes em regime opcional, dever-se-ia adotar
uma abordagem diferenciada de problemas de :
diagnóstíco
perfil de áreas Fortes e Fracas
. planejamento da intervenção
estabelecimento de objetivos

118
avaliação dos níveis de realização progressiva
desenvolvimento de programas (planos de lição detalhados,
altemativas pe dagógicas, trabalho com objetivos operacionais,
avaliação da eficácia da in tervenção, elaboração de dossiers
individualizados, etc.)
experiência com materiais didáticos e com recursos específcos.
estratégias educacionais.
Paralelamente a dinâmica do curso deveria garantir:
Responsabilidade progressiva de casos (com tutor)
Trabalho prático intensivo com crianças
Contactos com centros especializados
Formadores e formados a trabalhar em conjunto com professores.
Análise
profunda da situação de ensino e de aprendizagem na base de
modernas
técnicas: "micro-teaching" e simulação. Utilização sistemática do
video tape. Estudo de caso, como avaliação trimestral.
Completados estes 8 semestres de formação, os professores seriam
integrados
já como profissionais orientados por tutores ou metodólogos, reduzindo
o tempo de
formação atualmente adotado pelo IAACF., e provavelmente tornando-
o mais eficaz.
Seria adotada então a formação "on the job", com tutores e
atendimento.
Contato regular, diário e direto com crianças, para contatar com a
situação em termos reais (relaçees com o tutor, com os formadores e
com os professores-colegas;
i.é., regime de "intemo dos hospitais").
Créditos pós-laborais (pós-estágio). Tópicos mais atuais, como por
exemplo:
dinâmica de grupo, processo da leitura, métodos novos e específicos,
sessões demonstrativas (seminários optativos visando à preparação da
dissertação - relatório
de estágio, relatório de investigação -) trabalhos de campo, artes e
ofícios, psicomotricidade, psicolingiiística, "management" da sala de
aula, análise de tarefas, treino pré-vocacional, legislação, terapias
aplicadas, projetos de investigação em desenvolvimento, etc. . . .),
deveriam ser abordados nesta fase.
Neste ano se completaria o bacharelato, culminando com a
preparação de um
relatório de estágio. O professor obteria nesta fase o certificado para o
EE. Apósgraduação seria viável a partir desta fase, concretizando o
modelo de formação permanente, na base de créditos, a que atrás nos
referimos.
A preparação da licenciatura seria efetuada em exercíeio e em três
anos de experiência profissional. O regime de créditos permitiria a
preparação de uma atitude
investigativa, terminando com as tradicionais intuições, levando a uma
monografia
ou a uma dissertação com alicerce em projetos de investigação, que
são cada vez
mais urgentes, a fim de eliminar as imprevisões e especulações, vagas
e duvidosas, habituais. Investigação e formação são efetivamente as
duas faces da moeda desta proposta de formação. Os blocos
seguintes, quase utópicos de abordar no atual sistema
de Formação de Professores em Portugal, deveriam orientar-se na
obtenção do mestrado e do doutoramento em Ciências de Educação,
com a finalidade de formar os
próprios formadores da Educação Especial.
119
Esta, em resumo, a nossa proposta para a formação futura dos
professores do
Ensino Especial em Portugal, a que não pode ser alheia à formação de
todo o professorado, que urge inovar. Caso contrário, o
desenvolvimento educacional e cultural do nosso país corre o risco de
se tornar ainda mais atípico e desviante.

120
ANEXO

ALGUNS ASPECTOS DA PROBLEMÁTICA


DA EDUCAÇÃO ESPECIAL

Com o objetivo de fazer um levantamento de alguns dos principais


problemas
da Educação Especial (EE), vamos abordar, esquematicamente, vários
pontos que
nos parecem da maior importãncia para a sua caracterização e
conhecimento, aspectos prioritários, sem os quais não se poderá levar
a cabo, o controle da sua realidade,
bem como a sua necessária e urgente transformação.
1- Definição e classificação da deficiência

1.1 - Aplicação preventiva dos fatores médicosjá conhecidos, com


progressivo apoio à investigação dos fatores desconhecídos
causadores de defectologia humana, nomeadamente no que se refere
ao aconselhamento genético e ao planejamento
familiar ;
1.2 - Adoção de medidas educacionais precoces facilitando o
desenvolvimento da criança deficiente, com extensão a medidas
vocacionais, nn sentido de uma
mais rápida integração social do deficiente ;
1.3 - Realização de investigações interdisciplinares que permitam a
adoção de
uma taxionomia da deficiência como primeiro passo para a aceitação
de uma definição e classificação, de onde poderão decorrer medidas
mais equilibradas de orientação e encaminhamento ;
1.4 - Utilização de um diagnóstico tridimensional: médico, psicológico
e pedagógico. O equilfbrio do diagnóstico visa a educabilidade máxima
possível da criança observada, com o objetivo de satisfazer as
necessidades educacionais especiais,
evitando anomalias no seu encaminhamento ;

121
1.5 - Dimensão do diagnóstico com atenção aos seguintes aspectos ;
(a) - eliminação de rótulos e etiquetas, que possam pôr em jogo
expectativas
negativistas ou segregacionistas e atitudes de piedade e resignação,
que em nada favorecem a aplicação de direitos humanos que assistem
a todas as crianças, deficientes ou não ;
(b) - revisão da legislação ou de outros regulamentos dentro de uma
visão educacional e social, através de processos mais flexíveis,
satisfazendo as necessidades
intra-individuais das crianças deficientes, ajustando-as às fãcilidades
sócio-educacionais já existentes ;
1.6 - Seleção de crianças para as classes especiais na base de um
diagnóstico
rigoroso. Em nenhuma circunstãncia a seleção pode ser arbitrária ou
negligente. No
futuro da criança deficiente, o estigma, pode representar um obstáculo
à sempre desejável integraçâo, daí o imperativo do pensamento
educacional que deverá presidir
à definição e classificaçâo da deficiéncia. O propósito do diagnóstico é
servir as crianças, no sentido de maximizar e otimizar os seus
potenciais e aptidôes. Só se deve
recorrer à classificaçâo, quando tal leva a uma mais eficiente provisão
de serviços.
O enfoque deve estar na educação e na orientação educacional e não
na aplicação
do diagnóstico só por si. O diagnóstico justifica-se pelas intervenções
pedagógicas
que sugere e prescreve. O diagnóstico nâo deve ser só descrição, mas
sim e também,
prescrição. O diagnóstico e a intervençâo constituem um todo dialético
e mutuamente interdependente.
1.7 - Avaliação da criança de acordo com o consentimento prévio dos
pais ;
1.8 - Diminuição da falta de consenso no diagnóstico, com recurso a
diagnósticos sofisticados, que em nenhuma circunstãncia devem gerar
hostilidades interdisciplinares, nem acumulações inconseqnentes de
informação mas, pelo contrário, deverão facílitar o futuro educacional
da criança e estimular a investigação psicopedagógica, de modo a
superar os vazios de conhecimento caracteristicos da EE.

2 - Identificação precoce da deficiência


2. I - A identificação precoce (IP) constitui uma prevençâo de futuros
problemas, ao mesmo tempo que abre o caminho à intervenção
precoce através de programas precoces de estimulaçâo, de
desenvolvimento e de reabilitação, podendo assim,
minimizar efeitos secundários;
2.2 - A IP poderia constar de um exame pediátrico aos 2 anos e de um
exame
multidisciplinar antes da entrada para a escola, com rastreios de rotina
da audição e
da visão aos 7 e 8 anos. A IP deveria integrar várias áreas do
comportamento, nomeadamente: compreensão auditiva, fala,
psicomotricidade, visomotricidade, criatividade, socialização, etc.
2.3 - A IP assim perspectivada garantiria as seguintes medidas de
grande significaçâo educacional: evitaria o insucesso escolar;
controlaria a negligência de sinais
de risco educacional ; detectaria a criança vulnerável ; evitaria a
dispedagogia ; orientaria pais; formaria professores na base de
investigações pedagógicas; facilitaria a cons122
trução de currículos e de tarefas educaeionais; permitiria aos
professores desenvolverem formas informais de observação e de
avaliação ; etc.
2.4 - A IP poderia constituir a primeira fase da Caderneta Educacional
Individual, meio da grande interesse soeial em paralelo com uma
Caderneta de Saúde ;
2.5 - A IP, a ser adotada, envolveria as instituições materno-infantis,
(infantários, creches, jardins infantis, etc.) e pré-escolares, de onde
decorreria uma planificação de serviços educacionais de acordo com
as necessidades e as disponibilidades.

3 - Serviços (Saúde, Bem-Estar e Educação em total coordenaÇão

3.1- A orientação dos serviços deve evoluir dos esforços privados


(Associações de Pais, Cooperativas de Educação, etc.) à
responsabilidade pública. Os deficientes devem ter o direito de
prioridade, na medida em que tém maiores necessidades
que os normais Os deficientes não podem aguardar até que estes
estejam educados.
O direito à educação é de todos, e os deficientes devem ser os
primeiros privilegiados, dado que a sua independêneia futura é mais
crítica.
3.2 - Os serviços devem pugnar pela defesa da qualidade da vida;
3.3 - A articulaçâo entre os serviços médicos, psicológieos e
educacionais,
merece ser pensada em termos de comunicação estreita;
3.4 - A rede nacional de Infantários, de Ludotecas e de Escolas Pré-
primárias
parece prioritária, para além do envolvimento das comunidades no
processo mais
vasto da Educação e da Cultura dos seus elementos, como, por
exemplo, na educação dos pais, na formação de professores e
técnicos, que deverão ser mais informados sobre as necessidades
psicofisiológicas das crianças, bem como, sobre as condições da
deficiência, a medicaçâo, os estados emocionais, os períodos críticos
de desenvolvimento, etc.
3.5 - Os professores têm de estar, por outro lado, conhecedores dos
serviços
existentes na zona ou na região, a fim de formularem recomendações
mais ajustadas
às necessidades especiais das crianças deficientes;
3 .6 - O sistema escolar e os seus agentes, têm de desenvolver uma
maior aceitaÇão pela variedade humana, oferecendo cada vez mais
oportunidades apropriadas
à iealizaçâo do potencial humano das crianças deficientes, cultivando
de início as
atitudes sociais necessárias à sua integração;
4 - Educação Pré-Primária

4.1 - Desenvolver o mais cedo possível processos de desenvolvimento


e de intervenção educacional, pois reconhecem-se como fatores vitais
para aligeirar as condiçôes da criança deficiente ;
4.2 - Desenvolver meios de colaboração com os pais, quer por
atividades domiciliares quer escolares. Não é válido, porém, alertar os
pais para o problema dos
seus filhos, quando depois não se proporcionam serviços adequados,
pois assim aumentam as tensões e as angústias. Aliás, os pais
reconhecem que não há precisão,
nem coordenação da informação dos especialistas;

123
4.3 - A entrada precoce no sistema escolar é sempre vantajosa;
4.4 - A Educação Pré-Primária pode compensar as diferenças sócio-
econômicas não legitimando, por conseguinte, as diferentes condições
de desenvolvimento,
daí a validade dos objetivos sociais preventivos e evolutivos, que a têm
de caracterizar

5 - In tegração

i 5.1 - As escolas normais ou regulares devem aumentar a sua


capacidade para
identificarem e integrarem crianças deficientes ;
5.2 A formação dos professores em exercício pode orientar-se na
aplieaçâo
de processos de identificaçâo (screening), com o objetivo de vir a
desenvolver currículos e de oferecer oportunidades educacionais;
5.3 - A escola deve equipar-se com pessoal consultivo para resolver os
problemas educativos dentro das estruturas escolares e não fora delas,
através da colaboraçâo com equipes interdisciplinares itinerantes;
' 5.4 - A integração a ser pensada deve tomar em consideraçâo a
planificação
mais geral do sistema escolar, nâo só quanto às necessidades
educacionais; comovoGacioais e sociais;
5.5 - As escolas regulares atuais deverão apetrechar-se no futuro com
equipamentos humanos e técnicos para fornecer apoio às crianças
deficientes, começando
pela flexibilidade dos programas e dos currículos, e pela criação, cada
vez mais
óbvia, de centros de recursos locais, regíonais ou nacionais;
5.6 - As deficiências mais severas justifcam unidades especiais em
espaços
próprios. As classes especiais, continuam a ser importantes só na
medida em que
proporcionam meios mais sofisticados de intervenção. As classes de
apoio, são preferíveis às anteriores pela integração que nelas está
contida, naturalmente apoiadas
por pessoal competente, que trabalhe em coordenação com o
professor das classses
regulares;
5.7 - Recomendam-se unidades de EE dentro das escolas já
existentes. As
unidades de EE a críar devem íntegrar crianças com paralisia cerebral,
deficientes
auditivos e deficientes visuais ;
5.8 - A integração tem de garantir progressivamente condições
educacionais
e sociais dentro das escolas normais e dentro das próprias
comunidades.

6 - Formação de professores

6.1 = A fornzação inicial deve dar mais atençâo ao desenvolvimento


da criança, através de situações de observação como meios
experimentais de indicação da
variãncia e da atipicidade dos "padrões normais"
6.2 - A formação inicial tem de preocupar-se com um melhor
conhecimento
dos fatores sociais e emocionais que podem facilitar ou inibir o
desenvolvimento das
crianças deficientes; por outro lado, as bases fisiológicas e biológicas
(neurobiológicas), tém de ser melhor conhecidas, para além da
sensibilização à puericultr.tra, na

124
medida em que a intervenção domiciliária (para a qual os professores
se devem preparar), o justifica plenamente, não só porque alarga o
leque da sua intervenção em
zonas desfavorecidas, como pode vir a ter uma ação meritória junto
dos pais e das
fam ilias ;
6.3 - A formação deve nortear-se pela adaptação à mudança
tornando-a especial, visto que toda a criança é especial. Tal formaçâo
só se pode obter através da
relação recíproca com uma investigação formativa centrada nos
seguintes vetores de
conteúdo: Teorias do comportamento e da aprendizagem; Perspectivas
sobre as Dificuldades de Aprendizagem e sobre a Multideficiência;
Estudos particulares sobre
a etiologia, incidência, diagnóstico, prevenção, desenvolvimento e
intervenção específica das várias deficiências; Estudo de métodos
pedagógieos com experimentação e avaliação de casos identificados e
seguidos durante a formação ; etc..
6.4 - A formação tem de respeitar o amplo conhecimento das
condições interiores, inerentes à criança, e das condições exteriores
próprias do envolvimento
educativo. Os parâmetros da mesma equacionam a necessidade de
experiências clínicas coadjuvadas com observações de campo,
advogando uma relação prático-teórica iniciada desde os primeiros
momentos da formação. A seleçâo dos candidatos
deve ser mais rigorosa, quer quanto às qualidades pessoais, quer
quanto às capacidades profissionais, de modo a garantir uma
especialização com nível científicopedagógico ;
6.5 - Os cursos a instituir terão de satisfazer necessidades
profissionais diferentes: cursos de 2 anos, de 1 ano, cursos de tempo
inteiro ou parcial, cursos por
créditos trimestrais, cursos por cargas horárias ou semanais, cursos
por qualificação
profissional, etc. Tais cursos a serem encarados como enriquecimento
e sensibilização nunca poderiam substituir a qualificação do professor
de EE de valor universitário ou equiparado. De fato, todos os
profissionais envolvidos na EE deveriam possuir uma qualificação
pedagógica adicional, combatendo assim, a falta de qualifícação tão
caracteristica;
6.6 - A carreira do professor de EE deve ser esta realidade,
introduzindo estatutos e atrativos de valorização profissional,
preparando-os para atividades préescolares (ações domiciliárias, ações
de identifcação precoce,
etc.) e pós-escolares
(ações de formação pré-profssional quer para os serviços quer para
oficinas e campos
de trabalho protegidos e integrados nas comunidades, etc.);
6.7 - Ações de sensibilização a todos os professores primários que
mais tarde
serão envolvidos na educação de crianças deficientes;
6.8 - Formação em exercício na base de um corpo docente
peripatético regional com apoio de centros regionais de formação e
animação pedagógica, se possível, com suporte nas universidades.
6.9 - Formação de Psicólogos Escolares (integração dos já formados e
desempregados), bem eomo de lLlédicos Escolares, Terapeutas da Fala
(intervindo ms
no campo educacional), Enfermeiras Assistentes Sociais, etc.
125
7 - Investigaçâo
7.1 - Acompanhar a inovaçâo do campo por pesquisas, investigação,
estudos
epidemiolbgicos, estudos longitudinais, estudos piloto, etc.;
7.2 - Troea de investigações, nacionais ou internacionais, elevando a
qualidade da investigação atual;
7.3 - Aplicação dos resultados das investigações conduzidas;
7.4 - Favorecer a investigaçâo interdisáplinar;
7.5 - Promover o desenvolvimento tecnolóco que permita a aplicação
dos
resultados, dentro de uma viabilidade econ8mica mínima;
7.6 - Atualização de conhecimentos através da atribuição de bolsas e
subsídios que permitam unificar a informação dispersa por vários
setores e serviços, concentrando-a e disseminando-a de acordo com as
necessidades ;
7.7 - Realização de conferências sobre temas mais específicos;
7.8 - Participar nos esforços internacionais de cooperação; com a
circulação
de recursos e de técnicos;
7.9 - Estimular a investigação em áreas mais controversas:
Dificuldades de Aprendizagem, Deficiência Auditiva e Deftciências de
Comunieação ;
7.10 - Planiflcar a investigação no sentido de conhecer a realidade da
Defectologia e da EE em todos os seus aspectos.
Em resumo, as medidas prioritárias inerentes à EE põem em destaque
os seguintes pontos ;
1. - Prevenção nas gerações seguintes e educação e socialização nas
crianças
deficientes atuais ; (um pouco de prevenção é preferivel a muita
terapéutica) ;
2. - Igualdade de oportunidades. Todos têm direito à educaçâo ;
3. - A escola nâo está apta para a variedade humana, daí a
importância do
pensamento educacional que deve rodear a problemática da
defíáência;
4. - Não podemos afastar ou excluir as crianças defcientes, que não
podem
continuar a ser vistas como indesejáveis, que ofendem ou perturbam a
ordem social ;
5. - Acabar com a caridade. A educaçâo de crianças deficientes
encerra um
problema de direitos humanos ;
6. - É neeessária uma atitude mais aberta face à verdade humana,
não impondo normas de rendimento e de eficácia que segregam os
mais desfavorecidos ("A sociedade deficíente"...);
7. - Transformar o sistema escolar arterioeselerótieo,
basando toda a Pedagogia ao sucesso e combatendo a tendência
seletiva e reprodutiva da escola;
8. - Otimizar os potenciais e minimizar as deficiências;
9. - Rever a legislação - sem leis perpetua-se e institucionaliza-se a
deficiência ;
10. - Instituiçâo do seguro soeial a todos os deficientes;
I 1. - Uma em cada cinco crianças precisa de um apoio escolar
espeeial. Toda
a criança é especial, como também a sua educação o deverá ser.
126
Neste Ano Internacional da Criança ó preciso pensar de uma vez para
sempre,
que a criança é uma montanha que ó preciso ir ao encontro. Mais, a
CRIANÇA E O
PAI DO HOMEM, aqui cstá a verdade da Civilização Humana, na medida
em que a
sua metamorfose é o espelho da História da Humanidade...

lLlOTEC
1M0 EDUCCIONL
dd ências dc LIt6,

127
BIBLIOTECA ARTES MÉDICAS
TÍTULOS EM PRODUÇÃO
Aimard & Morgan: Abordagem Metodológica dos Proble mas de
Linguagem
Bergeret: Personalidade Normal e Patológica
Bettelheim, Bruno: Sobrevivência e outros Estudos
Bleichmar, Emilce: O Feminismo Espontâneo da Histeria
Bleichmar, H.: Angústia e Fantasma
Brazelton: A Dinâmica do Recêm-Nascido
Castorina e cols.: Psicologia Genética
Cherry: A Procura do Sfmbolo
Condemarín, Mabel: A Escrita Criativa e Formal
Corson: Cirurgia Ginecoldgica de Greenhill
Cratty, Bryant: Desenvolvimento Perceptivo-Motor
Curtiss: A Alegria do Movimento
Czermak, Matcel: Pasxões do Objeto (Estudo Psicanalftico
dns Psicoses)
Dejour, C.: O Corpo entre a Biologia e a Psicanálise
Dolto, Françoise: Soliclão
Dolto, Françoise: A Dificuldade de Viver
Dor, Jol: Introdução a Lacan (O Inconsciente Estruóu rado como
Linguagem)
Elkaim: Formação e Prática em Terapáa Familiar
Enderle, Carmen: Psicologia da Adolescência - Uma
Abordagem Plurrdimensional
, Fain & Dejours: Corpo Enfermo e Corpo Erótico
Fromber: O Sucesso na Sala de Aula
From, Reichman - Prsncfpios de Psicoterapia Intensiva
Gearheart, B.: Distúrbios de Aprendizagem
Harari, Roberto: Discorrendo a Psicanálise
Hughes: Crianças e Números
Jerusalinsky, A.: O Inconsciente (Atas do Encontro de
Psican&lise em Porto Alegre)
Julien, Philfipe: O Retorno de Lacan a Freud
Keeney & Ross: A Subjetividade em Terapia
Klerman: Psicoterapia da Depressão
Koppitz, E.: Avaliação Psácológica do Desenho da Figura
Humana por Escolares
Kohut Hesns: Psicologia do Self
, Laplanche, Jean - Teoria da Sedução Generalizada e
Outros Ensaios
Le Boulch, J.: Rumo a uma Ciência do Movimento Hu mano
I.e Boulch J . : Face. ao Esporte
Luborsky, L.: Princfpios de Psicoterapia Psicanalftica
Mahler, M.: Os Tiques Infantis
Mannoni, Maud: Um Lugar para Viver
Marcelli & Braconnier: Manual de Psicopatologsa do Ado lescente
Mc Grath, Wilfiam: Polftica e Hi,rseria - Freud e o
Descobrimento da Psican&lise
Mc Hugh: Perspectivas da Psiquiatria
Mckinnon & Yudorfski: Manual de Avaliação Psiqui&trica
Melman, Charles: Estrutura Lacanáana das Psicoses
Milner, Jean Claude: O Amor à Lfngua
Moscovici: Psicologia Social
Neil & Kniskern: Da Psiquê ao Sistema (Carl Whitaker)
Piaget, Jean: A Representação do Espaço na Criança
Puga & Teitelbaum: Psicologia Social e Institucional
Ramos, S. P. e cols. - Akoolismo
Schaffer Roy: A Atitude Analttica
Souza, Alduísio M.: Rèlato de uma Anâlise Terminada
Tlttt, Veikko: O Relncionamento Mêdico-Paciente
Tallis e cols.: Dificuldades na Aprendizagem Escolar
, Weber: Prê-Escola
, Weirer, Myron: Psicoterapia Prática
Fim da obra

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